HERMES RODRIGUES DA FONSECA

Hermes Rodrigues da Fonseca nasceu na Vila de São Gabriel, na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, a 12 de maio de 1855, sendo seus pais o Capitão Hermes Ernesto da Fonseca e D. Rita Rodrigues Barbosa da Fonseca.

Em maio de 1866, com onze anos de idade, veio para o Rio de Janeiro em companhia da mãe e dos irmãos.

Na capital do Império foi matriculado, em 1867, no Colégio Saint-Louis do padre Jules Janrard, permanecendo apenas um ano neste educandário, já que, no ano seguinte, ingressava no Imperial Colégio Pedro II.

Com o consentimento do pai, sentou praça no 1 º Batalhão de Artilharia a Pé, para, em 1872, ingressar na Escola Militar da Praia Vermelha, cujo curso completou, “ com serena regularidade e nos padrões comuns” (1).

(1) FAGUNDES, Umberto Peregrino Seabra. Justiça Histórica ao Marechal Hermes da Fonseca. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, julho/setembro de 1984, p.69.

A 17 de dezembro de 1877, casou-se com sua prima, D. Orsina Francione da Fonseca, filha de seu tio o Cel. Pedro Paulino da Fonseca, união que perdurou até 30 de novembro de 1912, quando a mulher faleceu.

Sua carreira militar foi rápida e brilhante. Em 1876, recebeu as insígnias de 2 º Tenente, posto em que permaneceu até 1879, quando foi promovido a 1 º Tenente, contando antigüidade para ser elevado a Capitão, em 1881. Nove anos mais tarde, ou seja, em 1890, foi promovido a Major por serviços relevantes e, em outubro do mesmo ano, a Tenente Coronel por merecimento, ascendendo ao posto de Coronel quatro anos mais tarde, a General de Divisão, em 1905 e a Marechal em 6 de novembro de 1906, por ato do Presidente Rodrigues Alves.

Hermes da Fonseca ocupou muitos cargos de grande responsabilidade durante sua carreira militar.

Assim, foi Ajudante de Ordens de Sua Alteza o Conde D’Eu, durante a Comissão de que este foi incumbido pelo governo Imperial, nas Províncias do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Comentando sua nomeação para tão alto cargo, assim se pronunciou Seabra: “Não a faria o Conde D’Eu sem ter para isso motivos especiais, ligados à personalidade do oficial sobre o qual incidia” (2).

(2) FAGUNDES, Umberto Peregrino Seabra. Op. Cit., p.69.

Durante a preparação do movimento de 15 de novembro de 1889 e após a instalação da República, foi Ajudante de Campo e Secretário Militar de seu tio, o Marechal Deodoro da Fonseca, figurando entre seus colaboradores mais ativos, sensatos e leais.

Por ocasião da Revolta da Armada (1893), participou dos combates, como comandante da artilharia na Ponta da Armação, em Niterói, contribuindo decisivamente para que ela não fosse conquistada pela esquadra rebelde.

Em 1896, no governo de Prudente de Morais, foi convidado pelo Vice-Presidente Manuel Vitorino, então no exercício da presidência, para ocupar o cargo de Chefe da Casa Militar da Presidência, em substituição ao Cel. Luís Mendes de Morais, permanecendo no exercício da função, mesmo depois que Prudente de Morais reassumiu o governo.

A 24 de dezembro de 1904, foi designado comandante do 4 º Distrito Militar, elaborando, na ocasião um vasto programa de remodelação e reorganização do Exército, realizando, em meados de 1905, em Santa Cruz, as primeiras manobras do Exército, as quais despertaram grande entusiasmo nos meios civis e militares.

Referindo-se às manobras e às que se seguiram, informa Fonseca Filho: “Jamais em anos próximo a 1904, houve movimento tão vivificador do espírito militar, de preparo de tropa tão intenso” (3).

(3) FONSECA FILHO, Hermes da. Marechal Hermes. Rio de Janeiro, I.B.G.E. – Serviços Gráficos, 1961, p.59.

Sua brilhante atuação no comando do 4 º Distrito Militar, levou o Presidente Afonso Pena, cujo governo iniciou-se em 15 de novembro de 1906, a convidá-lo para a Pasta da Guerra.

Como Ministro da Guerra, teve o Marechal Hermes iniciativa pioneiras, como a introdução da Aeronáutica na organização militar brasileira e o envio da chamada “Missão Indígena”, constituída de 20 oficiais que foram mandados estagiar no Exército alemão. Além disso, criou, em caráter permanente, as Grandes Unidades, então representadas pelas chamadas Brigadas Estratégicas, tipo de organização adequada à realidade brasileira; instituiu o Serviço Militar Obrigatório; criou os Tiros de Guerra; modernizou o ensino militar; dotou o Exército de um armamento mais adequado, como o fuzil Mauser, modelo 1908, para a Infantaria, e com o material Krupp, de tiro rápido, para a Artilharia. Todos estes serviços redundaram em benefício de sua classe, da qual sempre foi um dedicado defensor.

Por ocasião da sucessão do presidente Afonso Pena, este desejava que fosse indicado à sua sucessão seu ministro Davi Campista. Contra esta candidatura se levantou Pinheiro Machado, chefe do Partido Republicano Conservador, que juntamente com outros homens públicos, como Lauro Müller, José Mariano, Francisco Sales, Francisco Glicério, defendiam a candidatura do Marechal Hermes da Fonseca, numa tentativa de “estabelecer um equilíbrio pacificador entre os grupos mais fortes do país – São Paulo e Minas…” (4).

(4) BASBAUM, Leôncio. História Sincera da República. São Paulo, Edições LB, 1962, vol. 2, p.275.

A bem da verdade, o Marechal Hermes não ambicionava nenhuma posição política. Na pasta da Guerra da presidência de Afonso Pena, “mostrava-se completamente alheio a qualquer ambição ou a qualquer outra forma de paixão política” (5).

(5) BELLO, José Maria. História da República. São Paulo. Companhia Editora Nacional, 1959, p.237.

Assim, relutando muito em aceitar sua candidatura à Presidência, acabou cedendo às pressões dos grupos políticos que o apoiavam.

Contra sua candidatura, com o apoio dos Estados de São Paulo e Bahia, ergueu-se a de Rui Barbosa, que acabara de chegar de Haia, onde, por sua brilhante atuação, conquistara enorme popularidade.

Apesar de desenvolver uma campanha eleitoral como jamais se vira no Brasil, os “civilistas”, partidários do grande jurista, foram vencidos pelos “hermistas”, partidários de Hermes da Fonseca que obteve 403.000 votos contra 222.000 concedidos a Rui Barbosa.

Apesar de sua política conciliatória, o novo presidente teve que enfrentar, logo no início de seu mandato, a Revolta da Chibata, quando alguns navios da Esquadra, entre os quais os encouraçados São Paulo e Minas Gerais, revoltaram-se sob a liderança do marinheiro João Cândido, que chegou a ameaçar bombardear a cidade do Rio de Janeiro. Pouco depois sublevava-se o Batalhão Naval, assenhoreando-se de toda a Ilha das Cobras.

No campo econômico, não eram menores as dificuldades com a desvalorização simultânea dos produtos básicos de nossa exportação – o café, a borracha e o açúcar, sendo necessário um novo acordo, um novo “funding-loan” com os credores estrangeiros.

No campo político, a chamada “Política das Salvações” propiciou intervenções armadas nos Estados que, embora permitidas pelo artigo 6 º da Constituição, provocaram grande mal-estar e tiveram como resultado a derrubada de algumas oligarquias locais, permitindo a ascensão das oposições ao poder.

Apesar de todas estas dificuldades, o governo do Marechal Hermes não deixou de ser rico em realizações administrativas e iniciativas pioneiras.

Em seu governo, a rede ferroviária nacional ganhou cerca de 4.500 quilômetros de trilhos; a cultura do trigo, praticamente abandonada, ganhou novo alento com a criação de uma Estação Experimental de Trigo, em Bagé e com as variedades Rio Negro e Frontana, conseguidas pelo geneticista sueco Ivar Beckman; foi criada, em 1913, a Escola Brasileira de Aviação, uma iniciativa pioneira que permitiu ministrar instrução de pilotagem a oficiais do Exército, da Marinha, e a civis; foram construídas as Vilas Operárias, com a entrega de casas populares, elevando o nível social e o padrão de vida das classes trabalhadoras.

O Marechal Hermes da Fonseca dando continuidade à tradição de veraneio dos Presidentes no Palácio Rio Negro, esteve em Petrópolis nos verões de 1913 e 1914, dando seqüência à prática dos despachos no referido Palácio.

Muito preocupado com os conflitos no Ceará, onde as disputas coronelísticas se agravaram, quando o Padre Cícero Romão Batista, forte aliado do coronel Floro Bartolomeu, resolveu participar dos mesmos, realizou no Rio Negro importantes reuniões para tratar do assunto, com o Senador Pinheiro Machado e o Deputado Fonseca Hermes.

Numa delas, preocupado com a evolução dos acontecimentos naquele Estado, enviou um telegrama ao General Torres Homem, Inspetor da 4 ª região militar, “concitando-o a envidar esforços no sentido conciliatório e pacificador, para impedir que se generalizasse a conflagração já existente naquele Estado” (6).

(6) Tribuna de Petrópolis, 21 de dezembro de 1913.

No verão de 1913, num de seus passeios a cavalo, pelas estradas de nossa cidade, conheceu D. Nair de Teffé , filha do Barão de Teffé, com a qual se casou a 8 de dezembro do mesmo ano, em cerimônia realizada no Palácio Rio Negro.

A respeito do importante acontecimento, a Tribuna de Petrópolis teceu os seguintes comentários: “A cerimônia civil do casamento foi presidida pelo Sr. Ticiano Teixeira Tocantins, 1 º juiz de paz, tendo como escrivão o Sr. Ten. Cel. José Caetano dos Santos, oficial do registro civil e realizou-se no salão de recepções do Palácio.

A cerimônia religiosa foi celebrada pelo Sr. Cardeal Dom Joaquim Arcoverde, Arcebispo do Rio de Janeiro, coadjuvado pelos Monsenhores Theodoro Rocha e Macedo da Costa e realizou-se no salão de despachos do Palácio, onde fora armada uma capela, ricamente ornamentada…

Foram padrinhos, no civil e religioso a Sra. Álvaro de Teffé, o senador Pinheiro Machado, o deputado Fonseca Hermes, por parte do noivo e a Sra. Pinheiro Machado e os Senhores Álvaro e Oscar Teffé, por parte da noiva.

Os noivos recepcionaram os convidados com serviços de Buffet e Buffette, fornecidos pela Confeitaria Paschoal, enquanto nos jardins do Palácio faziam-se ouvir as bandas do 55º Batalhão de Caçadores e do Corpo de Marinheiros Nacionais…” (7).

(7) Tribuna de Petrópolis, 26 de agosto de 1954.

Este foi na realidade o maior acontecimento social ocorrido no Palácio Rio Negro, com extraordinária repercussão a nível nacional e internacional.

Após deixar a Presidência, fixou residência em Petrópolis, instalando em sua casa uma oficina de artesanato, onde, após seus passeios matinais, se distraia, trabalhando em madeira e em couro, pequenos objetos para adorno.

A 9 de setembro de 1923, vítima de uma síncope cardíaca, falecia o Marechal Hermes da Fonseca, na residência de seus sogros, à rua Silva Jardim, em Petrópolis. Noticiando o infausto acontecimento, a Tribuna de Petrópolis assim se pronunciou: “Com o seu desaparecimento perdeu o Exército Nacional a sua figura mais representativa dos últimos vinte anos e o Brasil um filho que sempre soube honrar o seu país… Como chefe da Nação, não levou para o poder nenhum ressentimento. O seu governo respeitou os direitos dos adversários da véspera e preocupou-se em atender às necessidades do país. Houve erros, mas estes foram resgatados pelos benefícios praticados… Não fez testamento porque nada tinha para deixar. Sua viúva ficou apenas com a pensão do seu soldo” (8).

(8) Tribuna de Petrópolis, 11 de setembro de 1923.

Antes de falecer, dispensou todas as honras militares a que tinha direito. Segundo seu desejo, foi sepultado à paisana, tendo o corpo coberto com a bandeira do Brasil, de seda bordada a ouro, que as senhoras do Estado do Amazonas lhe haviam ofertado, quando, na qualidade de Ministro da Guerra, inaugurou a Linha de Tiro de Manaus, em 1908.