A CAPELA DOS CORRÊAS E SUA SUCESSORA

Raul Ferreira da Silva Lopes, ex-Associado Titular, Cadeira n.º 32, Patrono – Oscar Weinschenck, falecido

(Resumo)

Não havia nas terras da Serra da Estrela nenhuma capela que atendesse os anseios religiosos de quem por ali vivia. Estamos falando dos meados do século XVIII; Ana do Amor de Deus era proprietária da Fazenda Rio da Cidade e casou-se com Manoel Antunes Goulão que recebeu as terras, por carta de sesmaria, que confrontavam com a dela; com a união foi aumentado o latifúndio do casal.

Ana consagrara o seu nome à devoção do Amor de Deus. Os dois tornaram-se, por conseqüência, responsáveis pela difusão do culto à Virgem, na região das glebas do Piabanha.

Como não havia nenhuma capela na região serrana, Manoel Antunes requereu, a quem de direito, licença para erigir uma capela com a faculdade de usar a pia batismal e tomou a Santa Virgem como padroeira, sob a invocação do Amor de Deus. Foi construída e benzida e tornou-se a primeira capela levantada “nas amáveis terras da Serra da Estrela”.

Não está muito claro nos escritos este assunto. Deduz-se que essa primeira capela foi erguida modestamente na fazenda Rio da Cidade e só depois passou para a casa da fazenda dos Corrêas, pois sua colocação, privilegiada, às margens da Estrada dos Mineiros, a tornaria mais acessível à veneração da Virgem. Nela se ampliaram depois os ofícios religiosos com a realização da lei do matrimônio e teve, também, a regalia do Santíssimo Sacramento.

“O altar era suntuoso, de madeira burilada, e a imagem de Nossa Senhora do Amor Divino foi talhada num só bloco de pesadíssima madeira. Era realmente um precioso exemplar de estatuária religiosa artística, de uma perfeição de detalhes inimitável”.

Ajoelharam-se a seus pés senhores e modestos escravos das fazendas que formariam, depois, a maior parte do nosso município, bem como os forasteiros e autoridades que por ali passavam.

Em 1823, o marechal Cunha Mattos, hóspede cinco dias na fazenda, deixou escrito em seu diário, a seguinte referência: “ao lado da casa do padre Corrêa existia uma belíssima capela com perfeitas imagens de santos, e um lindo presépio. Esse presépio, armado em local engenhosamente preparado, possuía dimensões que excediam do vulgar.”

“As numerosas figuras, de gesso e de madeira artisticamente trabalhada, foram, aos poucos, depois que a fazenda entrou em decadência, tomando destino ignorado”.

D. Pedro I e família, que várias vezes se hospedaram na fazenda, e em cujos aposentos tinham comunicação interna com a capela, costumavam assistir aos ofícios religiosos.

O erudito doutor Escragnolle Dória, em 1926, fez uma curta temporada de repouso em Corrêas. Na “Revista da Semana” do mesmo ano, escreveu: “Ainda há pouco, viajando, teve alguém ensejo de passar por antiga fazenda mais ou menos como tal a deixou a escravidão, embora apropriada a outros mistéres. Quase tudo ali é outrora: os quartos amplos, as salas espaçosas, os largos soalhos para séculos, sobretudo a capela, recinto pequeno, silencioso, de meia luz, ao fundo do qual surge o altar-mór, antigo e único, porém cuidado, vestido de alva toalha; Nossa Senhora, no lugar de honra, imagens de santos formando côrte de respeito”…

Desde 1924, porém, já se cogitava seriamente, pelos moradores católicos, de se possuir um templo moderno que substituísse a pequena capela da fazenda.

A 29 de maio de 1928, fundou-se em Corrêas a “Irmandade do Espírito Santo e de Nossa Senhora do Amor Divino”.

Essa Irmandade além de cumprir sua missão de promover as comemorações do mês mariano e os festejos do Espírito Santo, empenhou-se na construção de um novo templo. Várias quermesses e campanhas foram realizadas no parque do hotel D. Pedro I – antiga casa da fazenda – para angariar recursos que possibilitassem a realização do sonhado projeto.

A 17 de agosto de 1930, foi finalmente, depois de vários tropeços, lançada a pedra fundamental, em terreno já adquirido, não muito longe da capela da fazenda.

Tratava-se de uma realização em marcha, que seguiria até a sua completa finalidade, encaminhada por intrépidos batalhadores.

“A planta de sua construção obedeceu o desenho da matriz de Bráz de Pina, do Rio, que por seu turno reproduziu o modelo de uma igreja da Holanda.”

Muita luta foi necessária para se obter recursos para a obra, mas o povo de Corrêas não decepcionou, bem como os devotos do Amor Divino.

A 28 de agosto de 1932, dois anos após o lançamento da pedra fundamental, o novo templo, “sóbrio e confortável, com muita graça, muita luz, muito ar e excelente acústica, abria-se solenemente ao culto público”.

Foi aproveitado o altar que pertencia à antiga capelinha, admirável exemplar de obra de entalha. A bela imagem de Nossa Senhora do Amor Divino ganhou seu novo trono e Corrêas preservou a tradição de 200 anos, iniciada na fazenda Rio da Cidade, e continuada na fazenda do padre Corrêa.

Nota: Os donos do Hotel D. Pedro I, Antonio Machado e sua mulher, foram os principais entusiastas promotores da nova Igreja. Eles doaram o altar e a imagem de Nossa Senhora que ainda estavam na velha capelinha da Fazenda, originais.

Fonte:
Antonio Machado – Trabalhos da Comissão do Centenário de Petrópolis, 1941, volume. IV, pgs. 49 a 60.