O CENTENÁRIO DA FÁBRICA GETÚLIO VARGAS EM PIQUETE-SP

Cláudio Moreira Bento, associado correspondente

A Fábrica Getúlio Vargas foi inaugurada em 15 de março de 1909, no então recém criado município de Piquete-SP. A idéia de sua construção foi iniciativa do Ministro da Guerra (1898-1902) Marechal João Nepomuceno Medeiros Mallet, filho do Marechal Emílio Luís Mallet, patrono da Artilharia do Exército.

Anteriormente, em 1898, o Ministro havia criado o Estado-Maior do Exército junto com a então Fábrica de Pólvora e Explosivos de Piquete, a primeira de pólvora sem fumaça na América do Sul constituindo-se, ambos, pontos de inflexão para a Reforma Militar do Exército (1898-1945). Tal reforma elevou os baixos índices operacionais do Exército de 1874-1887, aos elevados índices comprovados pela Força Expedicionária Brasileira durante a 2ª Guerra Mundial nos campos da Itália, onde ela fez muito boa figura, ao lutar contra ou em aliança com frações dos melhores exércitos do mundo presentes na Europa.

O nome da Fábrica foi mudado, mais tarde, para Fábrica de Piquete e, em 8 de dezembro de 1942, para Fábrica Getúlio Vargas. Um dos valorosos chefes da construção da fábrica de pólvora de base dupla foi o Coronel Luiz Sá Affonseca que, como general, chefiou a construção da AMAN (vide do autor: Os 60 anos da AMAN em Resende. Resende: Gráfica do Patronato, 2004).

O próprio Presidente Getúlio Vargas visitou a Fábrica em outubro de 1942, na ocasião em que ocorriam as manobras do Exército no Vale do Rio Paraíba.

A construção da fábrica teve início em julho de 1905, no governo do Presidente Rodrigues Alves, por determinação de seu Ministro da Guerra, Marechal Francisco Paulo Argolo (1896 e 1902/6) e foi conduzida pela equipe do Tenente-Coronel Augusto Maria Sisson.

O local definido para a fábrica atendia a critérios topográficos, estratégicos e geopolíticos, principalmente por situar-se entre os dois maiores centros industriais brasileiros, Rio de Janeiro e São Paulo.

Por questões de ordem técnica, o local inicialmente escolhido foi substituído pela região das fazendas Estrela do Norte, Limeira e Sertão.

A construção da Fábrica Getúlio Vargas levou três anos e atendia ao objetivo de melhor assegurar a soberania e a integridade do Brasil, cujas forças armadas dependiam da importação de munições e explosivos.

Cabe ressaltar que em 1908 ocorreu a Grande Reforma do Exército, levada a efeito pelo Marechal Hermes da Fonseca, e marcada pela criação de Brigadas Estratégicas. A reforma importou fuzis Mauser, metralhadoras Madsen, canhões Krupp e as respectivas fábricas de munições, que foram instaladas em Realengo.

O projeto da Fábrica foi elaborado nos Estados Unidos da América, em Nemours, pela Companhia Eleuthère Irénée du Pont que enviou para o Brasil, com a finalidade de acompanhar por quase um ano a instalação, o engenheiro L. W. Burwirth, o químico Theodore Baker e o mecânico T. R. Wright.

Em 25 de maio de 1905, teve início a fabricação de pólvora sem fumaça. Cerca de três meses mais tarde o Exército recebeu o primeiro lote fabricado no Brasil.

Em 1911, a Fábrica de Piquete conquistou o Grande Prêmio da Exposição de Torino, Itália. Em 1922, na Exposição Internacional do Rio de Janeiro, comemorativa do Centenário da Independência do Brasil, recebeu mais uma vez “O Grande Prêmio”.

O seu primeiro diretor foi o Ten. Cel. Achilles Veloso Pederneiras, que regressava da missão de Adido Militar nos Estados Unidos, onde discutiu questões para a construção da Fábrica com Eleuthère du Pont, além da compra de materiais a ela destinados. Permaneceu por seis anos na nobre função. Há diversas citações que enaltecem o trabalho do Ten. Cel. Pederneiras. Uma das mais significantes consta no livro de visitas e foi redigida pelo arquiteto Adolpho Morales de Los Rios Filho: “Ao ilustre Coronel Pederneiras, alma de artista num corpo de aço, fundador e primeiro Diretor da Fábrica, o meu incondicional parabéns!”

O Coronel Pederneiras deixou a Direção da Fábrica em 14 de março de 1915 para dirigir o Arsenal de Guerra do Rio. Veio a falecer dois anos depois.

A partir de 1977, a Fábrica Getúlio Vargas foi incorporada à Indústria de Material Bélico (IMBEL), empresa vinculada ao Comando do Exército.

A Fábrica de Piquete foi um dos grandes feitos do Exército e marcou a presença pioneira do Exército no Vale do Rio Paraíba. Presença militar resgatada em 1996 no Simpósio de História do Vale do Paraíba, promovido pelo IEV em Resende, na AMAN, na AEDB e, em Itatiaia, no Centro de Recuperação do Exército, no qual atuamos na direção científica como 2º vice-presidente do IEV. Dela saíram produtos para quartéis, fortalezas, navios e aviões, uma contribuição estratégica expressiva para as Forças Armadas do Brasil.

A Fábrica representou a vanguarda na fabricação de explosivos industriais e deu origem à indústria nacional de explosivos químicos. Seus produtos foram vitais na construção, em todo o Brasil, de suas hidrelétricas, túneis, estradas, metrôs, prospecção de petróleo, mineração de carvão, ferro e ouro, tornando-se conhecida em todo o Brasil, até entre os caçadores como eu fui, com sua célebre pólvora Piquete sem fumaça, muito superior à pólvora com fumaça que, lembro, era da marca Elefante.

Assim, apresentamos a síntese histórica deste empreendimento do Exército, criado com a dupla finalidade de abastecer o Exército e a Armada (Marinha) com seus produtos, entregando as sobras ao mercado, adaptadas no que conviesse, aos usos correntes, criando assim uma fonte de receita para o Estado; e proceder a estudos técnicos relativos a pólvoras e explosivos, como também, mediante indenização, para fins particulares.