A PRINCESA E O FREI

Otto de Alencar Sá Pereira, ex-sócio –

09 de Abril de 1937; 13 de Maio de 1888. Duas datas quase esquecidas pelos brasileiros e petropolitanos em particular. A primeira marca a morte de Frei Luiz, a segunda a Lei Aurea. Por que estão esquecidas? Por que, também, Frei Luiz e a Princesa Isabel estão sendo relegados a um segundo plano? Ambos viveram grande parte de suas vidas em Petrópolis. O “santo” e a “redentora”! Américo Mendes de Oliveira Castro, talvez o único escritor que ousou contar a vida de Frei Luiz (Editora Vozes – 1942), em um pequeno e precioso opúsculo, narra-nos a morte e enterro de Frei Luiz, no capítulo XIX: “Levantou-se sobre Petrópolis, no dia 09 de Abril de 1937, uma linda manhã de começo de inverno”. Depois de nos colocar no cenário petropolitano daquele triste dia ( alegre para os anjos e santos do Céu), ele nos assusta: “Frei Luiz morreu! Eis o que se ouvia em todos os cantos da cidade, em todos os lugares, quando duas ou mais pessoas se abordavam. A desoladora notícia voava dos tugúrios aos palácios e destes às moradias mais modestas. Naquela manhã não se cogitou de outra coisa em Petrópolis….: mais adiante, ele acrescenta: “Como que obedecendo a uma senha silenciosa, de todos os recantos da cidade a multidão, qual formigueiro imenso diligente e tenaz, moveu-se em direção à Igreja do Sagrado Coração de Jesus”. Era uma verdadeira romaria silenciosa e respeitosa, uma massa de pessoas que estampavam no rosto a orfandade. Todos o queriam ver, em seu ataúde, pela última vez, queriam tocá-lo à busca de uma graça ou de um milagre. Por que? Por que tudo isso? Responde-nos o salmista: “Porque sei que ensinaste a Verdade.” Poder-se-á acrescentar: “praticaste a caridade, imitaste o Divino Mestre, foste grande devoto da Virgem Imaculada.” Frei Luiz, ainda sem a palidez marmórea, repousava em frente ao Altar-Mór, com seu hábito de São Francisco, as mãos cruzadas tendo o crucifixo e o terço entre os dedos. As flores cobriam o chão da igreja. Os frades pediam que não se as colocassem na eça, para não esconderem o corpo do “santo” defunto. Houve Missa de Corpo Presente e o enterro era à tarde. Impossível entrar na igreja. Eis que surge a Família Imperial. Diz-nos Oliveira Castro: “A Família Imperial, sempre e em toda parte tratada com respeitoso acatamento e filial reverência, que seus imensos serviços a esta Terra e suas peregrinas e inexcedíveis virtudes justificam, chegou ao adro, foi preciso que um solícito franciscano, que, providencialmente avistara a Princesa Isabel, premida no meio da multidão, conseguisse com o respeito que sempre inspirou o hábito de São Francisco de Assis, e que naquela ocasião se impunha mais do que nunca, fazer os fiéis cerrar fileiras, abrindo assim uma estreita faixa na massa humana, por onde a Princesa ( e naturalmente os demais membros da Família Imperial) pode esgueirar-se, (…..) e tomar parte em todas as solenidades da cerimônia.”

Princesa Isabel! Parece-nos uma idéia universal! Oliveira Casto estaria plagiando Platão? Sim, assim como o brasileiro também considera D. Pedro, idéia universal, confundindo Pedro Alvares Cabral com D. Pedro I e com D. Pedro II !? (de Pedro a Pedro). Princesa Isabel! Certamente não se tratava da Redentora, pois esta falecera no exílio na França, em 1921, portanto 16 anos antes. Seria esposa de D. Pedro de Alcântara (filho mais velho da Princesa Isabel, titular da Casa de Orleans e Bragança, porém que renunciara a seus direitos ao Trono, justamente para consorciar-se a ela? ) Mas ela era conhecida como Princesa D. Elizabeth (embora Isabel seja Elizabeth em português)! Quem seria? Sua filha mais velha? D. Isabel de Orleans e Bragança, que teria então 25 anos e já era casada há 2 anos com Henrique (VI) de França, o Conde de Paris? D. Isabel do Brasil, filha de D. Pedro Henrique (O Chefe da Casa Imperial), não seria possível, pois só nasceria 3 anos depois…. e na França. O provável mesmo é que fosse a Senhora Condessa de Paris. O interessante, entretanto, na narrativa de Oliveira Castro, é a falta de interesse em especificar genealógicamente “qual a Princesa Isabel”? O Brasil sempre terá um D. Pedro e uma Princesa Isabel! São valores universais ( Platão). Entretanto, de fato, a Princesa Isabel a Redentora, deveria estar ali presente, em espírito. Não que o tivesse conhecido em vida, pois Frei Luiz só chegou a Petrópolis ( vindo da Bahia, e antes da Alemanha) em 1900, 11 anos depois do exílio da Família Imperial, mas certamente o conhecia de nome e santidade, uma vez que a Princesa, do exílio não se afastou dos interesses pelo Brasil, principalmente no que tangesse o espírito e a catolicidade. Seus filhos e netos que se possibilitaram, estavam ali, no enterro de Frei Luiz (o exílio da Família Imperial, foi abolido em 1922). Ela deveria conhecê-lo pela “fama de santidade”. A princesa era católica fervorosa. Por estas razões, conjecturo que, em espírito, a Princesa Isabel, a Redentora, estaria com toda certeza no enterro de Frei Luiz. Havia semelhança entre os dois, como sempre ocorre, com aqueles que “imitam a Jesus Cristo”.

Duas passagens marcam a semelhança do Frei e da Princesa: Na hora do perdão! Tentaram assassinar Frei Luiz em 1931 com um tiro, na portaria do Convento. Vendo-se banhado de sangue, julgando que ia morrer, só teve dois pensamentos: chamar o Superior para lhe ministrar o Sacramento da Penitência (absolvição) e rogar que perdoassem o facínora que o tentara matar.

A Princesa Isabel, depois de uma luta insana, contra os escravocratas, na qual ela precisou até derrubar o Gabinete de Ministros do Barão de Cotegípe, para poder nomear o abolicionista João Alfredo Corrêa de Oliveira e assim poder propor ao Parlamento, a Lei Aurea e finalmente sancioná-la, depois deste desprendimento verdadeiramente heróico, pois sabia que a conseqüência seria a queda da Monarquia ( o que de fato ocorreu um ano e meio depois), arguída, já no exílio, que se adivinhasse que perderia o Trono, teria assinado a Lei? Respondeu: “Quantos tronos houvesse a cair, eu não deixaria de assiná-la”.

Por que estão esquecidos? Respondo com as palavras do Evangelho: “Os seus reinos não eram deste mundo”!