CUM CHRISTO IN PACE CONFRADE IVO ALBUQUERQUE Fernando Antônio de Souza da Costa, Associado Titular, Cadeira n.º 19 – Patrono Galdino Justiniano da Silva Pimentel Quem conhecia Ivo Albuquerque desde logo se sentia cativado pela criatura afável e cordial que ornava o homem e o intelectual de multifacetados matizes culturais. E nesse mesmo diapasão não se concebia a presença de Ivo sem Linda, sua mulher. Atuante e elegante transitava em todas as camadas prestando relevantes serviços às obras sociais e assistenciais. Fomos alvejados pela presença do querido casal por diversas vezes em nosso escritório o que incluiu uma estada conosco em Cabo Frio bem antes de se mudarem para Belo horizonte, Minas Gerais. Eram elegantes no trajar e no conviver. Figuras presentes em todos os acontecimentos sociais, culturais e religiosos da Imperial Cidade de Petrópolis durante o tempo em que aqui residiram. Mereceram o reconhecimento público e foram distinguidos com o Prêmio Academia Petropolitana de Letras. Ivo em suas visitas ao escritório onde militamos gostava, sobretudo, de conversar conosco sobre os assuntos que versavam política e história. Há quinze dias telefonou para nossa casa como de costume. Ivo e Linda Albuquerque Agora me apercebo de que ele estava a se despedir. Conversou com Célio por longo tempo. Era mesmo o abraço de despedida do amigo aos amigos que subiu ao regaço paterno no sábado dia 9 de dezembro de 2017. Ele que nasceu no Rio de Janeiro, a 04 de dezembro de 1934. Possuía um rico, expressivo e dignificante curriculum vitae. Fez seus estudos secundários no Colégio Militar do Rio de Janeiro, ingressando, posteriormente na Academia Militar das Agulhas Negras, onde concluiu o Curso de Artilharia. Possuía ainda o Bacharelado em Ciências Contábeis e Administrativas, o Mestrado em Aplicações Militares, pela Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais e o Doutorado em Aplicações, Planejamentos e Estudos Militares, pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e vários cursos de Especialização e Extensão. Foi agraciado com as seguintes Condecorações: Ordem do Mérito Militar, no Grau de Cavaleiro, Medalha Militar do Prata, Medalha do Pacificador, Medalha da Organização das Nações Unidas (UNIPOM), Medalha Prêmio Internacional da Paz 1988, Medalha Marechal Hennes, Medalha do Sesquicentenário da Independência (Universidade Federal de Mato Grosso) e Medalha Marechal Mascarenhas de Moraes, as quais lhe conferem a condição de personalidade de alta expressão cultural, militar e cívica. Recebeu ainda 71 referências elogiosas durante sua permanência no Serviço Ativo do Exército e, como Oficial do Estado-Maior, teve ressaltados seu valor pessoal e zelo profissional através de expressivas citações dos então […] Read More
DOM PEDRO II: REFLEXÕES SOBRE O MONARCA INTELECTUAL
DOM PEDRO II: REFLEXÕES SOBRE O MONARCA INTELECTUAL Alessandra Bettencourt Figueiredo Fraguas, Associada Titular, Cadeira nº 27 – Patrono José Thomáz da Porciúncula Ao contrário das biografias clássicas de d. Pedro II que, além de apontarem para a dualidade entre o monarca e o cidadão, reforçam os epítetos de rei filósofo, erudito e mecenas, as recentes pesquisas fornecem indícios suficientes para a formulação da hipótese de que o imperador pôde contribuir direta e significativamente com a construção do conhecimento, configurando-se, para além do diletante, em um tipo de intelectual característico do último quartel do século XIX. Os seus estudos tradutórios e traduções, como salientam os pesquisadores coordenados pelo linguista Sergio Romanelli, ou a atuação como mestre das suas filhas, as princesas Isabel e Leopoldina, preparando-as para o governo da casa e, sobretudo, do país, como tem mostrado a historiadora Jaqueline Aguiar, por si só, permitiriam situar Pedro II, na acepção das mais recentes abordagens historiográficas, como um intelectual mediador, ou aquele que se dedica a atividades ou práticas de mediação cultural. No caso das traduções, por exemplo, a teoria literária reconhece o processo criativo implícito no trabalho, que não aparece como mero exercício de erudição, mas como uma ressignificação do texto original a partir dos códigos culturais do tradutor. Além disso, ao perfil de estadista mecenas, estudos têm contraposto a importância de Pedro II em uma rede de sociabilidade que envolvia intelectuais de várias partes do mundo, com os quais o imperador não só colaborou, financiando seus projetos, ou enviando amostras que pudessem fundamentar suas teorias, mas debatendo com afinco teses que pautariam um novo paradigma científico. O caso mais conhecido talvez seja o apoio financeiro e moral que deu para a fundação do Instituto Pasteur, criado em 1887, quando a teoria sobre os micro-organismos causava grande desconfiança e contestação. Não à toa, ainda hoje o busto de Pedro II encontra-se instalado na “Sala dos Atos”, no Museu Pasteur, em Paris. No Brasil, d. Pedro II foi um importante agente para a consolidação de dois espaços de pesquisa fundamentados na cultura científica dos últimos decênios do século XIX, relacionado às ciências práticas, ou que pudessem ser, segundo a concepção da época, úteis às conquistas materiais e, em última instância, à modernização do país. Neste sentido, na década de 1870, o imperador atuou diretamente para a fundação da Escola de Minas de Ouro Preto e a reorganização do Museu Nacional, especialmente […] Read More
120 ANOS DO DESASTRE DE CANUDOS (OS)
OS 120 ANOS DO DESASTRE DE CANUDOS Francisco José Ribeiro de Vasconcellos, Associado Emérito, ex-Titular da Cadeira n.º 37 – Patrono Sílvio Júlio de Albuquerque Lima Delenda Canudos foi a ordem terminante dos que em 1897 detinham nas mãos os cordéis do poder. Mas Canudos era conseqüência e como sempre ocorreu no Brasil, é sempre este que está na alça de mira dos poderes constituídos, ignorantes da velha máxima latina: sublata causa, tolitur effectus. Trocando em miúdos, somente subtraindo-se a causa e que se exterminará o efeito dela advindo. A questão de Canudos pôs a nu a tragédia social do interior nordestino, velha de muitos séculos, teúda e manteúda no feudalismo renitente, na escravidão à ignorância, no desesperado apelo aos milagreiros NE profetas, no cambão na paranóia coletiva em busca do nirvana. As causas do fenômeno canudiano foram levantadas e discutidas pelo gênio de Euclides da Cunha e as soluções para o drama sertanejo, com base no diagnóstico, dependeriam apenas da vontade política dos governos, fossem eles estaduais ou federais. Mas debelar causas custa tempo e dinheiro e isso não interessa ao imediatismo politiqueiro dos nossos coringas, que jamais pensam e agem a longo prazo e que só dispõem de verbas para supérfluos, fachadas e na advocacia em causa própria. E o desastre de Canudos, que afora cumpre 120 anos, provocou o seu maléfico efeito cascata. A desgraça comum seguiu latente Nordeste afora e a sedição do Juazeiro de 1913/1914 e todo o fanatismo que se desenvolveu no Cariri cearense em torno do Padre Cícero, comprovaram que a hégira continuava viva no sertão, como escreveu Euclides da Cunha. Segundo os historiadores, o desastre de Canudos foi a origem do processo de favelização do Rio de Janeiro, agravado no princípio do século XX com a reforma de Pereira Passos, que ao acabar com os infectos cortiços da região central da cidade, não criou nos subúrbios dela conjuntos habitacionais dignos e seguros para abrigar os egressos do bota abaixo. E como diria o velho Carvalhal Lage, muitas tempestades ainda estavam por vir. Repensar Canudos nesta lastimável quadra em que vivemos na atualidade, é lamentar os 120 anos perdidos com basófias, demagogias e populismos, alheios aos sábios ensinamentos de Euclides da Cunha. Passamos essas doze décadas evitando a lupa e o bisturi, usando e abusando de ungüentos, mesinhas e compressas; dourando pílulas, colorindo misérias, escondendo verdades, empurrando detritos para debaixo do tapete. Segundo […] Read More
D. PEDRO II ERA REPUBLICANO?
D. PEDRO II ERA REPUBLICANO? Alessandra Bettencourt Figueiredo Fraguas, Associada Titular, Cadeira nº 27 – Patrono José Thomáz da Porciúncula A pergunta já abordada por importantes veículos de comunicação no país pode parecer paradoxal, para não dizer estapafúrdia, em um primeiro momento, mas para surpresa de muitos, pode-se dar a ela uma resposta afirmativa. Aliás, este questionamento pode ser solucionado sob duplo aspecto. Em sentido estrito, d. Pedro II acreditava, sim, ser a república a mais apurada forma de governo, embora declarasse que o Brasil ainda não estava pronto para ela. Esta concepção vincula-se ao Iluminismo, especialmente a Montesquieu, para o qual, se a população é voltada para a causa pública – a virtude cívica – a ordem deveria ser a republicana. Ainda assim, o próprio Montesquieu defendera a monarquia constitucional moderna como a mais adequada dadas as condições históricas do seu tempo. Esta linha de pensamento não era estranha a d. Pedro II, como podemos exemplificar a partir de um fragmento de seu diário[1], escrito já no exílio, em 5 de janeiro de 1890, portanto, logo após os acontecimentos do 15 de novembro. Ao comentar a opinião de Carlos Leôncio da Silva Carvalho, que havia sido ministro, ocupando a Pasta dos Negócios do Império no Gabinete Liberal de 1878 a 1880, d. Pedro nos permite entrever o seu posicionamento diante dos fatos que levaram à sua deposição: […] Confessa Leôncio de Carvalho que não queria já a república porque o imperador criterioso e verdadeiramente amigo do país aceitava a federação das províncias como disse Saraiva e porque para a república ser o governo do povo pelo povo era preciso primeiro educar e preparar os cidadãos (Minha opinião ficou bem clara quando tratei disso com Saraiva). O ex-imperador … favorecia com inexcedível generosível [sic] generosidade a educação popular. Os fatos cuja responsabilidade pertence aos maus amigos e conselheiros da Coroa precipitaram os acontecimentos. [1] Os diários de d. Pedro II integram o Arquivo da Casa Imperial do Brasil (POB), pertencente ao acervo do Arquivo Histórico do Museu Imperial/Ibram/MinC. Ver BEDIAGA, Begonha (Org.). Diário do Imperador D. Pedro II: 1840-1891. Petrópolis: Museu Imperial, 1999. Em 7 de abril de 1890, o ex-imperador completaria: “Abdicara [sic] como meu Pai se não me achasse ainda capaz de trabalhar para a evolução natural da república.” No ano seguinte, em 4 de junho de 1891, revelou: “(…) não duvidaria aceitar a presidência da república, […] Read More
ARQUIVO DE ALCEU AMOROSO LIMA (O)
Arquivo de Alceu Amoroso Lima (O) Leandro Garcia, da Academia Petropolitana de Letras Petrópolis é mundialmente conhecida pelas suas belezas naturais, artísticas e históricas. Entretanto, a Cidade Imperial possui uma dimensão ainda pouco valorizada – a de ser uma cidade de pesquisas, considerando os seus importantes arquivos: o do Museu Imperial, o Municipal e, particularmente, o acervo pessoal de Tristão de Athayde (1893-1983), salvaguardado no Centro Alceu Amoroso Lima para a Liberdade, o CAALL, localizado na Rua Mosela 289, sua antiga residência na cidade. Quero falar deste último. Alceu foi o mais importante intelectual leigo católico do Brasil, bem como o maior crítico literário do nosso modernismo. Por esta última razão, teve contato com os principais escritores nacionais, especialmente entre as décadas de 20-50. A prática da correspondência foi a sua principal ferramenta, por isso saíam e chegavam à Mosela 289 uma infinidade de missivas, enviadas e recebidas dos diferentes rincões do país, tudo através dos Correios. Alceu de Amoroso Lima, Tristão de Athayde (1893-1983) Desta forma, ao longo da vida, Alceu organizou o seu precioso arquivo, que hoje compreende aproximadamente 50 mil documentos entre cartas, fotografias, recortes de jornal, manuscritos e outras naturezas textuais. O mais importante: tudo disponível à consulta e à pesquisa do público em geral. Desnecessário dizer da importância deste espaço para Petrópolis e para o mundo, e não exagero em dizê-lo, pois o acervo do CAALL se abre à investigação de forma interdisciplinar: Literatura, Teologia, História Geral, História da Igreja e outras temáticas. Assim, o arquivo de Alceu Amoroso Lima se abre a inúmeras possibilidades e potencialidades investigativas e hermenêuticas, em natureza sempre aberta, num sintomático processo de work in progress. Sabe-se que a Epistolografia – área da Teoria Literária que investiga cartas e correspondências – é uma ciência ainda incipiente no Brasil. Fato estranho e paradoxal, já que a carta sempre foi muito usada pelos nossos escritores. Todavia, uma pesquisa sistematizada, nos estudos literários brasileiros, é algo que começou a partir dos anos 2000, com a publicação do primeiro volume da correspondência de Mário de Andrade (com Manuel Bandeira), feito pelo Instituto de Estudos Brasileiros da USP. Alceu sabia da importância da sua correspondência, tanto que a organizou de forma meticulosa em diversos armários da sua casa, na Mosela 289, dando uma forma pessoal de organização e catalogação. O velho mestre usou suas cartas para construir uma boa parte do seu pensamento, para dar informações e […] Read More
MARTHA WATTS E O COLÉGIO AMERICANO: UMA EDUCADORA PIONEIRA EM PETRÓPOLIS (PARTE II)
MARTHA WATTS E O COLÉGIO AMERICANO: UMA EDUCADORA PIONEIRA EM PETRÓPOLIS (PARTE II) Alessandra Bettencourt Figueiredo Fraguas, Associada Titular, Cadeira nº 27 – Patrono José Thomáz da Porciúncula Grupo de alunos e alunas do Colégio Americano, no Palácio Itaboraí, de propriedade da Igreja Metodista, no Valparaíso. Petrópolis. Sem data. Crédito da Imagem: Acervo Arquivo Histórico. Museu Imperial/Ibram/MinC A missionária norte-americana Martha Hite Watts (1845-1909) é reconhecida na História da Educação pelo seu pioneirismo e pelas inovações pedagógicas que propôs. Em 1881, em Piracicaba/SP, fundou o primeiro colégio metodista do Brasil (atual Universidade Metodista de Piracicaba), e revolucionou o ensino ao trabalhar com classes mistas, seja reunindo meninos e meninas, seja por estarem abertas tanto a alunos protestantes quanto católicos. Além disso, introduziu classes de jardim-de-infância, e defendeu a importância dos laboratórios para experimentos científicos, atrelando o conhecimento teórico à verificação prática, um paradigma pedagógico extremamente revolucionário no final do século XIX.[1] [1] ELIAS, Beatriz Vicentini. Inovação Americana na Educação do Brasil. In: Revista Nossa História, n. 23, 2005, p. 81-83 Seu trabalho chamou a atenção de Prudente de Morais (terceiro Presidente da República do Brasil), que à época era Presidente do Estado de São Paulo, e a convidou para assessorar a reforma educacional que visava implementar em seu governo. Ela não aceitou a proposta por considerar mais importante a tarefa de criar outras escolas metodistas e, de Piracicaba, mudou-se para Petrópolis, onde fundou o Colégio Americano, em abril de 1895. A ideia do Colégio Americano em Petrópolis surgiu também como uma resposta às demandas das famílias, particularmente as da elite, que desejavam se refugiar na cidade serrana. Se, no ramo católico, o Colégio Notre Dame de Sion, exclusivo para meninas, transferiu-se para Petrópolis, passando a funcionar no Palácio Imperial (hoje Museu Imperial), do lado protestante, os metodistas compraram o Palácio Itaboraí[2], de propriedade do arquiteto Antonio Januzzi, que havia projetado, na década de 1880, o templo da Igreja Metodista do Catete, no Rio de Janeiro. É muito provável que, desde então, Januzzi tenha estreitado a relação com os metodistas, que culminou com a venda do seu palacete em Petrópolis. [2] Atualmente, o Palácio Itaboraí pertence à Fundação Oswaldo Cruz. O Colégio Americano visava atender a brasileiros e estrangeiros que buscassem o que Martha Watts chamava de “educação liberal, tendo por fim o desenvolvimento moral, intelectual e físico dos alunos”. Funcionou em Petrópolis, como internato e externato, até o início década de 1920, quando, […] Read More
MARTHA WATTS E A MISSÃO METODISTA EM PETRÓPOLIS (PARTE I)
MARTHA WATTS E A MISSÃO METODISTA EM PETRÓPOLIS (PARTE I) Alessandra Bettencourt Figueiredo Fraguas, Associada Titular, Cadeira nº 27 – Patrono José Thomáz da Porciúncula Martha Hite Watts. Bardstown, 1845 – Louisville, 1909 (Kentuck, EUA) Agente da “Womans Board of Foreign Missions” dos Estados Unidos. Créditos da Imagem: Acervo Centro Cultural Martha Watts/Instituto Educacional Piracicabano Desde o início do movimento metodista, ainda no século XVIII, na Inglaterra, a participação das mulheres foi uma realidade, a começar por Susana Wesley e, posteriormente, as 27 pregadoras autorizadas a trabalharem como leigas por John Wesley, a principal liderança do movimento que buscava reformas dentro da Igreja Anglicana. Nos primeiros anos do Metodismo no Brasil, há registros sobre as “mulheres visitadoras”, encarregadas de visitas e leituras da Bíblia para uma população majoritariamente analfabeta. A partir de 1880, ganhou fôlego o projeto educacional, que visava à criação de escolas como forma de expansão do campo missionário, no qual as mulheres tinham um papel essencial: de um lado, as que estavam nos EUA sustentando financeiramente a missão; por outro lado, as que vinham para o Brasil para implantar o trabalho e organizar as escolas, cujo lema “evangelizar e civilizar” atrelava-se aos ideais modernizantes e civilizatórios que permearam o clima intelectual da Belle Époque. É neste contexto que, em 1895, o projeto metodista foi estabelecido definitivamente em Petrópolis, a partir de duas vertentes missionárias: a organização da Igreja, com doze membros, sob o pastorado do Reverendo James L. Kennedy; e a criação do Colégio Americano, que ocupou o Palacete Januzzi (hoje Palácio Itaboraí), sob a direção de Miss Martha Watts, reconhecida pelo seu pioneirismo no campo da educação. Como integrantes das missões metodistas norte-americanas – financiadas pela Igreja Metodista Episcopal do Sul dos Estados Unidos -, Martha Watts e James L. Kennedy vieram juntos para o Brasil, em 1881. Mas foi em Petrópolis que, pela primeira vez, ambos se fixaram para o desenvolvimento de um trabalho conjunto. Martha Hite Watts é o primeiro nome no Rol de Membros da Catedral Metodista e, quanto à constituição da segunda igreja protestante da cidade, relata, em 1896: “(…) Desde então o irmão Kennedy preparou um grande salão em uma localidade central e nosso trabalho realmente começou. No primeiro domingo em que nos reunimos ali, ele organizou uma escola dominical com vinte e nove membros. (…).”[1] [1] Martha Watts, carta de janeiro de 1896, publicada em MESQUITA, Zuleica (org.). Evangelizar […] Read More
AINDA OS 190 ANOS DOS CURSOS JURÍDICOS
AINDA OS 190 ANOS DOS CURSOS JURÍDICOS Francisco José Ribeiro de Vasconcellos, Associado Emérito, ex-Titular da Cadeira n.º 37 – Patrono Sílvio Júlio de Albuquerque Lima Os que leram o artigo anterior sobre esse tema hão de pensar que eu me contrapus à iniciativa da criação dos cursos jurídicos no Brasil em 11 de agosto de 1827. Não seria esta a leitura correta do meu texto. O fato de haver examinado algumas decorrências culturais da implantação de tais cursos entre nós não significa negar o meu aplauso a tamanho cometimento que sobre ter começado a formar profissionais do Direito em território nacional estimulou a mocidade brasileira no rumo da interdisciplinaridade jurídica, de modo a capacitá-la a dedicar-se aos mais variados ramos da atividade liberal com boa margem de segurança calcada na abrangência do conhecimento da cultura humanista. Porém, o que não se pode negar é o chamado irresistível ao estudo da cultura bacharelesca entre nós, decorrente dos movimentos acadêmicos durante décadas. Trata-se de um estudo instigante e atrativo. Quando em 1977 transcorria o sesquicentenário da criação dos Cursos Jurídicos, Lourenço Luiz Lacombe, então diretor do Museu Imperial, promoveu um ciclo de palestras para comemorar o acontecimento. Trouxe professores de Pernambuco, de São Paulo e do Rio de Janeiro. E eu me recordo que entre os temas mais debatidos figurava justamente o pertinente à cultura do bacharelismo. E essa cultura evidencia-se de várias formas, inclusive pela ostentação palavrosa tão comum nos tribunais do júri, onde o drama existencial é vivido por personagens reais, protagonizados pelos profissionais da defesa e da acusação num duelo feroz em que não faltam os mais requintados lances teatrais. Esse teatro gratuito sempre calou fundo na alma popular, para a qual crime sempre foi sinônimo de homicídio, julgado necessariamente no Tribunal do Júri. E por causa do espetáculo do júri ficou na imaginação popular que advogado é aquele que fala muito e bonito. Tudo isso de uma certa forma tem a ver com a prevalência do Direito Público sobre o Privado, principalmente em matéria criminal. Em 110 anos, isto é, de 1830 a 1940, nós tivemos três Códigos Penais e somente um Código Civil que raiou em 1916. O criminalista italiano Cesare Lombroso, nascido em 6/11/1835, na cidade de Verona e falecido a 19 de outubro de 1909 em Turim, foi o pai da teoria do criminoso nato que se revelava através de uma índole comportamental […] Read More
D. PAULA MARIANNA, A PRINCESA SEM A QUAL PETRÓPOLIS PROVAVELMENTE NÃO EXISTIRIA
PAULA MARIANNA, A PRINCESA SEM A QUAL PETRÓPOLIS PROVAVELMENTE NÃO EXISTIRIA Bruno da Silva Antunes de Cerqueira, Associado Correspondente Poucos conhecem a história da loura filha de D. Pedro I e D. Maria Leopoldina que nasceu no Rio de Janeiro em 17.02.1823 e faleceu na mesma cidade em 16.01.1833. Paula Marianna Leopoldina Joanna Carlota Faustina Mathias Francisca Xavier de Paula Michaela Gabriela Raphaela Gonzaga era a quinta filha do casal imperial. Seus dois prenomes principais foram a homenagem do pai às Províncias de São Paulo e Minas Gerais (capital Mariana), que tanto auxiliaram D. Pedro e D. Leopoldina no processo emancipatório do Brasil. A rigor, ao nascer, D. Paula foi “Infanta de Portugal e do Brasil”, haja vista não existir, ainda, nossa Constituição, promulgada somente em 25.03.1824; a partir daí, D. Paula foi somente princesa do Brasil, ainda que genealogicamente continuasse a ser infanta portuguesa. Os grandes biógrafos e historiadores da mãe e do pai (Carlos Oberacker Jr., Octavio Tarquínio de Sousa, Pedro Calmon e outros) apontam que foi, em grande medida, para tratar das enfermidades de D. Paula que D. Pedro I se decidiu pela aquisição da antiga Fazenda do Padre Corrêa. D. Paula era asmática e epilética, como todos os demais seus irmãos — exceção para D. Maria da Glória (mais tarde D. Maria II, rainha de Portugal) —, mas, dizem os citados autores, sofria também de “doenças do fígado”. Episódio triste na história de vida dessa princesa que durou tão pouco foi, em julho de 1826, o reconhecimento oficial de D. Izabel Maria de Alcantara Brazileira (filha da Marquesa de Santos) como filha do Imperador e a concessão do título de Duquesa de Goiás. Houve uma exasperação de D. Leopoldina no Paço de São Cristóvão, seguida de ação firme da rainhazita (D. Maria II de Portugal), negando-se a cumprimentar a “bastarda”. Neste momento torpe do pai-herói — literalmente —, D. Pedro teria ameaçado bater em D. Maria II, ao que ela retorquiu-o dizendo que ele não podia afrontar a soberana de Portugal. D. Paula Marianna saiu em defesa da irmã-madrinha e atacou a Duquesa de Goiás, ao que levou algumas palmadas de D. Pedro [1]. [1] Episódio a que se referem vários autores. Cf. LUSTOSA, Isabel. D. Pedro I, um herói sem nenhum caráter. Cia. das Letras, Rio de Janeiro, 2006. P. 231 A perda dessa irmã foi muitíssimo sentida por D. Jannuaria, D. Francisca e o pequeno […] Read More
HÁ 190 ANOS NASCIAM OS CURSOS JURÍDICOS NO BRASIL
HÁ 190 ANOS NASCIAM OS CURSOS JURÍDICOS NO BRASIL Francisco José Ribeiro de Vasconcellos, Associado Emérito, ex-Titular da Cadeira n.º 37 – Patrono Sílvio Júlio de Albuquerque Lima Enquanto nossos vizinhos hispanomericanos conheceram a Universidade desde o século XVI, nós apenas tivemos algumas Faculdades somente no século XIX. E os cursos jurídicos raiaram aqui a 11 de agosto de 1827 com a criação das Faculdades de Direito de Olinda e de São Paulo. Desde então, deixamos de buscar as luzes do saber jurídico na Universidade de Coimbra, para nos nutrirmos delas em dois pontos estratégicos do Império: Pernambuco com irradiação pelo Norte/Nordeste; São Paulo polo de atração dos estudantes do Sul/Sudeste. Mas não foram poucos os casos de fluminenses, mineiros e até paulistas que cursaram a Faculdade em Olinda e de nordestinos que colaram grau em São Paulo. Feliz intercâmbio capaz de aproximar o arquipélago que compunha o Brasil Imperial. Mas longe da praticidade da vida forense, do objetivismo do pleito judiciário, o teoricismo livresco, a retórica de braços com a vaidade tupiniquim, criaram a cultura do bacharelismo promovendo a doutor o simples bacharel que jamais defendera qualquer tese perante austeras bancas examinadoras. Deslumbrada matrona campista, nascida aí por 1870, mãe de numerosa prole não se cansava de apregoar aos viventes de acanhada freguesia rural do município norte-fluminense: – Os meus filhos serão doutores! Era o título valendo mais que a profissão nem sempre exercida. E até hoje no sul da Bahia é raro ouvir-se de alguém formado em Direito ser ele advogado. O que ocorre com frequência é a declaração enfática: – Eu sou bacharel! O diploma de conclusão do curso jurídico era o passaporte vip para a carreira política de sucesso, calcada quanta vez no discurso palavroso, inconsistente, alegórico, distante da realidade nacional. Uma locução francesa valia mais que uma atitude pragmática. A cultura bacharelesca criou a hipertrofia do Direito Público, relegando o Privado a segundo plano. A prova cabal disto está no fato de só termos conhecido o Código Civil em 1916, apesar dos esforços anteriores de Augusto Teixeira de Freitas (1816-1883). Entretanto, a Argentina com Dalmacio Vélez Sarsfield (1800-1875) e o Peru tiveram Código Civil bem antes de nós, o primeiro em 1869 e o segundo em 1852. Durante o século XIX e até no princípio dos novecentos, mestres e alunos deixaram-se empolgar pelas escolas penais italianas e pelos constitucionalistas franceses, alemães, espanhóis e portugueses. Enrico […] Read More