ORA (DIREIS) OUVIR BILAC Leandro Garcia, membro da Academia Petropolitana de Letras Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac (1865–1918) se orgulhava de possuir, no seu nome próprio, a métrica do verso alexandrino, a grande marca formal da sua poesia. Este elemento, dentre outros, é relevante quando pensamos a vida e a obra deste grande poeta brasileiro, um dos mais populares da nossa literatura. Homem de grande cultura, Olavo Bilac teve sua vida ligada a diversas atividades além de sua produção lírica. Foi cronista, crítico de literatura e de teatro, autor de literatura infantil, tradutor, defensor de diversas campanhas cívicas como o serviço militar obrigatório (especialmente na Primeira Guerra Mundial) etc. Entretanto, foi na imprensa que se notabilizou, atuando em diversos órgãos da época, como A Imprensa (1885-1891), A Leitura (1894-1896), Branco e Negro (1896-1898), Brasil-Portugal (1899-1914), Azulejos (1907-1909), Fon-Fon (1905-1918), O País (1910-1912), Jornal do Commércio (1910-1915), Diário de Notícias (1915-1918) e Atlântida (1915-1918). Na historiografia literária, Olavo Bilac se eternizou como o Príncipe dos Poetas Brasileiros, título dado pela revista Fon-Fon, em 1907, após votação popular entre os leitores daquele periódico. É também comum lembrá-lo como membro da Tríade Parnasiana, ao lado de Alberto de Oliveira e Raimundo Correa. De fato, Bilac nos legou poemas inesquecíveis, versos de uma força lírico-expressiva que transcendem ao tempo, como “Ora (direis) ouvir estrelas! Certo, / Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto, / Que, para ouvi-las, muitas vezes desperto / E abro as janelas, pálido de espanto…”. Inclusive, do ponto de vista crítico, podemos abrir uma série de debates acerca destas classificações engessadas, pois em muitos dos seus poemas, a dimensão parnasiana se realiza apenas na forma, no apreço pela metrificação perfeita, pela seleção vocabular nobre que lhe proporcionava as rimas raras. Todavia, em termos de temática, sua poesia visitou outras escolas, especialmente a romântica e a simbolista, pela opção de temas como o amor, a morte, a solidão e o sonho. Então como classificá-lo, parnasiano ou simbolista? Isto é um dos problemas da atual revisão que temos feito, nos cursos de Letras, do cânone literário nacional. Prefiro dizer que grandes poetas e escritores excedem a classificação de escolas e movimentos, por isso são atemporais. Problema semelhante temos com o poeta petropolitano Raul de Leoni, cujo único livro Luz Mediterrânea sofre justamente com esta indefinição crítico-historiográfica, uma vez que Leoni optou pela métrica exuberante – parnasiana – dentro de temáticas […] Read More
DADAMA DO IMPERADOR (A)
DADAMA DO IMPERADOR (A) Luciano Cavalcanti de Albuquerque, Associado Correspondente Marianna Carlota de Verna Magalhães Coutinho (1779-1855), mais conhecida como a Dadama do imperador D. Pedro II, nasceu em Elvas, Portugal, e saiu da Quinta das Carrafouças, propriedade do marido, quando veio para o Brasil com a corte. Casada com o Conselheiro Joaquim José de Magalhães Coutinho, e com a filha nos braços, Maria Antonia, que completou dois anos em pleno Atlântico, deixava para trás parentes e amigos horrorizados por tamanha aventura. Sua dedicação ao marido e à família real, a quem serviam, a predispunha a enfrentar essas agruras, denotando, muito desapego. No Rio de Janeiro, Dom João doou ao Conselheiro Joaquim José, terras no Engenho Novo, onde construíram uma bela chácara; na propriedade, viveram cinco gerações dessa família. Após a volta da Corte para Portugal, passaram a servir ao Príncipe Regente D. Pedro. Logo D. Marianna Carlota enviuvou, quando o Conselheiro Joaquim José, em dia de grande gala, morreu, subitamente, ao lado do já Imperador D. Pedro I, em cerimônia na Igreja do Outeiro da Glória. A Dadama também possuía uma casa no Centro, para mais prontamente atender aos compromissos oficiais, era na Rua do Lavradio, a primeira residencial da cidade. Quando D. Pedro I abdica e sai do Brasil, a primeira mulher em quem pensa para tutora do pequeno D. Pedro II é justamente D. Marianna Carlota, dama da imperatriz. Na cena desesperadora que foi esse embarque, D. Pedro I manda, e roga, que Marianna Carlota cuide de seus filhos D. Pedro II e irmãs, como se fossem seus próprios filhos. Foi nomeada aia do menino-imperador, que de tanto lhe indicarem que ela era a sua dama, chamava-a de Dadama. Retrato da Condessa de Belmonte. Detalhe do quadro Coroação de D Pedro II, de François René Maureaux, de 1842. Coleção Museu Imperial A Dadama, sempre carinhosa e devotada aos novos “filhos” imperiais, soube dividir com seus filhos naturais, o mesmo amor e dedicação, discordando do tutor, José Bonifácio, o qual achava muito severo: às escondidas, dava brinquedos às crianças, antes de irem para a cama, quando por algum castigo, estavam proibidas de entrar no quarto de brincar. Ela mesma escreveu o Pequeno Catecismo Histórico, dedicado ao imperador-menino, para começar a sua instrução religiosa; mais tarde, D. Pedro II deu à netinha da Dadama, Francisca Carolina, o mesmo catecismo, com a mesma intenção, estando na família, até hoje, como relíquia. […] Read More
RUA DO IMPERADOR, 744
RUA DO IMPERADOR, 744 Luciano Cavalcanti de Albuquerque, Associado Correspondente Dos exemplos mais raros, da nossa arquitetura, em quase todo território nacional é o art nouveau, como também o chamamos por aqui, terra de francesismos e anglicismos. Não foge à regra a Cidade Imperial; em caminhadas e caminhadas pelas ruas e avenidas, quase não se vêem edifícios com os traços curvilíneos dessa “arte nova”, característica da Belle Époque. Esse quase fica por conta do número 744 da Rua do Imperador. Está derretendo? Pouco provável, mas sua decoração com linhas sinuosas, de cima a baixo, nos sugere algo em movimento, que se arrasta lentamente pela fachada, geminada a outras quase contemporâneas, nesse importante eixo do projeto urbano do nosso major Koeler. E será que está aí mesmo? Sim é claro, podemos até, além de olhar, tocar, entrar e garantir que é verdade, mas essa casa poderia estar muito bem ambientada em Bruxelas, um dos mais importantes centros do art nouveau no nosso planeta. Em 1925, como muitos desses sobrados do início do séc. XX, funcionava como residência e negócio, nessa época de Victorio Falcone. Já em 1931 era uma confeitaria onde também se jogava xadrez; temos ali, em 1933, a Padaria Eldorado de Antonio Rinaldi. Dois anos depois, Pedro Burger instala um armarinho onde também se vendiam “Chapéus de Cabeça”, assim mesmo, donde se conclui que muitos chapéus serviam a mesma cabeça, principalmente das elegantes senhoras da época, onde véus, flores e laços de fita os enfeitavam, os homens talvez tivessem uma cartola e um coco, no máximo, e se muito, um Panamá. Até 1937 a casa funcionou como a fábrica, primeiro de bolos de Isaura Bulls, precursora dessas nossas atuais e depois de vime, agora com Eugenio Cavalli. Quando, então, em 1937, pertencente a Horácio Magalhães Gomes, instala-se um elegante cassino onde se jogava, além do xadrez, bacará e roleta, o “campista”, meio em desuso hoje em dia, um interessante jogo de azar com três baralhos.
HISTÓRIA E MEMÓRIA NOS 175 ANOS DE PETRÓPOLIS
HISTÓRIA E MEMÓRIA NOS 175 ANOS DE PETRÓPOLIS Alessandra Bettencourt Figueiredo Fraguas, Associada Titular, Cadeira nº 27 – Patrono José Thomáz da Porciúncula O historiador francês Pierre Nora já afirmara que “a necessidade de memória é uma necessidade da história”. A comemoração dos 175 anos da criação da Povoação-Palácio de Petrópolis, pelo Decreto Imperial nº 155, de 16 de março de 1843, neste sentido, não deixa de remeter também a uma batalha pela memória, a qual envolveu os mais eminentes intelectuais da cidade nos anos que precederam a celebração do seu centenário, na década de 1940. De um lado, estavam aqueles ligados particularmente ao Instituto Histórico de Petrópolis, e que defendiam o 16 de março como a data da fundação de Petrópolis, liderados por Alcindo de Azevedo Sodré. Do outro lado, encabeçados por Antonio Joaquim de Paula Buarque, ex-prefeito, e a Academia Petropolitana de Letras, os que entendiam que o major Júlio Frederico Koeler era o verdadeiro fundador da cidade e que o 29 de junho de 1845, que marca a chegada dos colonos germânicos, deveria ser escolhida como a data em torno da qual se dariam as festividades do centenário. Anteriormente, em setembro de 1937, havia sido criada, por ato do então prefeito municipal Yeddo Fiúza, a Comissão do Centenário de Petrópolis, tendo como presidente de honra d. Pedro de Orleans e Bragança, príncipe do Grão Pará, composta por um grupo de estudiosos da história de Petrópolis encarregados de pesquisar e escrever sobre as origens da cidade, desde os tempos coloniais (como importante ponto de ligação da variante do Caminho Novo, por onde o ouro extraído das Minas Gerais chegava até o Porto de Magé) – passando pela compra da Fazenda do Córrego Seco pelo imperador d. Pedro I e, mais tarde, no Segundo Reinado, pelo arrendamento desta mesma fazenda ao major Koeler – até a elevação da povoação à categoria de cidade, em 1857, alcançando os primeiros anos do período republicano, quando foi capital do Estado do Rio de Janeiro, entre 1894 e 1902. Somando-se aos esforços da Comissão do Centenário, há que se sublinhar o empenho pessoal do presidente da República, Getúlio Vargas, e do interventor federal do estado do Rio de Janeiro, Ernani do Amaral Peixoto, para que os festejos obtivessem pleno êxito. No entanto, outras organizações municipais, como a Associação dos Amigos de Petrópolis, fundada pelo coronel João Augusto Alves, e a imprensa local, além […] Read More
LÍDIA BESOUCHET: UMA INTELECTUAL FEMINISTA EM PETRÓPOLIS
LÍDIA BESOUCHET: UMA INTELECTUAL FEMINISTA EM PETRÓPOLIS Alessandra Bettencourt Figueiredo Fraguas, Associada Titular, Cadeira nº 27 – Patrono José Thomáz da Porciúncula Em conversa com um amigo escritor, confirmei o que a intuição já apontava: é bastante comum despertarmos o interesse pela trajetória dos estudiosos que nos precederam em relação ao nosso objeto de pesquisa. Este foi precisamente o meu caso com relação à Lídia Besouchet (1908-1997), uma das três mulheres autoras de biografias de d. Pedro II. Antes dela, a historiadora norte-americana Mary W. Williams já havia escrito, em 1937, o seu Dom Pedro the Magnanimous, Second Emperor of Brazil. Completando a tríade feminina em meio a dezenas de biógrafos, Lilia Schwarcz lançou, em 1998, As Barbas do Imperador, que se tornaria uma referência incontornável. O que eu não poderia imaginar, no entanto, é que Lídia Besouchet, que publicou a biografia de d. Pedro II em 1975, e, em versão ampliada, o seu Pedro II e o Século XIX, em 1993, fosse uma das principais combatente pelos direitos das mulheres, na década de 1930, e que tivesse, para além do seu interesse por d. Pedro II, uma importante ligação com a história de Petrópolis. Nascida no Rio Grande do Sul, na adolescência, Besouchet mudou-se para Vitória, no Espírito Santo, onde iniciou sua trajetória intelectual, tornando-se um dos grandes nomes da escrita feminista capixaba, através dos textos que veiculou na revista Vida Capixaba, em cujas colunas desafiava o paradigma de mulher ideal, dedicada ao matrimônio e à maternidade, e questionava a submissão imposta às mulheres pela ordem patriarcal. Formou-se como professora, em 1924, frequentando, mais tarde, o Curso Superior de Cultura Pedagógica, onde teve os primeiros contatos com os ideais da Escola Nova, que, entre outros pontos, defendia a laicidade e o ensino público universal. A partir daí, não tardaria a ampliar seus questionamentos, sobretudo pautada nas leituras socialistas, que a levariam ao pensamento revolucionário e à aproximação com a Juventude do Partido Comunista. Nas rodas intelectuais de esquerda, Besouchet encontraria o seu companheiro, o jornalista Newton Freitas, com quem se mudou para o Rio de Janeiro no final de 1933. Instalados na capital carioca, o casal se dedicou à atividade jornalística e ao engajamento político, aderindo, em 1935, à Aliança Nacional Libertadora (ALN), de cunho progressista e antifascista. Paralelamente à sua militância no PCB e na ANL, onde se envolveu no movimento “Pão, Terra e Liberdade”, Lídia Besouchet atuou […] Read More
GRANDE GUERRA E PETRÓPOLIS (A)
GRANDE GUERRA E PETRÓPOLIS (A) Oazinguito Ferreira da Silveira Filho, Associado Titular, Cadeira n.º 13 – Patrono C.el Amaro Emílio da Veiga “A grande guerra”, como ficou conhecida, ocorreu em época onde não se discutia se uma guerra era justa ou injusta, como hoje é corrente, mas nada lhe retira a imagem de processo desumano, bárbaro de imensa irracionalidade. Sua denominação permaneceu até os anos 30, possuindo origem em uma guerra europeia que se expande arrastando aliados. Resultado do choque entre poderes políticos de Estados que se propunham hegemônicos com discursos nacionalistas, xenófobos, destruidores. Coroados pelos interesses econômicos do imperialismo, geoestratégico, tecnológicos que se orientaram por ideologia de superioridade nacional neodarwinista, evoluindo posteriormente para discurso racial. Sua representatividade era sinônimo da arrogância econômica das nações que arrotavam hegemonia à época. René Remond (1974) questionava o porquê de se atribuir tamanha importância à guerra? Não estaríamos superestimando seu papel? Suas consequências foram tão decisivas a ponto de mudarem a história da humanidade? Quanto às responsabilidades, presumidas ou aceitas, como no caso da Alemanha, perguntamos ainda o porquê da Alemanha ter desejado o conflito? Questão nacional? Econômica? Expansão? Necessidade vital do militarismo prussiano? A procura por novos mercados? Rivalidade com a Inglaterra? Poder, domínio ao custo de mais de dez milhões de mortos. Uma aventura nesta contabilidade hoje centenária! Pode ser que tenha transformado os países nela implicados, pois alteraram regimes, negócios, fronteiras, sistemas de forças, mas o mundo não se tornou melhor, pelo contrário em seu vácuo surgiram conflitos imensos que produziram seis vezes mais o número de mortos que esta. Discute-se ainda se a segunda guerra não seria sua extensão, garantida pela subdivisão. Continuidade em uma extensa faixa temporal de conflitos camuflados por disputas menores e imensos genocídios? Para o nosso país, noticiários dos jornais da Capital Federal refletiam esta surpresa, de certa forma com grande entusiasmo como registrou o jornal A Noite: “O entusiasmo do povo aglomerado na nossa artéria principal não tinha limites” (Avenida Rio Branco); “… à aparição de um símbolo das nações aliadas, vivas eram ouvidos acompanhados de salva de palmas, de aclamações ruidosas…”. Mas todo este entusiasmo não se compararia aos problemas vividos por nossa localidade serrana no decorrer de 1917 (Tribuna de Petrópolis). Em outubro, o “paquete” Macau, brasileiro, foi torpedeado por um submarino alemão no Atlântico, sendo o quarto, fato que “… conduziu nosso governo a proclamar o estado de guerra entre o […] Read More
VOU À AVENIDA
“VOU À AVENIDA” Joaquim Eloy Duarte dos Santos, Associado Titular, Cadeira n.º 14 – Patrono João Duarte da Silveira Maria de Fátima Moraes Argon, Associada Titular, Cadeira n.º 28 – Patrono Lourenço Luiz Lacombe É comum até os dias de hoje os moradores de Petrópolis dizerem “Vou à Avenida”, quando na verdade o nome do logradouro é Rua do Imperador. É uma história curiosa. A rua do Imperador vem dos tempos da monarquia, quando os principais logradouros do Quarteirão Vila Imperial receberam os nomes de membros da Família Imperial. Exemplos: rua Princesa D. Francisca, rua Princesa D. Januária, rua do Imperador, rua da Imperatriz, rua Princesa Isabel, rua Princesa D. Leopoldina, praça Príncipe Grão Pará, rua Dom Afonso. Com a mudança do regime, no dia 15 de novembro de 1889, tornando o país uma república federativa, cerca de um mês depois a nova ordem política republicana exigiu da Câmara Municipal de Petrópolis a mudança dos nomes dos logradouros, numa clara intenção de apagar a memória da monarquia. Assim, a rua Princesa D. Francisca virou rua General Osório; a rua Princesa D. Januária, Marechal Deodoro; a rua do Imperador, avenida 15 de Novembro; a rua da Imperatriz, avenida Tiradentes; a rua Princesa Isabel, Treze de Maio; a praça Príncipe Grão Pará, praça da Liberdade; e a rua Dom Afonso, avenida Koeler. Cuidemos da rua do Imperador, anteriormente avenida 15 de Novembro. Seu primeiro nome foi trocado em 5 de dezembro de 1889, pouco menos de um mês depois da mudança do regime, com a chegada da República. Assim, passou a denominar-se Avenida 15 de Novembro. Por muitos anos, a rua do Imperador, rebatizada avenida 15 de Novembro, foi inteiramente adotada pela população, que a denominava simplesmente “avenida”. No entendimento dos nossos legisladores, com o apoio dos estudiosos de nossa história, resolveu-se restaurar os antigos nomes das ruas do Imperador e da Imperatriz, o que ocorreu nos anos de 1979 e 1983 respectivamente, desaparecendo de nossa nomenclatura urbana a avenida 15 de Novembro e a avenida Tiradentes. O povo, no entanto, jamais deixou de referir-se à rua do Imperador como “avenida”, o que perdurará por muitos e muitos anos à frente. Então, “- Vamos à Avenida?”; “- Minha loja é na Avenida ; “ – Moro na Avenida”. E pelo traçado urbanístico e relevância histórica, afinal, a rua do Imperador é mesmo uma larga avenida.
ALUNO ALCEU E O PROFESSOR KOKPE (O)
ALUNO ALCEU E O PROFESSOR KOKPE (O) Maria de Fátima Moraes Argon, Associada Titular, Cadeira n.º 28 – Patrono Lourenço Luiz Lacombe Assim começa a carta [i] dirigida a Alceu Amoroso Lima (1893-1983), datada de 14 de agosto de 1926 e assinada simplesmente Winckelmann: “Permitta-me V. a quem perdi de vista ha tantos annos e venho agora encontrar, pelas saudades e recordações que acaba de trazer á beira do tumulo de um velho Mestre, o mesmo menino que conheci como o derradeiro discipulo de meu pobre Pae; […] meu comovido ‘obrigado’ pelas palavras de seu artigo de domingo último”. [i] Arquivo Tristão de Athayde. Acervo do Centro Alceu Amoroso Lima para a Liberdade – CAALL (Rua Mosela, 289 – Petrópolis), unidade da Universidade Candido Mendes. Quem era Winckelmann? Quem era o velho Mestre? Recorrendo aos jornais com os quais Dr. Alceu colaborava, localizamos n’O Jornal, edição de domingo, 7 de agosto, o artigo “O precursor” que elucidava a questão: tratava-se do professor João Kopke e de seu filho, Winckelmann Köpke (1886-1951). Esse e outros artigos de Dr. Alceu publicados n’O Jornal e na Revista do Brasil, nos anos 1926 e 1927, foram reunidos na sua obra Estudos (1927). Neste belíssimo e poético texto, Alceu Amoroso Lima revela a importância do professor particular na formação de sua mentalidade: “[…] aquele que representara, para mim, o primeiro contacto com as coisas da intelligencia”. É possível captar a afetividade construída entre o mestre e o aluno: João Köpke procurou sempre na criança o gosto da criança. Viveu com a infância e inserido na alma infantil. Desde o seu método de aprender a ler, que reagia contra o ensino triste, abstracto, mecânico das cartilhas e do b a-ba […]. Eu bem me lembro, por exemplo, que aprendi a escrever e a compor sem saber uma simples regra de gramática. E Köpke fazia questão de estimular a espontaneidade infantil. Aos nove anos de idade, quando ingressou no Ginásio Nacional, o menino Alceu levou um choque com o contraste, como ele próprio declara: “o ensino me appareceu em todo o seu horror de inquisição, de rigidez, de impersonalidade, de abstracção secca e distante”. Para ele, as aulas de Kopke eram “uma pequena aventura que abria realmente horizontes, sem cansar, sem pesar, com a illusão do fácil e do não ensinado mas apenas conversado”. João Kopke nasceu em Petrópolis, a 27 de novembro de 1852, e faleceu no Rio […] Read More
OUTRO FRÓES, O COLECIONADOR (O)
OUTRO FRÓES, O COLECIONADOR (O) Oazinguito Ferreira da Silveira Filho, Associado Titular, Cadeira n.º 13 – Patrono C.el Amaro Emílio da Veiga Já dizia Susan Sontag “Colecionar fotos é colecionar o mundo” (p.13), não importando o tamanho deste mundo assim como de seu alcance sobre o mesmo. A história de um sitiante de São José sempre me atormentava o inconsciente sobre o tamanho do seu universo quando foi trazido para a cidade e se sobressaltou com o que viu. Não seria este o caso de José Kopke Fróes (1902-1996) que preso aos umbrais de nossa cidade conhecia como ninguém cada quadrante desta “urb”, rememorava cada qual dos ocupantes deste espaço citadino, sendo a fotografia não uma mania, muito mais os “nervos” da cidade, de seu cotidiano, “…o resultado mais extraordinário da atividade fotográfica é nos dar a sensação de que podemos reter o mundo inteiro em nossa cabeça.” (Sontag,1983). José Kopke Fróes era o irmão de Gabriel (1897-1986), ambos apaixonados pelo “lugar”, parte integrante de sua história, colecionadores de memórias. Gabriel o “tecelão de memórias” por crônicas, contos e fichamentos, já José o caçador de livros, pois era bibliotecário e pesquisador de imagens, vasculhava pedra sobre pedra procurando identificar cada local presente em postais, fotos, cada esquina, cada comércio, cada morador. “Fotografar é apropriar-se da coisa fotografada.”, dizia Sontag, mas para Zé que não se dedicava ao mister, colecionar constituía-se na ação mais preciosa, apoderava-se do sentido presente na imagem, “encarnava” o espírito da cidade, forma de apropriação da representação, empoderava-se da identidade urbana. “Fotos fornecem um testemunho. Algo de que ouvimos falar mas de que duvidamos, parece comprovado quando nos mostram uma foto.” (Sontag). Assim entrevistei (1983) “Zé Fróes”, em uma das suas diversas exposições pela cidade, sendo esta exatamente nos saguões do prédio dos Correios e Telégrafos. Com sua calma peculiar, transmitida pela idade, saboreava as fotos expostas identificando não somente os cenários, mas se detendo sobre o tempo em que foram batidas. Possivelmente por quem as tivesse batido. Conhecimento ou propriedade ímpar que o remetia ao lugar apaixonado, espírito das imagens, sua cidade. Sua primeira exposição, transcorreu quando do centenário da chegada dos colonos alemães a Petrópolis (veja foto), no salão principal da Câmara Municipal, sendo ele o bibliotecário-chefe da biblioteca do município nesta época, portanto trinta e oito anos antes de nossa entrevista pela Tribuna de Petrópolis. José ainda comentou que sua coleção estimulara […] Read More
HÁ CEM ANOS MORRIA ALBERTO TORRES
HÁ CEM ANOS MORRIA ALBERTO TORRES Francisco José Ribeiro de Vasconcellos, Associado Emérito, ex-Titular da Cadeira n.º 37 – Patrono Sílvio Júlio de Albuquerque Lima Há cem anos morria no Rio de Janeiro Alberto de Seixas Martins Torres, um dos fluminenses mais eminentes entre tantos outros que tiveram como berço a chamada antiga província. Nascido em Itaboraí em 26 de novembro de 1865, Alberto Torres fez uma carreira vertiginosa, galgando os mais altos postos, fosse no estado do Rio de Janeiro, fosse no cenário nacional ainda muito moço. Parecia adivinhar que partiria cedo deste planeta, pois morreu a 29 de março de 1917, com apenas 52 anos. Aos 16 anos o jovem Alberto já estava em atividade política como abolicionista e republicano. Bacharelou-se em Direito em 1886, colando grau na Faculdade do Recife junto com Raul Pompéia (1863-1895) e Xavier da Silveira (1864-1912). Em oposição a Francisco Portela (1833-1913), primeiro governador do Estado no regime republicano, negou-se a participar da primeira constituinte estadual na chapa portelista. Deposto Portela em dezembro de 1891, Alberto Torres uniu-se aos comandados de José Thomaz da Porciúncula (1854-1901) e integrou a segunda constituinte fluminense que promulgou a Carta de 9 de abril de 1892. Tinha Alberto Torres 31 anos quando foi nomeado ministro da Justiça pelo presidente Prudente de Moraes (1841-1902). Exonerou-se em virtude dos desmandos praticados pelo vice-presidente Manoel Victorino Pereira (1853-1902), quando ocupou interinamente a primeira magistratura do país em virtude do afastamento de Prudente de Moraes por motivo de saúde. Eleito presidente do estado em julho de 1897, Alberto Torres cumpriu o triênio 1898/1900 em Petrópolis, então capital fluminense. Teve um governo tumultuado não só em razão da crise financeira, mas também por causa do racha no Partido Republicano estadual provocado pela rumorosa questão da duplicata de Câmaras Municipais em Campos dos Goitacazes. Teve o grande mérito de ter criado na cidade de Petrópolis o Ginásio Fluminense, lamentavelmente de vida efêmera, mas, enquanto existiu trouxe para estas serras mestres do calibre de Silva Ramos (1853-1930), de Louis Cruls (1848-1908), de Artur Thiré (1853-1923), de Raimundo Corrêa (1859-1911). Tinha o ilustre filho de Itaboraí 35 anos quando deixou o governo do Estado. Jurista de inegável valor, Alberto Torres foi nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal pelo presidente Campos Sales (1841-1913), que cumpria o quatriênio 1898/1902. Seus votos e pareceres foram sempre corajosos e lapidares. Em 1907 somente ele e Amaro Cavalcanti (1849-1922) […] Read More