RELÓGIO DA ESTAÇÃO NOVAMENTE EM FUNCIONAMENTO (O)

O “RELÓGIO DA ESTAÇÃO” NOVAMENTE EM FUNCIONAMENTO Arthur Leonardo de Sá Earp, Associado Titular, Cadeira n.º 25 – Patrono Hermogênio Pereira da Silva “Eu era então copeiro do rei” (Neemias, 1,11) Com os modernos sistemas de informação da hora, especialmente através das rádios-relógios e do telefone, conjugados e dependentes dos equipamentos de Observatórios Astronômicos, perdeu-se a noção do que representava, tempos atrás, a dificuldade de se saber e de se manter a hora certa. Pense-se, por exemplo, em uma pequena cidade afastada dos grandes centros, em um período em que a população não mais se guiava pelo deslocamento do Sol entre a aurora e o poente. Como se teria ali o conhecimento da exatidão da hora? Quem, afinal, dizia qual era a hora certa? É claro que se está cogitando de referências de tempo mais precisas do que aquelas manifestadas por expressões como “à noitinha nos encontramos”, ou “depois da chuva passo lá”, ou “chegue logo que amanhecer”, ou “o nosso acordo vale até o pôr-do-sol”. Em termos de minutos, quem dizia naquela cidade o que era certo ou errado, quem afirmava que este ou aquele relógio marchava bem ou não? Vem, então, à lembrança os relógios públicos. O da torre da igreja, o da estação, o do relojoeiro. Sim, é interessante marcar que a vida das cidades se organizava, no tocante a horários, pelos relógios públicos, sobretudo aqueles de maior confiança, aqueles dos relojoeiros que forneciam o padrão, a “hora certa”. Em Petrópolis (RJ), na Rua Dr. Porciúncula, diante da Estação da Estrada de Ferro Leopoldina, o relojoeiro OTTO JERKE instalou por sobre a loja onde funcionava a sua “Relojoaria e Ourivesaria Suissa”, um grande relógio, de duas faces, luminoso. Isto ocorreu entre setembro e outubro de 1922. O requerimento de licença para instalação foi protocolado na Prefeitura Municipal sob o nº 3359, a 4 de setembro de 1922 e foi deferido a 18 do mesmo mês, fixando-se o dia 20 de outubro seguinte como termo final do prazo para a colocação do relógio na posição indicada na parede do prédio. O serviço foi realizado satisfatoriamente e encaminhou-se o requerimento ao arquivo a 3 de novembro. Tanto a caixa e o artístico suporte representando uma águia, como o mecanismo haviam sido importados da Alemanha. A precisão do funcionamento foi por todos logo reconhecida e o relógio passou a comandar os avanços, os atrasos e a pontualidade da vida de […] Read More

PETRÓPOLIS: NOVO ANO, NOVO SÉCULO, NOVO MILÊNIO E NOVAS PERSPECTIVAS

  Petrópolis, ou antes a Fazenda do Córrego Seco teve seu destino determinado pelo decreto imperial de 16 de março de 1843: construção de um palácio para o Imperador, com suas dependências e jardins, terreno para uma povoação que deveria ser aforado a particulares assim como cem braças dum e doutro lado da estrada geral que cortava a fazenda para também ser aforado a particulares (com dimensões determinadas). Havia, ainda a recomendação de demarcar terrenos para uma igreja com a invocação de São Pedro de Alcântara e para o cemitério da povoação. Assim seria local de vilegiatura para a Família Imperial e desenvolver-se-ia como uma povoação comum. A presença do Palácio atraiu a afluência de famílias ricas, nobres, de diplomatas e funcionários, enfim de pessoas de alguma maneira ligadas ao Imperador e sua família. Houve grande número de edificações de casarões e hotéis, muitos dos quais testemunham a arquitetura, a arte e o desenvolvimento cultural da segunda metade do século XIX; ao mesmo tempo a qualidade de vida, com ar puro e água limpa e abundante, livre das febres e epidemias que assolavam o Rio de Janeiro fez com que educadores de visão mandassem construir importantes instituições de ensino para meninos e meninas cujos pais desejassem proporcionar aos filhos educação em ambiente saudável. As construções que ainda existem, com seus jardins também de época, formam o que chamamos de “centro histórico”. Ao mesmo tempo, a necessidade de pessoas habilitadas ao serviço de desmatamento dos vales onde se instalariam os futuros habitantes segundo a planta elaborada por Koeler, as construções das habitações e serviços de transporte, alimentação e outros, provocaram a vinda dos colonos alemães e de outros estrangeiros que aqui vinham tentar a vida. No final do século XIX, com a chegada até nós da chamada “Revolução Industrial” que proporcionou o desenvolvimento de grandes fábricas de tecidos, Petrópolis tornou-se conhecido no mundo inteiro pela sua produção textil, desenvolvendo-se sobremaneira no setor econômico e também na sua população pois suas indústrias atraiam, não só operários oriundos de outros estados brasileiros, sobretudo Minas Gerais, como também de outros países como foi o caso da Companhia Petropolitana, em Cascatinha em que a quase totalidade da mão de obra veio da Itália trazendo, por conseguinte, outros costumes, outras tendências e, mesmo, outras formas de encarar o trabalho com diferente perspectiva. Politicamente Petrópolis passou de colônia e povoação a Cidade em 29 de setembro de […] Read More

NOSSA INDEPENDÊNCIA (A)

A NOSSA INDEPENDÊNCIA Jeronymo Ferreira Alves Netto, Associado Titular, Cadeira n.º 15 – Patrono Frei Estanislau Schaette   O Brasil completou dia 7 de setembro p.p. mais um aniversário de sua independência. A evocação desta data tem um significado todo especial, pois foi nela que vingaram de uma vez para sempre os anseios da alma brasileira, pelos quais espíritos fortes, que não viam como transigir numa causa de tanta significação política e moral, se vinham batendo, representando a vontade de um povo que aspirava ser soberano. Nenhum progresso se faz com o desprezo do passado, de suas legítimas tradições, por isto é justo que procuremos em nosso passado os valores que possibilitaram o crescimento de nosso país e garantiram sua grandeza, até porque a História é o saber do homem preocupado com sua origem, seu estado atual e seu destino. O processo de nossa independência, só poderá ser entendido se atentarmos para o fato de que nossa emancipação não foi um fato isolado na nossa história política, assim como o grito do Ipiranga não foi o gesto de um só homem – D. Pedro I. Nossa independência foi o resultado de todo um processo político, cujas raízes remontam ao século XVII. Destarte, o l º movimento de emancipação brasileira, visava à emancipação comercial e explodiu no Maranhão em l684, com a revolta de Manuel Beckman e outros, contra os abusos da Companhia que monopolizava o comércio de certas mercadorias. Bem sucedidos a princípio, os revoltosos chegaram a criar uma junta de governo composta por dois membros de cada classe social, mas a repressão das autoridades portuguesas não tardou, sendo presos os seus líderes e executado o principal deles. Seguiram-se a esse movimento, em princípios do século XVIII, a Guerra dos Emboabas, em Minas Gerais e a dos Mascates, em Pernambuco, ambas marcadas pelo ódio entre portugueses e os naturais da terra, que pugnavam já então pela emancipação industrial. Na segunda metade do século XVIII, os progressos da Colônia foram tão acentuados, que o Marquês de Pombal, ministro do Rei D. José I, elevou-a à categoria de Vice-Reino, a 27 de janeiro de l763. Entretanto a exploração econômica continuou. O próprio Pombal concedeu privilégios odiosos à Companhia de Comércio, paralisando o desenvolvimento da agricultura e da indústria fabril, proibindo a cultura da cana no Maranhão e o fabrico de objetos de ouro, tecidos de sede e de algodão. Todas essas medidas […] Read More

REPÚBLICA E AMERICANISMO

Quando a onda libertária varreu os vários quadrantes das terras de Iberoamérica, nas primeiras décadas do século XIX, apenas o Brasil, por razões muito específicas, adotou a monarquia como forma de governo e com ela atravessou praticamente toda a centúria. Todas as demais nações que se formavam ao nosso redor, ao sul, a oeste e ao norte, aderiram à forma republicana , com menor ou maior sucesso. Aos olhos de tantas repúblicas, lindeiras ou não, éramos uma nódoa a manchar o continente, segundo diziam, vocacionado para a democracia, para a liberdade de escolha dos governantes. Enfim éramos tidos como imperialistas, como usurpadores de territórios alheios, como megalômanos expansionistas. Isso está consignado nas entrelinhas, e mesmo em discursos frontais, de próceres argentinos, uruguaios, chilenos e outros mais. Mas apesar das restrições e retalhações, do ódio e da desconfiança, a grande exceção na América, dava lições de estabilidade política, de prosperidade econômica, de desenvolvimento harmônico, de coesão interna, de paz, de respeito às instituições. Enquanto isso, aqueles que se vangloriavam de serem republicanos, democráticos, libertários, viviam quase sempre em acirradas disputas caudilhescas, em pugnas sanguinárias, que lhes roubavam a seiva vital do progresso e um mínimo de equilíbrio que lhes possibilitasse a sobrevivência como Estados de direito. Mas a república como idéia, como cogitação, como movimento, sempre esteve latente no Brasil e os mais apaixonados pelo tema, viam nela um inevitável elo de definitiva aproximação com os povos hispanoamericanos. Ledo engano. A cultura da desavença, do antagonismo, da digladiação separava irremediavelmente lusófonos e hispanófonos, inoculada que fora no espírito das partes desde os mais remotos tempos coloniais, pelos impérios ibéricos. E a verdade é que, passada a euforia da novidade republicana no Brasil, vieram os Zeballos e outros mais a alimentar a velha fogueira das diferenças entre brasileiros e hispanoamericanos, mesmo apesar do esforço de alguns apóstolos empenhados na sadia e construtiva aproximação de nós todos, os chamados americanistas lato sensu. Foi nos campos do Paraguai, durante a Guerra da Tríplice Aliança ( 1865 / 1870 ) que a idéia republicana brasileira tomou impulso. Foi da inconformada ala militar, diante das tristes ocorrências geradoras do maior genocídio da História da América, que partiram as primeiras reações contra a monarquia e sobretudo contra a possibilidade de um terceiro reinado desempenhado por uma mulher que tinha a seu lado um estrangeiro, usurpador das glórias alheias. Tratava-se de uma referência da presença do Conde D’Eu […] Read More

AURELIANO DE SOUSA E OLIVEIRA COUTINHO Do monólito de fundadores como o Instituto mereceu, nos seus duzentos anos

  Bastante divulgadas as origens do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro – ideais, objetivos, ações tendentes. De 16 de agosto de 1838 – a proposta, apresentada ao Conselho Deliberativo, firmada pelos secretários da Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional – a 21 de outubro, a instalação, medeiam o exame e a aprovação (19 de agosto) da criação da entidade que nos congrega, completando 162 anos. A compor o quadro fundador, 27 membros (hoje expandidos para mais de 240), integrados o cônego Januário da Cunha Barbosa e o marechal Raimundo José da Cunha Matos, idealizadores e proponentes, uma plêiade de homens que vinham dando ou muito ainda emprestariam ao Brasil, de sua capacidade, de sua inteligência, de seu bem doar. Aureliano um deles, na altura, na força de seus 38 anos, nascido no ano-fim do século XVIII. Sobre ser um dos 27, entre políticos, militares, professores, funcionários do governo, negociantes, titulares ou que o viriam a ser, um religioso e outras categorias profissionais, foi o 1º e 2º vice-presidente do Instituto. Se, na 11ª sessão, de 4 de maio de 1839, o secretário perpétuo, cônego Januário, propôs o pedido de um subsídio ao Legislativo, coube ao vice-presidente, Aureliano, assumindo o exercício, pela morte do marechal Cunha Matos, primeiro titular do cargo, ler requerimento formulando a solicitação (14ª sessão, 7 de junho do mesmo ano). Ainda em exercício, Aureliano de Sousa e Oliveira Coutinho ofereceu, em nome da entidade, na Sessão Solene do 2º aniversário, ao imperador e suas irmãs, d. Januária e d. Francisca, exemplares da medalha da fundação do Instituto, cunhadas por Zeferino Ferrez, em ouro e prata. Viria a tornar-se o dístico, o logotipo da instituição, para suas publicações, o colar acadêmico, sua marca, onde se impregna sua presença. Por sempre tão visualizada, tem-se perdido, acreditamos, para muitos o significado que está bem acorde com a imagem simbólica do Instituto. Na descrição de Januário da Cunha Barbosa – tirâmo-lo da Resenha histórica do sesquicentenário, organizada pelo então 1º secretário, Vicente Tapajós -, “um Gênio gravando com buril na rocha do Pão de Açúcar |a cidade presente| o dia da fundação do Instituto”, encimado pela legenda Auspice Petro Secundo, auspícios nunca negados, mesmo nos mais de cento e dez anos de República, fechada por esta outra, síntese do seu trabalho: Pacifica Scientiae Occupatio. O reverso, ainda em latim, ensina a fundação do Instituto Histórico e Geográfico, no dia 21 de outubro […] Read More

ONU E OS CONFLITOS INTERNACIONAIS; PRESENÇA BRASILEIRA EM FORÇAS DE MANUTENÇÃO DE PAZ (A)

A ONU E OS CONFLITOS INTERNACIONAIS; PRESENÇA BRASILEIRA EM FORÇAS DE MANUTENÇÃO DE PAZ Ivo de Albuquerque, Associado Emérito, ex-Titular da Cadeira n.º 39 – Patrono Walter João Bretz, falecido   OBJETIVOS: – Ressaltar a importância da atuação da ONU no Cenário Mundial; – Preservar a memória e a presença brasileira em missões internacionais de paz; – Resgatar a importância do fato histórico representado pela contribuição militar brasileira à conquista do Prêmio Nobel da Paz em 1988 pelas forças de manutenção da paz nas Nações Unidas. INTRODUÇÃO A HISTÓRIA, já dizia Cícero, é a senhora dos tempos, a vida da memória. “Para ser de utilidade ao homem ela necessita ter sempre por escopo a Verdade e a Justiça e, nesse sentido, deve assentar-se em duas condicionantes básicas: o seu registro e a sua veracidade. Sem verdade, ela se desvirtua, e sem registro, ela se perde, além de ser também passível de deformação.” Nesta homenagem que rendemos à ONU em seu 55º aniversário de criação, rememoramos os esforços desenvolvidos através de décadas, visando a construção de uma ordem jurídica internacional. Consideramos oportuno também associar a essa comemoração, um tributo de reconhecimento à presença e à conduta de patrícios nossos, militares em sua quase totalidade, em ações pacificadoras levadas a efeito em diferentes regiões do planeta, sob a égide das Nações Unidas. Tal reconhecimento decorre do propósito que nos anima a todos os patriotas que somos, no sentido de difundir e ressaltar fatos e feitos que nos engrandecem como pessoas, como cidadãos, como povo e como Nação. I – O SISTEMA ONU A necessidade de existência de um organismo internacional que promovesse a harmonia entre os povos vinha sendo sentida desde fins do século passado, a partir de quando ocorreu uma série continuada de movimentos em prol da criação de uma sociedade capaz de prevenir a guerra. A Carta das Nações, assinada em 26 de junho de 1945, na conferência de paz de São Francisco, Califórnia, e cuja entrada em vigor se deu a 24 de outubro daquele mesmo ano, data que passou a ser celebrada mundialmente como o DIA DAS NAÇÕES UNIDAS, simbolizou o esforço das 51 nações sócio-fundadoras da ONU – dentre as quais o Brasil – no sentido de serem alcançados os grandes objetivos fixados para a novel entidade, a saber: – a manutenção da paz mundial; – o desenvolvimento de relações amistosas e de colaboração entre as nações; […] Read More

CALÇADA DE PEDRA (A)

A CALÇADA DE PEDRA Carlos Oliveira Fróes, ex-Associado Titular, Cadeira n.º 18 – Patrono Gabriel Kopke Fróes, falecido Introdução O artigo “A Calçada de Pedra da Serra da Estrela”, publicado na edição de 1989 da Revista do Instituto Histórico de Petrópolis foi o resultado de um primoroso trabalho de pesquisa elaborado pelo competente Luiz de Oliveira. É em memória desse saudoso confrade do I. H. P. que decidimos apreciar a “Calçada de Pedra” em forma mais abrangente, estendida ao cenário do desabrochar do maravilhoso Século XIX. Também, aproveitamos a oportunidade para antecipar algo que pudesse chamar atenção para a Efeméride “O Início da Construção da Calçada de Pedra”, cujo segundo centenário será celebrado no ano de 2002. Foi esta predestinada via que, após o fim do Ciclo do Ouro e dos Diamantes, garantiu que a principal rota para o “hinterland” brasileiro ficasse mantida através do “Território Pré-Colonial Petropolitano”. Portanto, entendemos que o conhecimento pleno, em todos os seus aspectos, é assunto da maior importância para a História Petropolitana. Novas perspectivas para o Caminho Geral de Minas Gerais No limiar do Século XIX, a Metrópole passava a ver com outros olhos a sua tricentenária Colônia do Brasil, há um quartel alçada à condição de Vice-Reinado. Não havia mais esperanças de um outro miraculoso ciclo mineral. Em contrapartida, durante o século que terminara, havia se desenvolvido na grande região dos exauridos campos auríferos e diamantíferos das Alterosas o maior mercado de produção e consumo do Brasil. E a agropecuária, até então predominantemente de subsistência, despontava como opção para pretensões mais amplas, o que aliás condizia com a nova Política Econômica que o Conselho Ultramarino português reajustara em relação ao Brasil. E os nossos competentes planejadores lusitanos sabiam que, para a manutenção da Capitania de Minas Gerais como Pólo Econômico, deveria ser incrementado o setor de produção, condição “sine-qua-non” para que o mercado de consumo não declinasse. Nesse quadro, as exportações e as importações assumiram papel capital. Diferindo dos tempos dos Ciclos do Ouro e dos Diamantes, o valor específico das cargas transportadas diminuíra vertiginosamente. Conseqüentemente, o volume das mesmas crescia geometricamente. As antigas tropas de muares não mais seriam a unânime opção e a necessidade de substituí-las por carros de tração animal era óbvia. As vias de transporte não mais poderiam cingir-se aos caminhos — apenas aptos para viandantes e tropas — e suas substituições ou reconstruções em forma de estradas eram imperiosas e prementes. O açúcar ocupava o primeiro lugar na pauta de exportações […] Read More

A PROPÓSITO DE UMA ENTREVISTA

  Li com a atenção natural despertada pelo tema, a entrevista que Júlio Ambrósio concedeu ao eminente jornalista José Mariano D’Almeida e Silva, publicada na edição de 26 de novembro desta folha. Quem conhece Júlio Ambrósio e sobretudo a obra que já produziu tendo por argumento esta urbe serrana, percebe que o autor da “Geografia Petropolitana”, tem tudo a ver com a cultura da cidade, seja do ponto de vista do conhecimento das raízes psicodemológicas deste rincão da Serra da Estrela, seja no concernente a realizações que possa levar a efeito, se eventualmente for guindado a um posto de vanguarda na área cultural da cidade. Num romance chamado “No Sereno do Mundo”, único no gênero nestas paragens, Júlio Ambrósio vai aos intestinos da psiquê petropolitana, vasculhando os meandros da vida da sociedade urbana neste privilegiado pedaço da pátria fluminense. Trabalho completamente diverso daquele escrito há quase um século por Afranio Peixoto – “A Esfinge”, que em sua primeira parte trata de uma Petrópolis frívola, periférica, adventícia, forânea, segundo o próprio jargão ambrosiano. “No Sereno do Mundo” é em síntese a sociologia da servidão, elemento típico da paisagem urbana aqui da terra, mercê da topografia local e da concepção urbanística a partir dos quarteirões e dos prazos. Há servidões em rampa e em escadaria, retas ou sinuosas, pavimentadas umas, piçarradas outras. Há servidões com nomes pomposos e outras sem batismo ou ostentando a denominação que o povo dá, sempre mais autêntica e pitoresca. Mas nenhuma delas deixa de cumprir o seu papel precípuo: o de facilitar o acesso a todas as subdivisões dos prazos originais. Está aí uma peculiaridade da cultura local que ainda não foi suficientemente estudada, mas que não passou desapercebida à fina sensibilidade de Júlio Ambrósio, espírito vocacionado para a pesquisa de campo, naquilo que tange ao estudo e à compreensão da alma popular. A “Geografia Petropolitana” é um ensaio de roupagens singelas, mas de suculento conteúdo. Engana-se aquele que subestimar a obra ao simples contemplar de seu aspecto. É livro de sideração: corajoso, ágil, instigante. Tem lá seus exageros até mesmo alguns erros de avaliação, quiçá ensejadores de discussões e polêmicas válidas e saudáveis. Mas, ainda que não tivesse outros méritos, um pelo menos valeria volume de quatrocentas páginas: é que Júlio Ambrósio sustenta, com imensa razão, que antes de ser germânico, o petropolitano é mineiro. O angú venceu o chucrute. Ninguém antes de Ambrósio ousou tocar […] Read More

TEMA É AINDA PAULO BARBOSA DA SILVA (O)

O TEMA É AINDA PAULO BARBOSA DA SILVA Francisco José Ribeiro de Vasconcellos, Associado Emérito, ex-Titular da Cadeira n.º 37 – Patrono Sílvio Júlio de Albuquerque Lima Não percamos de vista que o Conde Ney, no seu depoimento sobre o Mordomo da Casa Imperial, desencavado em boa hora por Alberto Rangel nas suas exaustivas pesquisas realizadas no arquivo D’Orsay, disse com todas as letras que Paulo Barbosa da Silva tornara mais regular a administração das terras imperiais, fazendo crescer as rendas, sendo por conseguinte digna de aplausos a maneira como cumpriu suas funções. A leitura desse depoimento nos faz crer que o projeto Petrópolis almejava, antes de mais nada, aumentar as aludidas rendas. De que forma? Até o advento do ato de 16 de março de 1843 e do conseqüente instrumento de contrato celebrado com Júlio Frederico Koeler, a fazenda do Córrego Seco não passava de um taperão, arrendado por inteiro a pessoas que pagavam um aluguel anual que pouco deveria representar na contabilidade da Casa Imperial. A perspectiva do fraccionamento do solo dessa herdade e depois do das demais que se somaram a ela, através do sistema de facteosim ou enfiteuse, com pagamento de foros anuais pelo prazo aforado e suas eventuais subdivisões e laudêmio em face das transações inter-vivos a título oneroso, obviamente, haveria de proporcionar um maior faturamento para os cofres do senhorio direto, no caso, a Casa Imperial. Era o ovo de Colombo a que as terras serranas serviam como nenhuma outra, caindo pois o projeto da colônia / povoação como uma luva nos planos de Paulo Barbosa da Silva, sempre de olho na receita de seu amo e senhor. Na parceria com Júlio Frederico Koeler, o Mordomo matou vários coelhos com uma só porretada: fez crescer paulatinamente as rendas imperiais; atendeu à necessidade de mão de obra livre reclamada pela província fluminense na área das obras públicas com fulcro na construção da Estrada Normal da Estrela; ensejou a criação de uma colônia agrícola na serra acima; provocou o início de uma povoação que se desenvolveria pelos quarteirões nobres da concepção urbanística de Koeler e propiciou ao Imperador uma bela residência serrana de modo a poupá-lo dos rigores e da insalubridade dos verões cariocas. Essa perfeita união do útil ao agradável resultou da urdidura e da costura levada a efeito pelas mãos hábeis e já experientes do Mordomo. É bom lembrar que D. Pedro II, nessa […] Read More

CONSIDERAÇÕES SOBRE O PLANO KOELER

  “Só mesmo, eufemisticamente, pode-se considerar como planejamento urbano o processo de trabalho que levou alguns técnicos a elaborarem os “planos” de Belo Horizonte (engenheiro Aarão Reis), Goiânia (Atílio Correia de Lima e irmãos Coimbra Bueno), Aracajú (engenheiro Sebastião Pirro), Teresina, Aragarças, Fortaleza (arquiteto português Silva Paulet), Piracicaba, Londrina e de outras cidades brasileiras. Na melhor das hipóteses, são simples traçados urbanos convencionais, em regulamentação de zoneamento, sem hierarquização de vias e sobretudo sem a implementação necessária e indispensável ao prosseguimento do processo de planejamento. Isto sem falar nos aspectos sociais e econômicos, não considerados no processo. Eram planos para a época em que foram elaborados: só dentro dessa relatividade de tempo podem ser aceitos como planos. Em verdade, não passavam de “riscos” de cidades…” De fato, é discutível a época a partir da qual pode-se falar em urbanismo ou planejamento urbano, associando-se, em geral, tais conceitos ao evento da Revolução Industrial, ocorrida na Europa no final do Séc. XVIII. Entretanto, a história das cidades apresenta vários “riscos” acompanhados de precisas normas de ocupação, etc., em épocas diversas e até anteriores à era cristã… Se considerarmos o período da Revolução Industrial (entre 1760 e 1830) encontraremos um momento em que nas artes, predominava o neoclassicismo, na arquitetura, a técnica sobrepunha-se à arte, e, na economia, o capitalismo era favorecido pelas características do sistema de produção industrial. A sociedade européia modificava-se em consequência das melhores oportunidades de trabalho oferecidas nas cidades, ocasionando um êxodo rural sem precedentes. A sociedade industrial é urbana e impõe relações sociais e espaciais próprias, que alteraram profundamente as até então existentes. O grande crescimento das cidades européias, ocorrido a partir de 1830, e suas consequências, provocam um movimento de observação, reflexão, crítica e polêmica por parte dos pensadores da época, que foi denominado Pré-Urbanismo. As discussões desse período denunciam as condições de deterioração física, moral, social e econômica da classe operária e são movidas por sentimentos humanitários ou por consciência política. A crítica a essa “desordem” levou-os a propostas de modelos “ordenados” para as cidades industriais, que tiveram como base o próprio tempo: o passado (valores antigos foram perdidos) assumindo posições nostálgicas ou progressistas e apontando dois modelos principais de organização espacial da sociedade: o progressista e o culturalista. O modelo progressista, que tem como principais autores Owen, Fourier, Richardson, Cabet e Proudhon, baseia-se em princípios racionalistas da filosofia iluminista e determina o indivíduo “típico”, sua […] Read More