ANTICIÊNCIA: DO SÉCULO XV AOS PÓS-MODERNOS Fernando de Mello Gomide, Associado Emérito, ex-Titular da Cadeira n.º 23 – Patrono Henrique Kopke RESUMO A Física e a Astronomia de Aristóteles foram destronadas nos séculos XIII e XIV, devido especialmente à escola franciscana. Entretanto do século XV ao XVII, foram reinstaladas na escolástica, com a responsabilidade principal do Papa Nicolau V e dos dominicanos. A poderosa influência de Aristóteles daí decorrente, exercida sobre filósofos católicos e não-católicos, determinou uma generalizada hostilidade face à ciência nas várias escolas do pensamento filosófico ao longo dos séculos até nossos dias. ABSTRACT Aristotle’s physics and astronomy which were dethroned during the XIIIth and XIVth centuries, specially by the Franciscan School, were nevertheless reinstalled in scholasticism from the XVth to the XVIIth centuries. The chief responsability for that falls on Pope Nicholas V and the Dominicans. The powerful influence of Aristotle thereof was exerted on Catholic and non-Catholic philosophers alike, and that has determined an overall hostility towards science among the various schools of philosophical thought along subsequent centuries till our days. Certos filósofos escolásticos assim como filósofos não-católicos, pontificam parvoices empiristas, indutivistas e positivistas a propósito do conhecimento científico e mostram, como ADORNO, HORKHEIMER e HABERMAS, um inconfundível ódio à Ciência. Em meu livro “Filósofos, Cientistas e Anticiência”, (1) cito declarações absurdas desses filósofos. Também transcrevo trechos de certo prelado brasileiro em que afirma que nós físicos deixamos a “realidade totalmente depenada e oca”. Isto lembra o filósofo católico alemão não-escolástico FRITZ JOACHIN VON RINTELEN, que afirmava na década de 50, que físicos têm “intelecto inferior” e suas realizações científicas são positivismo e favorecem o ateísmo. Observemos que eles agravam sua ignorância sobre Ciência com uma atitude antiética, já que exibem desprezo e insultos. Bem, dois católicos com um nível ético não muito diferente daquele dos marxistas ADORNO e HORKHEIMER, que vociferam doestos contra os pesquisadores científicos. (1) (1) F.M. Gomide. Filósofos, Cientistas e Anticiência. Ed. Albert Einstein, Curitiba, 1996. Um exemplo superlativo de ignorância em matérias científicas e pretensão, aparece mais recentemente no brasileiro não-católico OLAVO DE CARVALHO adepto de ARISTÓTELES e do esotérico RENÉ GUÉNON. Em sua ignorância de história das ciências sentencia que o CARDEAL NICOLAU DE CUSA foi o iniciador da Física Matemática. (2) Ele raciocina com a incompleta lógica finitista aristotélica, visando a refutar as teorias de GEORG CANTOR sobre os conjuntos e os números transfinitos. (2) Lembremo-nos que CANTOR, […] Read More
REFLEXÕES SOBRE O ARQUIVO DA FAMÍLIA IMPERIAL E O PAPEL DE D. PEDRO II NA SUA FORMAÇÃO
Caros amigos, decidi aproveitar este momento para falar em voz alta sobre um tema que tem sido objeto de minha reflexão nos últimos 6 anos, tenho três intenções bem claras: a primeira, de me favorecer dos conhecimentos acumulados por vocês em torno de d. Pedro II, a segunda, o desejo particular de suscitar questões novas em torno deste imperador e a terceira, a esperança de obter algumas respostas a estas indagações. Como se tratam de reflexões e, por um vício profissional, eu as classifiquei como O primeiro estágio. Há 20 anos atrás, quando comecei a trabalhar no Arquivo Histórico do Museu Imperial as colegas do Museu que trabalharam e trabalhavam nele (d. Dora e Áurea), me apresentaram o Arquivo da Casa Imperial do Brasil, como o arquivo particular da família imperial, e através do inventário sumário organizado por Alberto Rangel, publicado nos Anais da Biblioteca Nacional em 1939, fui aos poucos tendo idéia do seu conteúdo. Mas no decorrer desses anos fui tomando conhecimento de vários fatos como a existência do Arquivo Grão Pará, se me depararam documentos sugestivos, surgiram-me freqüentes perguntas, dúvidas e afirmações feitas pelos usuários dessa documentação. Vou utilizar-me como trilha para o desenvolvimento do tema o capítulo 19 “Um fantasma chamado d. Pedro”, do livro As barbas do imperador, de Lilia Schwarcz, no qual ela trata da recondução oficial da figura de d. Pedro como herói nacional. Diz que “Em 1891, d. Pedro doara ao Instituto Histórico parte de sua volumosa biblioteca e de sua bela coleção de fotos. O gesto do ex-imperador era sem dúvida um claro sinal de estima por esse estabelecimento, que lhe fora tão fiel, mas também significava uma forma de perpetuar sua memória guardada nas imagens que durante tantos anos colecionara”. No Brasil de 1890 deram-se 13 leilões dos bens da Casa Imperial – objetos, móveis e semoventes. Procederam à avaliação dos móveis, carros, animais e objetos existentes na Quinta da Boa Vista e os vindos do Paço da Cidade o tenente-coronel Costa Ferreira, da parte do Juízo da 2ª Vara de Órfãos e João Teixeira, por parte do dr. José da Silva Costa, procurador de d. Pedro de Alcântara. O Juiz da 2ª vara, dr. Honório Coimbra nomeou para proceder ao leilão o leiloeiro Joaquim Dias dos Santos. Francisco Marques dos Santos, em seu artigo intitulado O leilão do Paço de São Cristóvão, publicado no Anuário do Museu Imperial, […] Read More
BARÃO DO RIO BRANCO: MAIS VIVAS DO QUE MORRAS
Ninguém jamais agradará a Deus e ao Diabo ao mesmo tempo. Os que acendem velas a um e outro se estrepam, segundo o velho dito popular. Nessa linha de raciocínio tem-se que ninguém terá a unanimidade dos juízos a seu favor, principalmente quando se detém os cordéis do poder e a capacidade de distribuir benesses, de contrariar interesses, de criar facilidades ou obstáculos. A evidência e a fama, frutos desse poder e dessa capacidade, despertam fatalmente simpatias e idiossincrasias, aplausos e vaias, paixões e ódios. Assim ocorreu com o Barão do Rio Branco, o ministrão da primeira década do século XX, o homem que comandou com plenos poderes a política externa brasileira, liquidando velhas pendências, fechando em definitivo o perímetro do nosso território, intervindo nas questões continentais, como mediador de inegáveis recursos intelectuais e de incontestável talento diplomático. Mudavam os governos – Rodrigues Alves, Afonso Pena, Nilo Peçanha, Hermes da Fonseca, mas o Barão com seus mapas, documentos, estudos, arrazoados e mil idéias, seguia firme no timão do Ministério das Relações Exteriores até que a morte o surpreendesse em pleno labor às vésperas do Carnaval de 1912. Sua falta foi tão sentida, quer nos meios oficiais, quer no âmbito popular, seu enterro foi de tal sorte apoteótico, verdadeira consagração promovida por todos os segmentos sociais, que chegou-se a cogitar da transferência das festas de Momo para outra ocasião. Mas apesar de tudo isso, apesar das muitas simpatias e admirações que despertou no Brasil e nas circunvizinhanças, o Barão teve também opositores ferrenhos, aquém e além fronteiras, que não lhe pouparam críticas e até ataques agressivos. Entre nós, a pena ressentida e revanchista de Lima Barreto nunca deu trégua ao Barão. Para o autor do “Triste Fim de Policarpo Quaresma”, o Barão do Rio Branco era um eterno sinecurista do governo, despótico a ponto de não reconhecer o limite entre a coisa pública e a privada. Era uma alusão ao hábito do Ministro de morar no Rio de Janeiro no seu próprio local de trabalho, o Palácio Itamarati e de fazer de sua casa em Petrópolis uma espécie de sucursal da chancelaria e um salão de festas onde recebia oficialmente o corpo diplomático. Crítica bastante mesquinha a um homem que não tinha hora para começar nem para encerrar seu expediente, que varava as madrugadas sobre livros e papéis de modo a preparar as defesas de suas posições, os textos dos […] Read More
TOCA PRO GABRIEL! – TEATRO EM PETRÓPOLIS
“TOCA PRO GABRIEL!” – TEATRO EM PETRÓPOLIS Arthur Leonardo de Sá Earp, Associado Titular, Cadeira n.º 25 – Patrono Hermogênio Pereira da Silva No dia 12 de julho deste ano passei por duas grandes emoções. Uma estava sendo curtida fazia tempo. A outra, e maior, foi inesperada e me atingiu quando acabava a reunião do Instituto Histórico de Petrópolis. A emoção aguardada foi, como se sabe, a de dar por inaugurado ali, de acordo com a pauta, o Acervo Histórico de Gabriel Kopke Fróes via Internet, no endereço www.earp.arthur.nom.br . A partir de então, desde o término da palestra daquela noite, qualquer pessoa poderia consultar tudo o que já existe transcrito, hoje em cerca de 12.300 entradas, dos dados colecionados pelo estimado amigo e sócio fundador do Instituto. Quase ao findar a apresentação, afirmei que utilizar o acervo era o primeiro passo de qualquer estudo sobre Petrópolis. Sem dúvida, é certo que as anotações de Fróes, por sua amplitude, hão de fornecer na maior parte dos casos alguma pista para o aprofundamento da pesquisa que se pretenda fazer. Como exemplo, vale publicar aqui, para delícia dos que investigam a história do teatro em nossa cidade, o texto de um manuscrito do acervo. É o seguinte, constante do registro 10446 do arquivo ama03001: “COLÉGIO DE SÃO VICENTE DE PAULO Caixa Postal 332 Rua Coronel Veiga, 550 Petrópolis, R. J. Fone 3032 Petrópolis, 29 de Junho de 1963 Meu caro Gabriel Junto, o que você me pediu sôbre o que sei do movimento teatral em Petrópolis. Se estivesse em casa, com tudo à mão e com a comodidade que aqui na enfermaria do Hospital não chega a ser mínima, outro teria sido o meu atendimento ao pedido do amigo que tanto merece e sôbre um assunto que tanto me interessa. Daqui, e com muita dificuldade, só posso concorrer com estas notas esparsas sem redação e até mesmo sem português, o que você saberá perdoar a um professor que no momento se vê como um artífice sem ferramenta. Falo muito em mim no que aí vai. Nem encontrei outro meio de expôr o que sei. Não veja nisso uma vaidade, e muito menos uma insinuação. Pois nem sei o feitio que você pretende dar ao seu trabalho. Caso encontre para êle qualquer subsídio na minha xaropada hieroglífica, pode dispôr sem receio, pois que tudo é verdade, e dela dou fé. Com o abraço […] Read More
NÃO SÃO DE HOJE OS CRIMES AMBIENTAIS EM PETRÓPOLIS
Em 12 de novembro de 1891, naquele período crítico da República recém nascida, que mediou entre o golpe desfechado por Deodoro da Fonseca contra o Congresso e a renúncia desse prócer republicano ao cargo de Presidente do Brasil, aqui em Petrópolis, Antonio Augusto de Souza Leite perguntava ao então Conselho de Intendência Municipal, chefiado por Ildefonso Carlos de Azevedo Dutra, se o mesmo havia permitido a canalização e desvio do curso natural das águas que corriam pelo vale existente no lugar denominado Costa Gama. Por certo a turbulência política, a revolução que pôs termo ao governo Portela, em princípios de dezembro de 1891 e que varreria do cenário petropolitano a Intendência supra citada, impediram que ficasse registrada nos anais a resposta à consulta em boa hora levantada e que dava a entender que mãos clandestinas e criminosas haviam, a revelia do poder público, desviado as águas naturais que corriam pelo vale em apreço e, o que é pior, canalizando-as. Esse tipo de infração já estava previsto no Código de Posturas da Vila da Estrela, aprovado provisoriamente pelo Presidente Aureliano Coutinho em 1º de fevereiro de 1847. Dizia o artigo 52 desse diploma legal: “Fica proibido fazer escavações nas margens dos rios, nos aterros e valas, fazer cortes de madeiras e tirar barro para olarias, ou para qualquer obra de forma que cause estagnações das águas; assim como estreitar os mesmos rios e valas com cercados, ou tapumes, fazer cortes nos rios ou mudar o curso de suas águas: o infrator será condenado em trinta mil reis de multa” . ( grifo meu ) É de se observar que Petrópolis, antes de ter o seu próprio código de posturas municipais, o que somente aconteceu em 1893, guiou-se pelo estatuto da Estrela, vila a qual pertenceu até 1857, quando a 29 de setembro deu-se a emancipação destes chãos serranos, criando-se o município e a cidade. E mesmo depois desse grande evento, o Código de Posturas da mais tarde extinta vila da Estrela seguiu produzindo aqui seus devidos e legais efeitos, mesmo a despeito de serem votadas umas que outras posturas durante os trinta anos derradeiros da monarquia brasileira. Também o Código de Posturas de Itaboraí, que veio a furo em 28 de janeiro de 1882, determinava no artigo 88: “Estreitar, tapar, entulhar, ou desviar em todo ou em parte, valas públicas, rios, córregos, fontes de serventia pública, ou fazer sobre elas […] Read More
FAZENDA DA MANDIOCA (A)
A FAZENDA DA MANDIOCA Alcindo Sodré, Fundador, Patrono da Cadeira n.º 2 No primeiro quartel do século XIX existiu na Raiz da Serra de Petrópolis uma propriedade rural denominada Fazenda da Mandioca. Seu organizador e primeiro proprietário foi um estrangeiro ilustre que realizou estudos científicos cortando em caravana os sertões do Brasil. Nessa propriedade rural ele procurou desenvolver várias culturas, experimentou a colonização alienígena no trato da terra, e nela hospedou várias personalidades nacionais e forasteiras, sobretudo os grandes viajantes e escritores que em demanda de Minas Gerais, através o Córrego Secco, ali pernoitavam. Esse estrangeiro, proprietário da Fazenda da Mandioca, era o barão Jorge Henrique de Langsdorff, médico pela Universidade de Goetingue, na Alemanha, e acatado entomologista. Consta ter nascido no Grão Ducado de Baden. Como médico do princípe Waldeck, seguiu-o a Portugal, quando este foi comandar o exército português ali introduzindo a prática da vacinação. Voltando à Alemanha ofereceu seus serviços à Rússia e logo a seguir tomou parte na expedição do capitão Krusenstiern ao Kamtchatka. Sob os auspícios do Imperador Alexandre I e nomeado cônsul geral da Rússia no Rio de Janeiro, foi incumbido de importante exploração científica pelo interior do Brasil. Trouxe então consigo para o Brasil o grande pintor Rugendas, o botânico Luiz Riediel, o astrônomo Ruszoff e o naturalista Ménetries. Enviou preciosas coleções naturais para o museu de São Petersburgo sendo agraciado Conselheiro de Estado e membro da Academia de Ciências da Capital russa, além de outras associações. Possuiu também entre nós uma residência na Corte situada em Santa Thereza onde dava grandes recepções à alta sociedade, ouvindo-se ali Neukon, organista da imperatriz Leopoldina. Remeteu certa vez para a Europa, mil e seiscentas variedades de borboletas e escreveu um “Guia para as pessoas que quiserem se estabelecer no Brasil”. Como chefe da expedição de naturalistas e astrônomos incumbidos pelo imperador da Rússia nos anos de 1825 a 1829 de S. Paulo atravessou Mato Grosso saiu no Amazonas e Pará. Dessa expedição fizeram parte, como desenhistas, Amadeu Adriano Tannay, que apareceu afogado no sertão de Mato Grosso e Hércules Florence, que escreveu em francês a narrativa da viagem e a quem se devem as notícias a respeito, pois nessa mesma expedição Langsdorff manifestou sintomas de loucura, seguindo diretamente para a Europa ao chegar a Belém, onde terminou sua operosa existência. Langsdorff pagara quase mil libras pela Mandioca, fazenda de dez milhas quadradas, pouco antes de […] Read More
ACERVO HISTÓRICO DE GABRIEL KOPKE FRÓES VIA INTERNET (O)
O ACERVO HISTÓRICO DE GABRIEL KOPKE FRÓES VIA INTERNET Arthur Leonardo de Sá Earp, Associado Titular, Cadeira n.º 25 – Patrono Hermogênio Pereira da Silva Não esqueço o encontro daquela tarde. Meu pai e eu fomos à casa de Gabriel Kopke Fróes, conforme especialmente combinado. A amizade que nos unia vinha de longe, de gerações. Na saleta, sentados junto à janela, com D. Hilda sempre o máximo em gentileza circulando por perto, realizamos algo que aos meus olhos se desenrolou em dimensões vitais. Fróes foi um colecionador persistente e meticuloso. No correr de longos anos, juntou todas as informações que levantou em sua cuidadosa pesquisa diária, principalmente sobre Petrópolis. O trabalho de sua vida, a melhor parte do trabalho, a voluntariamente escolhida, estava ali naquela sala, diante de nós, materializado em caixas com fichas, pastas, cadernos, amarrados, exemplares de publicações. A doença não mais lhe permitia manter em ordem os papéis, controlar a disposição física e o conteúdo do que criara. Seus arquivos escaparam do esquema adotado, fugiram-lhe das trêmulas mãos e da atenção já cansada. Com olhar provocativo e sorriso disfarçado, repetindo uma de suas características expressões fisionômicas de simpatia e brincadeira, indagou: – Nelson, você acha que ele vai tratar bem de tudo isto? O médico e amigo respondeu com outro gracejo. Recebi, então, o acervo. Fróes me disse: – Sirva-se deste material. Espero que ele seja útil aos seus estudos. Senti, em uma atmosfera densa de silenciosa emoção, como se o admirado amigo me estivesse entregando a alma. Percebi nos seus olhos, no breve gesto, um indefinido ar entre aliviado e aflito. Nos poucos meses que se seguiram até a morte de Fróes em Teresópolis, não tive tempo de conhecer suficientemente a sua obra para colher as explicações necessárias à restauração da organização que ele julgara ideal para os dados que pacientemente reuniu. Entendi sempre, desde aquela tarde, que não me cabia usufruir sozinho da preciosidade que me chegara às mãos. Decidi logo no primeiro instante que o meu empenho seria o de, reconstituídos os arquivos, colocá-los à disposição de todos. Que assim servissem ao maior número possível de pessoas, na exata grandeza de espírito de quem os produzira. Levei muito tempo para descobrir a chave que me permitisse caminhar no sentido da recuperação do perdido esquema elaborado e observado por Fróes. Hoje já foi alcançado o estágio que a todos possibilita a consulta do que […] Read More
ANTIPLATÔNICO BARÃO DO RIO BRANCO (O)
O ANTIPLATÔNICO BARÃO DO RIO BRANCO Francisco José Ribeiro de Vasconcellos, Associado Emérito, ex-Titular da Cadeira n.º 37 – Patrono Sílvio Júlio de Albuquerque Lima Para uma permanência de três meses, desembarcou no Rio de Janeiro numa radiosa manhã de domingo, em novembro de 1910, o polígrafo chileno Joaquim Edwards Bello. Espírito cultivado, alma sensível, com aquela permanente ponta de humor característica dos seus compatriotas, Edwards Bello, de lápis em punho anotou incontáveis aspectos da vida brasileira, do fim da primeira década deste século, e, reuniu tanto material que deu à luz, em 1911, o precioso volume intitulado “Três Meses em Rio de Janeiro”. O jovem chileno chegava justamente quando extertorava o tumultuado quatriênio Afonso Pena/Nilo Peçanha e quando ia ter início a era hermista, marco do começo da decadência da República Velha. Bello acompanhou os lances da Revolta da Chibata que irrompera na Guanabara em 24 de novembro de 1910; analisou o comportamento extravagante de representante diplomático de seu país, o irrequieto Francisco Herboso; criticou a maneira como os argentinos tratavam os brasileiros; falou da nossa musa popular, de João do Rio, de Ruy Barbosa, do Barão do Rio Branco, das águias do Palácio do Catete e, como não podia deixar de ser, das relações chileno-brasileiras. O ilustre viajor andino, não fazia parte da claque que vivia incensando o nosso grande Chanceler, o Barão do Rio Branco. No seu entender, era ele o grande culpado pelo arrefecimento da velha e tão alardeada amizade entre Brasil e Chile, máxime durante o segundo reinado. Sobre o Barão, logo no início do livro, disse estas palavras que raros de seu tempo, nacionais ou estrangeiros, ousaram pronunciar, quanto mais escrever: “No meio da fumaça da pólvora e do ruído das fanfarras e clarins aparecem as grandes figuras dos imperialistas da grande República e, dominando-as, surge a enérgica efígie do chanceler vitalício, o Barão do Rio Branco, o artificioso comediante que maneja os fantoches deste grande Guignol que é o mundo político sulamericano. Somente um fantoche que desapareceu do cenário manifestou-se rebelde à autoridade do mestre e esteve a ponto de lançar seu país em uma sangrenta guerra contra o Brasil, cujas ambições desmesuradas ele adivinhava; este homem foi Zeballos, o tigre, como o chamavam, cuja pele dissecada jaz, segundo a fantasia dos caricaturistas brasileiros, ao pé do leito do chanceler vitorioso”. E por que tanta antipatia votada ao Barão, que afinal tantas vitórias […] Read More
KOELER – HOMENAGEM NA PRAÇA PRINCESA ISABEL A 29 DE JUNHO DE 1993
Agradeço penhorado o convite feito pelo Clube 29 de Junho para ser o seu orador nesta solenidade de homenagem ao Major de Engenheiros Júlio Frederico Koeler, dentro das comemorações dos 148 anos da chegada dos colonos alemães a Petrópolis. De Koeler muito já se disse e muito a ser dito ainda há. Hoje, porém, neste lugar, os descendentes dos colonos querem prestar uma homenagem, não só da razão, do conhecimento, mas, sobretudo, do coração. São descendentes daqueles famílias que chegaram ao topo da Serra da Estrela tomadas da esmagadora incerteza dos imigrantes frente ao desconhecido das terras que pela primeira vez pisavam e à incógnita das condições reais de trabalho e subsistência. Eles querem reverenciar aquele que foi o executor da verdadeira hospitalidade, recebendo seus antepassados e encaminhando a solução dos problemas concretos que lhes oprimiam a alma. Sim, Senhores, os descendentes dos colonos alemães e todos nós outros aqui presentes queremos realizar agora algo de real e não uma farsa, algo de vivo e não uma representação. Queremos dedicar a Koeler, o vibrar autêntico da melhor emoção que possamos ter neste momento. E como fazer brotar tal emoção, que sem dúvida existe no nosso íntimo? Abramos com mais empenho os nossos olhos. Apliquemos verdadeira atenção ao que está diante de nossas vistas. Não estamos num palco. O monumento não é uma construção vazia. As pedras e os outros materiais artisticamente dispostos abrigam os restos mortais de Koeler. São os restos mortais daquele que caminhou tantas vezes por estes mesmos espaços que hoje ocupamos, daquele que acolheu e tranquilizou os imigrantes e lhes possibilitou uma vida digna, daquele que sonhou uma bela e humana Petrópolis e começou a concretizá-la. Foi a 23 de janeiro de 1955 que, por solene ato fúnebre, presentes o Sr. Prefeito Municipal Cordolino José Ambrósio e o Sr. Presidente da Câmara Municipal Arnaldo Teixeira de Azevedo, se transladaram os restos mortais de Koeler do cemitério para aqui (Petrópolis e seus monumentos, Coordenação Geral: José Ribeiro de Assis, pág. 47). Estamos, portanto, no local do repouso terreno de Koeler morto. A lembrança vale para nos levar ao respeito e à concentração que o especial campo santo pede e que a generosa emoção que queremos ter exige. A seguir, levantemos os olhos para além do monumento e nos deixemos invadir pela beleza deste verde das encostas do Quarteirão Francês, destas majestosas e variadas árvores, destas matas que […] Read More
HERMOGÊNIO SILVA
Hermogênio Pereira da Silva no tempo de sua atuação em Petrópolis é alguém que se pode comparar à importância que teve Koeler nos primórdios da cidade imperial. Foi líder político destacado, no grupo republicano, mas ganhou sua mais alta projeção como administrador do Município, ao ocupar no colegiado legislativo local, Intendência ou Câmara, a cadeira de Presidente, a quem competiam então as funções executivas, ainda inexistente o cargo de Prefeito. Desenvolveu e completou projetos já começados, iniciou e concluiu outros, buscou realizar alguns que se frustraram, todos do maior significado para propiciar a Petrópolis correto progresso. Foi na área do atendimento às necessidades básicas da população, pelos meios mais avançados conhecidos na ocasião, que Hermogênio Silva empenhou o seu saber e a sua energia. Abastecimento de água, fornecimento de iluminação e eletricidade, instalação de esgoto e de serviços de transporte, de telefone, construção de moradia para os de pequena renda, higiene e saúde, limpeza pública, abertura e calçamento de ruas, construção de pontes, arborização das vias públicas estiveram sempre entre as preocupações principais dele, assim como as de bem estabelecer minuciosos diplomas legais para tornar melhor o convívio social e de sediar condignamente os órgãos do poder municipal, ponto este que atingiu com a aquisição e a reparação do hoje chamado Palácio Amarelo, prédio belo e grandioso que aqui vai citado como símbolo e síntese material das metas de bela e grandiosa vida para o petropolitano que animaram a atividade pública de Hermogênio Silva. Considerando-se o difícil momento econômico, social, político e de ordenamento jurídico resultante do término do Império e do nascimento da República e a pobre situação em que se debatia Petrópolis, é que se pode olhar Hermogênio com olhos de quem vê Koeler. Se a cidade a este ficou a dever o planejamento e os primeiros passos, daquele recebeu em dias tão críticos o mais forte e vital impulso no caminho da autonomia e da maturidade. Assim como foi mencionado um prédio como símbolo de realizações e de projetos, pode-se também invocar o Código de Posturas de lavra de Hermogênio Silva, o primeiro que Petrópolis teve, como imagem dos reais e precisos cuidados, do lúcido exame dos problemas e da escolha das melhores soluções inspiradas nos dados científicos contemporâneos, das utopias que orientaram o espírito daquele que tudo fez para que Petrópolis fosse uma cidade esplêndida. A comprovação documental do valor de Hermogênio Silva no desenvolvimento […] Read More