A ELEVAÇÃO DE PETRÓPOLIS A CIDADE

Ascânio Dá Mesquita Pimentel

“Exmo. Sr. Carlos Magalhães Bastos, Prefeito do Município;
Exmo. Sr. Embaixador Macedo Soares, membro da Comissão de Codificação do Direito Internacional e Presidente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro;
Sr. Dr. Leão Teixeira Filho, Presidente do Instituto Histórico de Petrópolis;
Sr. Comandante do Batalhão de Caçadores aquartelado nesta cidade;
Sr. representante do Sr. Secretário de Estado de Negócios do Interior e Justiça;
Sr. Dr. Alcindo Sodré, Secretario Geral da Comissão do Centenário de Petrópolis, Diretor do Museu Histórico e animador principal dos modernos estudos sobre a história deste Município;
Minhas Senhoras;
Meus Senhores.

Como preparação e estímulo do público para as festas que se projetam em comemoração do primeiro centenário da fundação de Petrópolis, a comissão nomeada para esse fim pelo Sr. Prefeito tem promovido conferências explicativas sobre as primeiras datas da história petropolitana. Tratou o Dr. Alcindo Sodré da fundação do povoado; o Dr. Rangel Pestana da colonização alemã; o Dr. Leão Teixeira Filho da atuação urbanística de Koeler. Cabe-me hoje – interrompendo a lista desses nomes ilustres – falar sobre a elevação de Petrópolis à categoria de cidade.

Na época em que isso ocorreu Petrópolis contava pouco mais de uma dúzia de anos de existência. Era uma povoação numerosa e progressiva. Pelo seu território, pertencente, como até hoje, à Fazenda Imperial, dependia desta, em todas as operações sobre a propriedade imóvel, visto se haver constituído em regime de enfiteuse. Pela localização em sua periferia dos imigrantes alemães chegados aqui em grandes turmas no ano de 1845, ficara sujeita, no que concernia ao exercício do trabalho e à aquisição da propriedade rural por estes, ao sistema de colônia para esse fim organizado pelo Governo do Império. Enfim pelo estabelecimento e crescimento na parte central ou propriamente urbana da antiga fazenda, de uma população nacional livre, enquadrava-se nos moldes gerais da administração pública então vigorantes e que dividiam o poder, aproximadamente como hoje, entre os três grandes aparelhamentos administrativos justapostos e concêntricos: o imperial, o provincial e o municipal, – este último subdividido, ainda, consoante convinha, em freguesias e curatos, distritos de paz, termos e comarcas.

O povoado de Petrópolis que, ao nascer, era um simples curato anexo à Freguesia de São José do Rio Preto, da Vila de Paraíba do Sul, de cujo distrito de paz fazia parte, já em 29 de março de 1844 fora separado deste para constituir distrito próprio, e pela Lei Provincial nº 397, de 20 de maio de 1846, que criou a Vila da Estrela, fora anexado ao território desta e elevado à categoria de freguesia. Queria isto dizer que a povoação já possuía atividade política local, não tendo mais necessidade os “votantes” do distrito, para isso qualificados, de se transportarem, como antes, à próxima freguesia, nos dias de eleição, para aí exercerem o que era uso, então, chamar-se o sagrado direito do voto.

Tal situação, entretanto, não satisfazia às pessoas que se interessavam pelos destinos de Petrópolis.

Os cidadãos exerciam aí o direito de voto e as eleições se faziam, como de lei, na própria igreja matriz da paróquia. Mas a Câmara Municipal tinha sua sede na Vila da Estrela. Lá eram votados os impostos, lá nomeados os empregados municipais, lá distribuídos os parcos benefícios da ação administrativa. Petrópolis estava, pois, em uma situação subalterna incompatível com o seu progresso nos últimos anos e o seu privilégio de receber no verão a família imperial.

Urgia que se remediasse a isso obtendo do governo a sua autonomia municipal.

Não importa ao caso que sob o regime então vigente, que era o da Lei de 1 de outubro de 1828, essa autonomia fosse puramente fictícia. Os políticos petropolitanos de 1856 sabiam disso e pretendiam colaborar esforçadamente para a emenda dessa situação, como se vê dos artigos publicados nos primeiros números de O Paraíba, jornal editado em Petrópolis nessa época. Mas queriam primeiro alcançar o que lhes estava à mão, que era elevar o povoado serrano a melhor posição no quadro administrativo da província. E, com audácia intemerata, não se contentavam com pretender erguê-la à categoria de vila, como as suas vizinhas, de que fazia ou fizera parte, Estrela e Paraíba do Sul; queriam elevá-la à dignidade de cidade, como convinha a local habitadíssimo, progressivo como poucos, dotado de ótimos predicados naturais e que era honrado, todos os anos, com a estadia de S.S. M.M. Imperiais, dos representantes diplomáticos das nações estrangeiras, dos altos dignitários da política e da administração do império, dos mais famosos personagens da capital do país.

Quais tenham sido os progenitores dessa idéia é o que não é fácil apurar com exatidão.

É de supor que em Petrópolis, nessa ocasião, se haja constituído um grupo de pessoas, com foros de cultas e ambiciosas de ação política, como, guardadas as proporções, se verificara na “conjuração mineira” e ocorre sempre nos pródomos de qualquer movimento social.

Essas pessoas haveriam de se recrutar, certamente, entre as já qualificadas como votantes para as eleições anteriormente realizadas. Entre elas sobressairiam, de certo, como mais eminentes, os “eleitores” já escolhidos, na forma da Lei Eleitoral de 1846, para designarem, em nome do povo, os deputados à assembléia geral e à provincial. Esses “eleitores” eram então: o Tenente-Coronel Amaro Emílio da Veiga, João Batista da Silva Ignácio José da Silva, Augusto da Rocha Fragoso, o Dr. Thomaz José da Porciúncula e João Meyer. A essas pessoas se haveriam, também, de juntar outras de renome, posição, fortuna ou influência, interessadas pela vida pública local. Entre estas se contariam, provavelmente, os fundadores dos primeiros jornais de Petrópolis, Bartholomeu Sudré, do Mercantil, e Quintino Bocayuva e Emílio Zaluar, do Paraíba; o Professor Henrique Kopke, que se distinguiria nas primeiras escaramuças eleitorais; o Alferes Carlos de Barros Falcão Cavalcanti de Albuquerque Lacerda, que ia ser o secretário da primeira Câmara; o conceituado médico Dr. Manuel de Mello Franco; e, mais que todos, o Barão de Mauá que inaugurara havia pouco os quilômetros iniciais da primeira estrada de ferro assentada no Brasil e destinada a ligar a capital do império com a imperial fazenda de Petrópolis.

Permiti que abra aqui um parênteses para prestar uma homenagem especial a esse homem de grande energia e incontestável merecimento, do qual se vai comemorar a 21 do próximo mês o cinquentenário do falecimento.
Foi Mauá o realizador dos maiores empreendimentos industriais do Império. Tristão de Ataíde caracterizou-o com estas sintéticas e expressivas palavras: – “Foi o Caxias da nossa unificação econômica… Pressentiu e tentou resolver todos ou quase todos os grandes problemas econômicos brasileiros, os problemas essenciais do período moderno da nossa história”…

Mauá era homem de descortino, de audácia e de singular capacidade de ação. Foi ele que, em momento de suma gravidade, atendendo ao apelo desse genial homem de estado que foi o Visconde do Uruguai, soube restabelecer no Prata o crédito nacional abalado; foi ele que, no Brasil pacificado, instalou a primeira grande fundição industrial, a primeira fábrica de velas de estearina, os primeiros estaleiros de construção naval, curtumes modernos, fábricas de tecidos, engenhos de açúcar aperfeiçoados; foi ele que deu ao Rio de Janeiro a iluminação a gás, os bondes de trilhos, o cabo telegráfico submarino; foi ele que abriu à navegação internacional o porto do Rio Grande do Sul e os do Amazonas, que estabeleceu navegação regular para portos internos do Rio de Janeiro, que promoveu o assentamento das cinco primeiras estradas de ferro aqui construídas, que estendeu no país e nos Estados vizinhos, como disse Alberto de Faria (Mauá, p. 14) “aquéla vasta rêde de bancos que o povo conhecia por Casa Mauá…”

Não foi, contudo, só pelo motivo aludido, que procurei agora evocar a figura atraente e famosa do grande industrial do segundo império. É que me apraz – e creio que com justa causa – colocar sob o seu honroso patrocínio o feito que ora rememoramos. É certo que Mauá não precisa, para aumento da sua luminosa glória, de mais este pequeno lustre. Todavia quero crer, – embora sem me fundar em nenhum documento positivo, – que Mauá se haja interessado sobremodo pela idéia da elevação de Petrópolis a cidade, – se é que não foi ele o seu verdadeiro progenitor.

Quadra essa idéia com o seu gênio empreendedor e ativo. Quadra com os seus interesses de diretor da Companhia de transportes que começava a conduzir os produtos de Minas para a capital do Império através da bem fadada colônia de Petrópolis. Quadra com o que sabemos do seu entranhado gosto por esta terra onde radicou a família, onde veio a morrer e onde fixara residência, no bem situado palacete que construíra em 1854 na chácara em frente à confluência e que hoje, ligeiramente modificado, pertence aos herdeiros do seu caloroso biógrafo Alberto de Faria. Quadra, ainda, com a divergência que por diferença de índoles e de pontos de vista separava, habitualmente, as opiniões de Mauá das de D. Pedro II. Quadra, finalmente, com o fato indisputável de ter sido a proposta de lei elevando Petrópolis a cidade apresentada e defendida na Assembléia fluminense – onde constituiu seu único trabalho – por um auxiliar de confiança e amigo de Mauá, o Tenente-Coronel de Engenheiros Amaro Emílio da Veiga.

Estou certo de que com esta suposição que coloca sob o patrocínio de um nome de repercussão nacional a origem do movimento da emancipação de Petrópolis, não diminuo em nada o apreço e reconhecimento devidos ao denodado realizador da idéia, o Coronel Veiga, que, por se haver dedicado com afinco a essa empresa teve de pagar o seu triunfo com o sacrifício de sua honrosa carreira.

Com efeito, fosse Veiga o seu inventor ou a houvesse ele recebido de outrem, como sugestão, o certo é que foi ele quem assumiu, sob sua inteira e única responsabilidade, o difícil e espinhoso encargo de transformar em realidade aquela aspiração petropolitana consubstanciando-a em lei e vencendo, para isso, os óbices previstos, entre os quais avultava a vontade adversa do monarca.

Era Veiga uma personalidade bem talhada para se desempenhar da ingrata incumbência. Inteligente, destemido, generoso, enérgico, possuía um gênio audacioso e versátil a que um ardor insofrido e uma inquieta avidez de empreendimentos novos emprestava um prestigioso ar byroniano. Nascido nos Açores, viera aos seis anos de idade para o Brasil, onde seu pai ia exercer o alto cargo de Desembargador da Casa de Suplicação do Rio de Janeiro, o que equivalia aproximadamente ao de atual Ministro do Supremo Tribunal de Justiça.

Ainda jovem, – consoante informa na conscienciosa biografia que dele escreveu e gentilmente enviou a este Instituto o prestimoso historiador patrício Cel. Laurenio Lago – Amaro da Veiga assentara praça de guarda marinha e, após haver concluído com brilho seu curso, embarcou e exerceu importantes comissões no norte e no sul, auxiliando o governo a debelar as rebeliões que então assolavam o país na crise da unificação do Império e logrando merecer sucessivas promoções.

Não tardou, porém, em achar outro gênero de trabalho mais interessante e, permitindo-o a legislação que então vigorava, fez-se transferir para o Exército no posto de Capitão de Engenheiros, correspondente ao que alcançara na Armada. Os problemas da engenharia urbana, que veio nesse tempo a conhecer empolgaram-lhe, no entanto, a atenção mais do que os da engenharia militar da época e, com a licença do Ministério da Guerra, assumiu as funções, primeiro de ajudante e, depois, de engenheiro da Câmara Municipal da Corte, que exerceu durante cerca de oito anos.

Esses e outros trabalhos que então executou, como diretor da Fábrica de Pólvora da Estrela e como engenheiro das Fazendas Nacionais de Nova Friburgo, sob as ordens do Conselheiro Paulo Barbosa da Silva, deram-lhe oportunidade para conhecer a povoação recém-formada de Petrópolis e para travar relações com esse outro arrojado empreendedor de obras públicas a que já nos referimos e a cuja atividade ia se associar por vários anos. Irineu Evangelista de Souza, logo depois Barão e em seguida Visconde de Mauá. Este atilado conhecedor de homens não tardou em notar a operosidade e a capacidade técnica do engenheiro militar e contratou-o, com a devida autorização do governo, para dirigir as obras de construção das estradas de ferro e de rodagem da “Imperial Companhia de Navegação a Vapor e Estrada de Ferro de Petrópolis” que acabara de fundar, assim como da construção da grande ponte sobre o Paraíba que, como complemento da sua empresa de comunicações de Minas com o Rio, o governo da Província do Rio de Janeiro o autorizara a realizar.

Cerca de seis anos esteve o major Veiga ocupado nesses trabalhos empreendidos por Mauá e de como se houve neles e como foi apreciado pelo glorioso financista é o que informa abundantemente o ofício que este espontaneamente enviou ao Ministério da Guerra e, pelo valor de quem o subscreve, importa no mais honroso dos diplomas. Nesse ofício Mauá declarou que o seu auxiliar “se havia conduzido no desempenho dos importantes deveres a seu cargo com a maior atividade, zêlo e inteligência, satisfazendo-o completamente a todos os respeitos”. (v. biografia pelo Cel. Laurenio Lago).
Estava ainda e continuou Amaro da Veiga empregado nas empresas de Mauá quando foi eleito deputado provincial, tomou assento na Assembléia e frequentou-a na legislatura de 1855 a 1857.

Foi na sessão de 1856 que, ao projeto de lei elevando à categoria de cidade as vilas de Valença e Vassouras, apresentou Veiga a emenda acrescentando: – “e a povoação de Petrópolis”.

Defendido brilhantemente pelo novo deputado e bafejado favoravelmente pela influência do Marquês de Paraná, grande amigo de Mauá, – possuidor, naquelas regiões, de importantes fazendas e cujo imenso prestígio político continuou a ter efeito ainda depois de sua morte que veio, justamente, a ocorrer em 3 de setembro desse ano, – o projeto foi aprovado com a emenda e enviado à sanção. O Presidente da Província, no entanto, Luiz Antonio Barbosa, atendendo ao pensamento do Imperador, contrário à concessão dessa franquia que considerava prematura e prejudicial a Petrópolis, vetou o projeto e devolveu-o à Assembléia.

Na sessão do ano seguinte voltou o projeto a debate, com as razões do veto e, como narra o saudoso historiógrafo local Antonio Machado, “o Tte. Cel. Veiga sustentou com entranhada firmeza, em calorosos debates, a causa que abraçára” (Trabalhos da Comissão do Centenário de Petrópolis, vol. I). Em consequência obteve que por 18 votos contra 4 o veto fosse rejeitado e nova redação da lei fosse enviada ao Presidente da Província. Este, porém, ainda desta vez não a quis sancionar. Passado, então, o decêndio, a requerimento do Cel. Veiga aprovado por quase unanimidade de votos, pois só houve a exceção de um único deputado, a lei – como autorizava em tais casos a Constituição Imperial – foi solenemente promulgada pelo Presidente da Assembléia Provincial, Francisco José Cardoso, a 29 de setembro de 1857, recebendo o número 961.

A muitos haverá parecido que a elevação de Petrópolis diretamente de povoado a cidade constituiu singular privilégio e que normalmente devera ter subido, antes, a vila para só depois passar a cidade. Não houve entretanto, esse favor nem existia essa obrigação. Não havia na legislação brasileira, distinção específica entre vila e cidade. Tanto a Lei de 1 de outubro de 1828 que regulou a organização das municipalidades como a Constituição de 1824 referiam-se indistintamente a vilas e cidades, ambas as quais deveriam ter, para sua administração local, câmara eletivas. A única distinção suposta entre elas era a do tamanho, vilas seriam cidades pequenas e cidades vilas grandes. Tanto que o número de vereadores devia ser menor nas câmaras das vilas e maior nas cidades.

E preciso remontar à Idade Média para acertar com a diferença que as caracterizava. Esta consistia, parece-me, em assentarem as cidades, como entidades livres que eram, em terras alodiais; ao passo que as vilas, sujeitas a um suserano, podiam ser edificadas nas terras a este enfeudadas.

No Brasil ocorreu um fato interessante que bem explicaram Diogo de Vasconcelos em suas Linhas Gerais da Administração Colonial e Max Fleuis em sua História Administrativa do Brasil. – Pela penúria em que se encontrava a Coroa de Portugal na época dos descobrimentos, foram as navegações custeadas pela Ordem de Cristo, como obras de expansão da Fé, sendo ajustado, como compensação, que a ela ficasse pertencendo o senhorio direto das terras descobertas à sua custa pelos navegantes portugueses. Nessas terras, e era o caso do Brasil, pois que não pertenciam à coroa mas à Ordem de Cristo, só podiam ser erigidas vilas, e neste sentido foram redigidos os forais de doação das capitanias. Como, entretanto, os Bispos, como nobres de primeira grandeza que eram e príncipes titulares, só podiam residir em cidades, isto é em terras livres, alodiais, nem de outro modo consentira o Papa, acontecia que cada vez que era necessário erigir um bispado nessas terras, o Rei de Portugal, usando das sua atribuições de Grão Mestre da Ordem de Cristo e considerando que com isso prestava um serviço à Fé, emancipava a terra e logo, usando das suas atribuições de soberano, elevava à categoria de cidade a vila onde ia ter sua sede a diocese.

O curioso é que, no caso de Petrópolis, ocorreu exatamente o contrário. A povoação erigida em cidade pela Lei de 29 de setembro de 1857, não assentou, como as beneficiadas antigas, sobre uma terra livre, mas, por uma exceção rara em nosso país, sobre uma terra enfeudada à Família Imperial cujos descendentes são, ainda hoje, os seus senhorios diretos.

Como quer que fosse e nada importando ao caso essa circunstância, os políticos petropolitanos estavam satisfeitos. Tinham ganhado sua causa, graças à cooperação valiosa do Cel Veiga.

Breve, todavia, iam ter efeito as consequências desse ato mostrando que, melhor do que os políticos de ocasião, sabia discernir o Imperador as verdadeiras conveniências do povo que era de seu dever governar e que foi seu privilégio governar com inegável prudência e tino.

Efetivamente, com a sua emancipação Petrópolis ia perder o auxílio que pela sua situação especial de colônia lhe prestava a fazenda imperial e que montava a cerca de cem contos de réis por ano, soma bastante vultosa para a época, e com a qual se faziam os grandes trabalhos de preparo urbanístico do solo, como retificação de rios, aterro de pântanos, abertura e calçamento de ruas, construção de pontes e de edifícios públicos, etc.; ia ficar reduzida, para prover às despesas de sua conservação e desenvolvimento, aos seus recursos municipais ordinários cuja receita foi orçada, no primeiro ano de exercício de sua Câmara, em oito contos de réis (8:000$000)!; ia enfim, o que era ainda mais lastimável, ser assolada pelo flagelo das paixões políticas, inquietada e dividida pelas intrigas partidárias, ficar entregue às trapaças vergonhosas e deprimentes dos manipuladores de eleições.

As duas primeiras consequências não se verificaram por haver intervindo o monarca, o qual manteve sua proteção sobre o povoado que com tanto carinho aqui fundara e, apesar de extinta a administração da colônia por força da sua elevação a município, achou meios de prestar-lhe os socorros financeiros indispensáveis ao seu progresso obtendo que o governo da província suprisse com trabalhos públicos nas ruas, rios e praças da nova cidade as deficiências dos recursos financeiros a que esta se vira reduzida, tendo este regime continuado, para benefício de Petrópolis, até a proclamação da República.
A última daquelas deploráveis consequências, porém, não pode ser evitada. Logo depois de promulgada a Lei de 29 de setembro, em 6 de outubro de 1857, o Presidente da Província, expediu ordens para que as eleições do novo município se realizassem a 22 de novembro do mesmo ano. Assim foi feito. Mas logo após a realização do pleito começaram a aparecer indícios da tempestade política que se formava. Em o Paraíba de 13 de dezembro foi publicada a notícia de que “uma grande parte dos habitantes do 2º distrito representára ao governo contra os abuzos praticados pela meza paroquial que presidira ás eleições de 22 de Novembro, e especialmente por ter sido a eleição presidida pelo Juiz de Paz mais votado do 1º distrito, quando o deveria ter sido pelo 2º distrito; – e por terem comparecido 20 votantes, sendo 11 brancos e 9 libertos, entretanto que o áto do recebimento das cedulas diz terem comparecido, cento e tantos votantes e terem recebido cento e tantas cedulas, cumprindo notar que o número de votantes é muito superior ao número de qualificados como tais no 2º distrito e que é mui singular coincidencia terem obtido os nove votados oitenta e cinco votos cada um!”. Igualmente em o Paraíba de 20 e 24 de dezembro de 1857 se lêem por extenso o recurso que com mais 300 alemães naturalizados o Professor Henrique Kopke dirigiu ao Governo protestando contra a exclusão deles da lista de votantes, assim como a resposta dada a esses recorrentes por um dos três componentes da Mesa Paroquial do 1º Distrito.

Não é, pois, de estranhar que a 2 de junho de 1858 o Ministro do Império, depois de demorado estudo, expedisse um Aviso declarando nula essa eleição, visto como a ela haviam sido admitidos, ao mesmo tempo, votantes alistados pela qualificação de 1856 e pela de 1857. Aconteceu, assim, que o primeiro uso que fez Petrópolis de sua emancipação municipal foi participar, sem nenhum benefício público, da praxe de duplicatas e fraudes eleitorais que maculavam a atividade política do país.

As novas eleições, marcadas para 13 de março de 1859, tiveram a mesma sorte das primeiras: – foram declaradas nulas por Aviso do Ministro do Império de 12 de janeiro de 1859.

Finalmente, a 3ª eleição, marcada para 13 de março de 1859 e nesse dia realizada, foi apurada e considerada válida. Por ela haviam sido eleitos:

À margem do texto dos dois últimos parágrafos constam, manuscritos à tinta, sinal de interrogação e traço vertical, possivelmente de autoria da Gabriel Kopke Fróes

Tte. Coronel Amaro Emílio da Veiga
Comandante Albino José de Siqueira
Capitão Manoel Francisco de Paula
Capitão Augusto da Rocha Fragoso
Manoel Cândido do Nascimento Brito
João Baptista da Silva
Ignácio Batista da Silva
Dr. Tomaz José da Porciúncula
Dr. José Calazans Rodrigues de Andrade.

Constam, manuscritas à tinta, possivelmente de autoria da Gabriel Kopke Fróes, as seguintes anotações: pequeno traço diante dos segundo ao quinto nomes relacionados; Negociante, ao lado do nome de Manoel Cândido de Nascimento Brito; José, substituindo Batista do nome de Ignácio Batista da Silva; Médico do Hospital da Colônia, ao lado do nome do Dr. Tomaz José da Porciúncula

A política partidária, porém, ainda não dissera a sua última palavra no caso. Veiga e seu grande amigo Mauá haviam perdido os apoios a que se amparavam na política geral do Império. Paraná morrera no fim de 1856. Dois anos depois, no fim de 1858, o Gabinete Olinda, que lhe continuava em parte a orientação, e do qual fazia parte Souza Franco, muito amigo de Mauá, caíra justamente por advogar o regime de pluralidade bancária que este energicamente patrocinava. Sucedeu-lhe o gabinete Abaeté, composto ainda de partidários de Paraná, mas do qual fazia parte Torres Homem, o “Timandro” adversário de Souza Franco e da idéia da pluralidade bancária, portanto de Mauá, e que assumiu a chefia da nova orientação do ministério até que este caiu e foi substituído em agosto de 1859 pelo gabinete chefiado por Ângelo da Silva Ferraz, este decidido adversário de Paraná e inimigo da política de “conciliação” até então apoiada pelo Imperador. Em consequência dessas modificações, o Ministro da Guerra Manoel Felizardo de Souza e Melo, colega de Torres Homem no Gabinete Abaeté, negou ao Tenente-Coronel Veiga a licença de que precisava para assumir o exercício do cargo de vereador e, como mais votado, o de presidente da Câmara Municipal, visto como o art. 19 de Lei de 1º de outubro de 1828 e os artigos 1 e 2 da Lei 25 de junho de 1831 consideravam incompatível o cargo de vereador com o de oficial militar da ativa. Era legal a decisão; mas não se pode deixar de conjeturar que, talvez, ela houvesse sido diferente se estivessem ainda no poder os amigos de Mauá. Obstando-se à licença requerida o governo, a um tempo e com um só ato, castigava o deputado que ousara forçar a decretação da emancipação administrativa de Petrópolis e feria, indiretamente, através do seu auxiliar e amigo, o ardoroso defensor, na Assembléia Geral, da política da pluralidade bancária emissionistas, questão “nevrálgica” que já fizera cair o Ministério Olinda e ia fazer cair o Ministério Abaeté, de orientação contrária, que lhe sucedera.

Consta do impresso foto, em oval, com a legenda Coronel Amaro Emílio da Veiga e ao lado Juiz de Paz, manuscrito à tinta, possivelmente de autoria da Gabriel Kopke Fróes.

Afastado Veiga, afastaram-se, também, voluntariamente, os seus amigos Dr. Tomaz da Porciúncula e José Calazans, que foram substituídos pelos “suplentes” João Meyer e José Antonio da Rocha.

Com traço ligado ao nome de João Meyer consta Inspetor de Quarteirão, manuscrito à tinta, possivelmente de autoria da Gabriel Kopke Fróes.

O lugar de Veiga permaneceu vago. Os restantes vereadores eleitos e os suplentes chamados receberam os seus diplomas a 14 de junho e, a 17 de junho de 1859, tomaram posse e instalaram solenemente a nova Câmara Municipal sob a presidência do segundo vereador mais votado, o Comendador Albino José de Siqueira, dirigindo a cerimônia, de conformidade com a lei, o Presidente da Câmara Municipal da Estrela, município do qual acabava de ser destacado o de Petrópolis.

Para dar uma verdadeira idéia do que então se passou, transcrevemos – conforme a encontramos no artigo que sobre o assunto publicou na “Tribuna de Petrópolis”, a 14 de julho de 1909, o nosso ilustre confrade, o historiador petropolitano Cel. Walter Bretz, a quem devemos preciosas informações neste domínio – a notícia dada no dia seguinte pelo Mercantil sobre o que ocorreu na assinalada data.

“Como prevíamos, ha muito, foi hontem o dia da nossa emancipação e um feliz dia foi considerado pela população reunida. Reinou em todos os peitos o júbilo e todos os labios bendiziam aqueles que trabalharam incansaveis pela independencia de um lugar, que julgavam estar condenado a ser eternamente sujeito a outro.

A’s 11 horas, pouco mais ou menos, ouviram-se retumbar pelos ares as girandolas, que anunciavam a chegada do digno presidente da Vila da Estrela e o povo dirigiu-se em maioria para a casa destinada a ser o templo onde seria celebrada a solenidade da posse.

Esta teve lugar no predio pertencente hoje á Excelentissima Senhora D. Jesuina da Rocha Fragoso, á rua Paulo Barbosa, antiga nº 12, onde presentemente funciona a agencia do Correio desta cidade.

Presidiu-a, como ficou dito acima, o Dr. Bernardino Alves Machado, presidente da Camara da Estrela, medico, chefe político, deputado provincial e cavalheiro da Ordem de Cristo, tendo servido de secretário o Capitão Francisco Ignacio Vargas, titular desse cargo na Estrela.

Presentes os nossos vereadores, e entre eles o Sr. Albino José de Siqueira, digno presidente da nossa Camara, foi proferido pelo estimado presidente da Estrela, o seguinte discurso, no qual, longe de se encontrar um unico viso de despeito, reconheceu-se o desejo que esse senhor alimenta pela prosperidade da nossa nova cidade:

“Congratulo os habitantes de Petropolis pela sua elevação á categoria de cidade, tendo-se feito a justiça devida á sua reconhecida importancia e crescente prosperidade, que maior desenvolvimento vai por certo adquirir com a ilustrada administração de tão dignos vereadores.

Os elementos naturais de engrandecimento, a solicitude do governo da provincia e mais que tudo a desvelada proteção da Casa Imperial vos tornarão agradavel e facil a administração da nova Municipalidade, sem sobrecarregar vossos co-municipes com pesados impostos, bastando-vos, a principio, alargar pouco e fiscalizar bem o que desta freguezia percebia a Vila da Estrela e cujas tabelas serão fornecidas pelo nosso procurador e secretário, logo que exigirdes.

Não sendo antagonicos os nossos interesses, espero e peço que se mantenham as melhores relações entre a nova cidade e a Vila da Estrela e vejo disso bem seguro garante no prestante cidadão que tem de presidir vossos trabalhos e que não se esquecerá de que nasceu em Inhomerim e ali possúe seus melhores estabelecimentos.

As administrações por parte do governo da provincia e da Casa Imperial, que fizeram Petropolis nascer e crescer, devem ser respeitadas em vossas deliberações.

Cada passo de terreno conquistado sobre a natureza acidentada sempre grandiosa e bela destas serranias, cada pedra de vossa cidade atestam um beneficio e os nomes de suas principais ruas e praças perpetuarão vossa gratidão.

No governo da provincia sucedem-se os presidentes mas continúa uma ininterrompida solicitude pelo engrandecimento de Petropolis.

E o que diremos de S. M. o Imperador, que vos estabeleceu em terras do seu dominio particular, que aqui mandou construir a sua residencia de verão, que particularisa seus socorros a vossos templos, a vossos hospedes e á parte mais indigente de vossa povoação, que finalmente vos honra e anima com sua presença?

Não sou o interprete mais apropriado de vossos sentimentos de gratidão e por isso limito-me a rogar-vos que me acompanheis na seguinte saudação:

Viva S. M. o Imperador!
Viva a Família Imperial!
Viva o augusto protetor de Petropolis!”

Foi acolhido com geral aceitação, e o Presidente da nossa Câmara, correspondeu com igual afabilidade à do digno recitador.

A sala, destinada para este ato, achava-se magnificamente mobiliada, e a efígie do nosso augusto monarca, que a ornava, era obra do nosso compatriota, o Sr. Fragoso, ao qual um futuro esperançoso se entreabre.
De tão solene ato foi lavrado um termo especial, em livro rubricado pelo Presidente da Câmara da Estrela e que se encontra preciosamente guardado no arquivo municipal.

Finda a cerimônia da posse, aqueles que a presenciaram, foram render ao Eterno suas fervorosas preces para que fosse duradouro o prazer que nessa hora se apossava deles, e acompanhados pelos membros da nossa Câmara, e alguns da Estrela, cumpriram respeitosamente essa obrigação que lhes era destinada. (Esta solenidade constou de um Te Deum cantado na matriz com grande assistência popular).

Às quatro horas da tarde outras girândolas que subiram ao ar anunciavam ter chegado a hora do banquete oferecido pelos nossos vereadores à população de Petrópolis no Hotel do Bragança. Reinava o maior prazer em todos os semblantes, saudavam-se mutuamente os presidentes de ambas as Câmaras, os nacionais e estrangeiros e a maior boa ordem segui a todas essas saudações.

À noite, todos os moradores iluminaram suas casas, patenteando assim ser a alegria geral e na verdade era ela geral.
No Hotel Bragança houve grande baile popular que durou até alta madrugada.

No dia seguinte ao da posse da Câmara Municipal realizou-se a primeira reunião ordinária dessa corporação, sendo nomeados os primeiros funcionários e resolvido adotar-se, provisoriamente, o Código de Posturas em vigor na Vila da Estrela, deliberação que foi aprovada pelo Governo Provincial em 7 de julho do mesmo ano.

Os primeiros funcionários da Câmara Municipal de Petrópolis foram os cidadãos seguintes:

Secretário – Alferes Carlos de Barros Falcão Cavalcanti de Albuquerque Lacerda, ajudante do escrivão e fiel da Superintendência da então Imperial Fazenda de Petrópolis, nomeado na sessão de 18 de junho de 1859.
Fiscal – Tomaz Gomes Machado, nomeado na mesma sessão.
Procurador – Gregório José Teixeira, nomeado na sessão de 21 do mesmo mês, tendo sido fiador o negociante Baltazar José de Souza Machado, conforme o termo assinado em 13 de junho desse ano.
Porteiro – Guilherme Nicolay, nomeado em sessão de 21 de junho.
Engenheiro – Ricardo Soares, empregado da Diretoria da Colônia, nomeado em 27 de agosto.
Guardas Fiscais – Silvestre Antonio de Araújo e Antonio Maura de Gomes e Sá, nomeados aquele em 26 de setembro e este em 15 de outubro do supracitado ano.

O Mercantil e o Paraíba, jornais que se aqui publicavam nessa época, inseriram dias depois o seguinte edital, que foi o primeiro baixado pela nova edilidade:

“A Camara Municipal, desta cidade faz publico que se acha empossada de seu cargo, e para constar mandou afixar o presente. Paço da Camara Municipal de Petropolis em 18 de Junho de 1859 ¬ O presidente Albino José de Siqueira. O secretário, Carlos de Barros Falcão Cavalcanti de Albuquerque Lacerda”.

Instalada e organizada a municipalidade de Petrópolis, Amaro da Veiga a quem magoara profundamente a decisão do Ministro da Guerra negando-lhe licença para assumir a presidência da Câmara e determinando-lhe que se recolhesse à capital do Império “deu parte justificada de doente e havendo sido inspecionado de saude passou a ser considerado doente” (biografia pelo Cel. Laurenio Lago). Pouco depois a sua situação era definitivamente resolvida: “pela imperial resolução de 15 de novembro de 1859, tomada sobre consulta do Conselho Supremo Militar, o tenente coronel Amaro Emilio da Veiga foi reformado na graduação de coronel com o soldo de tenente coronel” (biografia pelo Cel. Laurenio Lago).

Nesse mesmo ano Veiga desligou-se das empresas de Mauá. Para o período de 1861-1864 foi novamente eleito vereador, com 209 votos, mas não tomou posse por se haver ausentado para fora do Império, e, mais provavelmente, por se haver desgostado da vida política ou não o impelir mais a essa atividade qualquer compromisso assumido com Mauá. Até o fim da sua vida morou parte do ano em Petrópolis onde várias pessoas ainda se recordam dele. Magro, ereto, com grandes suíças louras, ar distante, era uma figura austera e respeitável. De manhã era visto habitualmente no seu “brougham” que ele próprio guiava, de luva e cartola, muito empertigado, enquanto o cocheiro, de libré, no banquinho de trás, braços cruzados, sério e firme como um manequim, completava o conjunto de gosto acentuadamente vitoriano. Morreu nesta cidade a 22 de abril de 1896. A Gazeta de Petrópolis consagrou-lhe um brevíssimo artigo no qual lembrava que à sua atuação fora devida a emancipação de Petrópolis. A Câmara Municipal que, justamente nessa ocasião se achava reunida, para vergonha dela não lhe prestou a menor homenagem; os edis de então, preocupados de romperem quaisquer laços com a derrubada da monarquia, não tiveram sequer o atilamento de aproveitarem o ensejo para homenageando a Veiga, ferir de longe o exilado Imperador que se lhe opusera ao intento

Terminemos apresentando duas ligeiras observações que os próprios fatos que vimos comentando nos impõem.

A primeira diz respeito à reversão, que em nossos dias se operou, nas relações do Município com os demais órgãos do Governo, à situação vigente no tempo em que Petrópolis foi elevada a cidade. O recente Decreto-Lei federal n.º 1202, organizando o Departamento Administrativo dos Municípios, oferece interessantíssimas analogias com a Lei de 1 de outubro de 1828 que regulava o assunto durante a monarquia. Ambos esses atos souberam escapar à fascinação do prestigioso conceito de “autonomia municipal” para considerar na sua realidade concreta o município brasileiro frequentes vezes prejudicado pelos erros e enganos que, nas suas aplicações, esse falso conceito tem produzido entre nós.

A outra observação concerne à minguada eficácia das medidas políticas sobre os destinos profundos de um povo. Petrópolis tem se desenvolvido e progredido constantemente, quer como colônia e povoado, quer como freguesia e distrito, quer como município autônomo na 1ª República, quer como município tutelado na Monarquia e no Estado Novo, quer como simples cidade, quer como capital do Estado… E enquanto Petrópolis continuamente se adiantou, as suas rivais e semelhantes, as vilas que com ela tinham sido elevadas a cidade, Valença e Vassouras, se conservaram estacionárias ou, então, regrediram e se arruinaram, como a da Estrela, da qual ela fora tributária e a de S. José do Rio Preto à qual começou pertencendo e que hoje constitui o último e menos favorecido dos seus distritos.

O seu progresso não dependeu em ocasião nenhuma do amparo ou do embargo de medidas unicamente políticas ou administrativas, mas dos elementos valiosos que contribuíram para a sua formação e entre os quais se contam, o seu clima suave, a sua topografia pitoresca, a sua proximidade do mar e da capital do país, o reservatório no seu seio de possantes energias hidráulicas, a grande mescla em sua população, logo no princípio, de europeus trabalhadores e morigerados…

Petrópolis constitui um conjunto único em nosso país: é uma cidade de veraneio e de turismo, para descanso, alívio e encanto de ricos; – é uma cidade industrial, na qual vicejam fábricas e oficinas de toda a sorte, que dão subsistência a uma população de vários milheiros de operários; – é uma cidade de estudo e meditação, onde trabalham numerosos colégios, escolas e cursos de todos os graus e onde se acolhem diversas congregações e ordens religiosas ocupadas, de acordo com os seus particulares estatutos, no duplo labor incessante e tranquilo do serviço dos homens e do serviço de Deus…

Parece que a Providência Divina se comprouve em formar neste delicioso recanto fluminense uma cidade privilegiada, destinada a não sabemos que importante missão na história espiritual da nossa pátria.

Foi, talvez, profeta o escritor que, no número inaugural do Paraíba, publicou que “a cidade de Pedro não podia ser predestinada para nada menos do que para a capital do Imperio”.

Esperemos, confiadamente, na realização desses grandes destinos e, se tanto nos for dado, contribuamos para isso imitando o exemplo de atividade honesta e digna que nos deixaram esses antigos benfeitores de Petrópolis, um Mauá, um Veiga, cujos cometimentos hoje tivemos ocasião de rememorar.