RESGATES PETROPOLITANOS

Francisco José Ribeiro de Vasconcellos, associado emérito, ex-associado titular, cadeira n.º 37, patrono Sílvio Júlio de Albuquerque Lima

Há anos um mistério encobre uma das facetas mais significativas da imprensa petropolitana. Quem sabe a publicação desta matéria não proporcionará o deslinde da questão?

Recapitulemos. Em março de 1857 começou a circular nestas serras, à véspera da emancipação política da urbe, o jornal “Mercantil” de Bartolomeu Pereira Sudré. Em dezembro daquele mesmo ano, pela mão de Augusto Emilio Zaluar veio a furo o periódico “O Parahyba”. Aquele viveu até 1892; este morreu em fins de 1859.

A coleção d ‘ “O Parahyba”, graças ao espírito lúcido e com enorme visão de futuro do colono e vereador Felipe Faulhaber, está depositada na Biblioteca Municipal de Petrópolis, reunida em dois grossos volumes. Os números do “Mercantil” de 1876 a 1892 também estão encadernados e integram o acervo da mesma Biblioteca, embora com algumas falhas, em virtude do empenho do jornalista Thomaz Cameron, que antes de morrer em 1909, destinou sua coleção de periódicos à instituição em epígrafe.

Então perguntar-se-á: Onde foram parar os números do “Mercantil” de 1857 a 1875? Até hoje não consegui obter uma resposta convincente. Há muitas informações desencontradas, mas a triste verdade é que o mistério permanece. A Biblioteca Municipal não os tem. O mesmo acontece com as Bibliotecas Nacional e do Museu Imperial.

Onde teriam ido parar tão preciosos documentos que poderiam reconstituir a vida petropolitana da década de sessenta e parte da de setenta do século XIX?

Será que esses jornais integram ainda alguma coleção privada, algum acervo de família?

Deparou-se-me uma pista ao estudar a figura insigne de Frederico Damcke, que foi contemporâneo de Julio Frederico Koeler, testemunha ocular da fundação de Petrópolis e escrivão da colônia.

Encontrei na Biblioteca do Museu Imperial recortes da “Tribuna de Petrópolis” colhidos nas edições de 22 de novembro de 1959 e de 1° de janeiro de 1960. São transcrições de matérias de autoria de Frederico Damcke veiculadas durante o ano de 1857 pelo jornal “Mercantil”. No final do longo artigo que a “Tribuna de Petrópolis” trouxe a furo em 1° de janeiro de 1960, lê-se em letras garrafais: “COLEÇÃO DO JORNAL “O Mercantil” ANO DE 1857 PERTENCENTE AO ARQUIVO WALTER BRETZ.”

Parece ficar claro que o arquivo do jornalista e escritor Walter João Bretz, falecido em 29/10/1944, possuía, entre outros documentos, a coleção do jornal “Mercantil”, pelo menos referente ao ano de 1857, o da fundação do periódico.

Tudo leva a crer que a divulgação dos depoimentos de Frederico Damcke reeditados pela “Tribuna de Petrópolis” em 1959 e 1960, o foram graças ao empenho do genealogista, historiador e jornalista Guilherme Auler, que era na altura diretor da “Tribuna” e que nela divulgou incontáveis documentos acerca da vida colonial petropolitana, sendo pioneiro no levantamento genealógico dos colonos de origem germânica, entre os quais ele se inseria.

Portanto ele teve acesso ao arquivo de Walter João Bretz porque lá encontrou exemplares do “Mercantil” referentes às edições de 1857.

Isto posto, conclui-se que pelo menos até 1960 esses jornais existiam no mencionado arquivo e quiçá os números dos anos subseqüentes.

E agora, onde andarão eles? Estejam onde estiverem (a menos que tenham sido destruídos pelo fogo ou pelas pragas temporais) fica aqui o meu apelo para que eles sejam entregues à Biblioteca Municipal de Petrópolis, onde serão bem guardados e conservados e onde poderão prestar enormes serviços aos pesquisadores e à comunidade local.

Não sou petropolitano, mas há quarenta anos escavo a sua história e as suas tradições culturais, divulgando-as na imprensa e em livros disponíveis à consulta tanto no Museu Imperial como na Biblioteca Municipal. Não gostaria de morrer antes de comemorar junto com esta instituição o enriquecimento de seu acervo com as edições faltantes do “Mercantil”, órgão pioneiro da imprensa em Petrópolis.

O coletivo é burro para criar, mas bastante inteligente para difundir, coletivizando aquilo que alguém criou. Da assimilação pela coletividade do bem cultural, nasce a necessidade de sua preservação. E esta pertence à sociedade, não ao indivíduo. Qualquer arquivo deve ser encarado como um bem público, como patrimônio coletivo. Não pode, nem deve ser instrumento de satisfação pessoal, muito menos de vulgar mercantilismo. Desapropriem-no se for necessário.