18 de abril de 1918: Santos Dumont decidiu por Petrópolis

Marisa Guadalupe Cardoso Plum – Associada Titular, Cadeira n.º 18 – Patrono Gabriel Kopke Fróes

 

Há cem anos, no dia 18 de abril de 1918, Alberto Santos Dumont adquiriu o prazo de terras nº 1.422, no Morro do Encanto, Quarteirão Renânia Inferior, com testada para a Rua do Encanto, que pertencia a Henrique Rittmeyer. Nele construiu a sua casa denominada por ele próprio de “A Encantada”, obtendo o habite-se da Prefeitura Municipal de Petrópolis em 29 de agosto de 1918. Nela atualmente funciona o Museu Casa de Santos Dumont.

Durante os anos em que trabalhei na “Encantada” ouvi muitos visitantes que perguntavam: “Por que Santos Dumont escolheu Petrópolis para construir sua casa?” A resposta a esta indagação se completa por vários fatores, uns identificados  e outros ainda por se descobrir.  Petrópolis ocupou desde o séc. XIX um status especial no contexto nacional, desde o Império à República, pela sua tranquilidade, clima ameno, belezas naturais. Santos Dumont encontrava-se com a Princesa Isabel em seu exílio em Paris e certamente, falavam sobre as belezas da cidade imperial. Numa entrevista publicada na Tribuna de Petrópolis de 4 de janeiro de 1914, Santos Dumont descreveu sua viagem: “boa; fil-a agradavelmente. Quando o trem começou a subir a serra, senti um outro ar, que recebia das montanhas, que adornam o caminho férreo para Petrópolis.”  Segundo nos relatou  Jorge Henrique Dumont Dodsworth, seu sobrinho neto, haviam  familiares que  possuíam  imóveis em Petrópolis, um deles na Av. Ipiranga, onde atualmente é o Mosteiro da Virgem, e amigos como  Paulo de Frontin, que recebia Santos Dumont em sua casa na Av. Koeler, e era administrador da  fazenda de café do seu pai dr. Henrique Dumont, após este ter sofrido um acidente.

E o que se passou na vida do inventor brasileiro no hiato de dez anos antes do seu entrelaçamento com a terra serrana?  Em fins de 1908 na 1ª Exposição de Aeronáutica no Grand Palais de Paris, Santos Dumont participou com a sua Demoiselle, numa época em que os avanços aeronáuticos permitiram conquistas de novos recordes, compartilhados com aeronautas contemporâneos. Durante o ano seguinte, 1909, a Demoiselle, seu último aparelho, cruzou os céus franceses tornando-se extremamente popular, menor e mais veloz segundo a revista L’Illustration de 28 de agosto daquele ano. Aluizio Napoleão ressalta os resultados na aeronáutica e concretização do sonho de Santos Dumont:  “Fugindo do interesse das patentes, presenteara a Demoiselle, graciosa e de fácil construção, aos aprendizes de aviação do mundo inteiro.”(p.146).  Um deles, Rolland Garros, pioneiro no sobrevoo no Rio de Janeiro e montanhas petropolitanas, cruzando o Mediterrâneo e nomeia o famoso torneio de tênis.

Em 1910, Santos Dumont depois de dez anos deixou a “carreira de aeronauta”. Tornou-se então, um observador atento, recebeu honrarias como o Monumento de Saint-Cloud em Paris, outrossim, magoou-se também com o esquecimento gradativo pelos seus feitos. 

Com a eclosão da Primeira Grande Guerra Mundial em 1914 acompanhou entristecido a Europa lutar usando os aeroplanos. Vivendo seus conflitos interiores viu na participação do II Congresso Científico Pan Americano em Washington, a oportunidade de divulgar os seus propósitos de união das Américas. E como um mensageiro pacifista viajou pelo continente americano anunciando: “os países distantes se encontrarão apesar das barreiras das montanhas, rios e florestas. […] Chegaremos a um contato mais íntimo. Seremos mais fortes nos nossos laços de compreensão e amizade.” (p. 75). Participou em 1916 da Conferência Panamericana de Aeronáutica em Santiago, sendo homenageado no Chile e Argentina. Voltando-se para o Brasil, durante o ano de 1917, analisou e indicou caminhos para o desenvolvimento da aeronáutica nacional explicitados em seu livro “O Que Eu Vi, o Que Nós Veremos”, publicado em 1918, lançando seu olhar visionário: “ ver o aeroplano – hoje poderosa arma de guerra, amanhã meio optimo de transporte – percorrendo as nossas immensas regiões, povoando o nosso céo, para onde, primeiro, levantou os olhos o Padrre Bartholomeu Lourenço de Gusmão.”(p.104)

 

Obras consultadas:

Santos-Dumont. SP: Instituto Cultural Itaú, 1996.

Dumont, Santos. O Que Eu Vi O Que Nós Veremos. 1918.  Fundação Projeto Rondon –Minter, Ministério da Aeronáutica, 1986.

Napoleão, Aluisio. Santos Dumont e a Conquista do Ar. São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1957.

Tribuna de Petrópolis. 04/11/1914. Acervo Biblioteca Municipal Gabriel Mistral.