Um século não é nada e é muito. Em termos cósmicos, cem anos passam num átimo; para nós que afinal vivemos muito pouco, dez décadas valem uma eternidade.

Em 1897 Areal era um longínquo distrito de Paraíba do Sul, porque Três Rios, que então se chamava Entre Rios, ainda não havia alcançado sua autonomia. E quando tal aconteceu, Areal deixou de ser paraibano para ser trirriense, chegando nos últimos anos à condição de cidade, com direito à Câmara Municipal, Prefeitura e brasão de armas. E tudo isso aconteceu em um século. Para os arealenses foi um sonho de mil anos.

Mas voltemos ao pacato burgo sulparaibano em 1897. Às 12h30 do dia 11 de setembro, um trem da falecida Estrada de Ferro Grão Pará entrou resfolegando na estação do Areal. Não era uma viagem comum. O comboio trazia a cúpula da administração do Estado, que à época tinha Petrópolis como sua capital. Ali estavam o Presidente Joaquim Maurício de Abreu e os Drs. Cypriano José de Carvalho, Annibal de Carvalho e Sebastão Lacerda, respectivamente secretários de Obras Públicas, das Finanças e do Interior e Justiça. Ali também se encontravam os deputados Barros Franco e Soares de Gouvêa, o Conde Van den Steen, Ministro da Bélgica, os Srs. Max, Herbert e José de Iaegher, representantes da Societé Anonyme des Ateliers de Constructions, Forges et Aciéries de Bruges, engenheiros, empreiteiros e pessoas gradas.

O povo, que havia embandeirado festivamente a povoação, aclamou os visitantes em meio ao espoucar de foguetes. Tudo era festa naquela tarde de primavera nesse simpático recanto da serra fluminense.

Após pequeno descanso, o Presidente e sua comitiva tomaram a direção da ponte de aço lançada sobre o rio Preto, próximo à sua embocadura no Piabanha, para com toda a pompa inaugura-la. Ela ia substituir uma outra de madeira, tornando mais segura a jornada pela estrada do Areal a Bemposta.

O empreiteiro da obra, fez entrega dela ao engenheiro chefe da segunda seção técnica, Dr. José Augusto Devoto, que em breve discurso, rendeu suas homenagens ao Presidente Maurício da Abreu, ao secretário da Obras Cypriano da Carvalho, ao empreiteiro Domingos Rodrigues Cordeiro Junior, ao Ministro da Bélgica e aos representantes da empresa fornecedora do material. Mas, por um dever de justiça, não se esqueceu de mencionar os nomes do Dr. José Thomaz da Porciuncula e de Miguel da Carvalho, os quais foram responsáveis pela elaboração do projeto de lei que mandou abrir créditos especiais para viabilizar tão importante e necessário cometimento, que abriria novos horizontes à zona rural arealense.

O Presidente agradeceu, felicitou o povo local e cortou a fita entregando ao público a ponte metálica construída na Bélgica, que, dentro da circunscrição do povoado estava ligando a chamada ilha, faixa de terra entre os cursos dos rios Preto e Piabanha, à margem direita do primeiro, prosseguindo-se daí em diante na direção de Bemposta.

Feito o teste de carga sem maiores problemas, Maurício de Abreu e parte de sua comitiva cruzaram a ponte em vistosa diligência, seguindo os demais a pé, até a casa em que seria servido o lanche. Ao champanhe trocaram-se entusiásticas saudações, fazendo o Presidente um brinde à felicidade do povo sul paraibano e ao Ministro belga.

Às quatro e trinta o trem já estava de regresso a Petrópolis, deixando atrás de si toda uma população ainda em festa. Não era para menos. Quando Areal teria outra oportunidade para regozijar-se tanto? Creio que só lá pelos fins dos anos trinta, quando Getulio ali esteve para inaugurar a primitiva Rio/Bahia, a BR 4, que depois seria modernizada e asfaltada, passando a atender então por BR 166.

Vale dizer que a ponte metálica do Areal recebeu uma placa de identificação, que lhe conferia o nome de Maurício de Abreu.

Correu o marfim, como diria Ivan Hertz e, 79 anos depois, o governo do município de Três Rios, construiu sobre o rio Preto uma nova ponte de concreto, a qual foi inaugurada pelo então Governador Faria Lima, em 1976. Numa placa de bronze alusiva ao evento, consta o nome de Maurício de Abreu batizando aquela obra de arte. Embora o texto não seja detalhado e elucidativo, fez-se entretanto justiça ao presidente fluminense que, em 1897, levou o progresso a tão longínqua paragem, segundo os parâmetros da época.

Vale esclarecer que há uma ponte metálica, possivelmente contemporânea daquela inaugurada há 100 anos, lançada sobre o braço do Piabanha que deságua no rio Preto e que faz a conexão da ilha com o atual centro administrativo arealense e com a antiga estação ferroviária local. As fotos que ilustram o presente texto são dessa ponte, cuja origem estará nas minhas futuras cogitações.