A ONU E OS CONFLITOS INTERNACIONAIS; PRESENÇA BRASILEIRA EM FORÇAS DE MANUTENÇÃO DE PAZ
Ivo de Albuquerque, Associado Emérito, ex-Titular da Cadeira n.º 39 – Patrono Walter João Bretz, falecido

 

OBJETIVOS:

– Ressaltar a importância da atuação da ONU no Cenário Mundial;

– Preservar a memória e a presença brasileira em missões internacionais de paz;

– Resgatar a importância do fato histórico representado pela contribuição militar brasileira à conquista do Prêmio Nobel da Paz em 1988 pelas forças de manutenção da paz nas Nações Unidas.

INTRODUÇÃO

A HISTÓRIA, já dizia Cícero, é a senhora dos tempos, a vida da memória.

“Para ser de utilidade ao homem ela necessita ter sempre por escopo a Verdade e a Justiça e, nesse sentido, deve assentar-se em duas condicionantes básicas: o seu registro e a sua veracidade. Sem verdade, ela se desvirtua, e sem registro, ela se perde, além de ser também passível de deformação.”

Nesta homenagem que rendemos à ONU em seu 55º aniversário de criação, rememoramos os esforços desenvolvidos através de décadas, visando a construção de uma ordem jurídica internacional.

Consideramos oportuno também associar a essa comemoração, um tributo de reconhecimento à presença e à conduta de patrícios nossos, militares em sua quase totalidade, em ações pacificadoras levadas a efeito em diferentes regiões do planeta, sob a égide das Nações Unidas. Tal reconhecimento decorre do propósito que nos anima a todos os patriotas que somos, no sentido de difundir e ressaltar fatos e feitos que nos engrandecem como pessoas, como cidadãos, como povo e como Nação.

I – O SISTEMA ONU

A necessidade de existência de um organismo internacional que promovesse a harmonia entre os povos vinha sendo sentida desde fins do século passado, a partir de quando ocorreu uma série continuada de movimentos em prol da criação de uma sociedade capaz de prevenir a guerra.

A Carta das Nações, assinada em 26 de junho de 1945, na conferência de paz de São Francisco, Califórnia, e cuja entrada em vigor se deu a 24 de outubro daquele mesmo ano, data que passou a ser celebrada mundialmente como o DIA DAS NAÇÕES UNIDAS, simbolizou o esforço das 51 nações sócio-fundadoras da ONU – dentre as quais o Brasil – no sentido de serem alcançados os grandes objetivos fixados para a novel entidade, a saber:

– a manutenção da paz mundial;

– o desenvolvimento de relações amistosas e de colaboração entre as nações;

– a defesa dos direitos humanos e

– a promoção do bem-estar social e da melhoria das condições de vida.

A importância do papel desempenhado pela ONU e dos resultados por ela alcançados pode ser sintetizada através do aforismo segundo o qual “NÃO HÁ QUEM CONSIGA IMAGINAR O MUNDO SEM ELA”.

Nos seus 55 anos de existência ela tem se constituído, de fato, num fórum onde antagonistas de todos os credos e dimensões debateram suas queixas e argumentos; onde foram criadas condições para a elaboração de normas de Direito Internacional sobre questões de maior gravidade, como a não-proliferação de armas nucleares; a utilização do espaço exterior; a convenção sobre armas biológicas. Também ali, espera-se, devem ser discutidas e equacionadas outras questões de âmbito mundial e que não podem ser resolvidas por um único país, como é o caso do controle ambiental, do combate a epidemias, do tráfico de drogas e do terrorismo.

Apesar das críticas e restrições formuladas quanto ao seu desempenho e das múltiplas e variadas atribulações com que se defronta, a começar pelos problemas financeiros, não há como deixar de destacar sua extraordinária ajuda na cooperação internacional em áreas como as de cultura, tecnologia, comércio, saúde, alimentação, assistência às crianças e aos refugiados, na discussão de problemas ecológicos mundiais; na criação da Agência Internacional de Energia Atômica.

Destaque especial emprestamos à mediação de uma série de crises de extrema gravidade, passíveis de gerar conflitos de dimensões imprevisíveis, em face do perigo de um confronto nuclear.

II – OPERAÇÕES DE MANUTENÇÃO DE PAZ

1 – ANTECEDENTES

A realidade do pós – II Guerra Mundial deixou claro que o poder econômico e militar do mundo passou para as mãos das duas superpotências que emergiam daquela conflagração: os Estados Unidos da América e a União Soviética, ambas empenhadas em obter a hegemonia e a dominação dos povos exercendo, para isso, pressões de toda espécie. A dissipação do clima de harmonia entre as duas potências vencedoras da II Guerra Mundial deu margem à criação de um clima de antagonismo – a denominada “Guerra Fria” – travada de forma indireta entre elas e caracterizada por desigualdades, desentendimentos e incertezas.

Foi, assim, num mundo dividido em blocos antagônicos, que ocorreram inúmeros conflitos regionais fortemente influenciados por interesses estratégicos do bloco capitalista, altamente industrializado, e do bloco comunista, empenhado em voraz expansão. A questão da Coréia foi um divisor de águas na história política do pós-guerra e na história das Nações Unidas.

2 – FUNDAMENTAÇÃO

a. Para fazer face a essa realidade, as Nações Unidas criaram e desenvolveram as Operações de Manutenção de Paz, como um de seus principais instrumentos a serviço dos vários meios de solução pacífica de controvérsias. Tais operações se caracterizam pela forma de intervenção não-violenta, voluntária, executada com o consentimento das partes interessadas e revestidas de absoluta imparcialidade – sua arma mais poderosa.

b. Como não possuem Forças Armadas próprias, as Nações Unidas planejam cada operação em função das necessidades específicas da nova situação. O desencadeamento é autorizado pelo Conselho de Segurança, a quem incumbe fixar-lhe os objetivos gerais, a amplitude e o calendário próprios.

c. Os integrantes das missões de manutenção de paz, conhecidos mundialmente como “CAPACETES AZUIS”, representam a presença mais notória das Nações Unidas nas zonas de conflito. Isso desde maio de 1948, quando o primeiro grupo de observadores militares chegou ao Oriente Médio para supervisionar uma precária trégua durante a primeira guerra entre árabes e israelenses.

d. A presença das Forças de Manutenção de Paz permite que atividades políticas e diplomáticas continuem a ser encaminhadas para alcançar uma paz duradoura. Por outro lado, a eficácia das ações a seu cargo é facilitada pela autoridade de que as mesmas dispõem para abrir fogo em caso de ataque, embora sejam equipadas com armamento leve e recorram a medidas de força em grau mínimo e unicamente em legítima defesa.

e. Nos casos em que países conflagrados não aceitaram a intervenção de terceiros em seus territórios, o Conselho de Segurança autorizou alguns Estados-Membros a adotarem todas as medidas necessárias – inclusive a força – para se alcançar um objetivo específico. Esse tipo de ações coercitivas através de operações bélicas conjuntas são denominadas “Operações de Imposição da Paz”, dirigidas por um país ou grupo de países e conduzidas sob a vontade dos Estados-Membros participantes, sem que se faça imprescindível o consentimento das partes em litígio.

Como exemplo desses tipos de operações mencionamos as da Coréia (1949 a 1952); do Golfo Pérsico (1990); Somália (1992/93); Ruanda (1994); Haita; (1994/95); Bósnia-Herzegovina (1995/00); Albânia (1997); República Centro-Africana (1997); Kosovo (1999/00); Timor Leste (1999/…).

Importante é ressaltar que tais intervenções, embora sejam regidas pelas disposições da Carta das Nações Unidas, são formas inteiramente distintas das ações desenvolvidas em Operações de Manutenção de Paz.

O Brasil, coerentemente com a obediência aos princípios de não-intervenção e de auto-determinação, não possui tradição em matéria de participação em forças multinacionais autorizadas pelo Conselho de Segurança.

3 – FORMAS DE ATUAÇÃO

3.1 – Período da Guerra Fria (De 1ª Geração ou Clássicas)

As Operações de Manutenção da Paz, desde seu início, se desenvolveram e foram evoluindo no período da Guerra Fria sob a constante ameaça de um potencial confronto nuclear.

Sua forma tradicional da atuação consistia no desdobramento de pessoal, fundamentalmente militar, de uma série de países, sob o comando das Nações Unidas, com a finalidade de auxiliar no controle e na solução de conflitos armados entre facções hostis.

Os objetivos visados eram, basicamente:

– reduzir tensões

– criar condições necessárias às negociações de paz

– verificar a execução do previsto em acordos negociados

As operações envolviam duas categorias principais:

– missões de observadores militares, compostas por número relativamente pequeno de oficiais desarmados, encarregadas de:

– monitorar e supervisionar um cessar-fogo;

– patrulhar fronteiras ou zonas desmilitarizadas;

– supervisionar a retirada de tropas e a separação de forças.

– Forças de Paz, compostas por contingentes de tropas nacionais levemente armadas, desdobradas para conduzir tarefas similares às dos observadores e, com freqüência, atuar como um elemento neutralizador entre os adversários, mantendo a integridade territorial, a lei a ordem.

No período de 1948 a 1987 foram criadas 14 operações de manutenção de paz, com a participação de pessoal de 50 Países-Membros.

Os resultados das intervenções da ONU refletiram, principalmente, o nível de engajamento das grandes potências nos diferentes cenários e a vontade das partes de alcançarem uma solução para os conflitos. Essas condicionantes foram responsáveis pela coexistência de operações bem-sucedidas (Congo, Suez, Yriam Ocidental, Índia/Paquistão), com outras de resultado questionável (Iêmen e Líbano) e com aquelas que ainda persistem no Oriente Próximo, na Cachemira e em Chipre.

3.2 – PERÍODO PÓS-GUERRA FRIA

O período seguinte ao término do confronto ideológico e à aproximação dos EUA e da Rússia, tem se caracterizado pela transformação contínua do panorama político mundial e pela proliferação de crises e conflitos. Assim, a manutenção da paz, concebida inicialmente como uma forma de fazer frente à beligerância interestatal, tem evoluído e se aplica, cada vez mais, aos conflitos intraestatais, gerados por antagonismos internos de natureza política, étnica ou racial, e religiosa, envolvendo várias facções armadas com diferentes objetivos e linhas de mando difusas.

Em conseqüência, as missões de manutenção de paz têm-se defrontado, por vezes, com situações em que os acordos de cessar-fogo são ignorados, em que o consentimento outorgado para a presença das Nações Unidas é questionado e em que o governo e as instituições do Estado deixaram de funcionar ou estão desarticuladas.

A tudo isso somam-se as ações de forças irregulares e milícias que ignoram ou violam deliberadamente normas humanitárias, e ainda as frentes de confrontação que mudam continuamente.

Como decorrência natural desse cenário, as operações de manutenção de paz passaram a incluir cada vez mais difíceis e também complexas atividades, além daquelas clássicas, tradicionais ou de 1ª geração, objetivando iniciar a reconstrução e a organização institucional em sociedades devastadas pela guerra.

As técnicas e as experiências adquiridas ao longo dos anos serviram de base para uma evolução de conceitos, princípios e fundamentos, bem como para o desenvolvimento de diversas modalidades de ação.

O pessoal e a estrutura militares continuam sendo a base da maioria das operações, no entanto, efetivos cada vez maiores de policiais militares, técnicos e profissionais civis têm se associado aos efetivos militares.

As responsabilidades dos mantenedores da paz vão desde a proteção e assistência humanitária até a ajuda a antigos adversários na ultimação de acordos de paz; desde o auxílio ao desarmamento e à desmobilização de ex-combatentes e sua reinserção na vida civil, até a realização e supervisão de eleições; desde a capacitação da polícia civil até a supervisão do respeito aos direitos humanos e a investigação de denúncias de violação desses direitos.

Presentemente, as missões de manutenção de paz contam, ainda, com a colaboração estreita de organismos e representações da ONU, tais como o Alto Comissariado para Refugiados, o Programa Mundial de Alimentos, o Fundo para a Infância (UNICEF), o Alto Comissariado para os Direitos Humanos, entre outras entidades, como as ONGs.

Ênfase especial há que ser dada à importância das ações políticas desenvolvidas pela ONU com vistas a:

– intensificação das atividades diplomáticas em auxílio à implementação de acordos de paz, à interrupção da luta armada e ao consentimento das partes, tudo antecedendo o desdobramento das forças no terreno;

– criação de condições estáveis e seguras para as atividades destinadas a consolidar a paz uma vez terminado o conflito.

Encerrando a abordagem sobre o papel da ONU na atualidade, há que se ressaltar o saldo altamente positivo de 50 missões de manutenção de paz levadas a efeito em seus 55 anos de existência, envolvendo um efeito de mais de 750.000 pessoas, em sua grande maioria militares, dos quais, cerca de 1600 morreram em atos de serviço.

– 4 – PRESENÇA BRASILEIRA

A presença brasileira em missões internacionais de paz decorre de compromissos firmados desde a assinatura da Carta das Nações. Obedece a disposições constantes do Art 4º de nossa Constituição e é feita em consonância com os princípios básicos da política externa do Governo.

Atendendo solicitação dos Secretários-Gerais da ONU, militares de nossas três Forças Armadas têm integrado missões de manutenção de paz em regiões conturbadas dos cinco continentes.

A participação militar brasileira pode ser dividida em dois grandes momentos:

1º) O período de 1948 a 1967, caracterizado pela presença em 7 (sete) das 14 (quatorze) missões realizadas pela ONU até 1987 durante a Guerra Fria e consideradas, conforme já dito anteriormente, como de 1ª geração ou “clássicas”. Foram elas:

a. Na Europa

– UNSCOB, na Grécia, fronteira com a Albânia, a Bulgária e a Iugoslávia.

(Mai 48 a Mar 51)*;

– UNFICYP, em Chipre (Mar a Abr 64) **.

* Não considerada Operação de Manutenção de Paz, porém, assinala início da participação brasileira em iniciativas da ONU para aquela finalidade.

** Missão cumulativa com o Comando da UNEF-1.

b. No Oriente Médio

– UNEF-1, na Península do Sinai, lado egípcio, e Faixa de Gaza (Jan 57 a Set 67); e

– UNYOM, no Iêmen (Set a Nov 63).

c. Na África

– ONUC, no Congo (Jul 60 a Jun 64).

d. Na Ásia

– UNSF, na Guiné Ocidental/Irian Ocidental (Ago a 21 Set 62);

– UNIPOM, na Índia e Paquistão (Set 65 a Mar 66).

e. Na América Central

– DOMREP, na República Dominicana (Mai 65 a Out 66).

2) O período de 1989 até hoje, com participação mais variada, abrangendo 16 (dezesseis) missões consideradas de 2ª geração ou “multidisciplinares”, a saber:

a. Na Europa

– UNPROFOR, na ex-Iugoslávia (Ago 92 a Dez 95), desdobrada em:

– UNCRO, na Croácia (Mai 95 a Jan 96);

– UNPREDEP, na Macedônia (Mai 95…);

– UNTAES, na Eslavônia Oriental (Jan 96 a Jan 98) e

– UNMOP, na Península de Prevlaka (Jan 96…)

b. Na América Central

– ONUCA, na Nicarágua e Honduras (Abr 90 a Jan 92);

– ONUSAL, em El Salvador (Jul 91 a Abr 95);

– MINUGUA, na Guatemala (Out 94 a … e Fev a Mai 97). *

c. Na África

– UNA VEM-I, em Angola (Jan 89 a Mai 91);

– UNA VEM-II, em Angola (Mai 91 a Fev 95);

– UNA VEM-III, em Angola (Ago 95 a Jul 97);

– MONUA, em Angola (Jul 97 a Fev 99) **;

– UNOMIL, na Libéria (Set a Nov 93)***.

d. Na Oceania

– UNAMET, no Timor Leste (Jul 99…)****.

*Missão híbrida, civil (Of Lig e Of Prol) e de Operação de Paz
(Obs Mil).

**Mantida uma equipe médica de quinze Militares

*** Obs Mil cedidos da UNAVEM-III

**** Of Lig Obs Pol, Obs e Peritos Eleitorais

Afora esse total de 22 (vinte e duas) missões, o Brasil também contribui nos anos 90 para compor duas missões civis no Camboja e na África do Sul, com observadores eleitorais, além de integrar os quadros de especialistas da Comissão Especial da ONU para a eliminação das armas de destruição em massa do Iraque (UNSCOM), que não é considerada uma missão de paz propriamente dita, mas sim, uma missão de desarmamento.

Efetuou, ainda, a cessão gratuita de 11 (onze) oficiais das Forças Armadas para servirem no Departamento de Operações de Paz, na sede da ONU, em Nova York.

Em cada um dos dois momentos retrocitados, o Brasil também participou de Operações de Manutenção da Paz fora do âmbito das Nações Unidas. No primeiro período, salienta-se a participação na Força Interamericana de Paz na República Dominicana de Mai 65 a Set 66, integrada por 24.000 homens das Américas, sob égide da OEA.

No período atual, cumpre ressaltar: a bem-sucedida participação na MOMEPE – Missão de Observadores Militares na Cordilheira do Condor, região de litígio entre o Peru e o Equador, integrada pelos quatro países garantes do Protocolo firmado em 1942: Brasil, Argentina, Chile e EUA.

O Brasil exerceu a Coordenadoria-Geral da missão durante todo o período de 1995 a 1999, além da organização do apoio logístico;

Do que foi aqui exposto, fica evidenciado o elevado índice da participação brasileira, notadamente do segmento militar, em Operações de Manutenção de Paz.

O valor do soldado do Brasil tem sido ressaltado principalmente quanto à competência profissional, serenidade, firmeza e imparcialidade, e por sua determinação e coragem no cumprimento do dever.

Essas considerações que formulamos com justificado orgulho, se fazem dignas de nota, principalmente ao considerarmos serem nossas Forças Armadas modestas em efetivos e meios, em comparação com as de outros países mais ricos. A despeito dessas carências que nos impõem meticulosos planejamento e atribuição de prioridades no estabelecimento de núcleos de excelência, nosso pessoal tem sabido superar dificuldades de toda ordem e dignificado, nas campanhas externas de que participa, o prestígio e a projeção do nosso país no concerto das demais Nações.

5 – PRÊMIO NOBEL DA PAZ DE 1988

Como último tópico, cabe-nos enfatizar a participação militar brasileira na conquista do Prêmio Nobel da Paz de 1988.

Em 29 de setembro daquele ano, o Comitê Norueguês NOBEL, a quem incumbe selecionar os vencedores do maior dos prêmios do mundo contemporâneo na categoria da prevenção da paz, anunciava haver recaído sua escolha sobre as Forças de Manutenção de Paz das Nações Unidas, por representarem estas “a vontade manifesta da Comunidade das Nações de alcançar a paz através de negociações, e porque elas, mediante sua presença, deram, em muitos casos, uma contribuição decisiva para a iniciação das negociações”. Assinalou, ainda, a citação daquele Comitê, haver sido tal contribuição prestada “sob condições extremamente difíceis”, aspectos esses que valorizam sobremaneira a atuação dos integrantes das referidas forças.

A expressão da importância de que se reveste a participação brasileira nas missões realizadas no período abrangido pela concessão do Prêmio é referendada pelos seguintes aspectos:

a. As declarações do então Secretário-Geral da ONU, Javier Perez de Cuellar, perante a Assembléia Geral em Nova York, a respeito da outorga do Prêmio.

“O Prêmio é um tributo ao idealismo de todos quantos têm servido a esta Organização e, em particular, ao valor e sacrifício daqueles que têm contribuído e continuam a contribuir para nossas operações de manutenção de paz”.

The Boston Globe, edição de 30/09/88

“Os recentes êxitos das Nações Unidas não foram súbitos e nem fortuitos, mas representam resultados duramente conseguidos pela persistência e dedicação da Organização, durante muitos anos, às atividades em favor da paz.”

O Globo, edição de 30/09/88

b. As referências expressas pelo Departamento de Informação Pública das Nações Unidas na publicação “Nações Unidas – 40 anos”:

“A láurea do Prêmio Nobel da Paz de 1988 às Forças de Manutenção de Paz das Nações Unidas significa o reconhecimento da contribuição dessas Forças para a realização do objetivo de paz em várias áreas de conflito durante os últimos 40 anos.”

e “Ao conceder o Prêmio… O Comitê Norueguês Nobel destacou as pessoas jovens de muitas nações que, movidas por seus ideais, se engajam voluntariamente num serviço exigente e arriscado pela causa da paz.”

c. As referências constantes de publicações do Centro de Comunicação Social do Exército:

“Aos soldados, marinheiros e aviadores brasileiros distinguidos com o honroso título de Mensageiros da Paz, pertence uma significativa parcela do Prêmio Nobel da paz concedido aos Capacetes Azuis da ONU.”

“O Prêmio Nobel da Paz concedido em Oslo (Noruega) às Forças das Nações Unidas para a Manutenção da Paz, reconhece o conjunto das missões enviadas a quatorze cenários bélicos nos últimos quarenta anos, integradas tanto por forças militares (Capacetes Azuis), com armamento leve, quanto por observadores (Boinas Azuis).”

Registre-se, no entanto, que a inexistência de qualquer símbolo oficial que expresse a participação individual de nossos militares naquela conquista extraordinária, constitui, ainda hoje, uma lacuna, à luz dos princípios que norteiam a cultura institucional de nossas Forças Armadas, notadamente aquele voltado para a justa valorização de fatos e feitos.

CONCLUSÕES

– No seu meio século de existência, a ONU tem demonstrado inigualável aptidão e, sobretudo, legitimidade para a condução de operações de manutenção da paz, fruto de sua condição de única organização universal voltada para a manutenção da paz e da segurança internacionais.

– Da atuação de nossas Forças Armadas e Forças Auxiliares em missões de Manutenção da Paz decorrem reais benefícios para sua profissionalização, seu adestramento e reequipamento, fatores fundamentais para que se mantenham em bom nível de aprestamento. Acresçam-se a esses benefícios a oportunidade de participação em episódios marcantes da História mundial contemporânea, do debate e intercâmbio de vivências, conhecimentos e experiências, além do cultivo da camaradagem.

– As operações de manutenção de paz da ONU, embora possam abrigar mandantes multidisciplinares, hoje algo incontestável, dificilmente serão bem-sucedidas se forem violados seus princípios tradicionais do consentimento das partes, da imparcialidade e do uso da força somente em casos de autodefesa.

– A participação em missões de paz da ONU representa uma indicação do grau de responsabilidade que o país deseja assumir nos assuntos afetos à paz e à segurança. Essa participação ativa há que atender, integralmente, a diretriz de Política de Defesa Nacional que determina seja ela feita “de acordo com os interesses nacionais”.

– O valor individual do militar brasileiro, já sobejamente demonstrado em operações de guerra, foi também evidenciado durante sua participação, tanto isoladamente como em equipe, nas missões de paz de que o Brasil tem participado sob a égide da ONU e da OEA. As citações e referências elogiosas formuladas pelos altos escalões das organizações às quais nossos contingentes estiverem subordinados, bem atestam e confirmam esta assertiva.

Constituem, assim, tais demonstrações e evidências, valiosa contribuição para as gerações seguintes, em termos de exemplos de dedicação, responsabilidade, disciplina e sentido humanitário, dentre outros atributos indispensáveis ao cumprimento de missões delicadas e árduas como aquelas, nas quais se fazem sempre presentes a tensão e o perigo, o risco e as provações pessoais.