O VISCONDE DE OURO PRETO

Affonso Celso de Assis Figueiredo, nasceu em Ouro Preto, Minas Gerais, a 21 de fevereiro de 1837, sendo filho do ilustre casal João Antônio Affonso e Dona Maria Magdalena de Figueiredo Affonso.

Formado pela Faculdade de Direito de São Paulo em 1858, foi o Visconde, sem favor algum, um dos últimos representantes da respeitável estirpe de estadistas do Império.

Regressando a Ouro Preto, desempenhou importantes cargos, entre os quais os de secretário de polícia, inspetor da tesouraria e deputado provincial e geral e fundou na capital de Minas Gerais a folha liberal “O Progressista”, que circulou de 1859 a 1863.

Transferindo-se para a Capital, ali fundou “A Reforma”, órgão do clube político do mesmo nome.

Na Corte, com apenas 29 anos, foi nomeado Ministro da Marinha, integrando o Gabinete chefiado por Zacarias de Góis e Vasconcellos, em 1866, tendo na ocasião prestado relevantes serviços durante a Guerra do Paraguai.

Na verdade, sua atuação frente ao Ministério da Marinha, naqueles tempos difíceis foi, sem dúvida, extraordinária. Referindo-se a ela, José Bonifácio de Andrada e Silva, citado pelo historiador João Dornas Filho, assim se pronunciou:

“O Arsenal da Marinha operava verdadeiros prodígios fazendo construir, com rapidez inaudita vasos de guerra que logo foram movimentados. O Ministro providenciou prontamente sobre tudo quanto era urgente no gravíssimo transe…

Em menos de três anos, dos estaleiros do Arsenal foram lançados uma corveta, três encouraçados, seis monitores e duas bombardeiras, além da reconstrução quase completa de uma fragata e duas canhoneiras” 1 .

1) Cf. Dornas Filho, João. Figuras da Província. Belo Horizonte, Movimento Editorial Panorama, 1949, p.248.

Sua enérgica e profícua atuação no Ministério da Marinha o projetaram no cenário político nacional. Assim, escolhido senador do Império, em 1879, foi convidado a ocupar a Pasta da Fazenda no Ministério Sinimbu, tendo, no desempenho desta árdua função, reformado o método de apresentação de orçamentos e criado e regulamentado novos impostos.

Como conseqüência, em 1882, foi nomeado Conselheiro de Estado e, em junho de 1889, com a queda do Gabinete Conservador de João Alfredo, recebeu a incumbência de organizar novo gabinete, ocasião em que expôs com grande lealdade ao Imperador, a grave situação em que o país se encontrava, com a agitação reinante em algumas províncias, visando à mudança da forma de governo.

Fez ver ao Imperador a necessidade de enfraquecer e inutilizar as idéias falsas e imprudentes, responsáveis por tal agitação, demonstrando que a forma de governo monárquica tinha elasticidade bastante para admitir a consagração dos princípios da razão pública esclarecida e, finalmente, que a necessidade de empreender reformas não devia ser adiada para que as mesmas não se tornassem improfícuas.

As reformas propostas por Ouro Preto visavam a anular a expansão do movimento republicano e, certamente teriam atingido seu propósito, se tivessem sido aprovadas pela Câmara, o que não aconteceu, forçando a dissolução da mesma.

Com a queda do Gabinete, foi o Visconde recolhido preso a um quartel em São Cristovão, onde passou horas amargas, revelando contudo uma coragem e uma altivez pouco comum, até sua partida para o exílio.

Comentando este momento histórico, João Dornas Filho nos informa: “na noite de 15 para 16 de novembro, quando repousava no quartel em que estava detido, foi acordado violentamente por um oficial que lhe disse:

Levante-se para ser fuzilado, senhor Ouro Preto!

Ao que o Visconde respondeu:

A um homem da minha estatura não se avisa que vai ser fuzilado, fuzila-se logo e sem palavras. Não é só o soldado que sabe morrer com dignidade” 2.

2) DORNAS FILHO, João. Figuras da Província. Belo Horizonte, Movimento Editorial Panorama,1949, p.242.

Partindo para o exílio, redigiu em 9 de dezembro de 1889, em Santa Cruz de Tenerife, um histórico Manifesto aos seus concidadãos, defendendo o Imperador e o Regime Monárquico, dizendo a certa altura:

“Quais as faltas, ou crimes do senhor D.Pedro II, que em quase cinqüenta anos de reinado nunca perseguiu ninguém, nunca se lembrou de uma ingratidão, nunca vingou uma injúria, pronto sempre a perdoar, esquecer e beneficiar, que aboliu de fato a pena de morte, apoiou com dedicação e promoveu por todos os meios ao seu alcance o progresso, a felicidade e a grandeza da pátria, sacrificando ao bem comum interesses, repouso e saúde…” 3.

3) Cf. por Emília Viotti da Costa, Da Monarquia à República: momentos decisivos, p. 358.

Em apenas alguns meses à frente do Ministério prestou inúmeros serviços ao país, entre os quais merecem ser citados:

A regulamentação e execução do decreto sobre bancos de emissão; a reforma da Imprensa Nacional e do Diário Oficial; o estabelecimento de convenções sanitárias com as Repúblicas da Argentina e do Uruguai; a conversão dos juros da dívida externa; a elaboração do Código Civil; a realização de obras no porto do Rio de Janeiro, cais, docas, armazéns, guindastes etc.; a solução da questão de limites com a República da Argentina, referente ao Território das Missões, verdadeira vitória da diplomacia brasileira.

Retornando ao Brasil, após a revogação do ato que o baniu, isolou-se da vida política, para dedicar-se à advocacia e à cátedra que ocupava na Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais.

Foi nesta ocasião que por sugestão de seu filho, o Conde Affonso Celso, grande admirador de Petrópolis, que aqui já residia há algum tempo, atraído pelo clima e pela tranqüilidade de nossa cidade, adquiriu no Alto da Serra, uma casa onde durante anos veraneou e veio a falecer.

Participou intensamente da vida do bairro, merecendo destaque seus esforços pela construção de um templo, que veio a ser a Igreja de Santo Antônio, cujo terreno ele conseguiu em doação dos proprietários.

Escritor de consideráveis recursos, deixou-nos o Visconde obras de notável valor jurídico e de grande interesse social e educacional. Entre elas destacamos: Algumas idéias sobre a instrução, em 1882; Statu Liberi, em 1885; Reforma das Faculdades de Direito, em 1887; Finanças do império, em 1876; Finanças da Regeneração, em 1877; Reforma administrativa, provincial e municipal, em 1883; Advento da Ditadura Militar no Brasil, em 1890 e Marinha de Outrora, em 1894.

Faleceu em Petrópolis, em sua residência do Alto da Serra, após prolongada enfermidade, em 21 de fevereiro de 1912, sendo sepultado no Cemitério Municipal.

A cidade lamentou a perda desse brasileiro ilustre, prestando-lhe todas as honras. Ao baixar o corpo à sepultura, usaram da palavra o Dr. Viveiros de Castro, em nome do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, do qual o extinto era sócio e o Desembargador Lima Drumond, pela Faculdade Livre de Direito, ambos enaltecendo os elevados dotes do saudoso morto e recordando os serviços que o mesmo prestara à pátria.

ALBERTO SANTOS DUMONT

Nascido em l873, em Minas Gerais, passou sua infância e adolescência em São Paulo, onde ao ver, pela primeira vez, um balão, entusiasmou-se pela aerostação, entusiasmo que se acentuou mais tarde quando foi residir em Paris.

Na capital francesa dedicou-se à construção de aerostatos com motores, buscando resolver o problema da dirigibilidade.

Em 19 de outubro de 1901, realizou a proeza de contornar a Torre Eiffel em 30 minutos, em vôo circular, conquistando o prêmio Deutsch, retornando à pátria aplaudido e glorificado em hinos.

Em Petrópolis este seu grandioso feito provocou tal entusiasmo que, em 1903, Horácio Leite escreveu a seguinte canção em sua homenagem:
“Benvindo seja o condor
O bravo herói viajor
Incomparável nos ares
Que dirigindo o balão,
Zombando até do tufão
Ri-se da ira dos mares!

Nesse vislumbre de aurora
Que invade o Brasil agora
Vemos teu vulto brilhar;
Ouvimos viver ecoando
E a pátria inteira cantando,
Ao ver seu filho chegar!”

Retornando a Paris procurou resolver o problema do vôo num engenho mais pesado que o ar, que vinha se constituindo num verdadeiro desafio aos inventores, inclusive o francês Clément Ader, “o criador da palavra avião”.

Em conseqüência, a 23 de outubro de 1906, conseguiu levantar vôo diretamente do chão, a uma altura de dois metros, no campo de Bagatelle, em Paris, o que lhe valeu outro prêmio, o Archdeacon.

Em princípios de 1914, voltou definitivamente ao Brasil, sendo entusiasticamente aclamado no Rio de Janeiro e no dia seguinte já se encontrava em Petrópolis, agradecendo, segundo nos informa Fróes “ao Presidente da República, Marechal Hermes da Fonseca, a recepção que recebera, inclusive sua condução na carruagem presidencial, ao desembarcar” 4, sendo na ocasião recepcionado na residência do Senador Paulo de Frontin, localizada à Avenida Koeler, e hospedando-se no Hotel Majestic.

4) FRÓES, José Kopke. A História da Acirp (V): Grandes Brasileiros em Petrópolis, Informativo Acirp, p.4.

Mais tarde, retornou a Petrópolis, em 1918, hospedando-se no Palace Hotel, mas decidido a fixar residência em nossa cidade, iniciou a construção da “Encantada”, na Rua do Encanto.

Segundo as crônicas da época, os aviadores que conheciam Petrópolis, quando voavam em nosso céu, atiravam mensagens e flores sobre a “Encantada”, homenageando aquele que “deu asas ao mundo” e soube elevar, como poucos o nome do Brasil no exterior.

Em 1931, Santos Dumont foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras em razão dos dois livros que escreveu, uma autobiografia que no Brasil foi intitulada “Os Meus Balões” e o interessante trabalho denominado “O que eu vi e o que nós veremos”.

Em julho do ano seguinte faleceu, no Hotel La Plage, em Guarujá, onde procurava se recuperar de uma crise depressiva.

Sua morte provocou grande consternação em Petrópolis, tendo na ocasião, o Lyceu de Artes e Ofícios realizado uma sessão cívica em sua homenagem no Palácio de Cristal, sob a presidência do Dr. Yeddo Fiuza, sendo orador o Dr. Salomão Jorge.

Sobre o grande brasileiro, assim se manifestou Carlos Augusto Guimarães e Souza: “Santos Dumont, lançando-se ao ar não pensava em dominar mundos, semeando a morte, bombardeando cidades. Não! O que ele almejava era justamente o contrário. O que ele desejava era cortar o espaço, levando, como mensageiro da paz, o progresso. Santos Dumont desejava o progresso do mundo” 5.

5) Tribuna de Petrópolis, 30 de julho de 1932.