BIOMASSA, TECNOLOGIA DO QUINTO IMPÉRIO
Julio Ambrozio, ex-Associado Titular, Cadeira n.º 30, Patrono – Monsenhor Francisco de Castro Abreu Bacelar
O pós-liberalismo iniciou seu processo. Fortes indícios dão conta: a Enron, Xerox, WorldCom – controladora da Embratel -, mascaram prejuízos; investidores norte-americanos transferem muitas posições para a Europa. Se os EUA deixarem de importar, Alemanha e Japão serão arrastados juntos para a crise…
O poder militar resolve algumas coisas, mas não tudo.
– Qual o elo substantivo de ligação entre a guerra do golfo, em 1990, a invasão norte-americana do Afeganistão, a condenação do Iraque e a tentativa de golpe, ostensivamente monitorado pelos EUA, na Venezuela do ibero-americano, Chaves?
– O petróleo.
Iraque, Kuwait, Venezuela, estão entre os paises com as maiores reservas petrolíferas. O Afeganistão, além de carregar grandes reservas de gás natural, é a mais conveniente e potencial zona de passagem do petróleo das novas repúblicas saídas do fim da URSS.
É sabido que o carvão e o petróleo são as bases energéticas dos paises industriais; este último, ademais, gerou subprodutos advindos de aplicações científicas, tecnologias que resultaram, p. exemplo, em garrafas de refrigerantes e plásticos. Tudo estaria indo muito bem para as regiões dominadoras e, financeiramente, ricas do mundo, se um acidente de percurso não fosse descoberto e anunciado para um futuro bem próximo: o carvão mineral polui absolutamente e o petróleo, além disso, tem data certa para findar.
Vasconcellos, com este livro, chama a atenção para essa crise. Sobretudo porque a biomassa – energia do sol dos trópicos realizada através das plantas verdes -, além de apontar a solução do problema, é a base não somente de uma revolução tecnológica engenhada pelo homem dos trópicos, mas a estrutura, a peça fundamental do mestiço brasileiro na fundação de sua civilização.
Errou o padre António Vieira, remoendo textos bíblicos, quando enxergou em Portugal da Restauração e no rei D. João IV o Quinto Império, que jamais se realizaria no território lusitano, pois a grande terra e o imenso sol não formariam o ethos ibérico. Vieira, infelizmente, não compreendeu que a profecia tinha já singrado o Atlântico e aportado em terras brasílicas.
Sem citar Vieira na bibliografia, a Biomassa, de Gilberto Vasconcellos, realizar-se-ia como uma espécie de paráfrase dos trópicos do barroco A História do Futuro.
O Brasil hoje vive suas dores tal como Portugal à época da Restauração. No segundo quartel do século XVII os portugueses existiam encruzados: reduzir-se-iam à obediência de Espanha, como muito desejava uma parte da nobreza seiscentista lusitana, ou restaurar-se-ia a nação? Desejo que, ao cabo, congregou a maioria dos portugueses. Do mesmo modo, os brasileiros experimentam hoje, com mais urgência, sua cruz: o país continuará sendo um apêndice famélico do norte, sobretudo dos norte-americanos, como ardentemente aspira a classe dirigente brasileira? Ou afirmará, agora e para sempre, sua autonomia política, conseqüentemente, emancipando-se tecnológica e culturalmente, tal como anuncia sua possibilidade o cientista, antigo secretário de tecnologia do ministério Severo Gomes, criador do pró-álcool e profeta J. W. Bautista Vidal, traduzido e comentado didaticamente por Vasconcellos neste pequeno-grande livro.
Repare, leitor, se o primeiro parágrafo revela indícios de um novo e mais profundo 1929, a encruzilhada brasileira se reveste de enorme gravidade. Contudo, a Biomassa, de Gilberto Vasconcellos, acompanhará o povo brasileiro como breviário de resistência e de viável solução para as muitas batalhas que se anunciam.