PROFESSOR HENRIQUE PINTO FERREIRA

Manoel de Souza Lordeiro

Henrique Pinto Ferreira nasceu em Guimarães, noroeste de Portugal, a 17 de dezembro de 1888. De família humilde, eram seus pais o alfaiate José Pinto Ferreira e Dª Josefa Ferreira Gonçalves. Nos tempos de sua juventude a família de Henrique passou por muitas provações, o que contribuiu para moldar-lhe o caráter, tornando-o um homem obstinado e possuidor de uma grande força de vontade.

Em busca de uma oportunidade, trabalhou como “bedel” na Universidade de Coimbra, onde mais tarde viria a se formar. Pensando em seguir a carreira eclesiástica, chegou a ingressar num seminário onde teve como companheiro de clausura Manuel Gonçalves Cerejeira, o futuro Cardeal Patriarca de Lisboa. Consta que teria ingressado, também, na Escola de Engenharia Militar, sem concluir o curso, entretanto.

Por motivos políticos ou por desentendimentos com a família, não se sabe ao certo, aos dezoito anos resolveu emigrar para o Brasil, fixando-se inicialmente em São Paulo, onde foi funcionário concursado do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas – DNOCS. Transferido para o Rio de Janeiro, ingressou na Faculdade Nacional de Medicina no Largo da Misericórdia, formando-se em 1918; não satisfeito, ainda cursou Química Industrial e Farmacêutica pela então Universidade do Brasil. Em todos esses cursos foi aluno distinto mercê de uma inteligência privilegiada, à qual se somava uma dedicação incomum.

A transferência para Petrópolis se deu em razão de um convite que lhe foi formulado pelo Professor Antonio Noronha, diretor do Colégio Luso-Brasileiro, onde Pinto Ferreira passaria a lecionar. Em 1925, com apoio do Professor Noronha, funda o Ginásio Pinto Ferreira, a ele associando-se, mais tarde, o Professor Napoleão Esteves; o prédio onde se instalou o Ginásio ficava na Praça Visconde do Rio Branco, no início da Rua Paulo Barbosa. Anos mais tarde o imóvel seria vendido para dar lugar à construção do Edifício Imperador. Nessa época o educandário, já com a denominação de Colégio Pinto Ferreira, era dirigido pelo Professor Napoleão Esteves e foi transferido para o prédio da Av. Koeler (atual Palácio Koeler) [atual Palácio Sérgio Fadel], onde funcionara, até então, o Instituto São José, dos padres de Sion. A razão social do Colégio foi mantida ainda por dois anos após a morte de Pinto Ferreira, ocorrida em 1948. A partir de 1950 o educandário, vendido finalmente aos irmãos Mesquita, passou a denominar-se Colégio São José.

Henrique Pinto Ferreira foi membro da Academia Petropolitana de Letras, da Sociedade Real de Geografia de Lisboa, presidente da Sociedade Médica de Petrópolis e jornalista militante; da Academia Brasileira de Letras recebeu o Prêmio de Crítica José Veríssimo.

Humanista por formação e orador brilhante, Pinto Ferreira dominava diversas matérias tais como História Natural e do Brasil, Matemática, Química, Física, Latim e outras mais. Coração magnânimo e generoso e dono de um excepcional caráter, era como poucos dedicado ao ensino. Primado pela simplicidade e modéstia, alguém que lhe fosse apresentado não poderia, à primeira vista, supor que estivesse diante de um homem de tão grande erudição e sabedoria. Um fato curioso é que não obstante ser habilitado em diversas profissões, não as praticava, tal a atração que sentia pelo exercício de uma das mais nobres e também das mais árduas e ingratas profissões: o magistério. Não fazendo de sua atividade mera fonte de lucros, Pinto Ferreira não amealhou fortuna mesmo após anos de constante labor em que só fez enaltecer a nobre missão do professor.

Henrique Pinto Ferreira era casado com Dª Esther Mosquero Ferreira, com quem teve cinco filhos: Ernani Antonio, Paulo Emílio, Luiz Alberto, Vera Albertina e Esther Maria.

Meu encontro com o mestre se deu em 1945, quando o Colégio São Vicente de Paulo, onde eu cursava o 1º científico, encerrou as atividades daquele segmento do Curso Secundário, mantendo apenas o Curso Ginasial. Transferido para o Colégio Pinto Ferreira, já localizado na Av. Koeler, ali eu completaria o segundo grau. A primeira conseqüência dessa transferência compulsória foi a descoberta da minha vocação para a Geometria: a maneira agradável e mesmo divertida com que Pinto Ferreira transmitia a matéria fez com que o estudo da matemática, até então visto por mim como uma tarefa árida e por vezes tediosa, passasse a ter uma nova motivação. O destino me premiaria duplamente: mais tarde, já na Faculdade de Arquitetura, eu viria a ter como mestre o Professor Julio Cezar de Mello e Souza, conhecido nos meios literários como Malba Tahan, homem cuja personalidade tinha muito em comum com a do saudoso Pinto Ferreira e, por isso mesmo, me fazia lembrá-lo permanentemente, com sua matemática divertida e curiosa. Ainda hoje tenho gravada na mente a imagem do mestre de sobretudo e chapéu de feltro, indo ao Colégio à noite no rigor do inverno para ministrar aulas extras a alunos que, como eu, careciam de uma atualização na matéria. A esta altura Pinto Ferreira já estava bastante debilitado, o que não o impedia de cumprir o compromisso assumido com seus alunos.

Após longa enfermidade, faleceu Henrique Pinto Ferreira em 20 de fevereiro de 1948, sendo seu corpo velado no salão nobre da Academia Petropolitana de Letras; dali o cortejo seguiu para a capela do Colégio Pinto Ferreira, na Av. Koeler, onde foi realizada missa de corpo presente, uma última homenagem dos corpos docente e discente do educandário que fundou. Ao baixar o corpo à sepultura no Cemitério Municipal, vários oradores prestaram ao mestre sua derradeira homenagem. Em nome dos professores e alunos do Colégio falou seu grande amigo e também notável educador, o Professor Sandálio Alcover y Cots, a quem os jovens igualmente admiravam.

Como tributo à memória do mestre foi dado o seu nome a um logradouro do centro de Petrópolis, com início na Dr. Nelson de Sá Earp (antiga João Pessoa). Outra homenagem igualmente significativa foi o busto de bronze de autoria do escultor A. Gerales, erguido incialmente no Bosque do Imperador e depois transferido para a calçada fronteira ao CENIP, na Rua do Imperador.

J. Gomes Machado Filho, seu ex-aluno, compôs o soneto “Última Homenagem”, cujos versos finais, aqui reproduzidos, são bem uma síntese do que foi Henrique Pinto Ferreira:

MESTRE – ele o foi, de sucessivas gerações;
SÁBIO – iluminou o caminho de muitos corações;
AMIGO – ele o foi, da mocidade inteira.

Fontes consultadas:
PINTO FERREIRA, Paulo Emílio. A saga da família Pinto Ferreira. Petrópolis: edição do autor, 1995.
SOUZA ADÃO, Regina Maria Barcellos de. “Educação em Petrópolis – 1938-1988”. In: Revista do IHP. Petrópolis: IHP, vol. do cinqüentenário – 1938/1988. pp. 58 a 60
Recortes de jornais da época.