UM MEMORIAL PARA A MARECHAL DEODORO

Oazinguito Ferreira da Silveira Filho, associado titular, cadeira n.º 13, patrono Coronel Amaro Emílio da Veiga

Mais conhecida até a fundação da povoação como caminho dos mineiros, a estrada passou a incorporar a nomenclatura urbana de Dona Tereza quando após o planejamento urbano de Koeler ganhou a denominação que a acompanharia até o final do século XIX, Rua Princesa Dona Januária.

Observamos que não existia a passagem do Alto da Serra para o Morin (atual Padre Feijó), assim sendo o trajeto pesado de carroças e tropas de muares, corria por toda a Rua de Dona Tereza até o centro do então vilarejo, passava à frente da Fazenda do Córrego Seco até que atravessava o citado córrego continuando sua viagem pela Estrada dos Mineiros.

Após a proclamação do sistema republicano que fecha o ciclo monárquico em nosso país, o processo branco de ‘desmonarquização’ por que foi atingida a cidade, conduziu a novas denominações em suas ruas, e atingiu a Dona Januária que passou a ostentar a denominação do chefe maior do movimento, Rua Marechal Deodoro, assim como da principal via na qual desaguava, que deixou de ser Rua do Imperador, para envergar a data do movimento, Avenida XV de Novembro.

No ano de 1857, justamente ano da elevação de Petrópolis a cidade, segundo descrições de Gabriel Fróes, um dos maiores cronistas históricos de Petrópolis, foi aberta ao trânsito a nova ponte situada em frente a Rua Princesa Dona Januária, que segundo este era o tradicional ‘…desembocadouro de carros e passageiros que se dirigiam a cidade’. Antes se prolongava a viagem até o encontro dos rios, onde de outra ponte de madeira se passava ao lado oposto seguindo viagem para as Minas Gerais.

A construção da referida ponte fazia parte do projeto de urbanização de Koeler para a principal via da cidade.

Não podemos dizer que as obras estivessem concluídas, pois ainda levaram mais alguns anos, mas mesmo assim a cidade se tornava passo a passo o ‘cartão postal do Imperador’, digno de registro daquele que foi o mais importante fotógrafo da Corte, Klumb, que fotografou em 1865 a entrada da Rua Princesa Dona Januária e de uma de suas mais importantes casas comerciais da época na esquina (prédio onde atualmente possuímos a Farmácia Brasil), e de alguns habitantes da mesma região que para esta posaram.

Outro registro fotográfico processou-se mais tarde a partir do ‘Morro da Caixa d’Água’ (atual 24 de maio) e que registrava toda a extensão da Rua Dona Januária.

Os acontecimentos e marcos desta rua não passaram despercebidos aos cronistas e registra-se a presença dos imigrantes portugueses em Petrópolis nesta mesma rua, quando em 1854 (Fróes) foi criada a Padaria das Famílias, estabelecimento tradicional na história do comércio local que completou seu centenário no século passado, sendo homenageada por Tristão de Ataíde em crônica pela Tribuna de Petrópolis de 1961 cujo título era ‘A Carrocinha do Padeiro’.

A

Coleção José Kopke Fróes – Arquivo Histórico do Museu Imperial

Muitos afirmam de forma incompreensível a presença de uma sinagoga na Rua Aureliano Coutinho extensão da Marechal Deodoro e parte da Rua Tereza, mas compreende-se sua presença ao encontrarmos na região nesta segunda metade do século XIX o imigrante judeu Bernardo Horácio Wellisch, nascido húngaro ou germânico, estabelecido como o mais importante negociante petropolitano do seu tempo e que era proprietário de inúmeros imóveis na área, principalmente no numero 5 da Dona Januária com um armazém de secos e molhados por atacado e uma importante casa de consignações.

Wellisch também foi importantíssimo para a expansão imobiliária de Petrópolis, incrementando o progresso da região do Vale do Paraíso (Valparaíso) onde havia adquirido grande área de terras que foi loteada em 1888, segundo o jornal O Mercantil que noticiou a venda. Wellisch faleceu em Petrópolis, aos 56 anos de idade, a 12 de março de 1894.

Dona Januária, que registrava a descida dos meninos jornaleiros vendendo O Mercantil e correndo pelas ruas da cidade, oriundos da redação do jornal que ficava na Rua de Dona Tereza, segundo depoimento de José Kopke Fróes (entrevista quando da exposição no prédio da ECT, 1984).

A Dona Januária passou em 05 de dezembro de 1889, portanto vinte dias após o movimento, a denominar-se segundo proposta da Câmara Municipal Avenida Marechal Deodoro.

A presença evangélica em Petrópolis também é um grande registro da Rua e que se realizava desde quando a colonização avançou ao final do século XIX (ainda Dona Januária) com a presença de diversos missionários que chegam à região para fundar os princípios de novas seitas já estabelecidas nos Estados Unidos. Assim sendo, é que vemos já em 1898, a inauguração do primeiro templo Metodista no numero 9 da então Rua Marechal Deodoro que teve sua construção finalizada em 1905 com a definitiva inauguração do prédio que foi derrubado nos anos 70 para a construção do novo templo que hoje se apresenta.

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Coleção José Kopke Fróes – Arquivo Histórico do Museu Imperial

Ainda segundo Gabriel, foi em meados do século XX que desenvolveram as primeiras tentativas de fundar um “football club”, com a presença de Salvador Fróes, Edgard Bartlett James, Jorge Pereira de Andrade e outros rapazes petropolitanos que se reuniram no ano de 1902, nos fundos do prédio n.º 2, da Rua Marechal Deodoro e fundaram “Clube Esportivo Petropolitano”, cuja praça de esportes localizava-se em um ‘campinho’ na Terra Santa na área onde ocorreram as primeiras pelejas esportivas, ‘porém o Clube morreu no nascedouro’, segundo seus comentários.

Em 1942 ocorreu o alargamento da Rua Marechal Deodoro, com o fim das extensas calçadas com seus jardins, que foram a menina dos olhos da urbanização de Sá Earp na primeira década do século. E pelo decreto de n.º 70 do mesmo ano (1942), o local resultante do alargamento da Rua na confluência com a Avenida XV de Novembro, passa a denominar-se, Praça Dr. Sá Earp Filho. A Marechal Deodoro passa a ter como limites duas praças, no outro extremo a Praça Paulo Caneiro.

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Coleção José Kopke Fróes – Arquivo Histórico do Museu Imperial

Em 1955, já em prédio próprio no n.º 192, na Marechal Deodoro, inaugurou-se o Teatro da Escola de Música Santa Cecília.

O tradicional prédio da Fazenda do Córrego Seco, abrigou posteriormente o Hotel Mills, e por seqüência a Pensão Macedo e a Pensão Geofroy. Sendo derrubado nos anos 40 para a construção do Edifício Pio XII. Prédios que passam a ser erguidos sucedendo os sobrados que lhe eram tradicionais.

D

Coleção José Kopke Fróes – Arquivo Histórico do Museu Imperial

Nos anos 50 uma ‘ilha’ de concreto foi construída para dar abrigo aos passageiros de um ponto de carros de praça que já se localizava desde os anos 40 na região, sendo que mais tarde, nesta mesma ilha foi criado um café que reunia inúmeros comerciantes e bancários da região, assim como os funcionários da Coletoria Estadual de Rendas.

Quando registramos manifestações no centro da cidade, verificamos que estas é que por falta de registros impressos não faltaram ao histórico da Rua. De operários nos anos 20; políticas nos momentos mais importantes da cidade como as integralistas e aliancistas; movimentos artísticos como os que se apresentavam nos tempos da ‘jovem guarda’, quando shows como os de Jerry Adriani, Wanderley Cardoso, membros da “jovem guarda”, movimento cultural, eram organizados na Praça Paulo Carneiro e até mesmo concentrações populares que tomavam toda parte alta da rua e mesmo quando do movimento político contra medidas econômicas do governo organizadas na Rua Tereza.

Marechal Deodoro que registrava desde os anos 60 a subida e descida dos passistas da 24 de Maio ao inicio e final de seus desfiles vitoriosos pelo centro da cidade, assim como a comemoração da “escola” em seu glorioso desfile na Praça Onze (1968).

Uma rua com movimentação de escolares pelos anos 70 aos 90, do Colégio Werneck e do Colégio Santa Isabel. Ou como atualmente é conhecida, a rua da maior movimentação e moradia da população de sexagenários de Petrópolis, e que acusa também a presença do principal trafego de sacoleiros com passagem à Rua Tereza.

E

Tribuna de Petrópolis, 1984

Uma rua como poucas, com uma marcante memória registrada. A mesma Rua onde primeira diretoria eleita do Clube Petropolitano ocorreu a 20 de julho de 1920, reunidos que estiveram pela primeira vez, a 7 de agosto de 1920, em uma das salas da residência do Dr. Arthur de Sá Earp Filho, que localizava-se também na Avenida Marechal Deodoro n.º 73, visto ainda não ter o clube sede própria. E foi designada a residência para sede provisória do clube, o prédio n.º 73 da Rua Marechal Deodoro.

A 8 de maio de 1925, teve início em nossa cidade um estranho campeonato de dança realizado no sobrado da Casa Cosenza, que situava-se no 19 da Marechal Deodoro. Citado pela Tribuna como se tratando de ‘…competição interessante, moderna e elegante, para a qual não era mister somente o arrojo, mas também uma grande pujança física’. E, revertendo a renda dos ingressos em favor do Recolhimento dos Desvalidos (Terra Santa), ‘uma iniciativa, além do mais, humanitária’, como assinalou Fróes em seus registros.

Foi em 1925, quando Petrópolis comemorava, o centenário do nascimento de D. Pedro de Alcântara, que às 11 horas, foi inaugurada a construção em cimento armado de duas pontes na Avenida 15 de Novembro. Uma construída pela Prefeitura, fronteiriça à Marechal Deodoro, e outra pelo Banco de Petrópolis, fronteira ao Colégio Santa Isabel.

Finalmente em 1929, o ‘Petropolitano Football Club’ inaugurou sua sede social no número 19 da Marechal Deodoro, sendo que na mesma época instalava-se na mesma rua a Escola de Música Santa Cecília um baluarte da cultura petropolitana pelo decorrer do século XX, sonho do Maestro Paulo Carneiro.

O desenvolvimento e progresso industrial da cidade há décadas exigiam novos investimentos em comunicações. O último registro ocorrera com a fundação dos Correios e Telégrafos nos anos 20. Mas estávamos na era do telefone, rápido e importantíssimo, principalmente para as casas bancárias do centro financeiro. Assim em 1930, Companhia Telefônica Brasileira inaugura o novo edifício de sua estação, no número 39 da Marechal Deodoro (atual OI) e com ele o serviço revolucionariamente automático de ligações telefônicas, que tão logo sofria a concorrência dos empresários que corriam ao centro financeiro petropolitano.

Citamos a presença centenária do Petropolitano, mas não devemos nos esquecer que o Serrano que havia sido fundado em 1915 também teve sua sede inaugurada em 1932 no sobrado de número 19 da mesma Marechal Deodoro passando posteriormente para o prédio que se localizava na Praça Rui Barbosa.

Nas primeiras décadas do século os movimentos operários agitavam e envolviam a cidade, principalmente os grevistas. Sua representatividade se processou por diversas associações espalhadas pela cidade, mas os têxteis conseguiram já nas primeiras décadas se fazer presentes na Marechal Deodoro, no Sindicato dos Trabalhadores em Industrias Têxteis, bem mais organizado que seus congêneres, como o dos Operários da Rua Tereza, entre outros. Deste local partiram inúmeras manifestações grevistas que atingiram as indústrias de toda cidade. Nesta mesma sede surgiram, ou foram “batizados” posteriormente inúmeros outros sindicatos, até que nos anos 60 passou a ser chamado de prédio dos sindicatos por sua ampla organização.

F

Coleção José Kopke Fróes – Arquivo Histórico do Museu Imperial

Ainda nas palavras de nosso principal cronista, Gabriel Fróes, foi em reunião que se processou na casa do Coronel Antonio Antonino Condé, na mesma Marechal Deodoro, que foi fundada a segunda e mais importante casa bancária de meados do século XX, a Sociedade Cooperativa de Responsabilidade Limitada Banco de Petrópolis, cujas atividades desenvolveram-se até 1928 na Rua Paulo Barbosa, mudando-se posteriormente para o prédio da Avenida XV (atual Banco do Brasil) para iniciar sua batalha financeira contra seu rival de créditos o Banco Construtor.

A mesma casa da Marechal Deodoro, onde Berto Antonino Condé procurou rever a representação operária de Petrópolis, lançando jornal que foi criticado por todos os políticos petropolitanos e que o acusaram de se aproveitar dos movimentos grevistas nos anos 20.