A Família Noel e a Valônia

Ricardo Pereira Amorim, Associado Titular, Cadeira n.º 39 – Patrono Walter João Bretz

 

O colono Johann Noel que veio para Petrópolis pertence a uma linhagem de lenhadores-carvoeiros relacionados à indústria de metalurgia, da cidade de Ethe, em Virton (Valônia), na época, antigo Ducado de Luxemburgo (atualmente Bélgica).   Ethe era uma das nove cidades do Condado de Chiny, em 1226, o conde Arnold de Looz casa-se com a herdeira de Chiny e dá origem à linhagem Looz-Chiny. Essas cidades estavam sob a influência do Arcebispado de Liége e do Ducado de Luxemburgo; porém, se submetiam aos duques de Bar para manter o Condado sem conflitos. Após 1337, a região começa ser integrada ao Ducado de Luxemburgo e em 1681 é anexada à França.

Na sua genealogia encontramos Franz Noel (1670), esposo de Marie Pourra (Ethe) e seu filho Johann (ou Jehan) Noel (1700), esposo de Suzane Bideau (Meix-Le-Tige). O filho Johann migra para Züsch, aonde nasce Andreas Noel (1727), avô do nosso colono Johann Noel. Ethe e Meix-Le-Tige, estão na Província de Virton, na região da Valônia denominada Pays Gaumais ou Gaume, com tradições e características muito próprias; aonde falam francês e o patois Valão Gaumais. É muito comum o prenome Jehan (ou Johan), no Gaume e na Valônia, por fazer menção a João Batista e ao Apóstolo João (ver Revue Pays Gaumais, 1957); vindo do hebraico Yohanan (abreviação de Yohohanan: “Yahweh é Gracioso”).

O nome de família Noel significa “Nascido no Natal” ou “Colocado sob a Proteção do Deus Menino”. Até o início do século 20, muitos Valões mantinham o mesmo modo de vida, habitando pequenas cabanas (hütte) no meio da floresta, cortando árvores com machados, transportando lenha em trenós apoiados nas costas para descer encostas de morros até a beira do rio, transportando a madeira até o local da transformação em carvão (o trenó é chamado até hoje em Züsch e na Antiga Valonia Prussiana de Traineau). O processo do carvão durava 7 dias e 7 noites, com vigília para não perder o carvão. Era uma atividade desgastante, já que aspiravam muita fumaça. É típico dos Valões usar o Sabot, sapato de madeira, semelhante aos holandeses (tradição na Bélgica e áreas da França). Até hoje, em Petrópolis, a tradição da arte secular de madeireiras e serrarias, é preservada pelos Noel.  Uma das celebrações típicas no Gaume era a Grande Fogueira, que variava de data em cada cidade: Miex-Le-Tige era feito na Terça-Feira Gorda, com a queima de um boneco de palha e os recém-casados iam jantar nas casas dos pais. Na cidade de Virton e arredores, comemoravam em 23 de junho, véspera do nascimento de João Batista. A fogueira era acessa à noite, em local elevado, as pessoas ficavam dançando e cantando numa grande roda, à volta da fogueira. Em Ethe, tradição de pular fogueira para garantir riqueza e prosperidade no futuro. A Quermesse é algo típico dos Valões, assim como o Carnaval. Eram muito católicos, com culto a Santo Antônio e à Virgem Maria, sob a influência dos Monges Capuchinhos de Luxemburgo, como Anselmo de Esch e Boaventura de Luxemburgo. Atualmente, voltaram a comemorar, em Virton, no dia 26 de dezembro, a Festa dos Apaixonados, desfile de noivos e recém-casados com o casal de bonecos gigantes Djean e Djeanne, animado por uma banda, pela cidade e, ao fim, todos os casais recebem uma estatueta para dar sorte no matrimônio. No mesmo dia tem o concurso do Rei do Paté Gaumais, uma torta típica gigante, com recheio de carne suína, sendo coroado quem come mais.

As tradições valãs são muito ricas e muito alegres; com muitas danças típicas e muitos festejos. Cada região da Valônia possui suas próprias tradições, sendo possível conhecer todos no Museu da Vida Valã, em Liége, em seu acervo imenso. Este Museu possui uma sala dedicada as línguas Valãs, sendo possível ouvirmos textos nos dialetos de cada região, além de apresentar escultura com coisas típicas de cada uma delas; realmente vale à pena visitá-lo, com a possibilidade, dependendo da época, de ver o festival de comidas típicas.  Para os que forem visitar Virton, é interessante visitar o Museu Gaumais, que está situado num antigo Convento dos Frades Menores Recoletos.