RAUL DE LEONI – AINDA E SEMPRE

Leandro Garcia, Professor de Teoria Literária da UFMG e membro titular da Academia Petropolitana de Letras

Raul de Leoni (1895-1926) nasceu em Petrópolis, na residência da sua família que ficava na atual Rua Paulo Barbosa. Poeta singular, culto, formado nas mais clássicas tradições do nosso ensino e da nossa literatura, Leoni teve apenas um livro – Luz Mediterrânea – publicado em 1922, no ano da escandalosa Semana de Arte Moderna. Mas Raul de Leoni nunca foi modernista, foi um clássico em pleno séc. XX, optou pela tradição em plena era das vanguardas artísticas.

Mas Luz Mediterrânea marcou época e “permaneceu” através das décadas, ocupou um lugar no nosso cânone literário, gerou incompreensões e elogios, paixões e ceticismo. Lembro a matéria assinada por Mário de Paula Fonseca, publicada na Tribuna de Petrópolis, em 21/5/1922:

 

As manifestações da atividade humana vêm de um órgão limitado – o cérebro. E, no entanto, algumas delas, como a poesia e a música, se levam ao infinito. É que elas são produções mais nobres do cérebro, são as filhas diletas e gêmeas do pensamento ilimitado, centelhas que promanam imperecíveis, deslumbrantes e encantadoras. […] Está, pois, de parabéns a literatura nacional em aparição deste esplêndido livro, do poeta petropolitano Raul de Leoni.

 

Sabe-se que o poeta divulgou bem o seu livro, fez o que estava ao alcance da época, batalhou por espaço na imprensa especializada. Percebemos isso no ato de Leoni enviar um livro ao crítico literário Alceu Amoroso Lima, o mais importante à época da publicação. Neste exemplar, que se encontra na biblioteca do Centro Alceu A. Lima para a Liberdade, temos a seguinte dedicatória do autor:

 

A Tristão de Athayde, / – a quem entrego este livro / com tranquila confiança / na lealdade da sua nobre / crítica construtora – / homenagem / de / Raul de Leoni / Novembro de 1922.

 

De fato, Alceu leu, analisou e publicou uma bela crítica a respeito de Luz Mediterrânea, na edição de 1/4/1923 de O Jornal:

 

Ao passo que alguns poetas novos pedem, com razão, luz américa, mergulha o Sr. Raul de Leoni a raiz de sua inspiração nesse Mediterrâneo sutil e aventuroso. Seu livro é tipicamente europeu e exprime, melhor que qualquer dissertação erudita, toda uma face de nossa fisionomia. Não há nele nada de americano, nada de brasileiro, nada dessa mescla mental que caracteriza nossa cultura. É um livro de espírito universal, sem a menor correção, sem a mínima influência do meio novo, dos novos ideais, da nacionalidade peculiar em afirmação. Filho da cultura greco-latina, recuperada no humanismo do Renascimento, conservou intata a herança do espírito clássico.

 

Acho que Alceu acertou em cheio ao afirmar: “É um livro de espírito universal”. Realmente, nada mais clássico e universal que uma obra resistir ao tempo e transcender gerações, como é o caso deste livro, ainda pouco valorizado e lido pelas gerações atuais.