A FAMÍLIA KOPKE E SUA OBRA EM PETRÓPOLIS

PARTE II – OS KOPKE, DE HAMBURGO A PETRÓPOLIS

Carlos O. Fróes, Associado Titular (falecido)

O tronco da Família Kopke em Portugal foi Christian Kopke que, por volta de 1730, procedendo de Hamburgo, fixou residência definitiva na Cidade do Porto, a fim de cumprir as funções de Cônsul da Liga Hanseática. Casou-se naquela localidade e deu origem a uma numerosa linhagem.

Em meados do Século XVII, a família Kopke dominava uma expressiva parcela do Comércio Exterior no florescente Empório Comercial de Hamburgo e, conseqüentemente, gozava de grande prestígio no contexto da Liga Hanseática, então composta pelas Cidades Livres de Bremem, Lubeck, Dantzig e Hamburgo, sendo esta última a líder do grupo.

Bem antes de 1730, a presença dos Kopke já vinha se manifestando em Território Português. No terceiro quartel do Século XVII, Nicholas Kopke assumiu as funções de primeiro Cônsul Geral da Liga Hanseática em Lisboa e, poucos anos depois, estabeleceu uma sucursal dos seus negócios no Porto, o importante Empório Português do Norte.

As datas, até então, apresentadas pela crônica são imprecisas. Ao que tudo indica, seria impossível chegar-se a uma constatação, pois toda a documentação particular e oficial da família foi consumida, em 1888, por um incêndio que destruiu a “Herdade Kopke”, localizada nas cercanias da Cidade do Porto.

Entretanto, fontes fidedignas da genealogia portuguesa nos permitiram o levantamento dos dados suficientes aos propósitos do presente estudo.

Nicholas Kopke, natural de Hamburgo, casado com D. Emerence Crochmam, era o pai de Christian Kopke.

Christian Kopke nasceu em Hamburgo a 27.VIII.1693 e transferiu-se definitivamente para Portugal, por volta de 1730, a fim de assumir as funções de Cônsul da Liga Hanseática no Porto, local onde fixou residência. Ali, casou-se com D. Dorothea Whittingham Moring, a 22.III.1731. Deste consórcio nasceram cinco filhos: Nicolau, Joaquim, Dorothea, Emerencia e Christiano João.

Partindo da premissa de que toda a presença anterior dos Kopke em Portugal tenha ocorrido em caracter transitório, é licito apontar Christiano Kopke como o marco genealógico desta interessante família que se consolidou no Porto e, daí, se espalhou para outras áreas, inclusive o Brasil.

Com respeito aos filhos varões, sabe-se que prosseguiram nas áreas do Comércio de Importação e Exportação e da Diplomacia. Joaquim sucedeu o pai nas funções de Cônsul da Liga Hanseática e Nicolau assumiu as de Cônsul do Sacro Império.

Despontava, assim, uma vocação de família em relação à diplomacia e ao comércio que, ainda, iria se manifestar nas gerações subseqüentes.

Os negócios dos Kopke prosperaram vertiginosamente, levando-os a assumir posição hegemônica em Portugal. Em breve tornaram-se os maiores produtores e exportadores de Vinho do Porto do País., cujas imensas vindimas situadas no Alto Douro e as adegas de Vila Nova de Gaia representavam um incalculável patrimônio.

No limiar do Século XIX, a Família Kopke do Porto já havia se multiplicado consideravelmente e suas atividades não se resumiam, apenas, ao comércio e à diplomacia. Seus novos membros passaram a ocupar posições de destaque no Magistério Superior, nas Forças Armadas, no Judiciário, nas Profissões Liberais, na Administração Pública e na Literatura Técnica. Estenderam, ainda, a participação na área consular às Representações da Rússia, Alemanha e Áustria.

Em 1828, Christiano Nicolau Kopke participou como membro da Junta do Porto e, em 1836, foi nobilitado através do titulo de Barão do Villar.

Em meados do século em curso, Joaquim Augusto Kopke que havia assumido o controle pleno dos principais negócios da família, fundou a Câmara de Comércio do Porto e exerceu, por longo período, a presidência desta instituição. Em 1847 foi, também, nobilitado através do titulo de Barão de Massarellos.

Durante a “Questão Constitucionalista Portuguesa”, movimento que eclodiu em 1820, no Porto, a família Kopke teve atuação efetiva, apoiando as “Correntes Liberais Anti-Miguelistas:, tendo, alguns de seus membros, participado das ações de combate.

Em 1831, quando D. Pedro de Alcântara – Ex SMI D. Pedro I do Brasil e futuramente SMR D. Pedro IV de Portugal – estabeleceu o seu baluarte, em Território Português, na Cidade do Porto, estreitaram-se os laços entre o ilustre Monarca e os Kopke, relação esta que se estendeu a SMR Dona Maria II e, mais tarde, a SMI D. Pedro II, do Brasil.

É certo que a posição da Família Kopke tenha sido unânime. Entretanto, as parcas informações, até agora recuperadas, destacam como “devotados adeptos dos Movimentos Liberais”, apenas, os irmãos Guilherme e Henrique Kopke e, também, os seus primos Joaquim e Christiano Nicolau Kopke.

Visando a um direcionamento para a linhagem Kopke que se estabeleceu no Brasil, parece oportuno voltar as atenções para Joaquim, o segundo filho do patriarca Christiano Kopke.

Joaquim Kopke nasceu no Porto em 16.III.1736 e, por volta de 1770, casou-se com D. Maria Catherina Archer. Deste consórcio nasceram oito filhos: João Christiano, Joaquim, Maria Barbara, Diogo, Francisca Clara, José Joaquim, Nicolau e Claudia.

Visando, ainda, ao supracitado direcionamento, pretendemos nos ater, apenas, ao quarto filho, Diogo.

Diogo Kopke nasceu no Porto em 19.IX.1777 e, por volta de 1800, casou-se com D. Anna Pereira Barbosa Bryans de Ayala. Deste consórcio nasceram quatro filhos: Guilherme, Sophia, Henrique e Diogo.

Nesta geração – a terceira a partir do tronco Christiano Kopke – surgem os nomes de Guilherme e Henrique Kopke que, no segundo quartel do Século XIX, se transferiram para o Brasil.

Diversos historiógrafos petropolitanos ressaltaram que esta transmigração teria ocorrido por motivos políticos. Alguns, até mesmo, insinuaram que teria havido uma espécie de exílio compulsório por parte de Henrique.

Outros, procuraram acentuar os interesses técnicos e comerciais como causa primordial.

Entretanto, no nosso entender, julgamos procedente uma terceira hipótese, relativa a problemas familiares, tendo em vista que nenhum dos descendentes de Henrique Kopke recebeu nome que homenageasse seus ancestrais, como era praxe na época.

Em face da análise destas três possibilidades, julgamos conveniente desprezar qualquer versão relativa a motivos meramente políticos. Tanto Guilherme como Henrique eram militantes da causa vitoriosa e, apesar de não terem sido nobilitados como seus primos o foram, sempre desfrutaram do apreço, apoio e respeito de SMR Dona Maria II e do seu irmão SMI D. Pedro II.

Acreditamos que a decisão final teve seus fundamentos no rumo que tomaram os negócios da família – Joaquim Augusto Kopke passara a exercer o controle pleno das principais empresas do grupo – o que poderia ter levado seus membros a sérias desavenças.

Ademais, as tentadoras perspectivas de investimento no Brasil e a promessa de subsídios oferecidos pelo Governo Regencial devem tê-los encorajado.

Não há dados precisos nem registro algum de suas entradas definitivas no Brasil. Por razões de coerência, elas só poderiam ter ocorrido após a solução da “Questão Constitucionalista”, o que se deu em 1834.

Entretanto, em novembro de 1829, foi procedido um Registro de Entrada no Brasil referente a Henrique Kopke – Códice 0379, Vol. 01 Fls. 184, Arquivo Nacional – do qual foram obtidos os seguintes dados: chegada a bordo do Brigue “Meridian”, procedente de Liverpool; motivo da viagem alegado como a negócios; idade 22 anos; estado civil de solteiro; e não foi indicado no espaço específico a profissão.

Parece que esta chegada não deve ser encarada como definitiva. Somente assim teria explicação a participação de Henrique nas “Campanhas Liberais de D. Pedro” e sua qualificação como “Bacharel Formado em Direito”.

Outrossim, em 1845, por ocasião do processo de naturalização a que foi submetido, ele obteve dispensa de apresentação da “prova de residência no Brasil por espaço de quatro anos consecutivos”, o que, praticamente elucida quaisquer dúvidas.

Assim sendo, é simples deduzir que na década de 30 ele retornou a Portugal a tempo da participar das “Campanhas Liberais” e que, após 1934, cursou uma Faculdade de Direito, obtendo título de “Bacharel Formado em Direito”.

Quanto a Guilherme Kopke, diversas fontes consignam sua chegada ao Brasil em 1834, a fim de “tentar a exploração da navegação a vapor no Rio das Velhas e no Rio S. Francisco.”

Esta assertiva é bastante coerente. Na realidade, a Regência Trina, àquela época, vinha empreendendo exaustivos esforços para introduzir a novel tecnologia do vapor nos transportes. Por sua vez, o Governo Provincial de Minas Gerais promulgava, em 1835, o “Primeiro Plano Viário de Minas Gerais” que, dentre outras medidas, previa uma “ligação por estrada de boa qualidade, entre a Corte e o trecho navegável do Rio das Velhas, em Trairas.”

Cabe ressaltar que a tecnologia do vapor na Navegação Interior Brasileira já não era um fato inédito. Em 1819, o Marques de Barbacena, entusiasta e incentivador dos avanços tecnológicos que marcaram o início da “Era Industrial”, importou da Europa um barco a vapor.

E , em 1832, a navegação a vapor na Lagoa dos Patos e seus principais tributários já era uma realidade.

Foi dentro desta conjuntura que o Empresário e Engenheiro Guilherme Kopke decidiu investir na implantação e exploração da navegação a vapor no Rio das Velhas, ao mesmo tempo em que estava sendo perseguido o mesmo intento no Rio Doce, por parte de outros investidores.

Não há nenhum dado concreto sobre suas atividades em Sabará, local escolhido para residência e sede do projeto.

Pela tradição oral da família, o empreendimento foi, tecnicamente, bem sucedido. Nada foi registrado a respeito de sua continuidade.

Cessada a euforia dos anos 30, verificou-se um enorme atraso na concretização dos mirabolantes Planos Regenciais, dentre eles a imprescindível – para as pretensões de Guilherme Kopke – ligação do Rio de Janeiro a Sabará.

Sem o retorno esperado, a empresa foi desativada e, somente, a partir de 1865, foram reiniciadas, por outros, as tentativas no Rio das Velhas, com o Vapor “Conselheiro Saldanha Marinho”, sobre o qual recaem suspeitas de que seria o mesmo barco usado trinta anos antes.

A chegada de Henrique Kopke ao Brasil ocorreu em torno do ano de 1844, tendo ele viajado para Sabará, a fim de juntar-se ao irmão.

Naquela época já era possível prever-se uma alteração nos planos de Guilherme Kopke.

A intempestiva naturalização de Henrique Kopke constituía um forte indício de que se tratava de uma medida preparatória para alguma pretensão que exigisse tal requisito.

A verdade é que havia sido dado início ao planejamento de implantação de um grande estabelecimento de ensino, sendo que para o exercício de sua Direção a cidadania brasileira era condição “sine qua non”.

Em Sabará, Henrique Kopke casou-se com D. Felisbella Candida de Vasconcellos – filha do Comendador José Joaquim de Oliveira Chaves e de D. Josepha D’Almeida de Vasconcellos Chaves – , tendo nascido, a 7.II.1848, o primeiro filho do casal que foi batizado com o nome de Henrique Kopke Jr.

Na época de seu casamento, Henrique possuía um filho de onze anos – proveniente de uma perfilhação ou união anterior desconhecida – cujo nome era Henrique Augusto Kopke.

Entrementes, desde o final de 1847 os irmãos Kopke já haviam completado seu audacioso plano e selecionado o local de implantação que recaiu sobre a Imperial Colônia de Petrópolis. Guilherme transferiu-se para Petrópolis onde passou a cuidar das medidas preliminares para a execução das obras de engenharia do prédio a ser construído.

Não muito tempo depois – por volta de abril de 1848 – Henrique, acompanhado de sua família, deixou Sabará a fim de juntar-se ao irmão que já tinha dado início aos trabalhos necessários.

Guilherme Kopke não constituiu família no Brasil. Passou pouco mais de dois anos no novo domicílio, onde dirigiu os trabalhos de construção e instalação do “Collégio de Petrópolis”, inaugurado em 1.I.1850. O próprio Guilherme assumiu a gestão empresarial do empreendimento, entregando a seu irmão Henrique o cargo de Diretor.

Henrique integrou-se de corpo e alma à nova comunidade, tendo ampliado sua prole com três filhos mais: Lavinia, Felisbella e João.

Guilherme deixou Petrópolis logo ao final de 1850. Nada mais ficou registrado a seu respeito, daí por diante. Seu falecimento ocorreu, a 25.IX.1872, em Portugal.

O Dr. Henrique Kopke marcou de forma proeminente sua presença em Petrópolis.

Este ilustre pioneiro petropolitano notabilizou-se como o competente Diretor do “Collégio de Petrópolis”, o primeiro estabelecimento de ensino particular primário e secundário da Colônia, mais tarde consagrado como “Collégio Kopke”.

Porém suas atividades não ficaram restritas, apenas, à área de instrução. Ele participou efetiva e intensamente da formação social, política e cultural da comunidade que elegeu como domicílio definitivo.

Para caracterizar esta participação, parece oportuno que seja adiantada uma síntese biográfica a seu respeito, durante o período em tela, cujos dados serão devidamente ampliados nas demais partes deste Ensaio:

– Dentre os cargos e funções públicas que exerceu na Colônia, Freguesia e Município, destacam-se os de Juiz da Paz, Procurador da Mesa Paroquial, Presidente da junta de Qualificação, Juiz Municipal e de Órfãos, Juiz de Direito Substituto e Vereador eleito para compor a primeira Câmara Municipal de Petrópolis;

– Membro Fundador da Irmandade do Santíssimo Sacramento da Freguesia de S. Pedro de Alcântara (31.XII.1853);

– Profissões exercidas de Advogado e Diretor de Colégio;

– Acionista do periódico “O Parahyba”; e

– Condecorado por SMI D. Pedro II com a, Ordem da Rosa, no grau de Cavaleiro.

No ano de 1875, Henrique Kopke foi acometido por um sério distúrbio cardiovascular, conhecido na época como “amollecimento cerebral”, o que provocou seu afastamento das atividades públicas e particulares.

Seu falecimento ocorreu em sua casa, na Rua de Nassau, durante a madrugada do dia 10.XII.1881, aos setenta e quatro anos de idade. Entretanto, no Registro de Óbito consta a idade de setenta e nove anos, o que está incorreto, pois em três fontes fidedignas constata-se seu nascimento como tendo ocorrido em 1807.

O Dr. Henrique Kopke é o legítimo marco genealógico de sua linhagem no Brasil e sua grandiosa obra será melhor comentada, mais adiante, na Parte V deste Ensaio.