ANARQUISMO EM PETRÓPOLIS?
Oazinguito Ferreira da Silveira Filho, associado titular, cadeira n.º 13, patrono Coronel Amaro Emílio da Veiga
Segundo o historiador Daniel Aarão, os anos compreendidos entre a chegada dos anistiados em 1979, até 1984 quando da luta pelas Diretas Já, são considerados de transição entre a “longa noite” e o “amanhecer” político para a sociedade brasileira.
Este processo foi constatado nos grandes centros urbanos, mas que no interior brasileiro reproduzia-se de forma oposta.
Nem mesmo a presença de um Brizola em reuniões com grupos locais (1980/2), ou mesmo a reorganização político-partidária localista, principiada pelo PMDB, realizou mudanças no cenário conservador que se processava.
O “manto negro” da opressão ainda passeou por nossas instituições interioranas por um bom tempo e segregou muitos intelectuais.
O que deveríamos então observar em nosso passado trabalhista?
Em nossa memória política ou operária?
Na década de 80, mais precisamente 1981, quando acompanhado por Mário Pitzer respondíamos pelo Arquivo Histórico Municipal, procedi a uma longa pesquisa sobre a Imprensa Petropolitana na República Velha, aproveitei para realizar a indexação dos jornais operários de Petrópolis, sobreviventes do mesmo período, tais como A ORDEM e A ALVORADA, mesmo sabendo que não poderíamos publicar.
Coincidentemente, a esta época desenvolvia-se um importante movimento de pesquisas dos jornais operários em São Paulo resultando no Arquivo Edgard Leuenroth (1981), como no Rio, pela Biblioteca Nacional.
O movimento em ambas as capitais visava resgatar a memória do movimento operário e do anarquista no Brasil, ao passo que a história ou a memória do movimento operário não foi processada em Petrópolis.
Destacamos nesta oportunidade uma das curiosas publicações presentes na edição de nº. 08 de 16/07/1921 do jornal A ALVORADA:
Coluna: O proletariado nos Estados
“Em 18/06 se realizará conferência de Domingos Passos, secretário excursionista do 3º. Congresso Operário Brasileiro, por iniciativa da Federação Operária Mineira em Juiz de Fora e no dia seguinte uma segunda conferência na reunião dos Condutores de Veículos em Petrópolis.”
No mesmo jornal, presente em outra coluna, Carlos Dias, outro anarquista conhecido, criticava em artigo especialmente enviado para o jornal, o Cooperativismo.
Ambas as cidades, tanto Juiz de Fora como Petrópolis, possuíam imensa representatividade no contexto do operariado brasileiro, comportavam também a presença de movimentos anarquistas, que sofreram grande repressão por parte do sistema.
Inúmeros foram os anarquistas que como Domingos Passos, o “Bachunin Brasileiro”, viajavam do Rio para prestigiar reuniões e conferências em Petrópolis e Juiz de Fora, sob imensa vigilância da classe patronal, da elite e principalmente da polícia.
A repressão se fazia de forma violenta e constante, tanto que em 02/06/1919 um jornal anunciava com destaque a greve geral nas fábricas de tecidos do Rio de Janeiro, o que causou imenso reflexo e temor na elite petropolitana.
A greve integrava a luta pelo direito de oito horas de trabalho diárias, movimento reivindicatório de ordem internacional. Em Petrópolis, o delegado nomeado, Henrique Cunha, um cirurgião-dentista recém-formado, solicita o auxilio da capital federal para a presença de 30 praças da força policial que imediatamente sobem pelo trem da Leopoldina (Tribuna de Petrópolis).
Cunha, à frente dos soldados, percorreu todas as fábricas de Petrópolis inclusive a da Cia. Petropolitana na Cascatinha (por bonde especial destacado), impondo pressão com a demonstração de armas e cassetetes, porém, segundo o jornal, “…procurava cercá-las de todas as garantias necessárias”, expressão amena para a condição de imposição do terror e poder.
Mas, mesmo assim, segundo a edição, ocorreram “meetings” (reuniões) operários tanto na Cascatinha como nas fábricas do Bingen, chegando as mesmas a ocorrerem até mesmo na Fábrica Cometa do Meio da Serra, “…onde de forma ordeira se explicou aos operários os motivos da greve…”, frisa o jornal, como se quisesse justificar ao leitor realçando o “ordeira”; afinal tratava-se de um jornal oficial para o município.
Mas por outro lado, o mesmo jornal também noticia que os proprietários e o gerente da Cascatinha, temendo maiores problemas e conflitos, resolvem manter a fábrica fechada.
A História do Operariado em determinadas regiões do Brasil permanece na mais completa escuridão.
Juiz de Fora, organizou e valorizou seu Arquivo Histórico Municipal que hoje trabalha junto à UFJF e à Fundação Museu Mariano Procópio, também do município, com amplo apoio da comunidade industrial e comercial.
Petrópolis, infelizmente foge à regra, principalmente quando sabemos que a maioria dos arquivos foram destruídos após invasões policiais ou de “capatazes” das fábricas em ações realizadas na calada da noite e que foram registrados oficialmente como assaltos pelas colunas policiais dos jornais do período. Assim como os documentos que sobreviveram encontram-se “deteriorados”, pois conservação de arquivos e documentos no interior, com raras exceções, não traduzem votos ou popularidade.
Publicado em meados dos anos 80, como era o propósito inicial, ante a confusão ideológica, com toda a certeza criaria estigmas a um artigo de características memorialísticas como este. Quanto ao autor…