AS IGREJAS NEOGÓTICAS DE PETRÓPOLIS
Ruth B. Judice, Associada Titular, Cadeira n° 33, Patrono Padre Antônio Tomás de Aquino Correia
Antes de entrar no assunto peço vênia para um explicação prévia.
Sentimos que o turismo, em Petrópolis, começa a interessar a gregos e troianos; pessoas cultas, interessadas na história do período imperial do Brasil, e pessoas apenas curiosas em conhecer a cidade imperial. Enfim o gancho é sempre o nosso passado que desperta interesse. Está na hora de criar mais informações sobre o assunto.
Há anos (20) pesquiso a arquitetura de Petrópolis e há uns 5 anos surgiu a idéia de passar para o papel as conclusões a que cheguei. Com esforço, lentamente, pois o pior obstáculo é o financeiro, consegui, sem auxílio algum, editar o – Palácio de Cristal e, se Deus quiser, breve estarei com As Igrejas neogóticas, no prelo. É sobre elas que quero lhes falar hoje. Dei o nome de Guias Turísticos ao conjunto de 10 diferentes livros que estou programando. Aos dois, seguir-se-ão: Os Chalés, Os Casarões e a Arquitetura Palaciana.
Palácio de Cristal: comecei com a Revolução Industrial, para inserir no seu contexto, o nosso Palácio que surgiu nessa época. Só entendendo a própria Revolução Industrial, entenderemos a importância do nosso Palácio de Cristal e a necessidade de preservá-lo.
Igrejas: comecei com a origem das Igrejas cristãs explicando o plano basilical, chegando ao românico para atingir a sua evolução, ou seja o gótico. Isto posto, fica mais fácil explicar o neogótico de nossas Igrejas. Analisei, não apenas a Catedral, que é a mais importante, mas que não é a única. Falei da Igreja São Vicente de Paula (Westphalia) Igreja Evangélica, Santo Antônio, Coração de Jesus, e Sant’Ana e São Joaquim.
Começaremos nossa palestra com a origem das igrejas cristãs no ocidente.
A filosofia do cristianismo não começou com Cristo, mas sim multo antes do seu nascimento com seus profetas, que não pregaram apenas no ocidente, mas também no oriente. Passaram pela Grécia pagã e pela Síria. Fugindo das cadeias do Himalaia, seguiam as caravanas nos desertos, e, percorriam com elas o caminho da seda. Assim, evitavam o Mar Mediterrâneo onde havia obstáculos, tais como piratas e tempestades. Sabe-se que chegaram até a China e parece, terem chegado à Índia.
Cristo nasceu sob o domínio de Tibério e depois d’Ele, em Roma, os cristãos eram perseguidos e até jogados às feras no Coliseu, por isso praticavam seus cultos em lugares escondidos. Só com o Imperador Constantino, o Grande, pelo édito de Milão, em 313d.C é criada a liberdade religiosa, em Roma e, 390d.C., com Teodósio passa a ser sua religião oficial. A partir daí o local do culto não precisava mais ser escondido.
À luz do dia, os cristãos elegeram a basílica (que vem de Basileu), ou seja, o edifício da Bolsa de Comércio romana, portanto um edifício civil, como lugar privilegiado para sede de seu culto. Ela possuía uma planta longilínea onde a nave central era o dobro das naves colaterais. Útil, numa época em que ainda se separavam os homens das mulheres, durante o culto. Ao fundo terminava com um espaço semi circular que hoje chamamos de abside, lugar propício para o altar; tinha o teto plano. Nascia a Basílica cristã. Sua evolução foi enorme. Das simples basílicas com três naves, chegaram às basílicas de 5 naves, e, com triforium ou seja mais um andar, onde os monges se localizavam para assistir às missas.
A meu ver, temos em Petrópolis, um exemplo de uma igreja construída dentro do estilo, neo basilical. É a Igreja São Vicente de Paula na Av. Rio Branco. Há quem a considere uma igreja românica. A principal característica do Românico é ter paredes grossas e poucas aberturas, onde a luz quase não penetra, porque os construtores, na tentativa de construir tetos curvos, tinham medo que as construções ruíssem, o que acontecia com muita freqüência. No caso da Igreja S. Vicente de Paula, isso não acontece. As janelas são largas, apesar do teto curvo, e a luz jorra no seu interior. Podemos sim, caracterizá-la como híbrida, pois tem algumas características românicas, (abóbadas de berço, triforium), e outras características basilicais (nave central, duas colaterais e ábside ao fundo, onde está localizado o altar e sobretudo muita luz no eu interior). Por tudo isso prefiro incluí-la entre as igrejas neobasilicais.
A humanidade, nas artes, caminha através de uma senóide. Sobe, demora-se no alto, para depois descer, tornar a subir… descer….e assim por diante. Com arquitetura acontece a mesma coisa que com as artes em geral. Vimos o ocidente subir no classicismo grego e romano (não confundir com românico da Idade Média), produzir maravilhas em arte e arquitetura e com a queda do Império Romano começar a descer vertiginosamente. Nova escalada lenta no românico, para acelerar no gótico e explodir no Renascimento.
No período que antecipou a queda do império romano, o império do ocidente mudou-se para o pequeno porto de Bisâncio com Constantino e passou a se chamar Constantinopla. Nesse momento, o Império passa a ter duas capitais: uma no ocidente – Roma e outra no Oriente – Constantinopla. A do ocidente passa o bastão para a oriental
Da miscigenação dos estilos ocidentais e orientais brota o estilo bizantino.
Falamos que Roma caiu. Mas por que caiu Roma? Por um conjunto de fatores que cabe relembrar. Primeiro pela grande extensão do Império, que na época em que o único meio de comunicação entre a capital e sua possessões era o cavalo, ficava difícil controlar os generais que a defendiam nos distantes confins do Império, daí as traições, revoltas e brigas constantes pelo poder. Roma caiu ainda, pela invasão dos bárbaros que vinham do norte da atual Europa e que na sua passagem iam destruindo tudo e todos que encontravam pela frente, espalhando o pânico e o caos. Outra causa foi a divisão do seu império em império do ocidente e império do oriente. Com tudo isso Roma esvazia-se, o ocidente mergulha nas trevas, os artistas desaparecem, o homem se esquece até mesmo de como construir. A arquitetura da Idade Média se baseia na busca do ocidental da forma de como construir um teto curvo.
Se no passado, o ocidental chegou a construir tetos curvos, ex: a basílica de Constantino em Roma – 310-320 a.C ; o Pantheon de Roma séc. II d.C., com 43,70m. de autor desconhecido, depois disso não conseguiu mais construir um teto curvo. Desta busca e do reencontro, com as pequenas cúpulas, com as abóbadas de berço, abóbadas de aresta, segue tentando e só vai conseguir uma verdadeira cúpula, 13 séculos mais tarde, no século XV, com a cúpula de Santa Maria dei Fiori- Florença, obra de Brunelleschi. Com ela a arquitetura irrompe no Renascimento.
Falemos de Idade Média (X séc.). Época de sombras, mas também de luz; de esquecimento, mas também de procura. E bonito sentirmos o ocidental desarvorado com suas construções que caem a cada momento, mas ávido de reaprender aquilo que esqueceu! A Idade Média é pois a saída da escuridão para a procura da luz, até encontrá-la, para em seguida irromper no Renascimento (“renascere” das artes) ! Dos panos fechados, com pequenas janelas, sem luz; das paredes grossas para que a construção não caia, no Românico. chegam ao Gótico, passando por um período de transição. O Gótico já é luz, já é um agradecimento ao Senhor pelo caminho percorrido, com suas catedrais altas, como numa elevação de suas preces ao Criador; de luz jorrando pelas janelas largas, com vitrais coloridos que narram cenas bíblicas.
Decoradas com grandes rosáceas que enfeitam as fachadas; pelas gárgulas, campanários; pináculos (e não torretes ou coisa parecida, como tem saído nos jornais). Finalmente pela torre central em flecha, que marca o ponto mais alto das catedrais. Essas flechas chegaram a atingir 160m.de altura ultrapassando assim a pirâmide de Queops, com 146,39m.(medidas que só foram ultrapassadas nos nossos dias – Séc. XX).
Falemos da arquitetura românica. Surge no final do século X e perdura até o século XII, quando começa o Gótico. Seu nome vem de romano, estilo da velha Roma, que lhe transmitiu algumas de suas características, entre elas as pequenas cúpulas, abóbadas de berço e abóbadas de aresta além do plano basilical. O estilo bizantino lhe forneceu inspiração na decoração. Apesar de tudo que herdou, essa arquitetura afirma sua originalidade no desenho de suas plantas, na variedade das fachadas e na composição de suas portadas. Surge nessa época o deambulatório, que nada mais é do que o prosseguimento das colaterais que vão envolver a nave central, facultando a passagem por trás do altar, sem interromper a missa. Usam a planta em cruz latina criando com isso o transepto, que é o braço menor da cruz construído para abrigar os monges nas igrejas. Ainda no período românico surgem as primeiras abóbadas de aresta, apenas nas colaterais. Isso aconteceu nas igrejas de Vezelay, Saint-Dié e Laach, todas na França.
Passamos por um período de transição, para começar o Gótico.
O Gótico é a evolução do Românico.
O ocidental continua sua busca pelos tetos curvos. O termo gótico vem da palavra godo ou seja bárbaro. Foi usada pela primeira vez por Rafael, pintor renascentista. Termo de desprezo dado a arte que surgia e que não se inspirava no classicismo grego ou romano.
Arte nascida na França sem influência estrangeira, rompeu com todo o passado clássico e criou um sistema de construção inteiramente novo. Começou no século XII e chegou ao século XVI. O apogeu francês foi no século XIII quando muitas catedrais foram construídas, entre elas as de: Laon, Reims, Amiens, Bourges, etc.(a Notre Dame de Paris é anterior). É uma arte racional, é mesmo a própria lógica. Num edifício gótico ha uma concordância absoluta entre a estrutura e a forma. As fachadas mostram claramente as plantas que envolvem; as rosáceas, que parecem ter sido construídas apenas para iluminar as artes mais altas, são vazadas diminuindo o peso da construção; os arcos botantes transportam as cargas dos tetos curvos diretamente aos pilares que servem como dutos para descarregar as águas pluviais. Nada é feito ao acaso, nada é sacrificado pelo efeito decorativo. O edifício gótico usa a escala humana como referência, enquanto o classicismo se abstrai dela, usando como parâmetro o diâmetro da coluna. Assim a porta de uma catedral não é maior que a porta de uma igrejinha do interior, o que é mais lógico, enquanto a porta de um templo grego era maior ou menor de acordo com o tamanho do edifício. O gótico é ainda uma arte simbólica. As linhas ascendentes das catedrais são o símbolo do pensamento cristão. Vê-se nos fiéis (quase sempre os seus construtores) a intenção de atingir o céu. Suas principais características são: o arco quebrado (arco com dois centros); abóbadas de aresta; arco botante (feito para conter as cargas das abóbadas de aresta), a flecha central, rosácea; campanários; vitrais. Tendência à acuidade com sucessivas tentativas de elevação dos elementos arquitetônicos, tendo como conseqüência a eliminação das linhas horizontais, tendendo sempre para a verticalidade.
E para terminar falemos da arquitetura Neogótica.
Toda a riqueza do Gótico vai ser revivida no século XIX e começo do XX, com o Ecletismo. E conseqüência do saudosismo (revival) que tomou conta da Europa depois, que Pompeia, coberta pelas lavas do Vesúvio em 79 d.C., foi desenterrada em meados do século XVIII. Começa a busca de estilos antigos como fontes de inspiração e aparecem estilos batizados com o prefixo neo, entre eles o neogótico. O mesmo neogótico que invadiu a Europa chega ao Brasil, especificamente a Petrópolis. O século XIX foi pródigo em estilos arquitetônicos. Na época nem arquitetos, nem críticos se deram conta disso. Hoje, mais distante é fácil detectar o que aconteceu então. O estilo Neoclássico era o mais corrente. Mas todo o Ecletismo também era muito usado; usado também o Romantismo que não foi estilo arquitetônico, mas que era representado pela Belle Époque que chegou a influenciar a arquitetura. A Arquitetura do Ferro, produto da Revolução Industrial, não era nem detectada. Era encarada como uma solução técnica e as primeiras construções eram encapadas com arquitetura neoclássica, para – esconder o ferro -. Pouco a pouco ele se libera e começa a dar as ordens nas construções. Hoje, já se reconhece a existência do que acabamos de chamar de Arquitetura do Ferro, nome dado nos nossos dias.
Exemplos de neogótico: Parlamento inglês, o prédio da Ilha Fiscal, hoje tão na moda, onde aconteceu o último baile do Império e em Petrópolis, algumas de nossas belas igrejas. Prefiro passar slides das mesmas, que mostrarão mais que qualquer palavra que eu possa dizer.