BRINCANDO SÉRIO
Joaquim Eloy Duarte dos Santos, Associado Titular, Cadeira n.º 14 – Patrono João Duarte da Silveira
A infância é a fase mais encantadora da vida. Os participantes são seres que formam o corpo e educam o espírito. A criança é a síntese do presente projetada ao futuro.
Muitas frases soltas interligadas por uma única constatação: o universo da criança é puro enquanto à sua volta digladiam os adultos para manterem a infância no coração, sem consegui-lo, eis que a luta pela vida ultrapassa a fantasia para precipitar-se no abismo da luta pelo poder.
“Quisera ser criança novamente para voltar a brincar na casa antiga da infância” – disse a amargura do poeta. Verdade pura embora sonho distante. O Carnaval da brincadeira, da irreverência, da saudade, da alegria pode muito bem representar essa rebusca pela infância perdida. Nada é mais criancice do que a fantasia que esconde o trapo e cada canção entoada é um retorno às cantigas de roda. Por momentos o adulto despe o terno e a gravata, ensarilha-se com as armas da infância e sai à rua buscando o antigo espaço, que sabe perdido. O zepelim mágico das porfias com as bolinhas de gude, a búlica onde as bolinhas giram nas beiradas, como nas cestas do basquete, e nem sempre caem, as rodas das meninas, a corrida atrás das bolas de meia, as pistas para o ronco dos carrinhos de madeira, onomatopéia graciosa das crianças, tudo esfumado no ruço da lembrança, retorna na explosão do colorido farsesco comandado por Momo, mais um rei cultuado pelo imaginário popular brasileiro.
O adulto com boa memória da infância, largado na avenida da loucura, caído nas calçadas das cinzas que os garis recolhem na quarta-feira, é o mesmo que dorme de qualquer maneira no final do domingo, provocando: – Essa criança não tem jeito! Dormiu com roupa e tudo! Tudo findo, retorna-se à rotina, a criança de cada um fica mais longe, enquanto milhões de crianças sem infância e mínima perspectiva de serem adultos com boas lembranças, morrem nas ruas do mundo como cães sem dono, tomados pelas sarnas da nenhuma esperança.
SOS para as crianças abandonadas e sem infância do planeta é o que pedem as criaturas de boa vontade em mais um carnaval onde o luxo e as cores não conseguem esconder a triste miséria humana.