CENTENÁRIO DE NASCIMENTO DO DR. DÉCIO JOSÉ DE CARVALHO WERNECK

 

Victorino Chermont de Miranda, Associado Correspondente

 

Senhor Presidente

Professoras Vera Rudge Werneck e

Gilda Werneck Machado da Silva

Prezados Confrades

Senhoras e Senhores

 

 

Há dois anos, quando tomei posse como sócio correspondente desta Casa, uma das figuras que evoquei foi a do Dr. Décio José de Carvalho Werneck, porque o seu nome sempre esteve identificado, no meu imaginário, com o culto da História pátria, já que o Colégio Padre Antônio Vieira, por ele fundado e onde fiz minhas primeiras letras, dedicava ênfase especial à celebração da nacionalidade.

Não era minha intenção, entretanto, fazer uso da palavra nesta noite, como me sugerira o presidente, até porque, pensei eu, minha passagem pelo Colégio fora curta. Mas, ao sopesar, neste fim de semana, as lembranças daquele tempo, resolvi por no papel estas breves considerações, que se, por um lado, por certo, nada acrescentarão à fala, que iremos ouvir, de Francisco de Vasconcellos, por outro confirmam a imagem que a unanimidade dos ex-alunos guarda de seu estimado diretor.

Sempre tive, Senhor Presidente, por figuras austeras, como a do Dr. Décio, uma admiração particular, um pouco por temperamento, mas também por entender que elas sobrelevam, cada vez mais, em significação num tempo em que a compostura e a dignidade andam escassas. Mas é preciso dizer que a austeridade dele nada tinha com o distanciamento e a frieza que às vezes vemos em pessoas com tal perfil.

Era austero, sim, mas sem deixar de ser paternal e amigo de seus alunos. E o respeito que a eles infundia era fruto não tanto da autoridade que detinha, mas de seu carisma de educador. Alguém para quem educar não era sinônimo de reprimir inclinações ou impor ideias, mas de suscitar potencialidades e cotejar valores, com vistas a um projeto de vida voltado para a realização pessoal e a construção do bem comum. Por isto, a disciplina no seu Colégio era um exercício de responsabilidade, mais do que um cerceamento, uma descoberta da alteridade e das vantagens da convivência civilizada. Uma verdadeira iniciação à cidadania.

E assim como a disciplina não era um código cego, a proposta de ensino se antecipava, em muitos aspectos, com tantas vezes ouvi de colegas e professores que mais de perto a acompanharam, à pedagogia da época, estimulando a investigação, incentivando a capacidade crítica do alunado e fazendo do ensino uma experiência dialógica, em outros colégios sequer cogitada.

Mas havia algo mais, que já então me fascinava, nas galas daquele uniforme, nas solenes distribuições de prêmios, nas alegres e sempre concorridas festas dos jogos e até no badalar daquele sino, que nos punha em forma, mais do que em fila, para as atividades escolares.

Havia certa mística que de leve se insinuava e ia criando uma ideia de pertencimento a algo que, de imediato, talvez não captássemos para além da espacialidade do Colégio, mas que, em verdade, o transcendia, porque era a certeza, hoje o sabemos, de fazermos parte de um projeto maior, que nos distinguia e assinalava com um carisma próprio – o de membros de uma experiência pedagógica, nova e, sob tantos títulos, pioneira.

Naquele tempo, entretanto, vontade de criança não tinha vez e eu deixei o Colégio após completar o primário. Mas não o esqueci. Não que me tenha dado mal para onde fui, mas não o esqueci. E, por isto, nesta noite, em que nos reunimos para celebrar o centenário do Dr. Décio Werneck, também fundador deste Instituto, são muitas as recordações que me vêm do azul claro da memória, vivas, redivivas, na poesia e na saudade.

A uma, em especial, não posso deixar de me referir, pois se acha indissoluvelmente ligada à sua figura – D. Elza Rudge Werneck – sua esposa, seu braço direito, sua companheira de lutas e sonhos, de marcante e onímoda presença no dia-a-dia do Colégio, cuja lembrança continua a ser para mim um paradigma de fidalguia e dignidade. A ela, também, nesta noite, a minha homenagem.

Em 1962, por fim, quando da formatura da minha turma, àquele tempo ainda realizada no salão nobre do Clube de Regatas Botafogo, levei comigo as medalhas de prata, que eram então o prêmio máximo, obtidas nos meus quatro anos de Colégio, e mostrei-as ao Dr. Décio. Ele as segurou, comovido, e me deu um longo abraço, como que a compensar-se daquele curso interrompido, que ele, tanto quanto eu, lamentara.

Desde então, quase cinquenta anos se passaram. O aluno de ontem – hoje membro deste Instituto e vice-presidente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, sob cuja inspiração esta Casa nasceu – por um instante, se põe a perguntar: há, ainda, lugar para a recordação de tais medalhas? E a resposta lhe vem num assomo: certamente, pois foram as primeiras láureas que a vida lhe deu e, com elas, a inspiração para procurar seguir sempre alteetrecte, como a palmeira real nelas gravada.

 Com este sentimento, Senhor Presidente, saúdo a família de Décio Werneck, aqui tão bem representada por suas filhas Vera e Gilda, a que me ligam laços que tanto prezo, e em quem igualmente recordo seus irmãos Ian e Ênio, tão cedo levados de nosso convívio, por tudo o que o que significam para mim o Colégio que dirigem e a memória de seu fundador.

Muito obrigado.