CONTRIBUIÇAO À HISTÓRIA DA IMPRENSA PETROPOLITANA

“O DIABO PETROPOLITANO DA BELLE EPOQUE”[1]

 [1] Publicado na primeira pagina do segundo caderno da Tribuna de Petrópolis, em 10 de dezembro de 1983.

Oazinguito Ferreira da Silveira Filho, Associado Titular, Cadeira n.º 13 – Patrono C.el Amaro Emílio da Veiga

 

 No decorrer de 1982 ao iniciarmos nossas românticas pesquisas sobre a História da Imprensa Petropolitana, não poderíamos nunca imaginar que tal empreendimento nos forneceria tão apurado, raro e rico material documental para diversas publicações . E nem mesmo poderíamos conceber que a Petrópolis de outrora fosse tão dinamicamente diferente da inerte cidade que hoje conhecemos.

Assim sendo, após um longo ano de estudos e pesquisas conseguimos catalogar e documentar trazendo ao conhecimento de nosso público, inúmeros elementos até então totalmente desconhecidos pelas novas gerações, e é o que de certo modo nos continua estimulando ante tão difícil, sedutor e nada rendoso afazer, porém que em seu todo se torna espiritualmente e profissionalmente compensador.

 Não nos foi também sem méritos que as obras sobre História da Imprensa no Brasil do Professor Nelson Werneck Sodré e os diversos artigos especializados do professor Marcelo Ipanema, além do estimulo de diversos amigos com suas criticas e observações, nos amadureceram para que nos dedicássemos de corpo e alma a esta árdua iniciativa.  Assim com o apoio da equipe de direção da Tribuna de Petrópolis que nunca mediram esforços para que tais publicações se realizassem, e o material coletado e impresso hoje seguisse o perene caminho do registro histórico.

 Por tal, é que no interregno das publicações que ora se seguem dominicalmente sobre “A Imprensa Petropolitana na República Velha”, procuramos um assunto também pitoresco e relativo a imprensa e que pudéssemos no máximo esplendor técnico das possibilidades da Tribuna [2], imprimir, nos mais puros requintes da originalidade do documento como textualmente registrando assim de forma definitiva uma revista que marcou época na imprensa petropolitana. Pela sua altivez, beleza, leveza e pureza tanto de impressão como critico-humoristico, como foi O DIABO.

 [2] Já com impressão em off-set nesta época foi possível reproduzir a página do no. 1, assim como a primeira e última página (8) do no. 2, onde a arte predominava. Ressaltando-se na gravura da pagina 8, onde está “Petrópolis em caricatura”.

Teria a mesma que no conjunto de publicações da época do nosso antigo Distrito Federal, Rio de Janeiro, Possuir enorme destaque, não fosse haver escapado o seu registro pela Biblioteca Nacional e nem que dela houvesse conhecimento na Editora Jornal do Brasil, empresa gráfica que a imprimiu, isto segundo informações presentes na própria publicação.

Sendo assim só nos resta a Biblioteca Municipal de Petrópolis que reconditamente a guardou, onde a mesma escapou ilesa ao barbarismo dos tempos, das administrações e dos péssimos cliente e funcionários que por ali hajam porventura passado. O que torna este registro que ora trazemos aos nossos leitores, pioneiro, tornando por conseguinte os números existentes na Biblioteca Municipal de extrema raridade, dignos de pertencerem à qualquer relação de obras periódicas raras, apesar de seu estranho nome.

O DIABO faz parte de uma das melhores páginas da História da Imprensa nacional, a das revistas ilustradas, onde o plano das características artesanais e amoadoristicas são reverenciado em seu apogeu e declínio, anterior a constituição do empreendimento industrial que dá lugar aos famosos: O Malho, Fon-fon, Tico-tico e A Careta.

Ela reúne todos os caracteres embrionários que se origina com a Revista Ilustrada em 1876, indo ao das de revolucionário cunho empresarial como o das últimas citadas, sendo em resumo um dos raros e originais espécimes da sátira-mundana brasileira e fluminense.

Em uma rápida analise dos originais arquivados pela Biblioteca Municipal, observamos que os primeiros exemplares estão em estado regular quanto a sua conservação, onde presume-se que a impressão, graças ao desenvolvimento das artes gráficas da época, tenha sido revolucionariamente realizada em folha de papel jornal de excelente qualidade (a mesma do Jornal do Brasil da época), com clichês em impressão zincográfica a traço, sendo algumas ressaltadas pelo fundo em cor, o que exalta a qualidade dos desenhos caricaturais aqui observados pelas reproduções apresentadas.

Sua linguagem, não se desprendendo do depuramento lingüístico e literário de então, mantem um humorismo e criticismo- sátiro no mesmo nível das épocas anteriores, isto é, de qualidades irreverentes, porem sadios.

Exemplo:

 

Titulo da Coluna: O PURGATÓRIO

Tenha paciência o Dr. Sampaio Ferraz. Essa história de regulamentar a prostituição é reconhecer oficialmente como legitima tal profissão.

Força é convir que a tal profissão não é uma profissão… honesta.

Demais para que prender n’um viveiro essas formosas borboletas de azas invisíveis?

É bárbaro fisgal-as com o alfinete do Regulamento; porque esse FISGAMENTO em nada aproveita; porquanto a vantagem hygienica é negativa, segundo os tratadistas de melhor nota.

Deixai-as adejar por essas terras em fora, livres e doidas, aromando a SKINE e a IRIS a atmosphera empregnada dos miasmas das ruas e esgotos da Politicapolis.

Deixai-as.

Para que estabelecer-se um HAREM?

Para refinar de mais em mais a lubricidade?

Imaginais – quanta exploração será exercida. Reflecti que o caftismo progredirá, tomando outra pelle, de um modo espantoso.

Pobres Magdalenas… presas em viveiros…

Doutor, tende piedade dellas e… das nossas bolsas principalmente.

(O DIABO, pg. 2, no. 7)

 

Quanto as caricaturas de O DIABO, destas já tratamos anteriormente quando da série de artigos passados sobre o Caricaturismo em Petrópolis [3], porém forneceremos mais alguns dados.

[3] Março de 1983.

Podemos observar a caricatura em O DIABO como a pre-historia da caricatura petropolitana. Por que? Fato é que até então, não possuímos aqui nenhum jornal ou revista que houvesse dedicado qualquer uma de suas páginas a este tipo artístico de registro, nem sequer a qualquer impressão de desenhos em xilogravura, tornando-se portanto O DIABO o pioneiro nesta investida.

Em suas paginas encontramos caricaturas e desenhos humorísticos (hoje comumente denominados por charges) dos mais variados e escalonados assuntos e fatos, indo estes de políticos e sociais a outros, e sendo nestes não só descritos personalidades ilustres, como fatos políticos e sociais petropolitanos, isto tudo pelo lápis de Celso Hermínio, desenhista português trazido especialmente para O JORNAL DO BRASIL, com o intuito de estabelecer uma página com a mesma linha humorística intitulada “Tipos de Rua” no caderno dominical do mesmo em 1898, e que posteriormente associado à Henrique Marinho criam no habito do veraneio petropolitano a citada revista.

            Observamos com grande curiosidade a sátira presente no desenho “Petrópolis em Caricatura”, onde vislumbramos a figura de um “conhecido” político petropolitano a entrar na Assembléia Legislativa Estadual com uma pasta cheia de “projectos”requerimentos”; ao lado outra que criticava os temporais e as enchentes constantes nos veraneios petropolitanos; a seguir a de um garçon à porta de um hotel e moscas ao seu redor, em uma critica a época dos temporais; e finalmente uma onde se critica a diversão em Petrópolis, o circo, neste caso a Cia. de Albano Pereira [4].

[4] Este parágrafo foi inserido posteriormente em maio de 2003.

Celso Hermínio, é posteriormente substituído na redação artística da revista por nomes também famosos para a época, como Julião Machado, Theodoro Braga, L. Amaral, Mauricio Jubim, Calixto e Alberto Delpino. Isto por motivo de viagem de Hermínio para sua Portugal, onde acometido de grave doença vem a falecer em 1899.

Com este infausto, O DIABO perde seu estimulo e rapidamente chega ao seu fim após alguns meses de deliciamento do publico carioca e petropolitano.

Notadamente uma pesquisa apurada em suas páginas não nos poderá revelar ao certo se O DIABO seria uma publicação genuinamente carioca ou petropolitana, pois em seu expediente se revelará tanto o Rio como Petrópolis como distribuidores, com uma ressalva que se fará quanto ao destino das correspondências, Petrópolis, o que de certa maneira poderíamos tomar como redação e possível residência dos proprietários (um Hotel?) de veraneio (fins de semana?). Podemos sim dizer que era um órgão que trafegava nos dois sentidos e cujo destino era a elite populacional tanto da terra como a do Rio que aqui perambulava.

FICHA TÉCNICA:

TÍTULO O DIABO
PROPRIETÁRIO(S) Diretor literário, Henrique Marinho; Diretor artístico, Celso Herminio
INÍCIO 15/10/1898
TÉRMINO 29/01/1899 (última publicação ?)
REDAÇÃO Avenida XV de Novembro, 78
CARACTERISTICAS Revista ilustrada – Critica, literária “mundana”, com crônicas, poesias e charadas;ilustrações, desenhos, caricaturas e sátiras- Com anúncios publicitários a partir do no. 11, onde também passa a intitular-se “Semanário Literário e Ilustrado”
TAMANHO 7 X 10,5 cm.
PÁGINAS 8
COLUNAS 2
OBSERVAÇÃO Existem os exemplares do no. 1 ao 14 encadernados em brochura no Arquivo Histórico da Biblioteca Municipal de Petrópolis [5]

[5] Autor/ Ao realizarmos levantamento de fontes para o Centenário da Tribuna de Petrópolis, não mais constatamos a presença da encadernação, o que muito nos entristeceu, por sermos talvez seu único e último registro de existência, não devemos culpar os funcionários diretos, pois o controle torna-se impossível por parte da única técnica presente no arquivo com estagiários sem formação especifica.