D. PEDRO II E SULLY PRUDHOMME, DOIS CONFRADES DO INSTITUTO DE FRANCE

Maria de Fátima Moraes Argon, Associada Titular, Cadeira n.º 28 – Patrono Lourenço Luiz Lacombe

O amor pela poesia uniu o imperador D. Pedro de Alcântara (1825-1891) e o escritor e poeta parnasiano Sully Prudhomme (1839-1907), 1º Prêmio Nobel de Literatura obtido em 10 de dezembro de 1901. Ambos pertenciam ao Instituto de França – o segundo, eleito para a Academia Francesa (de Letras) em 8 de dezembro de 1881 e o primeiro, para a Academia de Ciências em 1º de março de 1875, como correspondente na seção de geografia e navegação e, posteriormente, como membro associado estrangeiro na mesma seção, em junho de 1877.

A relação literária entre eles pode ser comprovada por meio do diário de D. Pedro II e das cartas de Sully Prudhomme conservados no arquivo particular da família imperial, denominado Arquivo da Casa Imperial do Brasil (POB), doado ao Museu Imperial em 1948. Neste arquivo há uma numerosa correspondência de políticos, intelectuais, escritores, poetas, artistas e amigos com quem D. Pedro II mantinha contato, além de poemas, artigos e traduções por ele realizados.

A atuação tradutória de D. Pedro II tem sido objeto de estudo de um grupo de pesquisadores do Núcleo de Estudos do Processo Criativo/NUPROC e da PGET, da Universidade Federal de Santa Catarina. O fato de ser poliglota – falava latim, francês, inglês, italiano, alemão, espanhol, hebraico, grego, árabe, sânscrito, provençal e tupi-guarani – permitiu-lhe fazer traduções do grego, do hebraico, do árabe, do francês, do alemão, do italiano e do inglês. Traduziu vários textos de obras como As Mil e Uma Noites e autores como Longfellow, Manzoni, Victor Hugo, Homero, Liégeard. Na carta de Paris, 17 de abril de 1891, Sully Prudhomme comenta acerca da candidatura do poeta Stéphen Liégeard (1830-1925) para membro da Academia Francesa, que, segundo ele, contava com o apoio de D. Pedro II.

É possível que D. Pedro tenha se encontrado com Sully Prudhomme durante a sua terceira viagem à Europa (1887-1888), mas a primeira referência encontrada no diário data de 7 de fevereiro de 1888, ano da publicação de “Le Bonheur”: “1h. Acabei de ler o folhetim dos Débats de ontem sobre o poema “Le Bonheur” de Sully Prudhomme”. Anos mais tarde, D. Pedro pediu um exemplar, conforme podemos conferir pela carta datada de Cannes, em 20 de julho de 1890, que foi recentemente doada ao Museu Imperial pelo Presidente Michel Temer: “Minha escrita e meu gosto pela poesia são vossos conhecidos e eu gostaria bem de ter um exemplar do vosso poema da Felicidade. Eu espero encontrar nele muito alívio pela falta da minha, que, como você pode imaginar, nada mais é que a perda de uma campanha de quase meio século e o distanciamento da minha pátria”

Em outro trecho da mesma carta, D. Pedro informa que continua a tradução da obra do poeta romano e filósofo Tito Lucrécio (99-55 a.C.), “Sobre la naturaleza de las cosas (De Rerum Natura)”, cujo exemplar recebeu do próprio Prudhomme, conforme mencionado na carta datada de Paris, 28 de abril de 1890: “Eu verei com o maior prazer Vossa Majestade exercitar seu projeto de traduzir por sua vez este poema soberbo”.

Em 1888, D. Pedro traduziu dois sonetos, “La grande Ourse” e “Le rendez-vous”, de Sully Prudhomme, referentes à astronomia da qual era grande apreciador e estudioso. Os sonetos transcritos e traduzidos em seu diário foram publicados, no ano seguinte, no livro Poesias (originais e traduções) de S. M. o Senhor D. Pedro II, editado pelos seus netos D. Pedro e D. Luiz, filhos da princesa D. Isabel, obra do acervo do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

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Durante o exílio, D. Pedro II frequentou as sessões da Academia de Ciências e, nestas ocasiões, entabulava conversas com os membros da Academia Francesa, conforme ele próprio registra em seu diário:

9 de outubro de 1890 (5a fa.) 5h 10’ Chego da Academia Francesa onde se tratou do dicionário de que trago as palavras discutidas. Estiveram presentes muitos dos meus conhecidos, falando eu sobretudo a Gaston Boissier e a Sully Prudhomme. Aumale esteve presente.

Gaston Boissier (1823-1908), historiador e filólogo, entrou na Academia Francesa em 8 de junho de 1876 e foi secretário perpétuo da academia (1895 a 1908), e Henri d’Orléans, duque de Aumale (1822-1897), militar e historiador, era cunhado de D. Francisca, irmã de D. Pedro II, lá ingressou em 30 de dezembro de 1871. Este último, em testamento, doou sua propriedade de Chantilly (Oise) e suas coleções de arte antiga ao Instituto da Academia Francesa, tal como D. Pedro II, que deixou um inestimável legado ao Brasil: a sua coleção fotográfica D. Thereza Christina Maria doada à Biblioteca Nacional, a sua biblioteca, ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e a sua coleção de ciências naturais e de mineralogia, ao Museu do Rio, hoje, Museu Nacional.