Primeiramente darei um breve conhecimento histórico da família GABRICH.

A princípio ainda não foi possível pesquisar na Alemanha, a aldeia de origem do colono GEORGE GABRICH, sabe-se apenas que acompanhado de sua esposa Elizabete e mais 3 filhos, viajaram na barca inglesa “George” com destino ao Brasil, pagando 450 francos pelas passagens para a sua família. Partiram do Porto de Dunquerque na França em julho, chegaram ao Brasil em 26 de agosto e desembarcaram no Porto da Cidade do Rio de Janeiro em 29 de agosto de 1845. A seguir foram levados para o depósito dos colonos (Sociedade Promotora de Colonização da Província do Rio de Janeiro) na Rua da Glória.

Em 02 de setembro de 1845 entre outros, o colono George Gabrich e sua família, encontravam-se alojados na casa que servia de depósito dos colonos na Imperial Cidade de Niterói.

O colono e sua família ao chegarem no Povoado de Petrópolis, receberam o prazo de terras de 1ª Classe – n.º 271, com a superfície de 781 braças quadradas e um décimo – no Quarteirão Vila Imperial – com testada para o Caminho Colonial (hoje Rua Casemiro de Abreu).

Em 1847, recebeu a gratificação Imperial de 25$000 (vinte e cinco mil réis). Sendo 5$000 (cinco mil réis) por cada um da família.

Em 01/01/1854, pagou o foro de 7$810 (sete mil oitocentos e dez réis) relativo ao prazo de terras.

Em 16/07/1856, recebeu o título/registro de aforamento n.º 1097.

Em 27/12/1859, recebeu o n.º 110 da Relação da Diretoria da Colônia – nesta época constava o casal e 7 filhos.

Com a morte do colono em 13/04/1873, passados dois anos e exatamente em 12/04/1875, a viúva e os demais herdeiros de George Gabrich, vendem e transferem o prazo de terras para o foreiro Pedro Schmitz do qual pagou 3$000 (tres mil réis) pela transferência. Este documento foi assinado por Pedro Schmitz e como procurador da viúva e dos herdeiros, assinou o Sr. José Schaefer – (estes assentamentos estão registrados no livro 8-A da Cia. Imobiliária de Petrópolis).

No dia 11 de março próximo passado, tive o prazer de visitar a Sra. Aluízia Maria Gabrich Barenco. A representante mais idosa da família Gabrich – com 84 anos de vida.

A encontrei alegre, saudável e bem disposta a lembrar-se do passado.

A memória infalível de Dona Aluízia, transportou-me para o início deste século; com magníficas lembranças dos seus antepassados e reminiscências próprias.

A Sra. Aluízia, nasceu em 25/10/1913 em Petrópolis, no sobrado do prédio n.º 371 da Av. 15 de Novembro – atual Rua do Imperador. Filha de João Cristóvão Gabrich e Luíza Carolina Reichelt – bisneta pela parte paterna do colono germânico George Gabrich e Elizabeth (Gabrich) e bisneta pela parte materna do colono Joachim Glassow e Johanna Ohligschlager.

Aluízia dividia a casa com mais 3 irmãos: José Bonifácio, Alberto Edwin e João Luiz:

José Bonifácio, nasceu em 04/09/1899 e faleceu em 15/05/1989, casou-se com Brethildes Sampaio Lins Caldas, nascida em Curitiba no Estado do Paraná e não tiveram filhos. José – profissional músico – violinista, iniciou a sua carreira musical nos cinemas mudos. Onde mais tarde conquistou o cargo de diretor das orquestras, que atendiam a rede de cinemas da cidade do Rio de Janeiro.

Como diretor e coordenador das orquestras, selecionava as músicas de acordo com os filmes que chegavam do exterior. Sendo que a maioria dos filmes, vinham dos Estados Unidos e tinha sempre o privilégio de ser o primeiro a assistir os filmes.

Tudo corria muito bem na sua vida profissional, pois ganhava um ótimo salário – que o mantinha em condições econômicas favoráveis. Porém o mundo dos negócios estava se modernizando e novas tecnologias avançavam rapidamente.

Em princípios do ano de 1928, todos os filmes que vinham dos Estados Unidos eram falados; isto era o fim dos filmes mudos. Em apenas 6 meses tudo se modificou. José e muitos outros perderam os empregos e muitas dificuldades surgiram.

Dona Aluízia comenta – “embora no início o filme falado não fosse bom, com o passar dos anos, foi melhorando e o povo acabou se acostumando”.

Alberto Edwin, nasceu em 09/10/1900 e faleceu solteiro em 03/04/1975. Com um pequeno problema de audição, embora tivesse iniciado o aprendizado de violino, não teve bom aproveitamento, indo então trabalhar com o pai na oficina de funilaria.

Dos filhos homens; o caçula João Luiz, nasceu em Petrópolis em 04/08/1910 e faleceu em Santos SP em 05/08/1952. Casou-se com Cecília Weber (nascida no Estado do Paraná) e foram pais de João Luiz Gabrich Júnior, nascido em Santos SP em 07/07/1952 e falecido no Estado do Paraná em 06/01/1967.

João Luiz com uma formação musical excelente, contando com os seus 17 anos e no final do ano de 1927, preparava-se para trabalhar como violinista com o seu irmão José. Infelizmente não deu tempo nem para iniciar, devido ao término do cinema mudo.

José e João Luiz conseguiram emprego numa empresa de navegação marítima e foram tocar na orquestra de um navio. Tabalhavam geralmente nos horários de alimentação (almoços e jantares), em viagens que aconteciam entre o Sudeste, Norte e Sul do Brasil sempre com as saídas do Porto do Rio de Janeiro. Após alguns anos, conseguiram transferência para uma linha internacional entre o Rio de Janeiro e a Argentina, onde trabalharam até o ano de 1937.

Com o início e durante a 2ª Grande Guerra Mundial, tudo ficou muito difícil para os dois irmãos. José que já estava casado, abandonou a profissão de músico, mudou-se para a Cidade de Niterói RJ e no centro desta à Rua Gavião Peixoto, abriu uma loja de ferragens com o nome de “Dragão de IcaraÍ”.

João Luiz foi para o Estado de São Paulo, conseguindo emprego numa casa comercial tipo bar e nas proximidades do desembarque dos passageiros no Porto de Santos. Ganhava um ótimo salário e recebia boas gorjetas. Pois agradava a todos tocando músicas de todas as nacionalidades.

Relembrando o passado; Dona Aluízia continua. “Meu pai João Christovão Gabrich, era profissional bombeiro hidráulico e tinha grandes habilidades em trabalhos de funilaria. Além de manter uma oficina em casa (nos fundos do sobrado), também atendia a uma vasta clientela. Dos serviços prestados à grandes prédios, lembra: Colégio Sion e da casa do Dr. Paula Buarque (reforma na tubulação hidráulica, nas calhas e condutores de água)”.

“No sobrado da Av. 15 de Novembro (atual Rua do Imperador) onde morávamos, além das dependências que usávamos, haviam 9 quartos que meu pai alugava. Eram apenas para homens solteiros e sem direito à alimentação. Geralmente eram pessoas que vinham de outras cidades para trabalharem em Petrópolis. Passavam o dia todo fora, saíam de manhã cedo e só retornavam à noite para dormirem. Ainda lembro de alguns hóspedes: o Sr. Palma (funcionário do Correio), o Sr. Venâncio (da Editora Vozes) e o Sr. Gao Omacht (professor de violino da Escola de Música Santa Cecília). Lembro-me também que em todos os 25 de dezembro; minha mãe (Luíza), preparava um almoço para eles e todos juntos, comemorávamos o Natal e o aniversário do meu pai”.

“A parte térrea do prédio, era formada por 3 lojas que o meu pai também alugava, havia uma sapataria, uma charutaria e uma relojoaria. A 1ª era a do Sr. Knippel, a 2ª não me lembro e a 3ª era a do Sr. Dunley”.

“Por volta de 1924, saímos do prédio da Av. 15 de Novembro e fomos morar na Rua Casemiro de Abreu n.º 190. (Próximo de onde tinham sido as terras do bisavô de Dona Aluízia; o colono Geoge Gabrich). Neste local ficamos por pouco tempo, saímos e fomos morar na Rua 13 de Maio, onde permanecemos por 5 anos”.

“Em 1930; papai comprou um terreno próximo às Duas Pontes, na Rua Gonçalves Dias e lá construímos a nossa primeira residência. Porém lá não ficamos por muito tempo e papai vendeu o prédio em 1933. Mais tarde soubemos que o 3º proprietário desta casa tinha sido o ilustre escritor Stefan Zweig”.

Dona Aluízia após lembrar dos seus pais e irmãos, dá início às suas reminiscências: “fiz o curso primário no Grupo Escolar D. Pedro II, bem em frente onde morava ( no prédio n.º 371 da Av. 15 de Novembro). Durante às minhas atividades escolares, também estudei música (piano) com uma professora particular – Dona Aydê Batista. Mais tarde ingressei na Escola de Música Santa Cecília e estudei até o oitavo ano de piano.

Em 1925 fiz a minha primeira comunhão na antiga Matriz; templo que freqüentei durante toda a minha infância, assistindo à missa todos os domingos – vez e outra ía também à Capela do Colégio São Vicente; que ficava anexa ao prédio que hoje dá lugar ao Museu Imperial de Petrópolis.

De muitas lembranças que tenho do passado, algumas são tristes. Embora que na época eu tivesse apenas uns 5 anos, lembro-me bem do ano de 1918, quando do término da 1ª Guerra Mundial.

Lembro-me que em nossa casa era comum falarmos o idioma alemão. Porém, infelizmente foi proibido e quem era descoberto falando, passava por uma série de humilhações.

O povo um tanto rebelde e sem motivos, cometiam atos desastrosos. Vez e outra de dentro de casa, ouvíamos barulhos estranhos e gritarias. Corríamos logo para as sacadas e pasmos observávamos aquela multidão correndo pelas ruas, destruindo tudo o que encontravam dos descendentes dos colonos e de outros alemães que existiam na cidade. A preferência eram as lojas e não mediam o menor esforço para quebrar e saquear. Da Padaria Alemã que situava-se próximo ao nosso prédio. Muitos saíam correndo e carregando às costas os sacos cheios de farinha de trigo e outros pertences da loja. Lembro-me claramente daquelas cenas brutais e impotentes assistíamos a muitas outras atrocidades.

Em resumo, soubemos que algumas pessoas foram castigadas e perderam tudo o que tinham conseguido durante anos e anos de traballho. Passado este pesadelo, a cidade voltou à sua calmaria. Porém nem podíamos pensar em falar o idioma dos nossos ancestrais, porque estávamos arriscados a passar por duras penas.

Lembro-me ainda de um trecho da Av. 15 de Novembro (atual Rua do Imperador), que desde a Rua Barão de Tefé até onde hoje é a Praça D. Pedro II, era formado por um paredão; igual ou parecido com o de hoje existente em frente ao Museu Imperial.

Onde hoje está situada a Praça D. Pedro II, existia um lindo parque”. Dona Aluízia dá uma pausa e lamenta: “não sei porque ao longo dos anos, fizeram tantas modificações naquele belíssimo local. Bem no centro do parque havia um lago com pequenas pontes e outros ornamentos.

Geralmente aos domingos ou vez e outra, passeávamos pela Rua D. Pedro I. Nesta rua havia apenas uma casa, era de uma francesa que plantava morangos e os vendia em pequenas embalagens. As vezes íamos até a “Coroa” ou Coroa do Imperador – alto do morro assim conhecido naquela época. Ou andávamos um pouco mais até atingir a Rua Ipiranga”. Dona Aluízia faz uma breve observação. “Meu irmão; o João Luiz, colecionava borboletas e freqüentava muito esta parte do centro de Petrópolis”.

Sobre a sua adolescência; os bailes e as festas. Dona Aluízia indagada, responde: “não os freqüentava muito. Eu tinha uma amiga a Hortência Noel e com ela as vezes íamos ao Clube Coral Concórdia. Porém o que mais gostávamos mesmo era de ir aos casamentos. Porque após as solenidades, sempre tinham festas, seguidas de bailes animadíssimos”.

“Sobre a minha vida profissional; lecionei aulas particulares de piano durante muitos anos e trabalhei com o cargo de telefonista na antiga CTB (Cia. Telefônica Brasileira) até alguns dias antes do meu casamento”.

Descrevendo o seu belo passado, Dona Aluízia fala em tom de muita felicidade sobre o seu casamento e afirma, “foram 58 anos de muita harmonia. Casei-me em 08/09/1936 com Virgílio Barenco, (falecido em 07/03/1995). Ele era filho de José Pedro Barenco e Isabel Bessa. Pela parte materna, ele era bisneto do colono germânico Peter Klein.

Desta maravilhosa união com o Virgílio, tivemos uma única filha; a Lucília e que sempre foi motivo de orgulho para nós”.

Lucília Gabrich Barenco, nasceu em 22/06/1936. Desde muito jovem dedicou-se à música e mais tarde deu início à composição de versos. Participando de concursos nacionais de trovas e poesias, publicou alguns livros e participou com trabalhos poéticos em muitos outros. Teve ótima formação escolar: fez o curso primário no Colégio Sion e diplomou-se no curso “Normal” de professora na Escola Santa Isabel.

Lucília casou-se em 22/07/1962 com Rui Corrêa de Mello, filho de Sebastião Alves de Mello e Hermínia Corrêa. São pais de 5 filhos, que lhes deram 5 netos. São seus filhos: Marisol (professora), Maristela (Teóloga), Mariluce (Professora), Márcio e Marcílio. São seus netos: Daniel, David, Gabriela, Dominique e Clara.

Lucília tem muitas atividades e divide o seu precioso tempo com: afazeres domésticos, professora no magistério fluminense, professora de música, faz acompanhamentos musicais nas solenidades de casamentos, prepara os cantos litúrgicos com as crianças da comunidade da Vila Teresa – Alto da Serra (onde reside) e ainda continua produzindo os seus belíssimos versos, trovas e poesias.

Dona Aluízia que hoje vive para a filha, netos e bisnetos, ainda tem um compromisso que o faz com prazer. Pois todos os domingos e a 36 anos, acompanha com o órgão à missa das 7 h da manhã na Igreja de Santo Antônio da Vila Teresa – Alto da Serra e que com mais de 70 anos dedicada a arte musical, na harmonia e paz do seu lar, ainda executa belíssimas músicas ao piano.

Chegamos ao final de mais uma entrevista com uma descendente de um dos nossos pioneiros colonos germânicos. Pois são poucas as pessoas como a senhora, Dona Aluízia, que se colocam à disposição para nos receber e revolver um passado de lembranças. Revelando belíssimas recordações, reminiscências próprias e enriquecendo cada vez mais a história de Petrópolis.