EXPOSIÇÕES HORTÍCOLAS E AGRÍCOLAS DE PETRÓPOLIS

Maria de Fátima Moraes Argon, Associada Titular, Cadeira n.º 28 – Patrono Lourenço Luiz Lacombe

Parte 1

“No dia 2 de fevereiro do ano próximo vindouro, será efetuada nesta cidade uma exposição de flores, horticultura e indústria, da qual coube a iniciativa a Sua Alteza, a sereníssima princesa Imperial.” Esta comunicação foi feita pelo presidente da Câmara Municipal de Petrópolis, o vereador Paulino Afonso Pereira Nunes, na sessão de 19 de novembro de 1874, na qual declarou que a Câmara reconhecia que tal exposição tornaria públicas as riquezas produtivas do solo petropolitano, portanto ela envidaria todos os esforços para o sucesso do evento visando ao desenvolvimento do progresso e engrandecimento do município, bem como convidaria as corporações das câmaras dos municípios vizinhos a fazerem parte do projeto.

Cinco dias antes, D. Pedro II, que apoiava a ideia da exposição, escreveu à princesa D. Isabel participando que “A exposição hortícola petropolitana já tem sido annunciada pelas cem tubas da fama”.

Isabel amava as plantas, especialmente as flores – colecionava orquídeas –, e estudou botânica com o professor Francisco Freire Allemão de Cysneiros. Em sua correspondência, há várias referências ao assunto, como, por exemplo, na carta dirigida ao pai em 4 de abril de 1867, na qual critica o trabalho de um tradutor: “Hoje de manhã fiquei desesperada com um que me escrevia nomes de plantas em portuguez e latim como suas ventas, perdoe-me a expressão, como diria o Freire”. Ela mantinha amizade com os botânicos e paisagistas Jean Baptiste Binot e Auguste Glaziou, tanto que fez parte da expedição ao pico de Itatiaia, organizada por Glaziou, que depois publicou um livro com o título Plantes cueillies sur l’Itatiaia au mois de juillet 1872, oferecendo-lhe um exemplar com dedicatória. O livro pertence ao Museu Nacional de História Natural de Paris, tendo sido localizado em 2013 pelo pesquisador do Instituto de Botânica de São Paulo, Sergio Romaniuc Neto.

Todavia, a ideia da exposição não pode ser atribuída somente ao interesse incontestável de D. Isabel pelas plantas; tanto ela como seu pai, D. Pedro II, e seu marido, o conde d’Eu, sabiam das oportunidades que esse tipo de evento oferecia como espaço de divulgação dos produtos e, consequentemente, na ampliação do mercado, trazendo benefícios para a economia local. No Brasil, já haviam sido produzidas até então três exposições nacionais, todas inauguradas pelo imperador: a primeira, em 2 de dezembro de 1861; a segunda, em 19 de outubro de 1866; e a terceira, em 12 de janeiro de 1873. A quarta exposição somente se daria em 2 de dezembro de 1875, portanto dez meses depois da exposição de Petrópolis.

Isabel fez à comissão organizadora da exposição uma doação no valor de 4:000$000 réis para auxiliar nas despesas. Eram membros da comissão os vereadores Paulino Afonso Pereira Nunes e Augusto da Rocha Fragoso, o padre Francisco de Castro Abreu Bacelar, o comendador Antonio Ribeiro Queiroga, M. O. C. da Silva Torres e Alvim e o botânico e paisagista Jean Baptiste Binot.

Para abrigar a exposição de 2 de fevereiro de 1875, a comissão construiu um pavilhão no Passeio Público, local onde, hoje, se encontra o Palácio de Cristal. O júri incumbido do julgamento dos expositores foi constituído pelo barão do Catete e pelos botânicos Ladislau Neto, diretor do Museu Nacional do Rio de Janeiro, e Auguste Glaziou, chefe do Parque do Palácio de Petrópolis.

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Aspecto da 1ª Exposição Hortícola e Agrícola de Petrópolis. 02.02.1875. Fotografia de R. H. Klumb.
Acervo Museu Imperial/IBRAM/MinC

Devido ao êxito alcançado pela exposição, nasceu a Caixa Hortícola de Petrópolis, cujo conselho diretor era presidido pelo conde d’Eu, que, em 20 de janeiro de 1876, realizou a segunda Exposição Hortícola e Agrícola de Petrópolis.

Fontes: Atas da Câmara Municipal de Petrópolis e correspondência da família imperial (Arquivo Grão Pará).

Bibliografia: JUDICE, Ruth. 100 anos do Palácio de Cristal – Petrópolis. Instituto Histórico de Petrópolis, 1984.

 

 

Parte 2

O conselho da Caixa Hortícola de Petrópolis, presidido pelo conde d’Eu, motivado pelo sucesso da primeira Exposição Hortícola e Agrícola de Petrópolis inaugurada em 2 de fevereiro de 1875, a primeira do gênero realizada no Brasil, solicitou à Câmara Municipal de Petrópolis, através de ofício datado de 29 de agosto do mesmo ano, “a remessa da maior cópia possível de produtos agrícolas deste importante município, e bem assim plantas, aves e outros animais domésticos”, a fim de figurarem na segunda exposição que se pretendia inaugurar em janeiro do ano seguinte.

A Câmara Municipal de Petrópolis cedeu o pavilhão construído no Passeio Público na Praça da Confluência, cujo pavilhão lhe foi doado pela maioria da ex-comissão da exposição de 1875. Além disso, ofereceu um objeto de prata para que o conselho da Caixa Hortícola de Petrópolis premiasse o expositor que mais se distinguisse na exposição. O prêmio coube por decisão da Câmara à expositora Matilde A. da Costa Franco.

O conde d’Eu e o botânico José de Saldanha Gama discursaram na abertura da segunda Exposição Hortícola e Agrícola de Petrópolis, que se deu em 20 de janeiro de 1876. Os quatro primeiros expositores premiados foram os seguintes: Lourenço Hoyer, plantas ornamentais, grande medalha de ouro; Júlio Buisson, queijos de diferentes qualidades, pequena medalha de ouro; Matilde A. da Costa Franco, produtos agrícolas, grande medalha de prata; Carlos Meyer, plantas ornamentais, grande medalha de prata. Na segunda seção, foram os expositores: Francisco José Fialho, três cavalos do país, grande medalha de ouro; Gregório Domingues, uma égua do país, pequena medalha de ouro; Jacomo Próspero Ratton, uma égua e um poldro, grande medalha de prata; José Cândido Monteiro de Barros, uma vaca e dois bois de carro, grande medalha de prata.

Segundo informação de Ruth Judice (1984), os vencedores da primeira exposição foram Rocha Fragoso, Tinoco, Binot, Henrique de Deus, Frederico de Albuquerque, Diogo Velho, José da Cruz Pinto Silva, Manoel Moreira Guimarães, Manoel Fernandes Carneiro e João Martins. Cabendo a Jean Baptiste Binot a medalha de ouro e a Rocha Fragoso a joia de prata oferecida pela Câmara Municipal. As medalhas oferecidas aos vencedores de ambas as exposições e das realizadas posteriormente foram oferecidas por D. Pedro II e cunhadas na Casa da Moeda. Em carta escrita à princesa D. Isabel, em 22 de dezembro de 1875, ele informa: “Prometteram-me as medalhas da 1ª exposição hortícola de Petropolis para o dia 19. Para a 2ª exposição creio que é o mesmo numero de medalhas; porem mande dizel-o. Contudo não prometto levar estas no dia 20.”

O Museu Imperial possui uma série de 46 medalhas alusivas às seis exposições hortícolas e agrícolas realizadas em Petrópolis. Da 1ª Exposição (1875) são nove exemplares, sendo quatro de prata, três de cobre, uma de chumbo e uma de madeira de jenipapo; da 2ª Exposição (1876) – 10 exemplares, sendo uma de ouro, uma de prata, quatro de cobre, três de chumbo e uma de madeira de jenipapo; da 3ª Exposição (1877) – 11 exemplares, sendo uma de ouro, quatro de cobre, três de chumbo e três de madeira de jenipapo; da 4ª Exposição (1884) – cinco exemplares, sendo uma de ouro, uma de chumbo e três de madeira de jenipapo; da 5ª Exposição (1885) – seis exemplares, sendo uma de prata, uma de cobre, uma de chumbo e três de madeira de jenipapo e da 6ª Exposição (1886) – cinco exemplares, sendo uma de ouro e quatro de cobre.

Fontes: Atas da Câmara Municipal de Petrópolis e correspondência da família imperial (Arquivo Grão Pará).

Bibliografia:

ESCRAGNOLLE, Luís Afonso d’. Medalhas de Petrópolis. Anuário do Museu Imperial, v.19, p.147-196, 1958.

JUDICE, Ruth. 100 anos do Palácio de Cristal – Petrópolis. Instituto Histórico de Petrópolis, 1984.

 

 

 

Parte 3

 Um fato curioso e bastante significativo é que todas as medalhas alusivas às seis exposições hortícolas e agrícolas realizadas em Petrópolis trazem, no anverso, a efígie da princesa D. Isabel. A fixação do retrato de D. Isabel, cuja escolha está carregada de significado e de simbolismo, não só passava a mensagem aos seus contemporâneos de que ela era a idealizadora das exposições como demonstrava estar a herdeira do trono a serviço da grandeza do país, ligando para sempre o seu nome a essa iniciativa marcada pela modernidade e prosperidade.

Em uma de suas cartas, D. Pedro II mantém a filha informada sobre o trabalho de cunhagem das medalhas:

 

Fui á Casa da Moeda. Não gostei da punção de seu retrato. Felizmente o artista faz o baixo-relevo em cera e já lhe dei meus conselhos á vista da photographia. Como há uma nova e curiossissima machina de copiar medalhas, em um mez estará prompto o cunho para a medalha de premio da exposição de Petropolis.

 

Certamente, o artista citado é o chefe da seção de gravura da Casa da Moeda, Francisco José Pinto Carneiro, que participou da Exposição Geral de Belas Artes de 1875, na qual obteve a segunda medalha de ouro. Seu nome aparece no Almanaque Laemmert de 1902, nos seguintes endereços: Rua Visconde da Gávea, 18 e Praça da República, 101; no ano de 1907, somente na Rua Visconde da Gávea, 18.

Dos 46 exemplares do acervo do Museu Imperial, apenas as duas medalhas mandadas cunhar pela Câmara Municipal de Petrópolis como prêmio de animação não trazem o nome do gravador Francisco José Pinto Carneiro, e o retrato de D. Isabel é diferente dos quatro outros usados nas exposições.

 Os exemplares da medalha da primeira exposição trazem dois retratos diferentes de D. Isabel. Um deles teve como modelo a fotografia dos fotógrafos Henschel & Benque, tirada no início da década de 1870.

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A imagem acima será utilizada também nas medalhas da segunda, terceira e quarta exposições, mas surge outra utilizada para a segunda e terceira exposições:

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 Nas exposições de 12 de abril de 1885 (5ª) e 21 de março de 1886 (6ª), a imagem é substituída por outra, sendo utilizado, provavelmente, como modelo, o retrato tirado por Paul Berthier (França, 1822-1912) durante a viagem de D. Isabel a Paris.

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Os reversos das medalhas trazem dois ramos de louro atados por um laço e a inscrição com o nome e a data do evento.

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Fontes: Atas da Câmara Municipal de Petrópolis, correspondência da família imperial (Arquivo Grão Pará) e medalhas do acervo do Museu Imperial.

Bibliografia:

ESCRAGNOLLE, Luís Afonso d’. Medalhas de Petrópolis. Anuário do Museu Imperial, v.19, p.147-196, 1958.

JUDICE, Ruth. 100 anos do Palácio de Cristal – Petrópolis. Instituto Histórico de Petrópolis, 1984.

 

 

Parte 4

Em 12 de janeiro de 1877, a Caixa Hortícola de Petrópolis recebeu do Governo Provincial autorização para realizar as exposições no Passeio Público e, meses depois, em 18 de abril, inaugurou-se a Terceira Exposição Hortícola e Agrícola de Petrópolis.

O pavilhão que abrigou as três primeiras exposições foi demolido em 1878, conforme comenta D. Pedro II em carta de 30 de dezembro à sua filha, D. Isabel: “Achei derribado o antigo barracão do passeio público, mas ainda não se principiou o edifício para as exposições”. Logo em seguida, em 31 de janeiro de 1879, anuncia: “Depois de amanhã colloca-se a primeira pedra ou cousa que o valha do edifício da exposição hortícola no chamado campo de Santa Anna de Petrópolis. Não sei como será a festa porque este anno há pouca animação por aqui.”

O barão do Catete, como vice-presidente da Associação Hortícola de Petrópolis, convidou, por ofício de 29 de janeiro de 1879, o presidente e os vereadores da Câmara Municipal de Petrópolis para assistirem, no dia 2 de fevereiro, à solenidade da colocação da pedra fundamental do edifício que a mesma associação projetava construir no Passeio Público destinado às exposições. Nascia a ideia do Palácio de Cristal de Petrópolis, encomendado pelo conde d’Eu às oficinas de uma sociedade em Arras, na França, inspirado no Palácio de Cristal projetado pelo arquiteto Joseph Paxton para a Exposição Industrial de Londres em 1851.

Quase quatro anos depois, em 7 de janeiro de 1883, na ata da sessão da Câmara Municipal de Petrópolis há o registro de que o palácio de exposição hortícola, “simpática e patriótica idéia de Sua Alteza o senhor conde d’Eu”, ainda não estava concluído, mas se encontrava em grande adiantamento. A demora, certamente, devia-se à falta de recursos da Associação Hortícola e Agrícola de Petrópolis, o que levou o conde d’Eu e a princesa D. Isabel a patrocinar um concerto público em 1882, em prol da associação. Houve outros colaboradores, como o empresário cubano Bernardo Caymari que, segundo o jornal O Mercantil, de 17 de janeiro de 1882, fez doação de seis contos de réis para a conclusão das obras e do ajardinamento do palácio das exposições.

Finalmente, em 27 de março de 1884, o secretário da Associação Hortícola e Agrícola de Petrópolis, José da Silva Costa, comunicou à Câmara Municipal que a abertura da quarta exposição ocorreria no dia 20 de abril.

No Palácio de Cristal foram realizadas mais duas exposições: a quinta, inaugurada em 12 de abril de 1885, e a sexta, em 21 de março de 1886, sendo esta a última exposição hortícola e agrícola de Petrópolis.

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5ªExposição de Flores, Frutos e Pássaros. 12 de abril de 1885.
Acervo Museu Imperial/IBRAM/MinC

 

Logo depois, em 9 de maio de 1886, foi realizada a Primeira Exposição Industrial e Artística de Petrópolis no Palácio de Cristal, cedido à Câmara Municipal pela Associação Hortícola e Agrícola de Petrópolis. O projeto apresentado à Câmara pelo vereador Henrique Kopke contou com o apoio de D. Pedro II, que não só determinou a data do evento como distribuiu os prêmios, e também do conde d’Eu e da princesa D. Isabel, que doaram a quantia de 100$000 réis para a compra de medalhas.

Com o fim da monarquia, o barão do Catete assumiu a presidência da Associação Hortícola e Agrícola de Petrópolis e recebeu do vereador Domingos Manuel Dias, presidente da Câmara Municipal de Petrópolis, um ofício nos seguintes termos:

Constando a esta Câmara, por anúncio no Jornal do Comércio de 24 do corrente, que se deve reunir nessa cidade a Associação Hortícola e Agrícola de Petrópolis, a fim de resolver-se se deve continuar essa associação ou dissolver-se, a Câmara julga dever prevenir-vos de que, não estando regularmente estabelecidas as relações jurídicas entre a municipalidade e a associação, quanto ao edifício que esta construiu em logradouro municipal, desejaria ser ouvida no caso da dissolução da associação, a fim de se resolver de modo conveniente a ambas as partes qualquer embaraço que de tal estado de coisas possa surgir.

A Associação Hortícola e Agrícola de Petrópolis foi extinta em 18 de dezembro de 1890.

 

Fontes: Atas da Câmara Municipal de Petrópolis e correspondência da família imperial (Arquivo Grão Pará).

Bibliografia:

JUDICE, Ruth. 100 anos do Palácio de Cristal – Petrópolis. Instituto Histórico de Petrópolis, 1984.

TURAZZI, Maria Inez. Poses e trejeitos – a fotografia e as exposições na era do espetáculo (1839-1889). Rio de Janeiro: Rocco, 1995.