HISTÓRIA DEMOLIDA

Joaquim Eloy Duarte dos Santos, associado titular, cadeira n.º 14, patrono João Duarte da Silveira

Houve um tempo longo de nenhum cuidado. Em nome do progresso civilizações foram destruídas e sepultadas em proveito da futura arqueologia. O que poderia permanecer luzindo ganhou a poeira e o soterramento. Grandes conflitos mundiais destruíram e destruíram em nome da barbárie do poder sem freios. Vivemos 20 séculos, – numerados a partir de um momento histórico-religioso -, de transformações com poucos exemplares vivos da narrativa da Criatura Humana. Essas hecatombes medraram o desenvolvimento científico, aprimorando o conforto de muitos e gerando o infortúnio da grande massa de sobreviventes. Uma lei natural que jamais estancou as graves feridas da Humanidade porém elevou o Ser Inteligente a uma tecnologia de conforto para o bem viver mas frágil diante das botas dos poderosos por sobre as cabeças dos miseráveis.

O término da 2ª Guerra Mundial alertou a todos sobre o mau exercício da Humanidade em relação ao seu patrimônio. De repente, após a insanidade de grupos políticos desumanos, o rico patrimônio dos Velhos Continentes estava depositado no pó das ruas cobertas por cadáveres. Urgia a reconstrução, a retomada do conceito de herança, o bálsamo para as feridas expostas no desencanto das criaturas de boa vontade.

No Brasil, tão distante de tudo e sofrendo a invasão da massificação cultural distante de nossas origens, ofuscante no brilho das garrafas de refrigerantes, entendeu que modernizar era destruir o velho, coisa que a Capital da República, a cidade do Rio de Janeiro, já fizera no início do século XX com o Morro de Santo Antônio e a moderna Avenida Rio Branco.

Pois muito bem – certamente muito mal – chegou a Petrópolis a sanha do “novo” na poeira levantada pela construção civil e reavaliações urbanas, nos tempos da guerra e post ela, gerando uma série de derrubadas de prédios, casarões, monumentos da arquitetura e da engenharia petropolitana histórica, para a edificação de caixotes largos, médios, finos, muito longe da tradição formativa de nossa cultura. Não se respeitou nada, esquecendo-se todos que sepultava-se o futuro da cidade, a vocação tão propalada hoje pelo turismo, deitando-se no chão exemplares raros da História do Brasil dos séculos XIX e XX, enfeixando no meio de prédios bonitos e de estilos rebuscados, os espigões lisos, apertando e afogando os sobrados, machucando a estética e aviltando a beleza espremida.

Escapou muito pouco e o resultado ai está no comprometimento estético do Centro Histórico, com poucos exemplares do antigo e o sufocamento do moderno resultando o caos que hoje nos assiste e assusta.

Já em 1957, a alteração do Centro Histórico, com aquela agulha tão comum em tantos lugares e o cercamento dos riachos por balaústres, desmontou o Plano de Koeler, mesmo respeitada a malha urbana de seu projeto, permitindo a edificação de altos prédios de forma indiscriminada, sem nenhum senso estético ou planejamento urbanístico. E, pasmem todos, correu pelos catres do poder público da época um largo projeto visando passar o trator em todos os sobrados da então Avenida XV de Novembro, para um total corredor de prédios altos, com circulação dos pedestres nas “loggias” que se abririam por toda a extensão da via.

Alguns exemplares desse “boom” imobiliário estão plantados em nossa principal artéria urbana.

Agora, temos uma nova “revitalização”, corrigindo-se alguns erros do projeto de 1957, porém com soberbos equívocos históricos além, é claro, do estreitamento demasiado das pistas de rolamentos a um nível insuportável para o fluxo de veículos em futuro muito próximo. Talvez se aproveite uma idéia de um cidadão insano de outros dias, o famoso Antônio Crescêncio, o Conde das Perobinhas, de inserir o metrô petropolitano nos riachos petropolitanos. O buraco, pelo menos, já está aberto, assim diminuindo o montante das planilhas que devem ser obrigatoriamente divulgadas nas placas. Esperamos que ninguém aproveite a idéia do Conde das Perobinhas…

Petrópolis, em sua história demolida, quer centralizar sua vida futura no turismo, embora tenham caído dezenas de exemplares de uma arquitetura eclética, quanto atraente e bela por suas características e cuja salvação encontra-se sempre abalada pelos absurdos que se aprovam por ai.

O grande exemplo de hoje foi a demolição do casarão Grandmasson para a construção daquele modernosa casa, pertinho do largo que encanta a visão da Catedral.

Agora é ela, a feiosa casa, que está sob ameaça das picaretas, visando uma nova estrutura, a qual, salvo melhor estudo, não se coaduna com o entorno clássico, lindo e admirado pelo povo e visitantes de Petrópolis.

E temos organismos que têm objetivos de guardiãs da história e defensoras da Cidade. E, sem falar no Poder Público…

Mas, porém, contudo, todavia, senão…