JÚLIO FREDERICO KOELER

Maria de Fátima Moraes Argon, associada titular, cadeira n.º 28, patrono Lourenço Luiz Lacombe

Exmo. Sr. Prefeito Paulo Mustrangi, Sr. Presidente do IHP, Luiz Gomes, demais autoridades, Senhoras e Senhores

Agradeço o convite feito pelo confrade Luiz Gomes, Presidente do Instituto Histórico de Petrópolis, e pelo Clube 29 de Junho, para ser a oradora nesta solenidade de homenagem ao Major de Engenheiros Júlio Frederico Koeler, dentro das comemorações dos 166 anos da chegada dos colonos alemães a Petrópolis.

Não sendo especialista no assunto, essa é a segunda vez em que me arrisco a tratar desse tema. A primeira foi em 2001 quando, convidada para colaborar na edição especial comemorativa da Festa do Colono Alemão, organizada pela Tribuna de Petrópolis, escrevi um ensaio intitulado Breves Considerações sobre a memória dos colonos alemães, no qual tratei do Museu Casa do Colono, alegando que o museu não representa um espaço de reflexão sobre o significado deste legado do passado como experiência coletiva de formação da cultura e da sociedade, mas sim um monumento que existe e é preservado simplesmente como testemunho deste passado. Hoje, exatamente 10 anos depois, um passo importante é dado nesse sentido: a assinatura do decreto de tombamento desse patrimônio de Petrópolis. Estarmos diante do monumento de Júlio Koeler para comemorar a colonização germânica implica refletir sobre tradição, memória, patrimônio e cidadania.

A primeira homenagem ao Major Engenheiro Júlio Frederico Koeler, que construiu a primeira cidade programada e planejada do Brasil, foi feita em 1895, ano do cinquentenário da colonização germânica em Petrópolis, pela Câmara Municipal que resolveu denominar de Avenida Koeler a então Avenida 28 de Setembro, antiga Rua D. Afonso.

Nesse mesmo ano, um grupo de pessoas da sociedade local resolveu criar uma comissão encarregada de promover subscrições populares para construir uma estátua em homenagem a Júlio Koeler, um dos fundadores da cidade de Petrópolis. Depois de inúmeras tentativas frustradas o projeto foi retomado em 9 de julho de 1953, quando o Prefeito Cordolino Ambrósio designou uma comissão para tratar do assunto do monumento, sendo, finalmente, depois de quase cento e dez anos da morte de Koeler, inaugurado em 23 de janeiro de 1955, como um ato de gratidão do povo. O Historiador Paulo Knauss, coordenador da obra Cidade vaidosa: imagens urbanas do Rio de Janeiro (Rio de Janeiro: Sete Letras, 1999), observa que “A gratidão certamente é o enunciado que corresponde ao maior número de peças da imaginária urbana de caráter histórico” e “que esse enunciado da gratidão fixa simbolicamente a aliança entre Estado e Sociedade”.

Hoje, nesse ato de celebração, reconhecemos um legado que nos foi deixado e, portanto, somos responsáveis por essa herança do passado. A utilização desse bem cultural – que é patrimônio de todos nós – é válida para comemorar essa efeméride, os 166 anos da chegada dos colonos alemães a Petrópolis, e, certamente, ganha significado e relevância. Mas como parte do legado cultural da nossa cidade, é importante que se estabeleça um vínculo com a comunidade a fim de demonstrar a sua importância histórica, e também revelar o seu valor como matéria-prima para a atividade turística. Valorizar como obra de arte, como resultado de uma experiência social, e não como um objeto destituído de utilidade direta e imediata na vida cotidiana. Um dos caminhos que contribuem para se alcançar essa meta é o desenvolvimento de pesquisas históricas, entre cujas contribuições importantes podemos citar as de Guilherme Auler, Gustavo Bauer, Carlos Rheingantz, José de Cusatis, Paulo Roberto de Oliveira e José de Vasconcellos, este último que, em sua obra Júlio Frederico Koeler a dura conquista da praça, analisou de forma profunda e crítica o projeto do monumento inserindo-o no contexto político e social de Petrópolis. Tais contribuições permitem evocar esse passado comum, conservando e assegurando os referenciais comunitários e de identidade dos grupos sociais possibilitando, dessa maneira, que toda a sociedade celebre algo comum a todos.

Para encerrar, lanço mão de trechos da carta do Frei Estanislau Schaette ao Prefeito Cordolino Ambrósio, em 23 de janeiro de 1955: “Agradeço penhorado o amável convite telefônico que recebi ontem […] para assistir à festiva inauguração do monumento do célebre Major Koeler […] Foi em meados de julho de 1897 que vindo do histórico convento de São Francisco da Bahia, cheguei a Petrópolis para trabalhar na Escola Gratuita São José […] No segundo dia de minha estada em Petrópolis, fiz um passeio sozinho sem destino determinado no intuito de conhecer uma parte da cidade. Percorri vagarosamente as ruas Montecaseros, Piabanha e Treze de Maio. Anotei os nomes e fixei as principais curvas do rio. Parei na atual praça da Princesa, fitei a futura Catedral, com as paredes erguidas até a altura das janelas, cercada de andaimes serrados de igual altura e de ótima madeira. Escrevi o nome da rua Ipiranga, passei o Palácio da Princesa e descobri o título “Avenida Koeler”, Fiquei impressionado, andei devagar pela estrada mais linda da cidade e logo comecei a estimar o autor […] Forte curiosidade surgia em minha alma: Quem seria o Major Koeler […] Por felicidade no próximo domingo encontrei em frente a Igreja do Sagrado Coração de Jesus um grupo de idosos colonos. Cumprimentei-os e perguntei-lhes: Quem de vós sabe contar alguma coisa do major Koeler? O velho Francisco Maiworm logo respondeu: Conheci-o bem e trabalhei sob as ordens dele. Quando em 1845, meu pai com seus cinco filhos crescidos chegou a Petrópolis, eu contava meus doze anos, sendo o filho mais novo. O chefe da família Deister, homem de estatura alta e de barba branca à guisa do Imperador austríaco Francisco José, logo entrou em conversa com vivacidade. Diversas vezes visitei estes meus instrutores, tomei nota de tudo […] Começou então a lição histórica, minha narração sobre a atividade do Major Koeler. Os alunos não se mexeram. Parece que em suas almas sentiram surgir os belos efeitos do verdadeiro amor à pátria […] Hoje sinto grande alegria e satisfação ao ver realizado meu desejo forte de mais de meio século e felicito o Exmo. Prefeito, seus auxiliares, os membros da preclara família Koeler, todo o Instituto Histórico de Petrópolis e todo o povo que pretende imitar a atividade e a abnegação do Major Koeler”.

Torço para que cada um de nós assuma a mesma atitude do Frei Estanislau Schaette, a de caminhar pela cidade reconhecendo os bens culturais e, principalmente, que o governo municipal e os cidadãos assumam a responsabilidade pela valorização e preservação de cada um desses bens.