NO CORAÇÃO DA CIDADE HÁ UM PALÁCIO E SEU JARDIM…
Maria de Fátima Moraes Argon, associada titular, cadeira n.º 28, patrono Lourenço Luiz Lacombe
O jardim petropolitano do Imperador Pedro II é um espaço freqüentado até hoje pela população da cidade e seus visitantes.
D. Pedro II pelo Decreto nº 155, de 16 de março de 1843, determinou, entre outras medidas, arrendar a Koeler a sua fazenda do Córrego Seco, reservando um terreno suficiente para ali se edificar um palácio para si, com suas dependências e jardins.
A importância deste jardim histórico reside não só no seu aspecto paisagístico e nas raridades de suas espécies, mas também como um lugar de contemplação, de estudo, de lazer, de saudade, de lembranças, de segredos e, sobretudo, o seu vínculo estabelecido com a cidade de Petrópolis.
Em 18 de abril de 1858, a Princesa Isabel com doze anos incompletos, escreve a seu pai D. Pedro II: “A Condessa [de Barral] nos levou a passear um boucadinho no jardim recitando a minha historia antiga porque tinha um sol muito bonito”. Mais tarde, dez anos depois, já casada, ela escreve a sua mãe D. Teresa Cristina: “Escrevo-lhe esta cartinha para pedir-lhes dois magníficos pés de camélias brancas que existem no jardim, para eu levá-los para as Laranjeiras [local de sua residência no Rio de Janeiro]”.
Nos tempos de exílio da Família Imperial, o Visconde de Taunay escreveu no ano de 1891 diversas cartas a D. Pedro, falando de seus sentimentos de angústia e dor com os rumos políticos do Brasil. Na carta de 7 de julho de 1891, ele assim se expressa: “No meu retiro de Petrópolis ponho-me a pensar em muita cousa e não raro me coloco no Parque Imperial, tão cheio de grandeza em seu abandono, para, a gosto, meditar as lições do tempo e dos sucessos […].
A execução dos jardins ao lado e em frente ao Palácio Imperial que iam até a Rua do Imperador coube ao parisiense Jean Baptiste Binot que se achava instalado em Petrópolis desde 1847. O contrato assinado entre Binot e a Superintendência da Imperial Fazenda de Petrópolis, em 1854, foi citado por diversos autores como Alcindo Sodré e Lourenço Luiz Lacombe, mas até hoje nunca havia sido publicado em sua íntegra.
Códice 16 do Arquivo Grão Pará
1854
Nº 9
Contrato celebrado para a fatura dos jardins do Imperial Palácio de Petrópolis entre João Batista Binot e a Superintendência da Imperial Fazenda de Petrópolis.
Aos vinte nove dias do mês de abril do ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos e cinqüenta e quatro, no escritório desta Superintendência, achando-se presentes o superintendente José Maria Jacinto Rebelo e João Batista Binot, foi por aquele proposto a fatura dos jardins ao lado e em frente do Palácio Imperial, sob as condições que abaixo se seguem, às quais se sujeitou o referido Binot, perante as testemunhas José Francisco Dias e Maximiniano José Gudehus.
1º. Binot nivelará e preparará convenientemente, com o fim de serem plantados, os terrenos da frente e ao lado do Palácio, destinados para jardins.
2º. Executará os riscos conforme lhe forem dados.
3º. Riscará, arruará e encanteirará com grama as diferentes banquetas e canteiros, cavando pelo menos três palmos de profundidade para encher com boa terra, e dependente da natureza e tamanho da planta.
4º. Procurar terra própria e fazê-la conduzir, bem como o estrume, depois de escolhidos tanto um como outro para os canteiros e plantas.
5º. Substituirá o barro existente por boa terra e estrume.
6º. Fornecerá e mudará do seu viveiro da rua Nassau, as plantas e árvores frutíferas, arbustos, flores, etc., de conveniente tamanho, constantes da relação que apresentou para este efeito, na ordem, e número seguinte:
Árvores frutíferas da Europa: macieiras de 30 qualidades diferentes, 300 pés; pedreiras, idem, 500 pés; pessegueiros, idem, 30 pés; ameixeiras, idem, 20 pés; damasqueiros, idem, 10 pés; cerejeiras, idem, 10 pés; nogueiras, idem, 20 pés; macieiras com frutos, cheirosas, idem, 20 pés; avelãs, 20 pés; castanheiras, idem, 10 pés; total, 940 pés de plantas.
Roseiras de mais de 100 variedades, 1185 pés.
Arvoredo frutífero do país, de muitas variedades, 1550 pés.
Arbusto de flores e ornamentos, mais de 150 variedades, 640 pés.
Vinhas ou parreiras escolhidas (Chasselas, Fontainebleau, frontignan, Magdalena, etc.), 170 pés.
Cebolas, bulbos e raízes de flores diversas (variedade muito grande de amarilhos, gladíolos, tuberosos, narcisos, junquilhos, coroa imperial, jacintos, anêmona, reinúnculo, ciclâmen, agapantos, etc.), 2000 pés.
Dálias dobradas de mais de 200 variedades (tuberculosas), 5000 pés.
Plantas herbáceas de flores diversas (grande variedade), 3000 pés. Total 14:485 pés, fora 3 variedades de morangos, subindo a mais de 3000 pés, e mais de 2000 de violetas de Parma, dito azul das quatro estações, etc.
7º. Plantará todas as árvores frutíferas, arbustos, flores, etc., conforme sua melhor localidade.
8º. Responderá por todas as plantas acima mencionadas e também pelas suas qualidades, ficando delas incumbido até a sua conclusão.
9º. Extinguirá os formigueiros que encontrar nos jardins.
10º. Principiará o quanto antes o serviço acima mencionado, para aproveitar a estação própria de plantação, sem que haja interrupção.
11º. Admitirá por sua conta os trabalhadores que para esses serviços diversos forem mister, nunca menos de seis.
12º. O superintendente fornecerá os carrinhos, carroças, um preto e animais que for mister para condução das terras, estrumes e transplantação do viveiro; regadores, estacas e cordéis.
13º. Excetua-se os tanques, caramanchões e [bevedeis].
14º. Debaixo das condições acima mencionadas nos serviços próprios à plantação e preparos dos terrenos dos jardins; fornecimento das plantas e árvores referidas, se obriga o superintendente a pagar a quantia de = sete contos = exigidos por J. B. Binot, em prestações até final conclusão de todo o trabalho, e do modo seguinte.
15º. Pagará o superintendente mensalmente a Binot a importância da féria dos trabalhadores que ele tiver no trabalho dos jardins imperiais, e mais a quantia de oitenta mil réis, contando-se toda esta despesa por conta do ajuste feito.
16º. Na conclusão da obra, e três meses depois de finda a plantação, receberá o restante para o completo embolso dos = sete contos de réis = porque é contratada pelo referido Binot a plantação e fatura dos jardins do Palácio Imperial de Petrópolis.
E nada mais havendo-se a tratar, deu-se por findo o presente, em cujo contrato vão assinadas as duas testemunhas, o empreiteiro Binot e o superintendente da Imperial Fazenda de Petrópolis.
Petrópolis, 29 de abril de 1854. Francisco Alves de Brito Maia, escrivão. Maximiano José Gudehus e Antônio Fernandes Cardoso. João Batista Binot. José Maria Jacinto Rebelo.