O novo 13 de Maio
Maria de Fátima Moraes Argon – Associada Titular, Cadeira n.º 28 – Patrono Lourenço Luiz Lacombe
“É para a liberdade que Cristo nos libertou” (G1 5,1)
Alceu Amoroso Lima defendia a ideia de que somente com a plena recuperação da liberdade de pensamento e de ação é que se poderia restabelecer a vida democrática real do Brasil. Dessa forma, participou ativamente da campanha em prol da anistia política, escrevendo artigos desde 1964 até 28 de agosto de 1979, esta última, data da promulgação da Lei nº 6.683 conhecida, popularmente, como a Lei da Anistia.
Em 17 de junho de 1971, Dr. Alceu publicou no Jornal do Brasil o artigo sob o título “O novo 13 de maio” – escrito por ocasião da transladação dos restos mortais da Princesa Imperial D. Isabel para o mausoléu da Catedral de São Pedro de Alcântara, em Petrópolis –, no qual clamava mais uma vez pela anistia:
Será que teremos que apelar para alguma nova Isabel a fim de ser repetido, a quase um século de distância, o que no fim do século XX poderá corresponder, em nossa História, ao da Princesa no dia 13 de maio de 1888? Esse novo gesto, todo mundo sabe qual seja: é a Anistia Geral.
Para o autor, a Princesa Regente D. Isabel
[…] teve mesmo o alto bom senso de realizar, na prática, aquele sonho, que seu pai sempre alimentou sem nunca ter tido a varonilidade de o transformar em realidade política e social: a abolição […]. O seu gesto poupou ao Brasil uma guerra de secessão ou uma revolução sangrenta
e continua:
Os sancho panças de hoje, sensatos e realistas, nem pensam nisso. Como os do tempo da Redentora julgavam impossível o que ela ia fazer. E depois de feito, a vituperaram por ter ‘arruinado a agricultura’ e com ela o Brasil… Quando teremos uma nova Isabel que compreenda ser com grandes gestos que se constrói a História? E que a Anistia de hoje poderá ser amanhã um novo 13 de maio?
Podemos encontrar alguns pontos de contato entre Alceu Amoroso Lima e D. Isabel. Ambos, como católicos, usavam cada um a seu modo a religiosidade como chave de ação para contestarem o sistema em que viviam. D. Isabel, ao tratar das ações visando à restauração da Monarquia, em 1892, em carta escrita a João Alfredo Correia de Oliveira, ex-presidente do Gabinete de 10 de Março, que promulgou a Lei Áurea, extinguindo a escravidão no Brasil, desabafa: “Quando a política deixará de empregar meios que diminuem a grandeza moral dos povos e das pessoas! É assim que tudo se perde e que nós nos perdemos.”
Dr. Alceu, em 1970, também assim desabafa:
E há seis anos que vejo agravar-se, de dia para dia, de experiência política em experiência política, de regime em regime, a separação entre governantes e governados, entre a euforia oficial, pelas proclamações de otimismo, e o sofrimento do povo, no mudo protesto da maioria cortado pela explosão de desespero dos mais impacientes ou afoitos, que provoca, em represália, novas perseguições e novos abismos.
Hoje, passados quarenta e três anos do artigo de Dr. Alceu, poderíamos fazer novamente a mesma pergunta: o que, no século XXI, poderá corresponder, em nossa História, ao ato da princesa no dia 13 de maio de 1888? Inspirados pelo artigo “A que ponto chegamos”, do ex-presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, publicado no Jornal do Brasil, em 4 de maio de 2014, uma mudança é certa: o fim da corrupção na política!
E são dele as palavras:
Se, de fato, queremos sair do lodaçal que afoga a política e conservar a democracia que tanto custou ao povo conquistar, vamos esperar que uma crise maior destrua a crença em tudo e a mudança seja feita não pelo consenso democrático, mas pela vontade férrea de algum salvador da pátria?