ORA (DIREIS) OUVIR BILAC

Leandro Garcia, membro da Academia Petropolitana de Letras

Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac (1865–1918) se orgulhava de possuir, no seu nome próprio, a métrica do verso alexandrino, a grande marca formal da sua poesia. Este elemento, dentre outros, é relevante quando pensamos a vida e a obra deste grande poeta brasileiro, um dos mais populares da nossa literatura.

Homem de grande cultura, Olavo Bilac teve sua vida ligada a diversas atividades além de sua produção lírica. Foi cronista, crítico de literatura e de teatro, autor de literatura infantil, tradutor, defensor de diversas campanhas cívicas como o serviço militar obrigatório (especialmente na Primeira Guerra Mundial) etc. Entretanto, foi na imprensa que se notabilizou, atuando em diversos órgãos da época, como A Imprensa (1885-1891), A Leitura (1894-1896), Branco e Negro (1896-1898), Brasil-Portugal (1899-1914), Azulejos (1907-1909), Fon-Fon (1905-1918), O País (1910-1912), Jornal do Commércio (1910-1915), Diário de Notícias (1915-1918) e Atlântida (1915-1918).

Na historiografia literária, Olavo Bilac se eternizou como o Príncipe dos Poetas Brasileiros, título dado pela revista Fon-Fon, em 1907, após votação popular entre os leitores daquele periódico. É também comum lembrá-lo como membro da Tríade Parnasiana, ao lado de Alberto de Oliveira e Raimundo Correa.

De fato, Bilac nos legou poemas inesquecíveis, versos de uma força lírico-expressiva que transcendem ao tempo, como “Ora (direis) ouvir estrelas! Certo, / Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto, / Que, para ouvi-las, muitas vezes desperto / E abro as janelas, pálido de espanto…”. Inclusive, do ponto de vista crítico, podemos abrir uma série de debates acerca destas classificações engessadas, pois em muitos dos seus poemas, a dimensão parnasiana se realiza apenas na forma, no apreço pela metrificação perfeita, pela seleção vocabular nobre que lhe proporcionava as rimas raras. Todavia, em termos de temática, sua poesia visitou outras escolas, especialmente a romântica e a simbolista, pela opção de temas como o amor, a morte, a solidão e o sonho. Então como classificá-lo, parnasiano ou simbolista? Isto é um dos problemas da atual revisão que temos feito, nos cursos de Letras, do cânone literário nacional. Prefiro dizer que grandes poetas e escritores excedem a classificação de escolas e movimentos, por isso são atemporais.

Problema semelhante temos com o poeta petropolitano Raul de Leoni, cujo único livro Luz Mediterrânea sofre justamente com esta indefinição crítico-historiográfica, uma vez que Leoni optou pela métrica exuberante – parnasiana – dentro de temáticas claramente romântico-simbolistas, como o grande poema “Argila”. Lembrando que Luz Mediterrânea foi publicado em 1922, ano da explosiva Semana de Arte Moderna, força inicial do nosso Modernismo. Então como classificá-lo: simbolista, parnasiano ou modernista? Por isso, a necessária revisão do cânone. Neste sentido, outra injustiça – para ficar apenas nos parnasianos – é o que se tem feito com a obra de Francisca Júlia, pouco lida e quase nada criticada nos nossos cursos de pós-graduação e, para alguns especialistas, a nossa parnasiana perfeita – em temas e formas – com uma técnica criativa mais perfeita do que a Tríade Parnasiana já lembrada acima.

Polêmicas à parte, Olavo Bilac é o homenageado nesta minha crônica, e devo dizer que, como professor universitário de Letras, ele não é devidamente estudado nos nossos programas. Acho que muito disso se deve a preconceitos idiotas, visões pequenas e tacanhas que nos foram passadas a partir do nosso modernismo heroico – “tudo que é parnasiano não presta” – era a opinião de muitos; não nos esqueçamos do poema “O Sapos”, de Manuel Bandeira, lido aos berros na Semana de 22, satirizando o fazer poético da Tríade. Isto ficou em nós, e é difícil livrar-se.

Não me esqueço da primeira vez que li o soneto “Língua Portuguesa”, cujos primeiros versos são: “Última flor do Lácio, inculta e bela, / És, a um tempo, esplendor e sepultura”. Lembro o quanto isso ressoou na minha mente. O que era o Lácio? Por que a “última flor”? Por que “inculta e bela”? Confesso: Olavo Bilac nunca mais ficou parado nas minhas prateleiras.