SUBSÍDIOS PARA UMA HISTÓRIA DE ITAIPAVA
Jeronymo Ferreira Alves Netto, associado titular, cadeira nº. 15, patrono Frei Estanislau Schaette
SESMARIAS E FAZENDAS
Quatro importantes sesmarias foram requeridas, nas terras que constituem o atual 3º Distrito de Petrópolis, ao governador das Capitanias de Minas Gerais e Rio de Janeiro. Tais sesmarias eram as de Fernando Pereira de Vasconcelos, requerida a 15 de março de 1731; a de José Ferreira da Fonte, requerida a 28 de agosto de 1734, contígua à sesmaria que o mesmo possuía no Secretário; a de José da Silva Torres, requerida a 8 de janeiro de 1760 e a de Antônio da Silveira Goularte, também requerida a 8 de janeiro de 1760.
Cumpre lembrar que as sesmarias eram terras incultas ou abandonadas, doadas para efeito de povoamento e cultivo. As que foram requeridas no Vale do Piabanha foram doadas em quadras de uma légua, o que corresponde a 3.000 braças ou 6.600 metros.
Com o correr do tempo estas sesmarias foram se fragmentando em fazendas e sítios.
A sesmaria do Desembargador Fernando Pereira de Vasconcelos deu origem à célebre Fazenda da Manga Larga, com abundantes mananciais de água, com engenho, na qual mereciam especial atenção o cultivo da cana e a criação de gado. Entre seus proprietários destacamos Bazílio Zeferino Ribeiro (1867), Guilherme Carlos que a manteve até o seu falecimento ocorrido em 1914, Jeronymo Ferreira Alves, seu genro, que adquiriu as partes dos demais herdeiros de Guilherme Carlos, em 10 de janeiro de 1917 e as manteve até 25 de abril de 1929, quando então a vendeu a Renato da Rocha Miranda, cujos herdeiros a lotearam, em época recente. Atualmente em suas terras se encontra o importante Centro de Convenções General Ayrosa.
Em 1930, era a fazenda administrada por Manoel de Souza Mattos e, a partir de 1931, passou ela a ser administrada por Walter Hasse que, segundo informações fornecidas por sua filha Erica, nasceu em Hamburgo, Alemanha, em lº de março de 1888, tendo chegado ao Brasil, em 11 de novembro de 1911, estabelecendo-se em Pirapora, Minas Gerais, onde pretendia dedicar-se ao cultivo de batatas. Ainda, segundo informações de sua filha, veio para Petrópolis administrar uma propriedade de Walter Schlik no Alto da Serra. Em Petrópolis, casou-se com Elza Gaiser, filha de Fritz Gaiser, proprietário de um açougue à Rua Monte Caseros, sendo o primeiro fabricante de lingüiças em nossa cidade. À procura de um clima mais brando, radicou-se em Itaipava, onde administrou as propriedades do barão Schimidt Vasconcelos, de Franklin Sampaio e, em seguida a Fazenda da Manga Larga.
Duas importantes fazendas surgiram da sesmaria de José Ferreira da Fonte, a de Magé e a de São José do Piabanha. A primeira foi assim denominada porque “vieram famílias da Baixada Fluminense, especialmente de Magé, para trabalhar nas terras do Secretário, ganhando a região o nome de Magé” (1).
(1) SCHAETTE, Frei Estanislau. Fazendeiros e fazendas de Serra Acima. Anuário do Museu Imperial. Petrópolis, 1948, p. 87.
Tal fazenda, segundo nos informa Machado, “obtinha colheitas abundantes e dispunha de engenho, ferraria e casa grande de moradia, assobradada” (2).
Possuía a referida fazenda uma Capela consagrada a Nossa Senhora do Carmo, aberta ao culto em 1784, que era a sede do “Coadjutor da Serra Acima”, designação dada ao representante do vigário do Inhomirim.
Em terras dessa fazenda, ao que tudo indica, localizou-se, posteriormente, a Estação de Itaipava.
Do outro lado da estrada e do rio, comenta Machado, “ficava a fazenda de São José do Piabanha, que possuía a ermida de São José, posta em outeiro e franqueada ao culto das redondezas” (3).
Esta fazenda era provavelmente a mesma a que se refere Klumb, em 1862, como pertencendo ao português Antônio Tavares Bastos, “a cuja iniciativa, se deve a capelinha chamada de Itaipava” (4), acima mencionada.
(2) MACHADO, Antônio. A decadência da Fazenda. In: PREFEITURA MUNICIPAL DE PETRÓPOLIS. Trabalhos da comissão do Centenário. Petrópolis, 1941, p. 146. 4 v.
(3) Id. Ibid., p. 146.
(4) KLUMB, Henry. Doze horas em Diligência. In: MUSEU IMPERIAL. Cidade de Petrópolis. Petrópolis, 1957, p. 71.
Antônio Tavares Bastos cultivava em suas terras milho, feijão e batatas, sendo interessante assinalar que já naquela época utilizava apenas o trabalho livre, renegando o trabalho servil.
As origens de Bonsucesso podem ser encontradas no Sítio da Ponte, de propriedade do português Domingos Rodrigues da Rocha, natural da freguesia de S. Tomé de Agrião dos Arcos, no Arcebispado de Braga, em Portugal.
Domingos Rodrigues da Rocha faleceu em 28 de fevereiro de 1785. Em seu testamento “libertou os escravos que, pelo prazo de 20 anos lhe tinham servido com fidelidade, concedendo-lhes meia légua de terras no rio Araras e algum dinheiro para iniciarem sua vida independente” (5). Em sua propriedade, ergueu o Oratório de São Domingos da Ponte.
Da Sesmaria de Antônio da Silveira Goularte, adquirida por D. Brites Maria de Assunção, em 18 de janeiro de 1760, surgiram duas fazendas: Arca e Santo Antônio.
A Fazenda da Arca foi herdada por sua filha Maria Brígida de Assunção Goulão e, posteriormente, por sua neta Brígida Maria Correa Fragoso, casada com o major José Cândido Fragoso, a respeito do qual nos informa João Fernandes: ” foi nomeado por D.João VI, em 1818, capitão da 6ª Cia. Do Regimento de Cavalaria de Milícias da Província do Rio de Janeiro e, em 1823, foi designado para a Imperial Guarda de Honra do Imperador D. Pedro I” (6).
(5) SCHAETTE, Frei Estanislau. Fazendeiros e fazendas de Serra Acima. Anuário do Museu Imperial. Petrópolis, 1948, p. 86.
(6) FERNANDES, João. Major José Cândido Fragoso. Tribuna de Petrópolis, Petrópolis, 31 ago. 1930.
O major José Cândido foi também proprietário do Engenho de Santo Antônio do Benfica, já que o comprara aos herdeiros de sua avó materna, D. Paula Gomes da Conceição, viúva de Bento Lopes da Cunha Velho.
Com a criação do Distrito de Paz, na Freguesia de São José do Rio Preto, foi designado lº magistrado do novo juizado, cargo que exerceu até a sua morte, num renhido combate contra os malfeitores que infestavam os caminhos que conduziam até Magé, Paty, Pampulha e outras paragens.
A única filha do casal José Cândido/ Brígida Maria, casou-se com o Dr. José Maria Monteiro de Barros, ficando viúva um ano após o casamento e falecendo logo depois, deixando um filho, José Cândido Monteiro de Barros que foi criado pela avó.
José Cândido Monteiro de Barros foi educado pelo avô paterno, Visconde de Congonhas e pela avó materna D. Brígida Maria Gonçalves Dias Correia. Estudou no famoso Colégio Caraça, foi vereador à Câmara Municipal de Petrópolis, ocupando por várias vezes a presidência da mesma, tinha a patente de Ten. Cel. Da Guarda Nacional, foi condecorado pelo governo imperial com a Ordem da Rosa e recebeu do mesmo o pergaminho de Moço Fidalgo. Foi proprietário das fazendas do Retiro de São Tomás e São Luís, Engenhoca, Arca, Rio da Cidade, Benfica de Santo Antônio e Arca, imensos latifúndios.
A Arca acabou sendo dividida em vários sítios e a sede da fazenda acabou sendo adquirida pelo Cardeal D. Sebastião Leme que a transformou num local de veraneio de férias dos alunos e professores do Seminário São José, dando-lhe o nome de “Seminário de São Joaquim da Arca”.
Na partilha dos bens do casal Manuel Correia da Silva e Brites Maria de Assumpção a Fazenda de Santo Antônio coube a um dos filhos do casal, Agostinho Corrêa da Silva Goulão que denominou a propriedade de Engenho de Nossa Senhora da Soledade. Agostinho era doutor em leis pela Universidade de Coimbra e, inicialmente, dedicou-se em nosso país ao magistério, desempenhando as funções de lente de Filosofia e Retórica. Sobre ele informa Antônio Machado: “se constituiu lavrador de largo descortino; sua propriedade veio a ter organização das mais completas de seu tempo. Os cereais, o café, a cana de açúcar, tiveram ali cultivo desenvolvido; a exportação foi considerável e proporcionou recompensa valiosa. Fez-se muito rico o fazendeiro-doutor” (7).
(7) LACOMBE, Lourenço Luís. Ruas de Corrêas e outras crônicas. In: PREFEITURA MUNICIPAL DE PETRÓPOLIS. Trabalhos da comissão do Centenário. Petrópolis, 1940, p. 31. 3 v.
Faleceu Agostinho Corrêa da Silva Goulão em 10 de novembro de 1847, sendo amortalhado com o hábito da Ordem Terceira de São Francisco. Por disposições testamentárias libertou todos os escravos que lhe haviam servido, deixou seus bens aos seus sobrinhos, as terras da Tapera a uma escrava de nome Isabel, um sítio banhado pelo Córrego do Carvão a uma outra de nome Júlia e a propriedade da fazenda a Gregório José Teixeira.
Consta que Gregório José Teixeira vendeu sua propriedade a Irineu Evangelista de Souza, pela quantia de trinta contos de réis, a qual foi arrendada ao comendador Francisco José Fialho, tabelião no Rio de Janeiro, onde possuiu inúmeras propriedades, o qual por ocasião da falência de Mauá, a comprou ao Banco do Brasil, liquidatário do Visconde. Posteriormente, os herdeiros do comendador Fialho a venderam a Argemiro Hungria Machado, sendo a sede da fazenda restaurada em 1944 pelo arquiteto Lúcio Costa, encontrando-se em perfeito estado de conservação, inclusive o belíssimo Oratório consagrado a Nossa Senhora da Soledade.