Após ter sido tropeiro, comerciante, pequeno proprietário de terras e exercido a profissão de dentista, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, pediu e obteve permissão para assentar praça na Companhia de Dragões de Vila Rica.
Nas fileiras, segundo nos informa José Oiliam, “… fez-se logo admirado dos superiores e querido dos companheiros e subordinados, pela presteza, lealdade e generosidade que sabia colocar em suas atitudes”. (1)
(1) OILIAM, José. De Tiradentes. Editora Itatiaia Ltda., Belo Horizonte, 1985.
Logo adquiriu grande notoriedade pela forma como cumpria as ordens recebidas. Tal fato é testemunhado pela maneira como sem se deixar intimidar pela projeção social dos irmãos Vidal Barbosa, proprietários da Fazenda de Juiz de Fora, efetuou a prisão dos mesmos, por terem se negado a entregar à justiça um casal de fugitivos.
Como militar prestou inestimáveis serviços, escoltando Dom Rodrigo José de Menezes em suas famosas andanças pelo interior da Capitania, construindo o Caminho do Menezes que cortava o sertão, atravessando o leste mineiro e examinando os terrenos para verificação da existência ou não de ouro aproveitável.
É provável que por todos estes serviços e pelo amplo conhecimento que Tiradentes tinha dos caminhos de Vila Rica para o Rio de Janeiro, que D. Maria I, rainha de Portugal, por carta régia, lhe tenha concedido a patente de Comandante da Patrulha do Caminho Novo, com a finalidade de impedir o contrabando de ouro e diamantes e livrar a região dos assassinos e ladrões que assaltavam os sítios e fazendas e despojavam de seus bens os que transitavam nos citados caminhos.
No desempenho de suas funções Tiradentes agiu com a presteza que lhe era peculiar, realizando incursões arriscadas e prendendo inúmeros malfeitores, desbaratando inclusive o bando do famoso contrabandista Joaquim Montanha.
Assim, em suas viagens pelo Caminho Novo, fosse para cumprir suas tarefas militares, fosse para tratar de assuntos ligados à Inconfidência, Tiradentes costumava repousar no sítio da Varginha (Queluz de Minas) e no sítio de Cebolas (hoje distrito de Paraíba do Sul). Do mesmo modo, ao atravessar a Variante do Caminho Novo, construída por Bernardo Soares de Proença, é provável que se hospedasse em Correias, único local ao longo do citado caminho que, na época, oferecia condições satisfatórias de hospedagem.
Ali ficava localizada a casa do Padre Correia, descrita pelo viajante austríaco Emannuel Pohl, em 1818, do seguinte modo: “à entrada, um terreiro de seus 300 pés de comprimento e outros tantos de largura, formava um quadrado; duas gameleiras (figueiras) bravas de invulgar altura e espessura, chamavam à atenção dos viajantes. Para traz estavam as espaçosas senzalas e afinal o edifício principal fronteiro à casa térrea, sobre o comprido, para hospedagem dos viajantes. Ao sul notava-se espaçoso rancho” (2).
(2) POHL, Emannuel J. Visitantes Estrangeiros de Petrópolis. Tipografia Ipiranga, Petrópolis, 1942.
Com relação às citadas figueiras, formou-se segundo nos informa o saudoso historiador Antônio Machado “a lenda de que numa das famosas árvores, estivera preso, de pulsos nas algemas, o precursor da Independência quando seguia escoltado para o local do patíbulo…” (3).
(3) MACHADO, Antônio. Tiradentes e Petrópolis. Tribuna de Petrópolis, 21 de abril de 1946.
Entretanto, o próprio Antônio Machado concluiu ter sido isto impossível, já que Tiradentes foi preso no Rio de Janeiro e lá, depois de longo julgamento enforcado.
Sabe-se, contudo, que após a prisão dos inconfidentes em Minas Gerais foram os mesmos enviados acorrentados ao Rio de Janeiro. O fato inclusive foi registrado pelo pintor Antônio Parreiras, num quadro de sua autoria, intitulado “Jornada dos Mártires”, que se encontra no Museu Mariano Procópio. Sabe-se, também, que após o enforcamento e esquartejamento de Tiradentes foram seus despojos metidos em salmoura e conduzidos do Rio de Janeiro, em grandes sacos de couro, por oficiais da justiça até Paraibuna, onde começava a jurisdição do governador de Minas, quando então foram pregados em postes altos para que o tempo os consumisse.
Acreditamos que aos troncos das lendárias figueiras podem ter pernoitado acorrentados os companheiros do mártir da liberdade do Brasil, ou, quem sabe, os sacos de couro contendo os restos mortais do paladino da liberdade. Do contrário, como explicar o fato da recordação do episódio, embora com distorções, ter permanecido por tanto tempo na alma popular?
Tal fato levou Humberto de Campos a escrever na Tribuna de Petrópolis, de 21 de setembro de 1938, inspirado artigo, no qual afirma “que as árvores tem alma, como as criaturas humanas” e reportando-se ao acontecido à sombra daquelas figueiras, indaga: “Quem sabe, se as lendas sobre Tiradentes não foram sussurradas aos homens pela figueiras, as quais, com essa mentira, quiseram, apenas, ver-se respeitadas pelo machado sacrílego dos antigos lenhadores da serra? ” (4).
(4) CAMPOS, Humberto de. As árvores tem alma. Jornal de Petrópolis, 21 de setembro de 1938.