POSSE DE ALESSANDRA BETTENCOURT FIGUEIREDO FRAGUAS

Alessandra Bettencourt Figueiredo Fraguas, associada titular, cadeira n.º 27, patrono José Thomáz da Porciúncula

Senhores e senhoras,

É com grande respeito que me dirijo ao presidente deste Instituto, senhor Luiz Carlos Gomes, e aos demais associados e associadas, lembrando-me dos de ontem e dos de hoje, reconhecendo suas importantes contribuições para a escrita da história de Petrópolis e para a preservação do nosso patrimônio cultural, em trabalhos de pesquisa e divulgação, que marcam a trajetória septuagenária do Instituto Histórico de Petrópolis.

Não poderia deixar de formalizar um agradecimento especial à historiadora Maria de Fátima Moraes Argon que, acreditando em meu trabalho, indicou o meu nome à apreciação dos membros do IHP.

Esta indicação foi referendada pelos senhores Paulo Roberto Martins de Oliveira e Luiz Carlos Gomes, aos quais espero fazer jus à confiança em mim depositada, contribuindo de forma eficaz para a historiografia petropolitana.

Para este ato de posse coube-me a tarefa de escrever sobre o patrono da cadeira n.º 27, que passo a ocupar: o Dr. José Thomáz da Porciúncula. Tarefa paradoxal, porque, se por um lado, certamente um agente social com uma trajetória política tão profícua é objeto de estudo que permite muitos desdobramentos temáticos para a pesquisa histórica, por outro lado, o exíguo tempo para a pesquisa, o que dificultou o acesso a fontes primárias, levou-me a um recorte bastante pontual, que passo a expor.

O Dr. José Thomáz da Porciúncula, médico e político nascido em Petrópolis, em 25 de dezembro de 1854, foi eleito para a primeira Câmara Municipal de Petrópolis, em 1859, mas não chegou a entrar em exercício. Sua carreira política ganhou destaque como ardoroso republicano, tendo cumprido dois mandatos como deputado provincial entre 1881 e 1887.

Foi presidente do Clube Republicano de Petrópolis e, após a Proclamação da República, em 1890 foi designado Presidente do Maranhão, cargo que correspondia ao de atual Governador de Estado. Em 1892, tornou-se Presidente do Estado do Rio de Janeiro, o primeiro eleito diretamente, cargo que ocupou até 31 de dezembro de 1894.

É neste período que enfrentou a primeira Revolta da Armada, quando a cidade de Niterói, transformada em praça de guerra, deixou de ser a capital do Estado, a qual foi transferida para Petrópolis em janeiro de 1894.

Como presidente do Partido Republicano Fluminense, ligado ao Partido Republicano Federal, este criado em julho de 1893, ocupou o cargo de Ministro Plenipotenciário no Uruguai e cumpriu ainda os mandatos de Deputado Federal entre 1895 e 1897 e Senador de 1897 a 1901, quando faleceu, precocemente, aos 46 anos, nesta cidade.

A trajetória política de José Thomáz da Porciúncula, aqui recuperada a partir de pesquisa bibliográfica, tendo como fontes os Trabalhos da Comissão do Centenário de Petrópolis e os artigos dos pesquisadores Jeronymo Ferreira Alves Netto e Francisco José Ribeiro de Vasconcellos, publicados no site do IHP, leva a uma reflexão mais aprofundada sobre a crise política do Estado brasileiro na primeira década que sucedeu à Proclamação da República, como demonstrou o historiador José Murilo de Carvalho, em sua tese emblemática sobre Os Bestializados: O Rio de Janeiro e a República que não foi.

Seja a partir de sua designação como Presidente do Maranhão, onde ficou por seis meses, a fim de articular as bases políticas do novo governo com os poderes locais, seja como Presidente do Rio de Janeiro, quando a Revolta da Armada indicou toda oposição ao governo florianista e, talvez, seja um dos melhores indicadores destes anos conturbados, que o cientista político Renato Lessa, em A Invenção Republicana, chama de período de entropia, entendido como associação do estado de anarquia e elevado grau de incerteza, a partir da ruptura das bases políticas definidas pela ordem imperial.

Seja ainda como defensor do prudentismo e, depois, do governo do Presidente Prudente de Moraes (1894-1898), quando emergiram grandes problemas para a institucionalização da nova forma de governo, reais desafios para a sobrevivência da República. Ou como presidente do Partido Republicano Fluminense, como dito, ligado ao Partido Republicano Federal, que tinha como principal característica sua composição a mais eclética possível, onde se agrupavam todos os matizes políticos, desde ex-monarquistas a florianistas exaltados e jacobinos, revelando a suscetibilidade ideológica dos que tinham como desafio arregimentar a República.

Em todos estes pontos, a trajetória política de José Thomáz da Porciúncula se apresenta à historiografia como uma possibilidade para a compreensão de questões mais amplas, como a consolidação do governo republicano, por exemplo. Como tentei mostrar muito sucintamente, uma análise aprofundada de uma trajetória individual pode trazer à tona novas perspectivas, ou contribuir, para o desvelamento de problematizações historiográficas.

Em outras palavras, a trajetória política de José Thomáz da Porciúncula pode ser pensada como um flash, um recorte microscópico, que permite ao pesquisador entender e repensar um universo macro-estrutural: a instauração de uma nova forma de governo.

Finalmente, esta breve exposição me confere a oportunidade de apresentar minhas posições teóricas, já que, no meu entendimento, uma trajetória individual não pode ser analisada descolada da estrutura social que a condiciona. É de forma dialética que penso a relação entre os agentes da história e a estrutura social e, por isso, não poderia falar sobre o Dr. José Thomáz da Porciúncula prescindindo de pensar na estrutura social de forma geral, e no campo político e nas lutas políticas que, se não determinaram suas ações, certamente deram o sentido do jogo entre o indivíduo e a sociedade.

A História é complexa. Espero poder cumprir minhas atribuições como associada titular do Instituto Histórico de Petrópolis, e colaborar para com o esforço hercúleo que o ofício de historiador traz consigo, que é justamente o de analisá-la em toda a sua complexidade. Para isto, tenho como princípios básicos a necessidade de um trabalho conjunto, que leve em conta as contribuições dos que nos antecederam e permita a troca de conhecimento entre os que hoje desempenham a tarefa de escrever a história, além da aceitação da interdisciplinaridade com os diversos ramos das ciências sociais, e o reconhecimento de que qualquer contribuição será sempre uma parcela do que efetivamente seria possível.

No entanto, certa de que, como afirmou Max Weber, um dos pilares da Sociologia, “não teríamos alcançado o possível, se não tivéssemos tentado infinitas vezes o impossível”, espero dar o melhor de mim para que o meu desempenho no Instituto Histórico de Petrópolis seja adequado às expectativas que hoje se delineiam.

Muito obrigada a todos.