ALMIRANTE DUQUE DE SAXE (O)
Carlos Tasso de Saxe-Coburgo e Bragança (Dom), Associado Correspondente
Pouco antes da segunda visita da Rainha Victória e do Príncipe Consorte Alberto ao Rei Luís Philippe dos Franceses, no Castelo d`Eu, a fim de estabelecer a famosa “Entente Cordial”, nascia naquele Castelo, no dia 9 de agosto de 1845, Luís Augusto, Maria, Eudes de Saxe-Coburgo e Gotha, Duque de Saxe.
O jovem rebento era neto do Rei Luís Philippe, que por sua vez era filho da Princesa Clementina e do Príncipe Augusto de Saxe-Coburgo, primo da rainha Victória. Winterhalter, num dos seus grandes e maravilhosos quadros, no qual registrou a visita dos monarcas ingleses, retrata o recém-nascido nos braços maternos, entre as duas rainhas, a da França e a da Inglaterra. Esta famosa tela é sem dúvida um retrato histórico da maior raridade. Para completar esta extraordinária casualidade, devemos mencionar também, entre outras, a presença dos príncipes de Salerno. O Príncipe era o irmão da Rainha dos Franceses, e sua esposa era a irmã mais jovem da nossa Imperatriz Dona Leopoldina.
O batizado solene do pequeno Duque de Saxe se realizou no dia 27 de setembro de 1845, na capela de Santa Cruz, sempre no Castelo d`Eu, pelo vigário local, Metropolitano de Rouen. Os padrinhos foram, para completar as diversas coincidências, os Duques de Nemours, pais do Conde d`Eu.
Podemos afirmar que o pequeno Luís Augusto teve todas as prerrogativas para um feliz e promissor início de vida.
Os pais, naquele tempo, residiam num palácio em Coburgo, a pitoresca capital do Ducado, vindo frequentemente a Paris, a fim de visitar os avôs maternos. Em 1848, com a queda do Rei Burguês, as coisas mudaram, e os pais de Luís Augusto transferiram-se para Viena, onde ele passou a infância. No verão, eles recolhiam-se no Castelo de Ebenthal, uma pitoresca propriedade, distante 60 km de capital austríaca.
Luís Augusto e o irmão mais velho, o Príncipe Philippe, receberam uma esmerada educação e um acurado ensino por parte de ótimos professores. Foram preparados para enfrentar bem a vida. Luís Augusto estava destinado a secundar o irmão mais velho na administração do grande morgado, herdado da avó paterna, a Princesa Antónia de Koháry, na Boémia e na Hungria.
Luís Augusto era um amante da natureza, das florestas e das montanhas, acompanhando o pai a excursões e diversas caçadas. O seu interesse, todavia, era o mar. Sonhava grandes viagens, em países distantes, lia livros sobre as Marinhas, sobretudo aquela inglesa, a mais poderosa do mundo, naquele tempo. Insistiu com os pais e conseguiu ser admitido, em 1861, na Academia Naval Austríaca, em Trieste. Aquela linda cidade, com um importante porto, a partir de 1918, passou para os domínios da Itália.
O Arquiduque Ferdinando Maximiliano, irmão do Imperador Francisco José, na ocasião, era o Comandante em Chefe da Armada, antes de se jogar na aventura mexicana. Ele muito incentivou o jovem Duque de Saxe, assim como a seus pais, para que este viesse para Trieste, assegurando que acompanharia atentamente sua carreira. Realmente, com espírito severo e com grande interesse, Maximiliano seguia os progressos do jovem, e através da esposa, a Arquiduquesa Carlota, enviava notícias aos familiares. Nos dias de folga, Luís Augusto era convidado a almoçar em Miramar, o Castelo de residência de Maximiliano, onde naturalmente não podia evitar um pequeno interrogatório por parte do Arquiduque, o qual, ao mesmo tempo, o incentivava dando-lhe valiosos conselhos. O Duque de Saxe, mesmo nos anos futuros, sempre manteve um contato e uma grande admiração por esse homem notável que foi Maximiliano, tão culto e dinâmico. Ao apreender o seu triste e injusto fim em Querétaro, ficou muito abatido e revoltado. Luís Augusto, conforme se percebe na correspondência da Arquiduquesa Carlota, e também na documentação naval, foi um brilhante estudante, consciencioso, pontual, sério, cumpridor dos seus deveres, entusiasmado e dedicado à Marinha.
Por ser brilhante nos estudos, pela sua maneira afável e pelo espírito democrático, conquistou imediatamente os colegas, que muito o estimavam. Esteve embarcado diversas vezes durante esse período, todavia a sua última viagem de instrução realizou-se nos primeiros meses de 1863, a bordo do cruzador “Saida”, uma das glórias da Marinha austríaca. Estiveram no Pireu, em Atenas, Odessa, Constantinopla, naquele tempo capital do Império Otomano. Tão logo o sultão foi informado que o jovem Duque de Saxe estava a bordo, quis conhecê-lo e o convidou para assistir a uma grande manobra militar, da qual participariam 20 000 homens. Luís Augusto gostou do sultão. Este foi gentilíssimo, mostrou-lhe o Palácio, convidou-o para jantar e depois o conduziu até a chalupa que o levaria a bordo. Tudo tinha transcorrido muito bem, mas a grande dificuldade, durante a visita foi a conversação, pois o monarca somente falava o árabe. Por sorte, tiveram um intérprete.
O jovem príncipe tinha sido buscado e devolvido a seu navio pela chalupa de gala do Palácio, com as bandeiras da Áustria e aquela do Império Otomano hasteadas. A chalupa tinha vinte marinheiros em uniforme de gala, que remavam a embarcação. Terminada a travessia do regresso, o timoneiro se levantou e foi saudar o Duque, o qual agradeceu, efusivamente, todas as gentilezas e o ágil transporte. À essa altura, o timoneiro pediu uma gorjeta para toda a tripulação, pegando o jovem homenageado de surpresa. Este não tinha trocados, e então “foi-se” um quarto de sua mesada, mas, com este gesto tão generoso, ele comprovou uma bonita figura. Na volta, naturalmente, os colegas perguntaram gracejando se ele não havia sido convidado a visitar o harém do sultão e se tinha visto as moças, que diziam serem lindas. Seguiram-se os exames finais, que foram muito severos. Depois das provas escritas, enfrentou os exames orais. Foram duas horas, diante de uma comissão mista de professores e oficiais de Marinha. O Príncipe se saiu muito bem e os resultados foram ótimos. No arquivo Coburgo em Viena, se conserva o telegrama do Arquiduque, enviado aos pais do jovem marinheiro, com o seguinte teor: “Felicito-vos, de todo coração, pelo brilhante exame e estou feliz em poder nomear Vosso filho oficial”. Luís Augusto estava feliz, pensava em desfrutar de uma pequena pausa, mas poucos dias depois precisou embarcar, e seguir com toda a Marinha para o norte da Europa. A Áustria tinha entrado em guerra, ao lado da Alemanha, contra a Dinamarca. Era sabido que a frota daquele país era particularmente aguerrida. Houve, no começo, trocas de tiros, mas alguns dias depois, deflagrou-se uma violenta batalha, perto da ilha de Sylt, na qual a Áustria aniquilou a frota inimiga. Luís Augusto se bateu com extrema coragem, foi particularmente mencionado e elogiado, recebendo a Cruz de Guerra de primeira classe. A guerra havia terminado e a Dinamarca se rendeu.
Luís Augusto estava ainda embarcado quando soube que deveria seguir a Viena e pedir uma licença de seis meses à Marinha, na qual havia tão bem iniciado a sua carreira. Chegando em casa, ele soube que deveria seguir para o Brasil nos próximos dias e que o primo Gastão de Orléans o estaria aguardando para realizarem a viagem juntos. O motivo da viagem: Dom Pedro II estava procurando dois noivos para as filhas, e o Príncipe de Joinville tinha escrito para a irmã Clementina que Luís Augusto seria, por indicação dele, destinado à mais velha. Uma notícia que o colheu completamente de surpresa. Fez as malas, abraçou os pais e os irmãos e seguiu o seu destino. A Princesa Clementina estava feliz, mas o jovem candidato parecia incerto, pois casar aos 19 anos lhe deveria parecer cedo, e ainda mais, sem conhecer a moça. A carreira naval, tão bem iniciada, tomou um outro rumo com a viagem ao Brasil. O Conde d‘ Eu, acompanhado pelo homem de confiança dos Orléans, o General Conde Christian Dumas, já o estavam aguardando ansiosamente em Londres.
Seguiram juntos, via Lisboa, onde o Rei Dom Fernando II os recebeu com a sua proverbial gentileza, juntamente com o filho, o Rei Dom Luís. Chegaram ao Rio no dia 2 de setembro 1864. No dia seguinte encontraram, em São Cristóvão, a Família Imperial.
Parece-me desnecessário, descrever agora os acontecimentos já bastante conhecidos, relatados também, detalhadamente, no meu livro “A Intriga”. A velocidade com a qual se passaram os acontecimentos parece inacreditável. Os casamentos das princesas se realizaram, no dia 15 de outubro, com o Conde d`Eu, e no dia 15 de dezembro, aquele com o Duque de Saxe.
Poder-se ia perguntar porque as duas princesas não casaram no mesmo dia. A razão é muito simples. Faltava a autorização para poder casar ao Duque de Saxe, a qual deveria vir do Duque Reinante de Saxe-Coburgo, Ernesto II. Esta autorização chegou no fim de novembro. Ao contrário, o pai do Conde d`Eu, o Duque de Nemours, sabidamente e de acordo com o plano do Príncipe de Joinville, já a havia enviado antes da chegada do filho no Rio de Janeiro. Esta foi uma demonstração bem clara que o casamento do Conde d`Eu era já acordado com Dona Isabel anteriormente, ou pelo menos estas eram as intenções. Tanto o Conde d`Eu, como Dom Pedro II tinham pressa em realizar o quanto antes, pelo menos o matrimônio autorizado. As belas e românticas palavras de Dona Isabel, escritas anos mais tarde, diziam: “Pensava-se no Conde d`Eu para minha irmã, e no Duque de Saxe para mim. Deus e os nossos corações decidiram diferentemente” – não correspondiam à realidade, pois não foram, nem Deus e nem os corações, a decidir. Foi uma lenda fantasiosa espalhada, a qual ainda hoje é usada por historiadores cheios de instintos de romantismo. As noivas foram trocadas e, por sorte, os casais foram felizes. Os esposos foram nomeados, Marechal o Conde d` Eu e Almirante o Duque de Saxe. Devemos sublinhar que Luís Augusto nunca aceitou uma remuneração pelos cargos que lhe foram oferecidos por Dom Pedro II. O Imperador Maximiliano não esquecia o seu jovem protegido e amigo, e lhe escreveu uma carta afetuosa de felicitações:
“Cidade do México, 11 de dezembro de 1864.
Caro primo, a última carta nos trouxe a feliz notícia do seu próximo casamento com a minha cara prima Leopoldina. Charlotte e eu nos apressamos em apresentar-lhe e a sua futura consorte os nossos melhores votos. Eu tive o prazer de ver em Petrópolis, no ano 1860, a nossa querida prima, e compreendo plenamente a sua decisão. Agora estamos os dois no novo Continente, no Continente da força e do futuro, ambos oriundos da mesma escola, ambos oriundos da mesma eficiente Marinha, queira o Senhor continuar a nos proteger! Como seríamos felizes, Charlotte e eu, se o jovem casal do Brasil viesse nos visitar. A recepção no México seria certamente afetuosa e não seria um tempo perdido. Enquanto renovo os votos de Charlotte e os meus,
Seu caro Primo, o seu primo leal e amigo.
Maximiliano. ” (A Intriga, p. 176).
Esta carta tão afetuosa e amiga do Imperador do México, bem demonstra a grande estima e amizade que os ligava. Maximiliano tinha uma grande admiração por Dom Pedro II, e nota-se que o Império do Brasil era um exemplo para formar e consolidar o seu reino. A sorte não o quis.
Depois de casado com Dona Leopoldina, o Duque de Saxe teve dois objetivos. Estabelecer-se no Rio, pois gostara imensamente do Brasil, e tornar-se útil ao Imperador na Marinha, seguindo, como voluntário, para a Guerra do Paraguai. O seu ímpeto patriótico lhe foi negado pelos os mais diferentes motivos. Um desses motivos parece ser o de que o Imperador não queria envolver, naqueles momentos, os genros na guerra, para não alertar as potências aliadas. Diante da insistência de Luís Augusto, todavia, o Imperador finalmente acedeu em levá-lo consigo ao front. Esse foi um passo adiante, mas não era uma viagem para cumprir uma ação, mas sim uma caminhada de expectador. Não tinha função, portanto não podemos nos surpreender se um historiador apressado o tivesse considerado como desinteressado. Estava ele de mãos atadas, quando queria estar em uma das naus, na linha da frente.
Finalmente, no dia 10 de junho de 1865, ele pode acompanhar Dom Pedro II, embarcando no vapor “Santa Maria” para o Rio Grande do Sul. Vinha junto o Ministro da Guerra Moniz Ferraz. O Conde d`Eu à essa altura estava com a Princesa Isabel em viagem de núpcias na Europa, vindo juntar-se ao Imperador em Uruguaiana.
O Duque de Saxe teve ocasião de participar do encontro dos três chefes de Estado, Dom Pedro II, os Presidentes Mitre, da Argentina, e Flores, do Uruguai. Foi sem dúvida um encontro histórico e ao mesmo tempo pitoresco. Foi simples, sem qualquer cerimônia, num pomar de laranjeiras. O comandante brasileiro da rendição de Uruguaiana foi o General Barão Porto Alegre. O Duque de Saxe teve o grande prazer de encontrar o Almirante Tamandaré, que ele achou muito agradável, resoluto, sem dúvida uma grande figura e divertido. Ambos embarcaram juntos, no dia 17, para o eventual ataque em Uruguaiana no dia seguinte. No dia 18 de setembro, o dia do assalto, todas as tropas e baterias estavam formadas. Os três exércitos atacantes mantinham a sua autonomia no ataque. Mandaram uma última intimação ao Coronel Estigarribia, para a rendição, com duas horas de prazo para responder. Logo os paraguaios se entregaram, sem condições. Houve primeiramente a entrega das bandeiras inimigas. Cada um dos Chefes de Estado recebeu uma. O Imperador, sempre a cavalo, assistiu, flanqueado pelos Presidentes, ao longo desfile dos prisioneiros. No dia 22 de setembro, o Duque de Saxe esteve presente quando o Imperador recebeu no acampamento o enviado do governo britânico, Eduard Thorton, que vinha apresentar as desculpas pelo acontecimento de 1863, chamado “questão Christie”. Esta se resolveu favoravelmente para o Brasil, tendo sido mediador o Rei Leopoldo dos Belgas.
Terminada esta fase da guerra, que tantos problemas criou, convém mencionar uma carta do Conselheiro Seitz, que tinha acompanhado o Duque de Saxe à Uruguaiana, para a Princesa Clementina:
“Porto Alegre, 16 de outubro de 1865,
Hoje posso dar felizmente boas notícias. Em Uruguaiana se renderam 6 500 paraguaios. As tropas aliadas eram 17 000 e tinham 4 navios de guerra. Uruguaiana, uma pequena cidadezinha de fronteira, era ocupada pelos paraguaios e, por ordem do Imperador, foi assaltada. O Príncipe (Luís) Augusto estava na nau Almirante, junto com o Almirante Visconde de Tamandaré. O Conde d´Eu estava com a tropa. Pela libertação da Província do Rio Grande, reina um enorme entusiasmo no país. Grandes vão ser os festejos em toda a nação. S.M. e os príncipes vão ser aguardados para breve, pois se embarcaram, com três navios a vapor e seguiram para Pelotas. A clemência do Imperador com os prisioneiros encontrou grande reconhecimento em toda a América. ”
O Duque ficou observando Flores e Mitre, e transmitiu as suas impressões em carta para Dona Leopoldina, a qual as passava para os sogros: “Flores é horrível e um vilão, Mitre tem maneiras muito agradáveis, fala muito bem e é um homem distinto”. Depois de várias visitas e inspeções voltaram para o Rio, onde foram todos calorosamente acolhidos. Daquele momento em diante a guerra foi conduzida por Caxias, o qual derrotou definitivamente Lopes. O Conde d`Eu, terminou este triste período com muito brilho, depois de ter sido nomeado por Dom Pedro II Comandante em Chefe do Exército brasileiro.
Voltando ao Rio, os duques de Saxe foram procurar uma casa. Compraram uma propriedade adjacente ao parque do Palácio São Cristóvão. Ficou na história, como sendo o Palácio Leopoldina, na Rua Duque de Saxe, hoje General Canabarro. A Princesa Dona Leopoldina tinha a possibilidade de visitar frequentemente os pais, e estes, duas vezes por semana, vinham jantar com a filha e o genro.
O Duque de Saxe, como já mencionei, quis sempre participar dos combates. Entretanto, Dom Pedro II sempre o resguardou. Um dos motivos poderia ter sido o fato de não querer os genros imiscuídos diretamente nesta luta, diante das potências aliadas. Em 7 de outubro 1867, o Imperador nomeou o Duque de Saxe, Vice-presidente do Conselho Naval. Foi um ato muito gentil, um encargo honroso, vista também a sua idade, mas uma incumbência burocrática no meio de ilustres almirantes, que já se haviam cobertos de glória. Não era a posição justa para ele. O Príncipe de Joinville lhe havia dado tantas esperanças, em posições nas quais ele poderia ter desenvolvido uma outra e mais prestigiosa atividade. Teria sido uma tática para animá-lo a seguir para o Brasil? Já havia dado baixa na Armada Austríaca, não podia mais voltar atrás.
Apesar de ser muito estimado pelos imperadores, que o tratavam como a um filho, entrou num estado de frustração. O Conde d`Eu não se fazia ver, mesmo por um gesto de camaradagem, ou de apoio. Esta foi também a mesma tática com relação aos futuros filhos do Duque de Saxe. Uma espécie de medo o levava a procurar esquecer de suas incômodas existências, tão indesejadas. Uma atitude realmente hereditária. Dona Isabel e Dona Leopoldina, no entanto, se frequentavam o mais possível e mantinham viva a antiga amizade.
O Duque de Saxe, quando veio ao Brasil, estava acompanhado pelo Conselheiro Adam Seitz, um homem de grandes qualidades, de notável retidão e cultura. Ele manteve com os pais de Luís Augusto uma constante e detalhada correspondência, enviando notícias sobre o casal, sua posição na corte, as atividades do jovem Duque, a situação do Brasil e das intrigas do General Dumas. Em uma dessas cartas, do começo de 1867, ele escrevia: “Sua Majestade até agora, não designou o Príncipe para uma atividade na Marinha do Brasil, e assim ele fica com a Princesa a maior parte do tempo em casa”.
Por sorte, no dia 2 de maio 1868, chegou ao Rio o irmão mais velho do Duque, o Príncipe Philippe. Este era um homem muito ativo, interessado em botânica e muito progressista no desenvolvimento de suas atividades agrícolas em suas diversas propriedades. Como muitos príncipes da época, foi um grande caçador e viajante de países desconhecidos. Ele escreveu diversos livros sobre as suas caçadas, inclusive aquelas realizadas em diversos pontos do Brasil. Ele casaria, em 4 de fevereiro de 1875, com a Princesa Luísa, filha do Rei Leopoldo II da Bélgica. Foi muito bem recebido pelos imperadores, que lhe ofereceram um grande jantar e concederam-lhe a Grã-Cruz da Imperial Ordem do Cruzeiro. Entendeu-se bem com o Imperador. Apesar de que Dom Pedro II nunca tivesse caçado em sua vida.
O Imperador lhe abriu a Fazenda Santa Cruz, e lhe ofereceu as possibilidades de caçar nos arredores do Rio e de Petrópolis. Os dois irmãos foram juntos até ao rio Paraibuna, numa bem-sucedida excursão venatória. Grande interesse tinha o Duque de Saxe, assim como o seu irmão, em conhecer as cidades históricas de Minas Gerais, as matas do interior e a região do rio São Francisco. Resolveram assim, realizar uma verdadeira expedição. O programa era vasto e bem planejado, deixando uma recordação não indiferente no meio científico e na opinião pública daquela época. Levaram um bom fotógrafo, na pessoa de Augusto Riedel, o ajudante do Príncipe Philippe, o Capitão Ternes, quatro servidores e diversos tropeiros. Riedel fotografou as principais localidades, produzindo um álbum que o Duque de Saxe ofereceu a Dom Pedro II, o qual hoje, se encontra no Arquivo da Biblioteca Nacional. Infelizmente não ficou conservado o diário dessa viagem. Numa carta do Conselheiro Seitz ao Príncipe Philippe ele escreveu que estava passando a limpo as anotações, tendo já alcançado seiscentas páginas. Temos notícias somente por algumas cartas que Dona Leopoldina dirigiu aos sogros em Viena, e por uma carta do Capitão Ternes.
No dia 4 de junho de 1868, os dois príncipes iniciaram a longa viagem. A primeira etapa foi em Barbacena. A viagem devia ser bastante cansativa, mas muito interessante.
Passavam os dias a cavalo. Em Ouro Preto, foram festivamente recebidos. Visitaram encantados a linda cidadezinha e admiraram as obras do Aleijadinho. Inspecionaram as minas de ouro em Morro Velho, descendo os dois príncipes, pela escada ao fundo da mina. A viagem seguiu, com pequenas paradas, nas quais puderam admirar as principais igrejas e prédios históricos, em Mariana, Diamantina e Montes Claros. Chegaram finalmente até Januária. Estavam à beira do rio São Francisco. Admiraram em Januária a vivacidade e o movimento do porto comercial. Apesar de ser uma cidade pequena, naquele tempo, tinha uma grande importância econômica.
Contrataram um barco com dezesseis remadores para descer o grande rio até Juazeiro. Iniciaram uma viagem, relativamente calma, mas certamente aventurosa, com muitas paradas, pois chegaram em Juazeiro somente após quatorze dias. O barco também não devia oferecer algum conforto. Comiam aquilo que caçavam, pois ao longo do rio não existiam possibilidades de abastecimento.
A fauna e a flora que viam os devia ter deslumbrado, pois em 1879 o Duque de Saxe empreenderia uma nova exploração, desta vez, de caráter botânico. Juazeiro, naquele tempo, devia ser um lugarejo sem qualquer conforto ou atração. Chegaram com os seus remadores sem ter tido qualquer problema, mas o pequeno vapor, que devia levá-los até as cataratas, estava em avaria, e assim seguiram a cavalo. Depois de vinte léguas, notaram que não se encontrava água e que faltava forragem para os cavalos. Não restou outra solução a não ser a de continuar o trajeto por via fluvial, apesar dos perigos perto das cataratas de Paulo Afonso.
Tiveram sorte de encontrar um engenheiro austríaco, o Dr. Kraus, o qual lhes pôs à disposição uma espécie de balsa, ou jangada, constando de duas embarcações ligadas com tabuas entre si. Uma verdadeira aventura, pois tinham que superar vinte e quatro saltos do rio, o qual corria, naquele trecho, com uma certa velocidade. Com esta emergência, chegaram, finalmente, e com muita sorte, em Vargem Redonda. A cavalo foram ver as maravilhosas cataratas, e ficaram impressionados com esta notável obra da natureza. Viram a lápide da visita de Dom Pedro II às cataratas, realizada em outubro de 1859. Finalmente, em Paranhos, os atendia um vapor que os levaria a Penedo. Penedo era uma pequena vila, na época, mas com uma certa importância, pois controlava à foz do rio da “integridade nacional”.
A linda, cansativa, mas realmente interessante viagem terminou com uma visita a Salvador. Viram com profundo interesse esta joia da nossa arte colonial, e, com pesar, tiveram que voltar ao Rio, aonde chegaram no dia 16 de agosto. Poucos dias depois, o Príncipe Philippe teve que voltar para a Europa, levando muitas saudades, como se pode ler nos seus livros “Caçadas nas 4 partes do Mundo”. O Duque de Saxe voltou com muitas saudades para casa ansiando poder abraçar a família, Dona Leopoldina e o pequeno Dom Pedro Augusto, que tanta satisfação dava também a Dom Pedro II e à Imperatriz.
No dia 6 de dezembro de 1867 nascia, em Petrópolis, Dom Augusto, o futuro Príncipe Marinheiro do Brasil e o primeiro neto do Imperador, a ver a luz do dia naquela bela cidade. No dia 21 de maio de 1869, nascia no Palácio Leopoldina, no Rio de Janeiro, o Príncipe Dom José. Foi uma grande alegria para a família. Dom Pedro II, que logo após o parto foi visitar a filha, na saída encontrou o Conselheiro Seitz e o saudou dizendo: “Senhor Seitz, um Príncipe, um Príncipe !!!” (A Intriga, p. 279). Mais um herdeiro, devia pensar o extremoso avô.
Em abril, com a volta de Caxias da Guerra, o Imperador nomeou o Conde d`Eu, comandante em chefe das tropas, no lugar do Duque de Caxias. O Duque de Saxe, que tanto havia pedido para participar nesses combates, sentiu-se desencorajado com essa decisão unilateral. Sentiu-se inútil.
Após o solene batizado de Dom José, e depois de ter encarregado o fiel Mordomo Fragoso Jr. de ocupar-se do Palácio e dos seus interesses, resolveu viajar para Europa, para apresentar o recém-nascido aos seus pais.
Embarcou com a família no vapor Douro, no dia 8 de agosto de 1869. Passaram por Londres, onde foram cumprimentar a Rainha Victória, e se encontraram com Dona Francisca e o Príncipe de Joinville. Se estabeleceram em Viena, no Palácio Coburgo, passando temporadas em Ebenthal. Dona Leopoldina passou a conhecer as várias propriedades dos sogros na Hungria e Boémia. Gostou particularmente do Castelo de St. Antal (Santo Antônio), pela sua tranquilidade e pela grande gentileza da população local. O tempo passava e o Dr. Borges Monteiro, o Visconde de Itaúna, sempre os acompanhava, zelando pela saúde da família.
Dona Leopoldina se mantinha em contato epistolar com Dona Isabel, fazendo projetos para voltar ao Brasil. No entanto, estes planos sofreram uma pausa, pois no dia 15 de setembro de 1870, nasceu, no Castelo de Ebenthal, o quarto filho, Dom Luís.
Convidaram os Condes d`Eu para padrinhos, pois estes estavam na Europa numa longa viagem de passeio. Ficaram aguardando a vinda dos padrinhos, os quais, no entanto, adiavam mês a mês sua chegada. Dona Leopoldina aguardava ansiosamente, estava desapontada com os constantes adiamentos do batizado. Finalmente, recebeu a notícia que viriam depois do Natal. O Duque de Saxe não querendo perder os contatos com o Brasil, assinava vários jornais, entre os quais o “Germánia” o principal diário de Petrópolis. Luís Augusto gostava em particular da cidade serrana, na qual tinha passado tantos momentos felizes.
Passaram ainda um Natal feliz e puderam, finalmente, programar o batizado para janeiro. Em meados de janeiro, a Princesa Dona Leopoldina começou a se sentir mal. Era o tifo, que estava grassando por Viena. Depois de dez dias começou a perder os sentidos, entrando num estado de delírio. Naqueles momentos chegaram os Condes d`Eu. Vetaram Dona Isabel de entrar no quarto da doente, por risco do contágio. Não viram mais a Princesa em vida.
Com fortes dores, a pobre Dona Leopoldina faleceu no dia 7 de fevereiro 1871. A morte a colheu com pouco mais de 23 anos. Foi um desespero geral. O viúvo que não se dava paz, os pobres filhos naturalmente não compreendiam a grave desgraça que os tinha colhido. No Brasil os pais estavam aflitos. O Duque de Saxe estava realmente desanimado e profundamente abatido. Choraria a vida toda a sua querida esposa, nunca mais se casaria, apesar de ter ficado viúvo aos 26 anos.
Os funerais da Princesa Dona Leopoldina, foram solenes, austeros e muito sentidos, tanto pela aristocracia quanto pela população de Viena. A Corte Imperial decretou luto oficial por 15 dias. O Imperador Francisco-José, veio pessoalmente, acompanhado pelo seu ajudante, o General Conde de Bellegarde, trazer os seus pêsames, entretendo-se algum tempo na câmera mortuária, aprontada no grande salão do Palácio. Quem deu uma grande assistência espiritual, oficiando também todas as funções religiosas, foi o Núncio Apostólico, Monsenhor Mariano Falcinelli Antoniacci, que conhecia bem os Duques de Saxe, pois esteve como Delegado Apostólico no Brasil. O enterro se realizou em Coburgo, na Cripta da Igreja de Santo Agostinho. Ela repousa agora debaixo das armas da pátria, como as conheceu, as armas do Império.
Os imperadores não se davam paz, como bem mostram as cartas enviadas pela Imperatriz Dona Teresa Cristina ao genro e a seus pais, os quais já tinham Leopoldina como uma filha querida, apreciando muitíssimo suas grandes qualidades humanas.
Os imperadores estavam com o coração apertado, e assim viajaram para Europa, para rezar diante do jazigo da tão chorada filha. Embarcaram no dia 25 de maio do mesmo ano, no paquete Douro para Lisboa. Na capital portuguesa estava Luís Augusto, esperando os queridos sogros. Boulanger, que fazia parte da comitiva imperial, assistiu ao comovedor encontro e descreve o Duque de Saxe, que ele conhecia do Brasil:
“Causa dô o estado do infeliz príncipe. Tem a fisionomia profundamente contraída e está notavelmente magro e pálido. Tanta foi a dor, tantas as atribulações por que passou o seu coração amargurado. S. A. passou para o vapor, abraçou o imperador e a imperatriz, declarando que se submetia também à quarentena para ficar na companhia dos mesmos”. (D. Pedro II na Alemanha, op. cit., p. 30).
O Duque acompanhou os sogros durante quase toda a viagem. Em Coburgo, foram logo visitar o jazigo da querida defunta, na cripta da Igreja de Santo Agostinho. Naquela bela cidade, onde foram recebidos com as maiores honras, abraçaram o pequeno neto, Dom Pedro Augusto, o qual tinha sido trazido pela mão da Princesa Clementina. O menino tinha quase 5 anos, e devia lembrar-se ainda dos avôs, que tanto o haviam mimado.
No dia seguinte voltaram para uma missa, na cripta, e depois de agradecer à família Ducal, seguiram para Viena. No Palácio Coburgo abraçaram os netos, Dom Augusto e Dom José e com grande comoção viram o neto Dom Luís, o qual já tinha quase nove meses. Este já tinha sido batizado, pelo amigo Mons. Mariano Falcinelli Antoniacci, representando os Condes d`Eu a irmã do Duque, a Princesa Amélia.
Dom Pedro II foi visitar o primo, o Imperador Francisco José, que conhecia pelos retratos. Em Viena, o nosso embaixador era Francisco Adolfo de Varnhagen, que o Imperador bem conhecia, tanto do Instituto Histórico como por ter apoiado o ilustre diplomata e grande historiador, financiando a obra do mesmo, a “História Geral do Brasil”, base importante para a nossa história. Dom Pedro II deve ter tido diversos colóquios com Varnhagen, o qual muito insistiu para que os imperadores levassem os dois filhos mais velhos dos Duques de Saxe, para o Brasil. Lá seriam educados e preparados para uma eventual sucessão. Dom Pedro II devia já ter em mente a mesma ideia de Varnhagen. O Duque a aceitou, assim como os avôs paternos. Foi feito tudo em boa Fé, sem algum tratado escrito, o que no futuro deixaria pouca clareza a respeito dos dois pequenos príncipes. Dona Isabel ainda não tinha filhos e talvez se pensasse que nunca os teria, mas estes começaram a aparecer, quatro anos mais tarde. Ninguém tinha pensado no porvir.
O Duque de Saxe, acompanhando os imperadores, levou, em 24 de março de 1872, Dom Pedro Augusto e Dom Augusto para o Brasil. Seriam educados pelos imperadores. A história dos dois netos imperiais é conhecida. Um foi engenheiro e o outro marinheiro.
“No Rio, o Duque de Saxe, com extrema tristeza, visitou o Palácio Leopoldina. Percorreu meditando, sem falar e com os olhos lúcidos, os quartos e os salões, e a cada passo lembrava a pobre princesa”, escrevia Fragoso Jr. ao Conselheiro Seitz, o qual tinha ficado em Viena. (A Intriga, op. cit., p. 319).
Em 31 de julho de 1872, o Duque de Saxe se despediu dos filhos e dos imperadores e dos Condes d `Eu, pedindo ingenuamente aos mesmos que não se esquecessem desses meninos órfãos. No mesmo dia ele teve que seguir para Nova York, onde o aguardava o irmão, o Príncipe Philippe.
Visto o estado de depressão e a profunda tristeza na qual Luís Augusto se encontrava, o irmão Philippe o convidara para uma viagem “ao redor do mundo”, que duraria alguns meses. Portanto, não é verdadeira a afirmação de que o Duque de Saxe tivesse voltado à Europa, conforme afirma um conceituado, mas mal informado historiador, “para uma vida de prazeres”. (BARMAN, op. cit., p. 380.)
Esta viagem, que deveria compreender os Estados Unidos, Polinésia e boa parte do continente asiático, não teria somente o intuito de reanimar o abatido viúvo, mas também gozava de um caráter diplomático e científico. Intentava conhecer personalidades importantes em diversas partes do mundo e realizar pesquisas botânicas em continentes desconhecidos. As caçadas naturalmente também figuravam no programa, enfrentando animais exóticos.
O Duque de Saxe se lembrava que o Imperador Maximiliano, antes do período mexicano, tinha realizado diversas viagens transatlânticas, no Brasil e em outras partes do mundo, para efetuar também pesquisas botânicas. Nesta viagem ele era acompanhado por um médico da Marinha austríaca, o qual era também um renomado botânico. Portanto ninguém melhor do que o Capitão Dr. Heinrich Wawra von Fernsee, para acompanhá-los. Este acedeu com prazer ao encargo, deixando de lado outros trabalhos que estava realizando e pedindo uma longa licença na Marinha.
Wawra também já se encontrava em companhia do Príncipe Philippe em Nova York. O ilustre botânico, nascido em 1831, em Brünn, cidade Chéca, que então pertencia ao Império Austríaco, era um homem de uma grande cultura e um agradável companheiro de viagem. Foi amigo do grande botânico Martius e tinha publicado diversos trabalhos cientificamente relevantes. Esteve em diversas unidades importantes da Armada Austríaca, tendo participado da famosa Batalha Naval de Lissa, na qual a Marinha italiana foi derrotada. Ele foi uma testemunha valiosa, pois acompanhou Maximiliano ao México, quando este foi declarado Imperador naquele país, tendo-o assistido também no último período, em Querétaro. Ouviu muitas confidências do Imperador, as quais nunca tornou públicas.
Depois de alguns dias, durante os quais visitaram New York, seguiram para Philadelphia e para Longbranch, onde estiveram com o Presidente Grant. Este foi de uma grande cortesia e deu ordens para que os ilustres visitantes tivessem acesso a todas as facilidades e assistência. No dia 26 de agosto, o navio do Almirante Rowan os levou, subindo o rio Hudson, até Westpoint, onde foram recebidos, podendo visitar a Academia Militar. Depois rumaram de trem até as cataratas de Niágara, que visitaram longamente. Seguiram para Chicago. E para Amália, onde se encontrava a estação da Pacific Line. A próxima etapa foi uma visita a Salt Lake City, onde visitaram o chefe da comunidade Mórmon, Brigham Young.
Ao continuar a viagem começaram as primeiras pesquisas botânicas. Após quatro dias de viagem, atravessando uma região árida e pouco interessante, chegaram a Humboldt-House. Fizeram algumas visitas nas montanhas da Califórnia e em seguida foram conhecer as “Sequoias”, que os indígenas chamavam as “big trees”. Chegados a São Francisco, embarcaram no navio “Idaho”, que lhes pareceu terrivelmente velho e pouco confiável. Chegaram no dia 21 de setembro a Honolulu. Logo que chegaram, se fizeram anunciar na Casa Real dos Kamehameha.
No dia seguinte, os recebeu o Rei William Charles, um simpático e risonho senhor, já muito europeizado, que conversou com eles sobre música clássica e sobre a beleza dos Alpes. Sua Majestade fez questão de lhes mostrar o seu modesto palácio, e com muito orgulho exibiu o telefone, que acabara de instalar. Faleceu poucos anos depois, sem deixar herdeiros diretos, e assim, em 1898, um grupo de usineiros e industriais americanos deram um golpe de Estado e o reino do Havaí foi anexado aos Estados Unidos.
Ficaram encantados com as ilhas, com diversos vulcões, alguns dos quais eram ainda ativos e com a flora exuberante, a qual os impressionou pela enorme variedade de flores “Hibiscus”. O Dr. Wawra já tinha estado nesse pequeno reino com o então Arquiduque Maximiliano, e conhecia alguns botânicos locais, que vieram cumprimentá-lo.
No dia 25 de setembro, seguiram com o vapor “Newada” para Auckland na Nova Zelândia, completando em 19 dias a viagem. Durante esta longa travessia pararam um dia nas ilhas Samoa. Estas ilhas também os impressionou, mesmo sendo um ambiente e uma população tão diferente, bonita, mas preguiçosa. Ali, alguns aventureiros franceses destoavam naquele exótico ambiente. O Dr. Wawra aproveitou para examinar a flora e eles compraram uma coleção dos minerais próprios daquelas ilhas.
Deixaram a Nova Zelândia depois de várias excursões, colhendo farto material científico e adorando aquela paisagem verde, e em parte com altas montanhas, ainda virgens. A cidade de Auckland, quase um lugarejo naquele tempo, exercia uma especial fascinação. Dava a impressão de se estar numa vila da Escócia. O Príncipe Philippe se interessou muito pelo setor agrícola, querendo ver também as criações de carneiros, da raça “merinos”, conhecidos pela a sua lã especial. A viagem estava longe de ter alcançado a metade de seu percurso, e assim, no dia 24 de outubro, seguiram para Austrália.
A entrada na baía de Sidney foi espetacular, mas todos concordaram que a baía do Rio de Janeiro era insuperável. Em Sidney notou-se logo que de Londres havia vindo uma ordem, pois, já no cais do porto, os aguardava o ajudante do governador britânico, trazendo as boas vindas de S.E. com a ordem de se pôr à disposição dos ilustres visitantes. Gostaram muito da cidade e sobretudo das maravilhosas casas particulares. Recusaram vários convites, pois tinham pressa em estudar a natureza.
Seguiram depois de três dias, num trem especial que o governador lhes tinha posto à disposição, para toda a permanência no país. Começaram a visitar as Blue Mountains. Podiam seguir de trem para onde quisessem e em qualquer direção. Uma maravilha! De Melbourne, no dia 31 de outubro, seguiram para o imenso interior e visitaram Sandhurst, a cidade das minas de ouro. Visitaram as florestas de Eucalyptus. Viram as quantidades dessa espécie que existe naquele país. Entraram numa floresta de eucaliptos perfumados e acharam fantástico o crescimento da espécie. Em cinco a seis anos as árvores podiam ser cortadas. Que diferença com os pinheiros austríacos, que levam pelo menos setenta a oitenta anos para o momento do corte.
Depois de visitar as florestas, fizeram uma caçada aos cisnes pretos e aos cangurus. A Austrália, este imenso país, podia ter minerais de ouro, mas a vegetação era um desastre. “Que diferença com o Brasil”- repetia o Dr. Wawra. “A vegetação do Brasil é única no mundo”. Todos concordavam.
Assim deixaram este país continental, que, todavia, muito interessou também pelas espécies exóticas, que o Dr. Wawra colhia com afinco.
Em 28 de novembro, chegaram em Point de Galle, no Ceilão, hoje Sri Lanka. Desceram do navio para se transferirem para o vapor oficial do governo, que os levou para capital, Colombo, uma pitoresca e dinâmica pequena cidade. Nunca o Duque de Saxe poderia imaginar que justamente em Colombo, dezessete anos mais tarde, desembarcaria do cruzador brasileiro Almirante Barroso, seu filho, o Tenente Dom Augusto, por causa da Proclamação da República no Brasil.
Chegando em Colombo, no cais, foram recebidos pelo Governador Lord Gregory, que os levou para sua residência, a Queens House, onde ficariam hospedados. Como tinha sido avisado, já desde algumas semanas sobre a visita, o governador tinha programado um amplo programa para os dois príncipes. No dia seguinte, num trem especial, seguiram para Candy.
Sendo um dia maravilhoso, se instalaram na locomotiva, de onde avistava-se melhor a lindíssima paisagem. No dia seguinte foram convidados para uma caçada de elefantes. No entanto, acompanhados de alguns assistentes foram colher amostras das plantas exóticas que abundavam. Visitaram em seguida as plantações de café, que os interessaram especialmente. O café era cultivado debaixo da alta vegetação, portanto, à sombra, e as plantas eram baixas, parecendo com aquelas da espécie “caturra”, cultivada no Brasil. Viram também outras qualidades, que estavam sendo experimentadas, pois a cafeicultura no Ceilão estava em fase inicial. Eles eram os grandes produtores de chá. Pernoitaram numa bela e ampla casa sede, na plantação. Acordaram com o grito de macacos, indo depois ver a parte velha de Candy, a antiga capital, a qual os entusiasmou. Viram as raridades do jardim botânico, um dos mais bonitos e guarnecidos do mundo. A noite foi realizada uma grande festa, com a exposição do dente de Buda, no templo de Malagyha. Este dente é uma das maiores relíquias do Buda e é venerado por todos os Budistas no mundo. Na realidade é muito grande e se supõe que é um pequeno dente de elefante. Esta festividade se realiza normalmente no momento da Lua cheia de novembro. Como já havia sido realizada, foi repetida por causa dos visitantes reais.
O Dr. Wawra, já havia colhido as plantas de maior interesse, e assim no dia 2 de janeiro, seguiram viagem para Nagasaki no Japão, onde chegaram após uma forte tempestade, no dia 6. O vapor parou também em Singapura, Saigon, Hong Kong e Shangai, mas somente para a troca de passageiros.
Por causa do inverno não foi possível realizar pesquisas botânicas, e assim visitaram Hiogo e Yokohama. De lá foram conduzidos para a localidade de Jeddo e hospedados no palacete do cônsul inglês. Sofreram muito com o frio, pois a temperatura era de menos 7 graus centígrados. Tinha muita neve e a casa era construída com travessas de madeira e paredes divisórias de papel. Ficaram impressionados, de como a civilização europeia já estava avançando nas construções, destruindo já muitas habitações tradicionais. Foram para Tokyo, onde os recebeu o Mikado, falando um perfeito inglês. No dia seguinte os recebeu a Imperatriz, e ambos foram de uma incrível gentileza, brindando os dois visitantes reais com uma variedade de presentes. Esta generosidade muito os impressionou e ficaram embaraçados em não trazer consigo algum presente para retribuir-lhes.
Voltaram para Yokohama, e no dia 20 de janeiro embarcaram no navio “Menzaleh” para Hong Kong, que não tinham podido visitar na ida ao Japão. Nesta cidade estiveram rapidamente com o governador Inglês, e no dia seguinte partiram para Macau. Este enclave português interessou muito a Luís Augusto, pela sua história e pela ligação com Portugal.
A grande quantidade de bancos e casas de câmbio os deixou admirados, assim como o triste abundar de vendedores de drogas. Era uma cidadezinha portuguesa com influência chinesa, onde era difícil ver rostos europeus. Nesta última cidade, o Dr. Wawra ficou desobrigado da colheita de plantas. O seu trabalho, no momento, era garantir a secagem, a conservação e a catalogação do material coletado.
Seguiram para Singapura e de lá foram visitar o Marajá de Jahore, no interior do encrave, o qual os recebeu com muita gentileza, mostrando-se muito interessado em saber da vida no Brasil e sobre a imigração no país, bem como sobre a origem da mesma. Estiveram no Jardim Botânico e o Dr. Wawra conseguiu sementes de palmeiras desconhecidas nos registros europeus
No dia 11 de fevereiro, eles chegaram na ilha de Java. Foram recebidos com grandes formalidades, em meio a uma estrita etiqueta. Estavam numa colônia Holandesa. O Vice-Rei pôs à disposição dos visitantes sua residência de verão e mandou hastear a bandeira verde e branca da Casa de Saxe-Coburgo. Acharam o ambiente adorável e aproveitaram para descansar alguns dias.
De Buitenzorg, eles aproveitaram para seguir para uma excursão no dia 13 de fevereiro, conhecendo o interior da ilha e examinando a sua vegetação. Para os acompanhar foi designada uma escolta militar, sob o comando do General Meusenbrook. Visitaram o lago de Megamendon, circundado por uma maravilhosa floresta e por uma grande abundância de flores e ervas aquáticas endêmicas. Um paraíso para os botânicos. Noite funda chegaram à localidade de Bandung. Foram recebidos por um destacamento de cavalaria com os cavaleiros trazendo uma tocha acesa na mão. Foi um espetáculo fantástico, e ficaram agradecidos e comovidos com todas essas atenções. No dia seguinte puderam participar de uma caça aos rinocerontes.
De Bandung, no dia seguinte, foi programada uma subida ao vulcão TangKuban. Chegando à cratera, notaram que as árvores estavam todas retorcidas pelo calor e pelo gás com cheiro de enxofre. No dia 20 de fevereiro tiveram que voltar a Buitenzorg, para assistir aos festejos pelo aniversário do Rei da Holanda. Foi uma mistura de parada militar, na qual a Holanda queria exibir o seu poderio, e uma festa nativa, com os mais diversos exercícios exóticos e danças tribais. Para os ilustres hóspedes, foi servido um magnífico jantar de gala, com a presença das personalidades mais destacadas da colônia. O Duque de Saxe foi interrogado sobre o Brasil, a monarquia e sobre a personalidade do Imperador.
Fez um lindo discurso, pintando com as cores mais positivas a vida no Brasil e a figura do sogro, que ele tanto admirava. Para os presentes o Brasil era uma palavra enigmática e fascinadora, ao mesmo tempo. Depois de apresentarem os mais calorosos agradecimentos, embarcaram no dia seguinte no vapor “Austrália”, para a Índia, chegando no dia 12 de março em Bombaim. A viagem foi aproveitada novamente para organizar, secar e classificar o material botânico que haviam colhido naquela interessante ilha. Em todas as paradas, o Duque de Saxe naturalmente aproveitava as ocasiões e realizava uma hábil propaganda do Brasil, relatando as possibilidades econômicas, mencionando as riquezas do subsolo e a conveniência para se realizar bons investimentos. Foi uma tática que atraiu muitos interessados.
Em Bombaim foram recebidos com todas as honras pelo governador-geral da Índia, Lord Woodhouse, o qual também tinha preparado um programa de visitação para os hóspedes, colocando à disposição o ajudante de ordens, o Major Beagry. Este alto oficial era então o mais famoso caçador de tigres. O governador, além de alojá-los numa maravilhosa casa de hóspedes, colocou à disposição dos ilustres viajantes um vagão especial, com todos os confortos possíveis, que podia ser engatado a qualquer trem, e dessa maneira visitar pelo menos as mais importantes cidades. Para visitas no interior seriam realizadas expedições à parte. O primeiro dia foi usado para pesquisas botânicas nos arredores da cidade, em Sapora e no Jardim Botânico.
Foram ver os templos de Flura e o templo de Elefanta. Este último é uma notável realização, pois é esculpido na rocha, formando enormes salões, cheios das estátuas das divindades hindus, estando em evidência “Ganesh”, apresentado em forma de elefante. Ficaram muito impressionados em ver os crematórios dos mortos, os quais abundavam naquela ocasião, muitas vezes nas ruas, pois em Bombaim efervescia uma epidemia de febre amarela. Viram um museu com preciosidades históricas notáveis. A peças melhores, os ingleses já as haviam transferido para o Museu Britânico de Londres, coisa que naturalmente tinha aumentado o grande desgosto existente.
No dia 20 de março, seguiram de comboio para Godawara, Agra e Délhi. O Major Beagry quis levá-los a uma caçada de tigres, mas não tiveram sucesso. Além de ser muito difícil de alcançar os animais é uma aventura extremamente perigosa. Poucos dias antes, um grupo de ingleses, não teve sorte, pois um de seus caçadores mais arrojados foi atacado por uma tigresa ferida, que o dilacerou. Apesar de serem bons caçadores acharam melhor não insistir.
No dia 25 de março chegaram em Mussoori, no meio das montanhas. Era um habitat que o Dr. Wawra queria conhecer definitivamente, pela riqueza e variedade de plantas raras. Além das plantas puderam avistar os maravilhosos picos nevados do Himalaia. Foram também à Benares. Do ponto de vista cultural, esta cidade foi um dos momentos altos da viagem. Situada à beira do rio sagrado Ganges, é repleta de templos interessantes que são o centro da literatura e da cultura bramânica. O rio, naquele ponto, tem 1 km de largura, e de madrugada as águas se enchem de peregrinos rezando, a procura de libertar-se dos seus pecados. Naquelas águas são também despejadas as cinzas das inúmeras cremações realizadas às margens do rio sagrado. Ficaram impressionados com a situação sanitária. Mas ao mesmo tempo admirando a antiga cultura daquele povo.
Voltaram para Bombaim. Por causa da epidemia reinante naquela cidade, tomaram o vapor “Austrália”, logo no dia seguinte, 1º de abril, e chegaram, com uma pequena pausa em Aden, no dia 14 de abril, em Suez.
Apesar das tantas impressões dessa maravilhosa e interessante viagem, não viam a hora de voltar para casa, sobretudo por vários compromissos que os aguardava. Desembarcaram a abundante bagagem, seja a naturalística, como as várias aquisições realizadas no extremo oriente. No dia seguinte tomaram o trem que os levou para Alexandria. Tinham pressa de voltar à Viena. Com o vapor “Espero” embarcaram para Trieste.
Em 20 de Abril puderam abraçar os pais e o dois meninos, José e Luís, em Viena. Dom José e Dom Luís se haviam acostumado muito bem à avó Clementina e às duas ótimas aias. Naturalmente ambos eram muito apegados ao pai. Em breve começariam os estudos.
O vastíssimo material botânico foi depositado no Museu de História Natural, à disposição do Dr. Wawra. O simpático e competente botânico e companheiro de viagem, após de ter dado baixa como médico da Marinha, se ocupou, durante algum tempo, com a catalogação do material e em fazer desenhar as espécies mais raras para o grande e importante livro que tencionava publicar dentro dos próximos anos.
Apesar dos muitos particulares, talvez inúteis, pensamos de ter sido útil realizar um extrato dessa viagem, baseando o texto, em parte, nas passagens da publicação do ilustre cientista, médico e marinheiro que foi o Dr. Wawra. Nesta raríssima obra, publicada depois em dois volumes, na qual são citadas as “novas” plantas encontradas, Wawra as descreve em latim, da forma habitualmente usada na botânica, citando igualmente as localidades onde foram encontradas.
Em Viena preparava-se a grande Feira Internacional. O Império do Brasil também participaria do evento. O Duque de Saxe era o presidente da Delegação Brasileira. No dia 1º de maio se realizou a abertura. O pavilhão do Brasil estava muito bem organizado e dava amplas informações sobre todos os produtos e materiais exportáveis. Foi muito elogiado e trouxe ao país um importante acréscimo comercial, bem como capitais, prontos para investir.
Depois da longa viagem Luís Augusto se dedicou à educação dos filhos que tinham ficado; aqueles que Dom Pedro II havia levado estavam bem, estavam sob a sábia educação do monarca, e dos quais recebia, de vez em quando, fotografias. Devemos dizer que precisamos admirar o Duque de Saxe, pois perder a esposa tão amada e renunciar aos dois filhos maiores foi sem dúvida um grande sacrifício. Dom Pedro Augusto e Dom Augusto os tinha oferecido a Dom Pedro II e ao Brasil. Não sabemos se foi ou não discutido, com o Imperador, um regresso do Duque ao Brasil. Penso que em todo caso ele teria recusado, pois vista a resistência, mesmo que disfarçada, sem uma atividade condizente na Marinha, se constituiria para ele um ambiente muito difícil de suportar. Além do mais, a sua família estava dividida, com dois filhos em cada um dos continentes. Esteve muito em Viena e nas suas florestas em Schladming, e na Hungria com seu amado irmão Philippe.
O Duque de Saxe teve a sorte de ter ainda outro irmão, o Príncipe Fernando, muito mais moço, mas de brilhante inteligência e habilidade política. Estava frequentemente com ele, no tempo que este se instalava em Sofia, primeiro como Príncipe da Bulgária e depois com Czar. Esteve muitas vezes na Inglaterra, seja em Londres como em Balmoral, na Escócia, a convite da Rainha Victória, e em Bruxelas, com os primos da Casa Real belga.
A Princesa Clementina o incentivou a passar algumas temporadas em Paris, para assistir a conferências ou a espetáculos de teatro, com encontro de literatos e cientistas.
O tempo estava passando e muitos se perguntavam como ele podia deixar os filhos tanto tempo no Brasil, sem visitá-los. As viagens não eram, naquele tempo, tão fáceis como hoje. Viajar para o Brasil levava pelo menos três semanas. O Duque de Saxe sabia que estavam bem amparados e educados, e que a Imperatriz Dona Teresa Cristina era uma verdadeira mãe para eles. Muitas visitas teriam aumentado ainda mais a dor da separação. Praticamente ele tinha uma vida prejudicada, pois recasar não quis, a Marinha, tanto na Áustria como no Brasil, por vários e diferentes motivos, era impraticável. As razões realmente eram inúmeras, com parte dos filhos ausentes, os irmãos ocupando altas posições, um com o grande morgado e o outro futuro rei da Bulgária.
Assim mesmo, em 1879, ele se decide por vir ao Brasil. Seria uma viagem de 3 meses, veria os filhos já então com 13 e 12 anos e iria abraçar os sogros. O Palácio Leopoldina ainda existia, administrado pela Casa Imperial, na espera da maioridade dos dois filhos, que iriam habitá-lo.
Ao mesmo tempo, soube que o Dr. Wawra estaria livre, e pensou então em contratá-lo, para ampliar as pesquisas já realizadas com ele, e assim publicar uma única obra, em dois volumes, coisa que realmente conseguiria. O Dr. Wawra já tinha estado no Brasil em 1857, a bordo da corveta austríaca “Carolina”, e uma segunda vez, acompanhando o Arquiduque Maximiliano, em 1860. O Duque de Saxe convidou o irmão, Fernando, que era um grande amante da botânica e da ornitologia. Este aceitou, com o maior prazer, a oferta. O Príncipe Fernando era ainda jovem, tinha 18 anos.
Partiram de Viena 12 de maio de 1879, embarcando em Bordeaux no navio “Niger”, uma embarcação considerada rápida. Passaram por Vigo, Lisboa e Recife e no dia 9 de junho, pela manhã, entraram na baía do Rio de Janeiro.
O Imperador e a Imperatriz estiveram no cais aguardando e abraçando o genro. Os recém-chegados seguiram antes diretamente para o Palácio Leopoldina, onde se hospedaram. Em seguida se dirigiram para São Cristóvão, onde estavam os filhos. Estes, como podemos imaginar, estavam radiantes. Ficaram uns dias com os jovens príncipes e com os imperadores, no Rio. A capital do Império tinha mudado bastante, se modernizara, notando-se uma grande e rápida retomada econômica, graças às exportações do café, depois da sangria financeira causada pela guerra do Paraguai. O Duque e o irmão deram umas voltas pela cidade e Fernando estava encantado. O Imperador estava feliz com a presença dos dois príncipes e também muito interessado em conversar com o Dr. Wawra, sobretudo sobre as várias viagens que este havia realizado, e naturalmente sobre Martius, que ambos conheceram e admiravam.
No dia 11 seguiram para Petrópolis. Uma nova emoção para Luís Augusto. Rever a casa onde passou a lua de mel, aquelas belas avenidas, o Palácio Imperial, enfim, uma enxurrada de lembranças o deixaram triste. Por sorte, os filhos estavam perto dele e o consolaram. No dia seguinte os dois irmãos e o incansável Dr. Wawra visitaram o território entre o Paraíba e o Paraibuna. As matas ainda tão virgens foram uma satisfação e uma alegria, pois colheriam plantas locais a serem estudadas, preparadas e descritas.
O Príncipe Fernando, nos momentos livres, fazia amizade com os dois sobrinhos brasileiros, uma amizade que ficaria muito sólida também para o futuro. Os colibris, naturalmente, foram a principal atração para o jovem tio, pois ele era um apaixonado ornitólogo. Lastimava em não poder levar alguns exemplares para Europa. A visita mais importante foi aquela realizada no dia 13 de julho, ao Pico do Itatiaia. A escalada foi dura mas valeu a pena, pois era uma área particularmente rica de flores raras ainda não descritas por botânicos. Por esta razão foram registradas também alguns exemplares com nome dos dois príncipes, tais como: “Ateliconia Ferdinando-Coburgi”, a “Hyris Augusto-Coburgi”, a “Vriesia Philippo-Coburgi”, a “Bromélia Itatiaiae” e a “Aspidium Wawraeanum”, além de muitas outras plantas desconhecidas pelos botânicos. Estas, em todo caso, foram registradas nos arquivos internacionais de botânica.
Na escalada do pico de Itatiaia, puseram a vida em perigo, pois não tinham equipamentos nem guias para enfrentar a subida. Ficaram encantados com a vista espetacular, daquela altura de 2.700 metros. Voltaram muito satisfeitos ao Rio, com a ampla coleção herbácea e floreal. Descansaram dois dias e depois escalaram, primeiro, o Corcovado, e no dia seguinte, a Pedra da Gávea. Faltou os “Dois Irmãos”, mas o Dr. Wawra, que não era mais jovem, achou que já tinha material para diversos livros. Assim, permaneceram no Rio, aproveitando a ocasião para apreciar a coleção mineralógica e numismática de Dom Pedro Augusto.
Era ainda embrionária, mas nos anos seguintes se transformaria num conjunto muito importante. Este jovem príncipe, não somente criou este “museu de pedras raras”, sobretudo do Brasil, mas escreveu e publicou estudos científicos sobre diversos minerais, alguns dos quais ele apresentou na Academia da França. Estas publicações são hoje da maior raridade.
O Duque de Saxe ficou muito satisfeito e admirado pela preparação cultural dos seus dois filhos, aos quais Dom Pedro II procurava inculcar também um grande amor pela terra que os viu nascer.
Durante os dias de pausa, Dr. Wawra procurava secar o material colhido, mas a humidade do Rio lhe causara muitas preocupações, tanto é que pegaram revistas colecionadas no Palácio Leopoldina, sobre cujas folhas estenderam as várias plantas. A humidade prejudicaria as diferentes orquídeas e bromeliáceas e muitas outras com nomes científicos imponentes. Os ilustres viajantes tinham que estar ocupados e saciar seu espírito de pesquisa, e assim, Dom Pedro II os levou pessoalmente para passar dois dias na Fazenda de Santa Cruz. O Imperador levou também os netos. Foram de trem, com a locomotiva enfeitada, e chegando ao destino, o monarca foi acolhido por todos os dependentes, com danças, músicas e foguetes.
Foi uma acolhida imponente, que muito impressionou. Em Santa Cruz, Dom Pedro mostrou, com muito orgulho, a fazenda modelo, a plantação de café, as várias espécies de laranjeiras e outras árvores de fruta. O Príncipe Fernando e o Dr. Wawra ficaram muito interessados nas árvores de jabuticaba, que eles não conheciam. Ficaram maravilhados e gostaram muito das saborosas frutas. No segundo dia, o Duque de Saxe saiu para um passeio a cavalo, acompanhado dos filhos. Quem mais se distinguiu naquelas cavalgadas foi Dom Augusto, o qual, apesar dos seus 12 anos, mostrou uma grande disposição e coragem.
Passaram mais 6 dias na cidade serrana, e o dr. Wawra ficou muito admirado com as belas construções que haviam erguido, pois ele tinha estado em Petrópolis no ano de 1860, acompanhando o Arquiduque Maximiliano. A cidade tinha realmente se transformado, estava linda.
De lá foram para Entre Rios, que na época tinha somente o prédio da Estação. Wawra, prognosticou um grande futuro para aquele lugar, pelas conexões ferroviárias, já existentes naquele tempo. Gostaram muito de Juiz de Fora, que era, em 1860, quando Wawra a visitou pela primeira vez, uma pequena, mas muito agradável cidadezinha.
Ficaram tristes de ver o desaparecimento das grandes florestas, vendo as múltiplas queimadas. Esta visão feriu os sentimentos e o espírito do botânico, o qual tinha um compreensível amor pela vegetação.
Uma visita a Nova Friburgo não podia faltar, assim como a Teresópolis, a antiga Santa Teresa, e naturalmente a “Serra dos Órgãos”. Seguiram de trem, vindo de Niterói. Durante a viagem travaram conhecimento com Mr. Schuch–Capanema, diretor geral dos Telégrafos do Brasil. O seu pai, austríaco de nacionalidade, tinha acompanhado a Imperatriz Dona Leopoldina para o Brasil. Acabou gostando da nova terra e das suas possibilidades, acrescentando, em seguida, ao seu sobrenome o nome de “Capanema”. O Museu de História Natural de Viena contém inúmeras espécies vegetais, colhidas por Schüch pai, na sua nova pátria.
Em Cordeiro, estação vizinha a Cantagalo, foram recebidos, na estação, pelo Barão de Nova Friburgo. Este era o maior e mais rico fazendeiro do Brasil naquele tempo. Causou a eles uma profunda impressão os mais de 3 000 escravos das fazendas do Barão.
Foram hospedados na linda Casa Sede, com uma maravilhosa vista para as imensas propriedades dos ‘Nova Friburgos’. Tanto o Barão como a Baronesa foram muito gentis. Ofereceram um maravilhoso jantar e conversaram longamente com os visitantes sobre suas plantações, os problemas com as exportações e sobre a questão da mão de obra, a qual fatalmente passaria a ser livre e precisando ser atraída de países europeus. O Barão era muito amado por seus escravos, pois lhes oferecia e às suas famílias uma vida em boas senzalas, farta comida e um bom prêmio em dinheiro, no fim do mês, de acordo com o trabalho realizado. Contar com bons fiscais era necessário, com sentimentos humanos e espírito cristão, para dirigir este “exército” de trabalhadores. Na manhã imediata realizou-se uma caçada, na qual mataram muitas capivaras e muitas codornas. À noite se realizou um grande churrasco, com músicas e danças locais, que foram muito apreciadas.
No dia seguinte, eles agradeceram pela tão generosa hospedagem. O Duque da Saxe convidou o Barão para conhecer, na Áustria e na Hungria, as fazendas e como lá se trabalhava, com mão de obra assalariada e assistência médica, alcançando desta forma ótimos resultados. Ficaram amigos.
Voltaram para o Rio, o tempo tinha se esgotado. Precisavam se despedir dos imperadores e abraçar os filhos, e ainda saudar os condes d´Eu.
O Dr. Wawra escreveu em sua obra: “Com grande gratidão tínhamos que deixar este lindo país, lembrando sempre com gratidão, as acolhidas amigas que tivemos”.
O Imperador e os filhos os acompanharam no embarque, no “Orènoque” e com muita tristeza se separaram. Acostaram os mesmos portos que haviam tocado na vinda.
Em Lisboa, o Duque de Saxe, acompanhado pelo irmão, Fernando, desembarcou para saudar o tio Fernando II. Foi a última vez que o viram, pois ele faleceria em 1885. Portugal iria perder um grande Rei.
Em Paris, onde chegaram no dia 5 de agosto de 1879, se despediram do Dr. Wawra, o qual seguiu para Viena, com a imensa bagagem de plantas, onde ele iniciaria a sua grande obra botânica, toda com espécies descritas e documentadas em latim. Ele não chegou a terminar o grande trabalho, que foi concluído pelo Dr. Günther von Beck, em 1887, pois veio a falecer em Baden, perto de Viena, em maio de 1883. O corpo foi trasladado para Brünn, sua cidade natal, onde foi sepultado num mausoléu, em cemitério local. O Imperador Francisco José lhe havia concedido, pelos seus merecimentos como médico de Marinha, como assistente do Imperador Maximiliano, e como cientista, o título de “von Fernsee”.
Em 28 de julho de 1881, faleceu, no Castelo de Ebenthal, o pai do Duque de Saxe. Este príncipe se manteve sempre afastado de movimentações políticas, ao contrário da esposa, a Princesa Clementina. Foi um hábil administrador do grande morgado Coburgo-Kohary, colecionador de arte, protetor dos artistas e da cultura em geral. General do Exército Austríaco, Cavaleiro da Ordem do Tosão de Ouro, Bailio Grã-Cruz da Ordem de Malta, Cavaleiro Grã-Cruz das Ordens de Dom Pedro Primeiro e do Cruzeiro.
O Duque de Saxe, viveria, depois da sua última viagem ao Brasil, afastado dos grandes acontecimentos políticos e sociais. Em 7 de julho de 1887 assistiu à ascensão do irmão Fernando, Príncipe Reinante da Bulgária. Em 1886, Luís Augusto veria o filho Dom Pedro Augusto, quando este acompanhava Dom Pedro II em sua viagem à Europa. Um golpe muito duro foi para o Duque de Saxe o falecimento do filho Dom José, o qual, estando na Academia Militar, em Wiener Neu Stadt, perto de Viena, morreu de pneumonia, no dia 13 de agosto de 1888. Tinha 19 anos, uma lástima!
Em 1889, encontrou os dois filhos mais velhos, sempre no Velho Mundo, com o advento da República no Brasil. Depois adoeceu, de maneira irremediável, o seu querido e brilhante filho, Dom Pedro Augusto. O Príncipe Dom Pedro Augusto teve uma vida de estudos. Em primeiro lugar, se formou em Letras no Colégio Dom Pedro II, e em seguida foi o primeiro príncipe, de uma Casa Real, que se havia formado em Engenharia. Ele era orgulhoso de haver-se formado brilhantemente na Escola Politécnica do Rio de Janeiro. Especializou-se em Mineralogia e Numismática. Publicou, como já mencionamos, diversos estudos, alguns dos quais ele os proferiu, em uma sessão da Academia de Ciências da França, da qual foi feito sócio-correspondente. Graça às suas publicações, foi eleito sócio do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
Sobre a sua vida e trabalhos científicos, foi publicado em 1958, um interessante “Esboço Biobibliográfico”, pelo Dr. Clado Ribeiro de Lessa, e incluído na reedição dos trabalhos do Príncipe. Devemos salientar o grande apego que teve aos avós, que foram verdadeiros pais para ele. O seu grande amor pelo Brasil e o seu interesse, não somente pela história do país, pela conservação de seus edifícios e igrejas históricas, mas em particular pelo progresso econômico, e a sua constante preocupação com grave situação social da população menos favorecida. Nunca aceitou ter escravos no Palácio Leopoldina, que foi a sua residência depois da maioridade. Conserva-se, no Museu Histórico Nacional, um significativo documento no qual Dom Pedro Augusto subscreveu, com Dom Pedro II e a Imperatriz Dona Teresa Cristina, uma importante soma, visando possibilitar a Carlos Gomes apresentar, no Rio de Janeiro, a ópera “Lo Schiavo”, por ocasião do dia 7 de setembro de 1889. O Príncipe foi o único descendente de imperadores que assinou este documento, o qual não somente era uma ajuda ao nosso grande músico, mas guardava um significado importante, naquele momento, pela libertação dos cativos, que também o afligia particularmente.
Em 30 de setembro de 1889 presidiu, no Palácio Leopoldina, a Sociedade da Independência, e propôs, naquela ocasião, a criação de um Museu de Arte Retrospectiva para colecionar todos os objetos que interessassem à história do Brasil. Sugeriu também a instituição de uma medalha, que seria distribuída no dia 7 de setembro todos os anos, aos autores dos melhores trabalhos sobre o Brasil, em ciência, história, letras e artes. (SANTOS apud LESSA, 1954, obra não publicada).
Dom Pedro Augusto queria que o Brasil fosse modernizado o mais depressa possível, seguindo o caminho de muitos países europeus e americanos. Seguia com muita atenção os desdobramentos da política no país, não escondendo a sua preocupação com o futuro do Império. Não tomou partido por ninguém e se ocupou, sobretudo, com assuntos culturais e científicos.
Infelizmente, nota-se que escritores hodiernos, com intenção de tornarem suas publicações interessantes, usam a infeliz doença de Dom Pedro Augusto para atrair o interesse dos leitores. Não pensam que ninguém tem culpa em ter sido atingido por uma doença. Estas pessoas não têm escrúpulos e não respeitam nem a memória dos defuntos, sabendo que estes não podem se defender. A coisa chegou a tal ponto que indivíduos sem moral tentaram enlamear a ilibada reputação do neto predileto de Dom Pedro II, com afirmações altamente ofensivas.
Em 28 de dezembro de 1889, faleceu, no Porto, a querida Imperatriz Dona Teresa Cristina, e em 5 de dezembro de 1891 deixou este mundo, em Paris, o admirado e grande sogro, o Imperador Dom Pedro II.
Finalmente, um sinal positivo para Luís Augusto, em 30 de maio de 1894, casou o filho Dom Augusto, com a Arquiduquesa Dona Carolina da Áustria. O Duque de Saxe estava orgulhoso em ver o filho Dom Augusto, 2º Tenente da Armada Imperial Brasileira, seguindo a mesma carreira marítima que ele. Ficou chocado com o ato do governo provisório, o qual, por razões políticas, expulsou um jovem oficial de seus quadros militares. Em primeiro lugar Forças Armadas não são políticas e Dom Augusto teria seguramente permanecido a bordo do Cruzador Almirante Barroso, acatando o telegrama com a ordem de Dom Pedro II: “Sirva o Brasil!” Durante o Império ninguém foi expulso, a República começou banindo aqueles que tanto serviram à Pátria! O ato da República foi uma demonstração de fraqueza, uma prova de medo diante a um 2º Tenente!
Em 16 de janeiro de 1907, faleceu em Viena a tão estimada e poderosa mãe, a Princesa Clementina. Sua morte deixou um grande vazio na família, pois era ela quem dirigia os destinos políticos da mesma. Por exemplo, o filho caçula, Fernando, obteve o trono da Bulgária, também, em parte, graças às suas intervenções nas monarquias europeias. Quantos acontecimentos num prazo de tempo limitado!
Luís Augusto de Saxe-Coburgo e Gotha, Duque de Saxe, Almirante efetivo da Armada Brasileira, Presidente Honorário do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, detentor da medalha de ouro da Rendição de Uruguaiana, da Cruz de Guerra pela Batalha de Sylt, da Grã-Cruz de todas as Ordens do Império, botânico amador e grande amante do Brasil, teve uma vida com muitos altos, mais ainda, com muitíssimas baixas. Ficou viúvo aos 26 anos e nunca mais se casou. Todos estes acontecimentos, que se haviam acumulado no decorrer dos anos, devem ter deixado um sinal.
Realmente a sua saúde não devia estar em boas condições, e assim ele procurou Karlsbad, na Boémia, para tentar a cura com aquelas famosas águas minerais. No dia 14 de setembro de 1907, de manhã, o encontraram morto.
Foi achado com um semblante sereno, tranquilo, e resignado, talvez ele tenha visto, naquele momento, a sua tão querida Leopoldina, no Brasil, que tinha vindo buscá-lo. Repousam juntos, na cripta da Igreja de Santo Agostinho, em Coburgo.
B I B L I O G R A F I A
Arquivo Saxe-Coburgo, Viena
Arquivo Museu Imperial, Petrópolis
Arquivo Imperial, Viena
Arquivo Ducal Saxe-Coburgo, Coburgo
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