ASILO DE SANTA ISABEL E ASILO DO PADRE SIQUEIRA OU ESCOLA DOMÉSTICA DE N. SENHORA DO AMPARO

José Nicolau Tinoco de Almeida

ASILO DE SANTA ISABEL

O padre Nicolau Germain (1), ex-vigário da freguesia de São Pedro de Alcântara em Petrópolis, francês de origem e brasileiro por adoção, cordialmente afeiçoado à nacionalidade que adotara, consagrou-se por mais de 20 anos ao mais escrupuloso desencargo da importantíssima missão que se impôs. Convencido de que a educação moral, civil e religiosa é a única base inconcussa para sustentar o edifício social empenhou todo o seu valimento em proporcionar uma verdadeira educação às crianças deserdadas da fortuna. Faltando-lhe, porém, os recursos precisos para fundar uma escola que satisfizesse plenamente ao seu ideal recorreu à Congregação de São Vicente de Paulo, o Pai e o Apóstolo dos desvalidos, sendo assim fundado o atual Asilo de Santa Isabel, que começou em modestíssima escola destinada à educação de meninas pobres, ereta em casa térrea mediante 50$000 mensais. Dentro de poucos meses era ela freqüentada por 100 alunas.

Faltando os recursos precisos para imprimir-lhe o desenvolvimento de que tanto carecia visto que nem para o aluguel havia a renda necessária e nestas críticas circunstâncias as próprias irmãs sofriam muitas necessidades, a condessa do Rio Novo, sabendo do estado precário de tão útil instituição, ofereceu gratuitamente por cinco anos o prédio que possuía na Rua do Imperador, nº 58, para o qual se mudou a escola em 1870. Esse auxílio, verdadeiramente providencial, foi da maior importância para a sustentação da escola, não foi, porém, para acudir a todas as necessidades.

Por mais de uma vez, pois, resolveu a Congregação mandar retirar as irmãs que, ainda assim, não chegaram a abandonar o seu posto, porque por mais de uma vez também lhes proporcionou a Divina Providência alguns recursos inesperados, que as animavam de novo a persistir no caridoso exercício da santa missão que se haviam imposto.

Terminado o prazo fatal de 5 anos, reaparece a primeira dificuldade com a falta de um edifício próprio em que a escola continuasse a funcionar e cujo aluguel importaria em sacrifício superior aos ainda muito minguados recursos do estabelecimento.

Nesta difícil conjuntura a condessa do Rio Novo, proprietária do prédio, sempre caritativa e solícita pela sorte dos desvalidos, tendo em alta consideração a educação das meninas pobres, propôs à Congregação a venda do seu prédio por preço muito inferior ao valor real, com a condição de ser utilizado, em todo o sempre, para aquele mesmo fim. Desse modo aquela benemérita senhora vendeu pela quantia de 24:000$000 um prédio que valia cerca de 40:000$000. Donde obter, porém, essa quantia de 24 contos quando o estabelecimento não dispunha nem de 24$000?

Foi então que monsenhor Sanguigni, internúncio apostólico, solicitando com instância o concurso de alguns amigos, a fim de organizarem uma associação caritativa que se encarregasse de prover a tão grande necessidade, foi aceito o encargo, instalando-se a Associação Religiosa e Caritativa do Asilo de Santa Isabel, sob a presidência do senhor bispo diocesano, sendo o tesoureiro o referido vigário Nicolau Germain e secretário e cônego José Mendes de Paiva.

Redigidos os estatutos e aprovados pelas competentes autoridades, concorreram logo os sócios fundadores com as suas respectivas jóias nunca inferiores a 1:000$, sendo o prédio comprado pela Associação e entregue a Congregação de S. Vicente de Paulo com a indeclinável condição de ser utilizado sempre em benefício da educação de meninas pobres.

Vencida a primeira dificuldade e remediada a mais urgente necessidade, cumpria ocorrer às despesas em que importavam o custeio, incremento e a manutenção do estabelecimento que não possuía um real de patrimônio. Nenhum meio se oferecia com probabilidade de duração, senão a criação conjunta de um colégio anexo para a educação e instrução de meninas contribuintes, a fim de que os lucros que daqui proviessem fossem aplicados à manutenção do asilo das meninas pobres. Assim se prôpos, assim se venceu. Novas dificuldades interpõem-se ainda à realização deste projeto. O edifício era insuficiente para tanto e sendo de absoluta necessidade aumentá-lo em maiores proporções, como realizá-lo sem capitais?

Veio nesta embaraçosa ocasião em auxílio da Associação um dos sócios fundadores, monsenhor Francisco de Castro Abreu Bacelar (2), de saudosa memória! Propôs este virtuoso sacerdote adiantar sem juros a precisa quantia para as indispensáveis obras, cuja importância excedeu a 100:000$000, não se limitando sua inesgotável generosidade a este grandioso ato de caridade. Mais tarde sendo necessário mais amplo espaço de terreno para o desenvolvimento das construções, o mesmo sacerdote cedeu, da soma que havia emprestado, a quantia de 40:000$ a fim de que a Associação pudesse fazer aquisição do novo terreno sem aumentar a dívida já contraída.

É para lamentar sinceramente, à vista do exposto, a perda de tão benemérito associado e seria absolutamente irreparável se não lhe sobrevivesse seu irmão o comendador Fernando de Castro Abreu Magalhães que até no espírito de caridade se mostrou sempre consangüíneo daquele cujo passamento foi tão profunda e sinceramente lamentado.

A custa de todos estes auxílios, verdadeiramente providenciais, o Asilo de Santa Isabel, criado na Cidade de Petrópolis, tem obtido cada ano notável incremento, prestando o benefício de uma verdadeira educação moral, civil e religiosa a mais de 200 alunas das seguintes categorias:

Alunas internas contribuintes ……………………………………………… 50
Alunas internas gratuitas …………………………………………………… 33
Alunas meio pensionistas ………………………………………………….. 54
Alunas externas gratuitas ………………………………………………….. 64

É de 14 o número das irmãs de caridade, incumbidas do magistério e mais trabalhos deste estabelecimento, que reúne todas as condições higiênicas, tratamento acurado e alta capacidade da superiora (3).
ASILO DO PADRE SIQUEIRA OU ESCOLA DOMÉSTICA
DE N. SENHORA DO AMPARO

Esta casa de caridade fundada em 1868 pelo padre João Francisco de Siqueira Andrade é um verdadeiro baluarte contra a perversão dos costumes, contra as ameaças da miséria. É um estabelecimento destinado especialmente à educação de meninas desvalidas sem distinção de classe, cor ou origem, de modo que elas encontrando amparo e proteção possam viver de seu trabalho honesto e corresponder aos elevados fins de uma instituição de incontestável utilidade. Naquele santuário a órfã abandonada ou a menina pobre têm instrução indispensável à mulher, e acostumam-se ao trabalho, sendo o tempo ali dividido entre o estudo e o trabalho.

A escola funciona em vasto edifício situado na Rua Bragança, esquina de D. Leopoldina, levantado por meio de esmolas e graças à força de vontade do padre Siqueira.

O que constitui a instrução das educandas consiste em doutrina cristã, ler e escrever corretamente a língua nacional e as quatro operações fundamentais da aritmética, exercício de leitura em livros piedosos, história sagrada e música de cantos, obras de agulha, costura, bordados, tecidos, flores, calçados de lã, chapéus, etc., cozinhar, lavar e engomar, confeitaria, conhecimento prático de horticultura e jardinagem vulgares e prática na enfermaria da casa. Estes trabalhos são distribuídos semanalmente pelas educandas que são divididas em classes e estas em turmas, tendo-se em especial consideração as idades, forças físicas e aptidões de cada uma.

O asilo conta atualmente 69 meninas órfãs e desvalidas, sob a direção da irmã superiora D. Teodora de Schaeffer e Almeida e fiscalização do cônego José Bento de Andrade, irmão do fundador falecido a 10 de abril de 1881. Consta o patrimônio de 97 apólices, sendo a casa sustentada pela caridade pública. Desde a sua fundação (14 anos) têm saído para mais de 30 meninas, umas para criadas em casas de famílias, outras para professoras e adjuntas em colégios e, finalmente, têm-se casado algumas. A educação das meninas tem sido tão esmerada quanto se tem podido.

A Escola Doméstica de Nossa Senhora do Amparo vive de esmolas. Dentre outros benfeitores, cujos nomes não se olvidarão jamais, destaca-se os de Vicente Ubelhart, que deixou em seu testamento o importante legado de 74:000$000 em apólices da dívida pública aplicado ao patrimônio da casa por seu testamenteiro o comendador Manuel José Rodrigues. Da Escola Doméstica de Nossa Senhora do Amparo, pode-se dizer, à vista dos fatos, que uma instituição desta ordem devera ter sido fundada a mais tempo pelos resultados benéficos que tem apresentado (4).

NOTAS:

Estes textos foram transcritos da obra rara “Petrópolis – Guia Turístico” de J. Tinoco, publicada no Rio de Janeiro, em 1885.

1 – O padre Nicolau Germain, francês de nascimento, chegara ao Brasil como náufrago, em 1854. Dedicou-se a trabalhos braçais enquanto aguardava, da Europa, os documentos comprobatórios de suas funções. Foi nomeado coadjutor do Cônego Correia, o primeiro vigário de Petrópolis, sendo designado, em 1858, para ocupar esse cargo, que exerceria até 1878. Petrópolis deve-lhe, entre outras benemerências, a fundação do Colégio Santa Isabel.

2 – Monsenhor Francisco de Castro Bacelar construiu para sua residência o prédio à R. D. Afonso – hoje propriedade da família Franklin Sampaio. Posteriormente foi levantado à sua frente a Vila Itararé, tendo hoje o antigo palacete acesso pela Praça Rui Barbosa. Nascido em Portugal, transferiu-se para o Brasil e aqui ordenou-se sacerdote. Foi proprietário em Petrópolis, construindo muitas casas da rua que, então, se abria e que veio a receber o seu nome.

3 – Fundou-se em Petrópolis a Associação Caritativa e Religiosa Santa Isabel (em homenagem à Princesa Isabel) e que seria a semente do Colégio Santa Isabel. A casa da Condessa do Rio Novo elevava-se no local em que está hoje o prédio próprio do estabelecimento. O Colégio fundou-se em 1877.

4 – O Asilo do Amparo foi fundado pelo Padre João Francisco de Siqueira Andrade, paulista de Jacareí. O prédio que se ergue à Av. Roberto Silveira, esquina com Padre Siqueira, data de 1871. Dedicara-se anteriormente o sacerdote à educação de rapazes, mantendo na velha casa da fazenda que fora do padre Corrêa, o Instituto Científico S. José.

Raul Ferreira da Silva Lopes, ex-Associado Titular, Cadeira n.º 32, Patrono – Oscar Weinschenck, falecido