PETRÓPOLIS CIDADE DE KOELER E DE TODOS NÓS
Fernando Antônio de Souza da Costa, associado titular, cadeira n.º 19, patrono Galdino Justiniano da Silva Pimentel
Benditas sejam as mãos do Criador ao encrustar esta jóia em meio às colinas! Creio, sobretudo, não caia uma folha sequer que não esteja pré-determinado, por isso providencial que o Senhor de todas as coisas e pessoas conduzisse até nós a sensibilidade, arte e a competência dos empreendedores, talentosos, dedicados e queridos colonos alemães, dos quais esta Imperial Cidade se ufana. Não desejo aprofundar-me quanto ao aspecto meramente histórico, mas dar voz e vez ao coração. Em rápido lampejo pincei de Gênesis, Capítulo 12 Versículos 1-3, quando Deus fala a Abrãao: “deixe sua terra, sua família e casa de seus pais e vá para onde eu lhe mostrar, farei de você uma grande nação…”.
Parafraseando este belo enunciado bíblico, penso tenha ocorrido o mesmo, reservando-nos a sorte de podermos ser presenteados com a primeira leva de imigrantes que estiveram trabalhando na abertura da estrada do meio da Serra, a seguir vieram para a Fazenda do Córrego Seco, em 1837. O destino destes pioneiros era Sidney, na Austrália, mas devido às péssimas condições de viagem interromperam o trajeto e resolveram permanecer no Rio de Janeiro.
Ali, foram recrutados pelo engenheiro Köeler “para trabalhar nos melhoramentos da Serra da Estrela”, assim relatou o insigne Professor Rabaço às fls. 78 – História de Petrópolis e ainda nos dão conta os arquivos históricos do nosso Instituto, a imprensa, arquivo Nacional e historiadores: A Fazenda do Córrego Seco, atual cidade de Petrópolis, foi adquirida em 1830, por Dom Pedro I, do sargento-mor José Vieira Afonso, com a intenção de mandar construir um palácio que, nos meses de verão, abrigaria a Família Imperial. Contudo, o projeto de construção do palácio só se realizaria anos depois, no reinado de D. Pedro II. O início da obras exigia o uso de mão-de-obra em grandes escalas. Resolver esta questão implicava em decidir entre a contratação de trabalhadores livres, ou a utilização do trabalho escravo, predominante no Brasil. A decisão do Imperador recaiu sobre a contratação de mão-de-obra livre. Para tanto, foi assinado, em 16 de Março de 1843, um decreto-lei através do qual D. Pedro II autorizava ao “Mordomo Paulo Barbosa da Silva” a arrendar a fazenda do Córrego Seco ao Major dos Engenheiros Júlio Frederico Köeler, pela quantia de um conto de réis anual. Através dessa legislação D. Pedro II determinava o assentamento de uma povoação, a construção de um palácio imperial e um programa de arrendamento e colonização das terras da Fazenda, nomeando o engenheiro Júlio Frederico Köeler para a direção da colônia agrícola e superintendência da fazenda imperial.
Criaram-se, assim, as condições necessárias à fundação da cidade de Petrópolis. De origem germânica, o Major Köeler apresentou ao Imperador um plano de povoamento baseado na contratação de imigrantes alemães. Este segundo grupo migratório foi trazido em navios, de Dunquerque para o Brasil, através de Charles François Joseph Delrue. Em 1845, as famílias compostas por imigrantes alemães aportaram no Rio de Janeiro. Eram mais de 2000 pessoas, entre adultos e crianças. Do Rio de Janeiro os colonos alemães vieram para a Fazenda do Córrego Seco, onde chegaram no dia 29 de Junho de 1845, data em que se comemora o Dia do Colono e o começo de povoamento de Petrópolis, a primeira cidade planejada do Brasil. Na verdade, a área não era pródiga à agricultura, motivo maior, creio eu, a que pudessem deixar fluir o dom e o talento de cada qual ao construírem um povoado próspero, que desenvolvendo-se com rapidez, já em 1846 era elevado de Curato à freguesia de São Pedro de Alcântara de Petrópolis e apenas 11 anos mais tarde tornava-se Município, sem passar pela categoria de Vila, o que era até àquela data fato inédito no país.
Recebendo o nome de Petrópolis, (“Cidade de Pedro” em grego), a cidade já nascia diferente pois ao mesmo tempo era imperial e européia e continua sendo assim até os dias de hoje. A herança alemã está em todos os setores, e o da Família Imperial também, como em nomes de ruas, monumentos, construções, Palácio de Cristal, e descendentes diretos que são a Família Orléans e Bragança, conhecida e querida dos petropolitanos. Da descendência alemã, um exemplo é a Avenida Köeler, a mais bonita de toda a cidade e com certeza está entre os mais esplêndidos monumentos arquitetônicos e urbanísticos do mundo. Temos toda a tradição da família imperial e a descendência germânica que os alemães imprimiram em nossa cultura.
Ressalte-se a grande obra realizada pela comunidade evangélica luterana a qual sempre manteve laços fraternais com os cristãos católicos petropolitanos, pilares do pontificado de Cristo na formação do caráter e preservação da cultura e raízes deixando perpetuado nas sandálias de cada colono, descendentes e demais conterrâneos as marcas do amor e fidelidade à terra que ao seu regaço os acolheu.
Petrópolis não parou de crescer, progredir, modernizar-se, em exuberância, eloqüência, beleza, civilidade e cultura. Vir à Petrópolis àquela época significava uma viagem de barca, através da travessia da baía até o porto Mauá, trem até Raiz da Serra, finalmente diligência puxada a cavalos por entre o verde e a serra. Se por um lado era uma façanha e maratona até aqui chegar, posso imaginar o tom romântico, indelével e repleto de surpresas. Ora relva, ora o canto dos pássaros, bromélias, orquídeas, hortênsias e frutos tropicais que o viajante iria descobrir a cada passo… Era, certamente o mesmo encantamento que fascinou D. Pedro I nos idos de 1822, em seu percurso ao caminho do ouro em Minas Gerais, chamando a atenção da Corte para o excelente clima e natureza privilegiados.
Petrópolis contava com a presença do Imperador Dom Pedro II durante 6 meses ao ano, por isso Capital administrativa do Império, onde os nobres, políticos e intelectuais transitavam, em convívio com nosso Monarca, intelectual respeitado em todo o mundo, tanto que enquanto no Rio grassava a febre amarela e o intenso calor da capital, a vida social da serra era intensa e alegre, quer pelos bailes, saraus, espetáculos competindo com a animação e fausto carioca já que era elegante a alta sociedade da corte, delegações estrangeiras e diplomacia rumarem montanha acima.
Revivendo ainda nossos Colonos Alemães é de bom alvitre recordarmos que quando eles chegaram a Petrópolis em 1845 o centro da cidade era pouco mais que um brejo, constantemente invadido pelas cheias dos rios Piabanha, Palatinado e Quitandinha. De suas mãos surgiram canais que vieram conter tais enchentes, construíram pontes, os prédios mais antigos, o Palácio de verão de Sua Majestade, hoje Museu Imperial.
Os colonos nos legaram um senso de unidade, deixando fortes sinais na preservação dos costumes e culto à língua. Homens, mulheres e crianças, deram a nossa terra a fisionomia primeira. Petrópolis de Westfália, Mosela, Renânia, Darmstadt, Wormstadt, Ingelhein, Nassau, Bingen, Siméria, Castelânea e Palatinados Central e Inferior, notadamente porque de várias dessas regiões originaram essa brava gente, que não obstante prestarem homenagens à Cidade, também o fizeram em honra à Família Imperial criando a Vila Imperial e Vila Teresa, e o mesmo ocorrendo com relação aos grupos nacionais integrantes da população petropolitana, incluindo por isso aos Quarteirões, além das reverências à região dos colonizadores, ao Governo das províncias, e tributo ao país através dos nomes Quarteirão Brasileiro, Mineiro, Presidência, Princesa Isabel, e ainda ao povo italiano, francês, inglês, suíço, juntando-se à Renância Superior, Worns, dentre outros.
Köeler era um ecologista por natureza, preservando os vales, qualidade de vida de seus moradores, respeitando a natureza, caminhos de acesso mais suaves, ao lado dos cursos d’água. Era idealista, mecenas e um espírito franciscano por excelência, bastando-se como exemplo o fato de doar sua Fazenda, situada em Quitandinha para ser incorporada à criação e ampliação da Cidade de Petrópolis. Em cada canto uma lembrança quer no Valparaíso, Morin e arredores. Revivendo o tempo, resgatando a cultura, história, os fatos, as coisas, praxes e tradições, lutemos a que permaneça acesa a chama do existir, jamais se arrefeça da história e das memórias atuais e das gerações do porvir o grande legado de nossos colonos alemães cujos nomes estão perpetuados neste obelisco e no coração de nosso povo.
Há séculos mandavam-se erigir obeliscos, marco da fundação de uma Cidade; assim, no Cairo, Atenas, Roma, Paris, Rio, São Paulo, Moscou, Jerusalém, Nova York, Madri, Tóquio, Petrópolis e etc. possuem belos e imponentes monumentos simbolizando a pedra fundamental do Município.
E o obelisco é o ápice da emancipação desta terra e da presença viva da colonização germânica. São 361 nomes desde Adams até Zoebus. Petrópolis de descendentes notáveis como os historiadores Guilherme Martinez Auler, Gustavo Ernesto Bauer, Hugo José Kling, Manoel Walter Bechtlufft, Guilherme Pedro Eppinghaus (engenheiro responsável quando da edificação de nossa Catedral), Jacob Müller – regente do 1º coral de Petrópolis, Aluízia Maria Gabrich, pianista, Carlos Kling Sobrinho – fundador do Harmonie Moselthal, Pedro Hees, fotógrafo, Guttmann Bicho, artista pintor. Colonos com habilidades manuais e artesanais, como ferreiros: Jacob Monken, Ludwig Echternacht, funileiro: Adams Boller, marceneiros: Jacob Nicolai Heinrich Brahm, Heinrich Ludwig Jaeger, Theodor Eppinghaus, os Shaefer e os Reith. Os Noel (descendência também do Historiador Paulo Roberto Martins Oliveira, a quem, desde já agradeço a presença a esta cerimônia) no ramo de carvoaria e materiais de construção, os primeiros professores colonos católicos Friedrich Husch, Martin Dupont, Heinrich Monken Heirich Rablais, e os professores evangélicos Peter Jacob, August Moebus e Johann Wilhelm Scmidt., assim como os Berner, os Kapps (um deles músico internacional da Família do Promotor de Justiça Sérgio Carvalho), e a Família Haack no comércio e medicina.
Embora não colonos prestaram relevantes serviços à Comunidade Walter João Bretz, Carlos Grandmasson Rheingantz, os professores evangélicos Friedrich Stroell e Eintracht (Coral Concórdia), e os professores católicos Theodor Pausacker, Karl Lager, o escultor Carlos Spangenberg, Heinrich Sieber, lapidário de vidros e Ernest Papf, fotógrafo, artista e grande pintor. Os Maiworm notadamente na fabricação de vinho. Os Gehren, os Kreischer e os Hoelz, todos pioneiros no setor coletivo de ônibus.
Caríssimos, são apenas tênue mostra; quisera declinar nome a nome, descendente por descendente, desde os mais célebres aos mais simples, na verdade todos merecedores de galardões e aplausos. Aqui estamos, para glorificar, exaltar, agradecer e rezar. É tempo de bênçãos e reconhecimento, de homenagens aos bravos colonizadores em preces e louvores a tantos quantos descansam junto ao regaço do Pai e aos descendentes a prosseguirem ajudando a escrever tão belas páginas da história pontilhada em carinho, abnegação e arte. Confesso-lhes constituir-se em subida honra e emoção o sentimento que invade-me nesta hora, não apenas na condição de Membro de diversos Cenáculos Culturais desta comunidade, notadamente do Instituto Histórico de Petrópolis e ainda, pela deferência conferida através do Clube 29 de Junho, Instituições e Municipalidade, a que os representasse neste momento tão solene à Imperial Cidade, mas especialmente pelo amor devotado a esta terra e a seu povo, porque Petrópolis é na verdade, “o altar que Deus quis construir na natureza”.
Petrópolis vive hoje mais uma Bauernfest. Gosto de apreciar as avenidas repletas de galhardetes, flâmulas, símbolo de nosso preito aos Colonos Alemães, em meio aos palcos preparados para as danças, amplos, iluminados e bonitos.. . Por duas vezes estive na Alemanha, aprendi a admirar e a contemplar sua paisagem, cultura, arquitetura, beleza e civilização. O passeio pelo Reno foi inesquecível. A música, o folclore, a alegria. Têm muito de brasileiros ou temos muito de alemães, sobretudo no bom humor e simpatia. Seus pratos – deliciosos – desde o eisbein, choucroute, purê de maçã, strudel, salsichas e tantos mais. E a cerveja? As casas, cada qual mais bela, desde os cortinados, à higiene, arquitetura, pintura ou esculturas fascinantes!. Por diversas vezes nos desfiles de abertura e encerramento da Bauernfest passei horas a ajudar a enfeitar charretes e carruagens. Sabemos que esta festa nasceu graças ao Clube 29 de Junho, entidade que tem em sua Presidência a Sra. Emygdia Hoelz Lyrio e dileta Diretoria. Para mim, mais que Clube, é uma Casa de Cultura. Sinto-me feliz. Feliz por conhecer um pouco do muito que realizam. Nossos colonos e descendentes são os principais responsáveis hoje e sempre a que Petrópolis: “Altiora Semper Petens”, mantenha-se sempre nas alturas!
Devo concluir, na certeza de que em cada flor que margeia nossos rios, em cada fragmento de nossas ruas, casarões, templos e palácios centenários, reflete-se a alma germânica, a sensibilidade e arte sob o clima ameno embalado pela doce brisa e serração inconfundíveis. Petrópolis, esteja certa de que se as pantufas contassem, um pouco de sua história, encheriam mil canteiros, com flores de tuas glórias! Glórias aos céus e a nossos Colonos, seus grandes arquitetos. E unindo-me a seus colonizadores e descendentes, mais uma vez acariciamos sua fronte ao dizer-lhe que é eterna poesia e nossa rainha, a quem prometemos ser fiéis e amá-la ainda que nos faltem todas as forças, porque possui a pureza de mãe, o ombro amigo se choramos, os braços estendidos se sorrimos, adotou-nos como se filhos fôssemos, Petrópolis de onde não sairemos jamais, pois seguiremos os mesmos passos de Sipião, o Centurião Romano. Deus assim há de querer, e Ele quer, disso temos certeza.