PETRÓPOLIS NA GUERRA DO PARAGUAI

Jeronymo Ferreira Alves Netto, associado titular, cadeira nº. 15, patrono Frei Estanislau Schaette

Da Guerra do Paraguai (1865-1870), sem dúvida o maior conflito militar ocorrido na América do Sul, participaram inúmeros petropolitanos, natos ou por adoção, pertencentes à Guarda Nacional ou ao Corpo de Voluntários da Pátria.

A Guarda Nacional, cumpre lembrar, foi criada pelo Padre Diogo Antônio Feijó, quando Ministro da Justiça da Regência Trina Permanente, em 18 de agosto de 1831.

Foi instituída com o escopo de defender a Constituição, a liberdade, a independência e a integridade do Império; manter obediência às leis, conservar ou estabelecer a ordem e a tranquilidade pública; auxiliar o Exército de linha na defesa das praças, fronteiras e costas. No dizer de Gustavo Barroso, a Guarda Nacional “foi uma instituição militar que, à exceção de seus derradeiros anos de decadência, prestou relevantes serviços ao país, como reserva do Exército” (1). Tomou parte em inúmeras campanhas internas, assegurando a manutenção da ordem, mas foi na Guerra do Paraguai que ela mais se destacou, mobilizada pelo Decreto n.º 3.383.

A Guarda Nacional só foi extinta pelo artigo 22, do Decreto n.º 13.040, de 29 de maio de 1918.

Os Corpos de Voluntários da Pátria foram criados pelo Decreto n.º 3.371, de 7 de janeiro de 1865, do Governo Imperial, buscando aumentar o número de soldados no Exército Brasileiro, que no início da guerra era considerado inferior ao número de soldados do Exército Paraguaio.

Na ocasião, a solução encontrada pelo governo brasileiro “foi apelar para a tradicional magnanimidade do povo brasileiro, pacífico e tolerante, mas sempre pronto a derramar generosamente seu sangue em momentos de crise nacional, predisposto a assegurar com seu prestimoso concurso a integridade da pátria” (2).

Em consequência, o apelo do governo brasileiro ao voluntariado “despertou uma verdadeira cruzada patriótica, contribuindo para que o exército ativo que, em 1865, era de aproximadamente 18.320 homens, atingi-se, no ano seguinte, a elevada cifra de 67.365 homens e, em 1869, 82.271 homens” (3).

(1) BARROSO, Gustavo. História Militar do Brasil. Cia. Editora Nacional, São Paulo, 1938.

(2) DUARTE, Paulo de Queiroz. Os Voluntários da Pátria na Guerra do Paraguai. Rio de Janeiro, Biblioteca do Exército Editora, 1981, p.200.

(3) SCHWARCZ, Lilia Moritz. As Barbas do Imperador. São Paulo, Companhia das Letras, 1998, p.303.

Segundo nos informa Bretz, “o Governo Imperial, pelo Decreto n.º 919, de 27 de fevereiro de 1852, criou um comando superior da Guarda Nacional, nos municípios de Magé e Estrela. A Vila de Estrela, à qual pertencia o território da então Colônia de Petrópolis, coube um batalhão de Infantaria, com seis companhias e mais duas de reserva” (4).

Mais tarde, pelo Decreto n.º 3.010, de 25 de novembro de 1862, Petrópolis, então separado de Estrela, obteve seu primeiro batalhão privativo, com duas companhias, o 38º de Infantaria, que era composto de quatro companhias, e um batalhão de reserva, o 17º, com duas companhias.

Domingos Manuel Dias, petropolitano por adoção, já que nasceu em Portugal, em 1851, aqui chegando com apenas 10 anos de idade, foi um dos que tomou parte na Guerra do Paraguai, distinguindo-se por atos de heroísmo, sendo agraciado com as medalhas de ouro do valor militar e o “Passador n.º 5”, condecorações somente concedidas aos que combatiam com bravura.

Posteriormente, distinguiu-se em nossa cidade como Depositário Público da Comarca, como comerciante e como político, filiado ao partido liberal. Era Tenente Coronel da Guarda Nacional e foi o Presidente da última Câmara Municipal da Monarquia, transmitindo o poder à Intendência Municipal, nomeada pelo Governo Provisório Republicano.

Segundo informa a Tribuna de Petrópolis, na edição do dia 12 de março de 1919, “era um caráter austero e bom, contando por isso com muitas relações de estima” (5).

(4) BRETZ, Walter João. A Guarda Nacional de Petrópolis. In: O COMMERCIO, Petrópolis, 25 de julho de 1912, p.1.

(5) TRIBUNA DE PETRÓPOLIS. Petrópolis, 12 de março de 1919, p. 1.

Hermogênio Pereira da Silva, também petropolitano por adoção, ainda cursando a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, se ofereceu como voluntário para a Guerra do Paraguai. No posto de Tenente médico cirurgião, serviu nos hospitais brasileiros de sangue, na referida guerra.

Pelos relevantes serviços prestados, recebeu inúmeras citações, inclusive por sua atuação no hospital de campanha da histórica batalha de Tuiuti.

Retornou ao Brasil em consequência de uma grave enfermidade contraída no cenário da guerra.

Em 1884, mudou-se para Petrópolis, onde se casou em segundas núpcias com Carolina de Sá Carvalho, participando da fundação do Clube Republicano, do qual foi Secretário, tornando-se um destacado político.

O Município de Petrópolis “teve nele, por sua integridade, por sua cultura e por sua capacidade administrativa, o grande governante e líder político ao curso das duas primeiras décadas da República” (6).

Joaquim Francisco de Paula pertencia ao 38º Batalhão de Infantaria da Guarda Nacional, sediado em Petrópolis, no qual ocupava o posto de Tenente. Por ocasião da Guerra do Paraguai apresentou-se como voluntário, sendo incorporado “ao 5º Batalhão de Voluntários da Pátria, tendo participado das batalhas de Curupaiti, Tuiuti e Itororó, falecendo em conseqüência dos ferimentos recebidos nesta última batalha” (7). No decorrer da guerra, chegou ao posto de Major.

(6) SÁ EARP, Arthur Leonardo. Hermogênio Silva. In: Patronos do Instituto Histórico de Petrópolis – Informes Biográficos. Petrópolis, 1999, p.97.

(7) BRETZ, Walter João. A Guarda Nacional de Petrópolis. In: O COMMERCIO, Petrópolis, 25 de julho de 1912, p.2.

Ricardo Narciso da Fonseca chegou a Petrópolis, em 1844, um ano após a fundação da povoação, tendo dirigido um pequeno negócio na Fazenda do Córrego Seco, a pedido do Major Júlio Frederico Koeler.

Como capitão do 38º Batalhão de Infantaria da Guarda Nacional, comandou uma milícia cívica que prestou serviços durante a Guerra do Paraguai, guarnecendo a Fortaleza de Santa Cruz no Rio de Janeiro. Pouco depois foi promovido a major e, por ocasião da Revolta de 6 de setembro de 1893, foi elevado ao posto de Tenente Coronel.

Exerceu inúmeras atividades em nossa cidade “vereador em vários períodos, chegando a ocupar a presidência da Câmara Municipal, escrivão da Superintendência da Fazenda Imperial, secretário da Câmara Municipal no período republicano” (8).

(8) BRETZ, Walter João. A Guarda Nacional de Petrópolis. In: O COMMERCIO, Petrópolis, 25 de julho de 1912, p. 2.

João Detsi, natural da Grécia, onde nasceu em 1824, veio para o Brasil contratado para servir na campanha contra o ditador Rosas. Naturalizado brasileiro em 12 de agosto de 1856 e, comissionado no posto de Major, seguiu para o Paraguai, onde combateu de 1866 a 1867, recebendo a medalha “Passador n.º 2” (medalha geral da campanha contra Lopes).

Veio para Petrópolis, onde se casou com Ana Maria Rody, com quem teve vários filhos, entre os quais o Dr. Miguel Detsi, um dos engenheiros que construiu a Estrada de Ferro Príncipe do Grão Pará.

Faleceu João Detsi em nossa cidade, em 17 de março de 1881, segundo nos informa o Jornal de Petrópolis, de 19 de fevereiro de 1933.

João Cordeiro de Carvalho também participou da Guerra do Paraguai, tendo falecido em Petrópolis, aos 40 anos de idade, em 14 de setembro de 1885.

Em 8 de fevereiro de 1940, sua viúva, Clementina Cordeiro de Carvalho requereu à Prefeitura Municipal de Petrópolis (Requerimento n.º 01463, de 8 de fevereiro de 1940) certidão do registro de óbito de seu marido, para o fim especial de receber dos cofres do Ministério da Guerra a pensão devida aos voluntários que serviram na Guerra do Paraguai, de conformidade com o Decreto Federal n.º 1.544, de 28 de agosto de 1939, que concedia pensão vitalícia aos voluntários militares das campanhas do Paraguai e Uruguai.

João Cordeiro de Carvalho foi um estimado tabelião em nossa cidade. Ainda jovem, alistou-se como voluntário e fez toda a campanha da referida guerra, de onde voltou com a patente de Tenente Honorário do Exército. Foi condecorado com o grau de Cavaleiro da Ordem da Rosa, com as medalhas da Campanha da Guerra do Paraguai, da rendição de Uruguaiana, de bravura militar e, mais tarde, por ocasião das festas comemorativas levadas a efeito na capital, foi promovido a Capitão Honorário do Exército.

“Distinguiu-se no movimento da abolição dos escravos, a cuja causa dedicou-se com o sacrifício de seus interesses e de muitas amizades” (9).

No desempenho de seus deveres profissionais soube sempre merecer por sua honradez a estima e a consideração de seus superiores e a plena confiança dos petropolitanos.

Pantaleão Antônio Trigo, negro, também voluntário na Guerra contra Lopes, tomou parte em várias batalhas, tendo sido inclusive ferido em uma delas, sendo em consequência condecorado com a Medalha de Campanha. Em Petrópolis, onde viveu até o seu falecimento, tornou-se conhecido como fogueteiro nas festas cívicas e religiosas.

(9) GAZETA DE PETRÓPOLIS, Petrópolis, 18 de setembro de 1895, p. 2.

O Padre João Francisco de Siqueira Andrade, nascido em Jacareí (SP), em 1837, incorporou-se como Capelão do 7º Batalhão de Voluntários da Pátria, prestando seus serviços, até que foi vítima de uma pertinaz enfermidade que o obrigou a regressar à pátria.

Aos 30 anos de idade, veio para Petrópolis, a procura de um clima mais saudável, aqui criando o Asilo Nossa Senhora do Amparo, “soberbo monumento da caridade de nosso povo talhado para atravessar séculos e séculos” (10).

A Escola Doméstica Nossa Senhora do Amparo admitia, exclusivamente, meninas pobres e desvalidas, expostas aos perigos da miséria.

Faleceu em São José dos Campos (SP), em 10 de abril de 1881.

Domingos de Lima Ferreira de Britto, médico, foi também voluntário da Guerra do Paraguai, que mais tarde, segundo nos informa Machado “desfrutou em Petrópolis de uma popularidade, talvez ainda não igualada, tendo sido o primeiro Diretor do Hospital Santa Teresa, permanecendo no cargo de 8 de janeiro de 1892, até o ano de 1900″.

Manuel Cunha Barbosa, conhecido popularmente como “General Barbosinha”, veterano da Guerra do Paraguai, no dizer de Fróes, “subiu a montanha para repousar o corpo e serenar o espírito na paz da nossa Corrêas, logo que concluiu seu tempo de serviço na sangrenta guerra” (11).

Sua residência, comenta ainda Fróes “[…] era atraente e original pois as paredes internas eram revestidas, umas com bilhetes de loteria da Candelária, outras forradas com rótulos de caixas de fósforos Jankopin e ainda outras com cupões que os condutores da antiga Carris Urbanos da Corte destacavam e entregavam aos passageiros. O quarto do general, porém, era todo ele – paredes, portas e janelas – forrado com selos do correio que representavam uma pequena fortuna. Oferecia o cômodo ainda outra originalidade: a cama não tinha colchão, nela se dormindo sobre a tabua lisa” (12).

(10) MACHADO, Antônio.Trabalhos em Comissão do Centenário de Petrópolis, P.M.P., 1938, p. 268.

(11) FRÓES, Gabriel Kopke. O General Barbosinha. In: Revista Social, Petrópolis, n.º 500, 22 de abril de 1973, p.10.

(12) FRÓES, Gabriel Kopke. Id. Ibid., p.10.

Fato digno de nota é que, embora tenha sobrevivido à dura campanha militar, o general veio a falecer em consequência de um acidente; ao mudar de vagão, quando viajava de trem para Petrópolis, sofreu uma queda fraturando uma das pernas, sendo necessário amputá-la, com o que ele não concordou, vindo a falecer como resultado dos ferimentos mal cuidados.

No interessante trabalho “Exército em Operações na República do Paraguai, publicado pela Tipografia Francisco Alves de Souza, em 1877, encontramos algumas citações meritórias sobre o bravo militar: “promovido a Tenente Coronel, por merecimento (Resolução Imperial de 18 de dezembro de 1865, p. 132); desistiu da gratificação que lhe competia como diretor do hospital ambulante, em favor das despesas da Guerra. O Quartel General do Comando em Chefe do Exército em operações, no acampamento em Tala Corá, em 18 de março de 1866, deu conhecimento deste ato de patriotismo ao Governo Imperial, através da Ordem do Dia n.º 142, p. 267); ordenou sua Majestade o Imperador que o Marechal de Campo Barão de Herval, louve e agradeça a aquele oficial a prova que dá de seu patriótico procedimento (Ordem do Dia n.º 157 de 21 de junho de 1866, p. 518)” (13).

(13) EXÉRCITO EM OPERAÇÕES NA REPÚBLICA DO PARAGUAI. Rio de Janeiro, Tipografia Francisco Alves de Souza, 1877, p. 132, 267 e 518.